Transcrito do BLOG DO VICENTE
» DIEGO AMORIM
Não importam a dor, as lágrimas, nada. “Tem que esperar, tem que esperar”, responde, impaciente, a funcionária do Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF) a quem se aproxima dela para saber quantas pessoas estão na fila. Quando se trata de saúde, a angústia com a inércia dos serviços públicos parece ganhar proporções maiores. “Ninguém vê a gente, ninguém quer ajudar”, resmunga uma senhora, de terço nas mãos. A mãe dela está internada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). “É um absurdo”, dispara ela, numa frase fácil de ser escutada por ali.
Para quem depende do Estado para ter acesso a um médico, não resta muito a não ser obedecer à funcionária, ou seja: sentar e aguardar, mesmo que o desespero bata. “E ainda agradeça a Deus se for atendido”, diz Rita Vieira Leite, 60 anos, com dores pelo corpo. “Se não posso pagar, o jeito é esperar, meu filho. Mas vou chegar e sair daqui caladinha, sem maltratar ninguém”, completa a aposentada, enquanto, perto dali, pacientes começavam a reclamar da demora no atendimento do Pronto-Socorro.
Jercioni Morais, 66, saiu do Gama até o Hospital de Base, na Asa Sul, porque, na unidade de saúde de lá, a informação é de que não há médico disponível. A filha dela havia sido assaltada na noite anterior, em Valparaíso de Goiás, onde mora. Os bandidos deram uma coronhada e muitos chutes na jovem. O boletim de ocorrência não foi feito porque os policiais civis estavam de greve no Entorno. “O povo sofre”, tenta resumir Jercioni. “É uma humilhação. E eles nem olham para gente”, completa.
Com a falta de pessoal para fazer a triagem adequada do atendimento, o Correio flagra o momento em que um dos médicos deixa o consultório e vai ao saguão da emergência ouvir alguns pacientes. Ele orienta um ou outro sobre o que fazer e alerta uma mãe cujo bebê engatinha no chão do hospital: “Não deixe a criança assim. Aqui é tudo contaminado”. Os vigilantes terceirizados, responsáveis pelo rígido controle do acesso ao corredor que leva a consultórios e leitos, sabem disso. Só encostam nas maçanetas das portas com papel toalha.
Sempre que escuta no rádio ou lê no jornal representantes do governo falando de melhorias na saúde pública, José Lopes Viana, 52, se irrita. “Só se melhorou para eles porque, para nós, pobres, só piora. O sentimento é de que não valemos nada”, comenta um senhor que mora no Recanto das Emas e tenta marcar uma cirurgia para a mulher. O pedido médico que ele carrega dentro de uma pasta traz em destaque a urgência da prescrição. “A gente fica aqui nesta fila da morte, sem saber se vai dar certo ou não”, lamenta.
Antes mesmo do início do horário determinado para marcação de consultas e cirurgias, cerca de 100 pessoas se enfileiram na esperança de serem vistas e ouvidas pelo Estado. O aposentado Vitor Alves, 67 anos, é um dos que mendigam a atenção. “Ontem, passaram o dia dizendo que o sistema estava fora do ar. Quem está fora do ar são eles mesmos”, reclama o morador do Núcleo Bandeirante, à espera de um OK para tirar a radiografia da laringe recomendada pelo médico. “Isso aqui não tem solução, não”, solta uma senhora, desistindo de esperar.
Quem se dispõe, por necessidade, a encarar as longas filas por tempo indeterminado procura alguma forma de se distrair, nem que seja compartilhando a frustração. “O pior é que a gente se acostuma com isso aqui, a ficar sem perspectiva de que vai melhorar”, afirma Francisca Ribeiro, 41. Enquanto alguns pacientes se amontoam próximo à entrada do local das marcações, ela tricota. “Pelo menos, ameniza a sensação de tempo perdido”, explica.
A Secretaria de Saúde do DF informa que já houve um “avanço imenso” no serviço prestado à população e que as equipes passam por treinamentos e cursos pelo menos duas vezes ao ano.
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