quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

GOVERNOS ESTADUAIS NÃO TÊM CONTROLE SOBRE OS PRESÍDIOS, DENUNCIA INTEGRANTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA


Alessandra Duarte
(O Globo)
Supervisor de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário do Conselho Nacional de Justiça, o desembargador Guilherme Calmon critica o uso de verba na área e defende intervenção federal em presídios críticos.
Como o senhor avalia o anúncio de que o Regime Diferenciado de Contratações poderá ser usado para construir presídios?
Esse é um sinal de que o governo federal está se preocupando com o sistema penitenciário, mas é a adoção de uma medida paliativa. Ajuda, porque vai dar maior agilidade à contratação de construção de presídios, vai dar mais flexibilidade. Mas é uma medida que vai ter efeito a longo prazo. E esse efeito, quando vier, talvez já chegue defasado. O que temos percebido, no âmbito federal ou estadual, é resistência a ações que solucionem mais rapidamente pontos como condições de insalubridade das unidades, separação dos detentos e concessão de benefícios. Poderiam se planejar e realizar ações para melhorar serviços prestados dentro dos presídios. Mas os governos não têm controle do sistema prisional atual.
Um exemplo seria o Maranhão. Seria o caso de uma intervenção lá?
O CNJ não tem poder de decretar intervenção num estado, quem tem esse poder é o Supremo. Tem de haver uma ação da Procuradoria Geral da República pedindo essa intervenção, e isso segue para decisão do Supremo. A Procuradoria pode basear essa ação nesse nosso ofício ao estado, por exemplo, se o que recomendarmos ao governo estadual não for atendido. Outra situação crítica é no Presídio Central de Porto Alegre, onde o caso foi denunciado à Organização dos Estados Americanos; ali, pela falência do poder público, o Brasil pode, sim, vir a ser condenado na OEA. E talvez seja uma forma de se chegar a uma solução; no caso da Lei Maria da Penha, por exemplo, essa lei só veio após condenação do tipo. No Espírito Santo, por volta de 2008, foi denunciado que havia presos em contêineres; só depois que se chegou a esse fundo do poço é que o sistema lá começou a melhorar.
Já houve alguma intervenção federal desse tipo no país?
Em relação ao sistema prisional, acredito que não. E, na minha avaliação, há três estados onde já deveria ter havido uma intervenção federal no sistema penitenciário há muito tempo: Maranhão, Rio Grande do Sul e Rio Grande do Norte, também crítico, este ano teve rebeliões e fugas com mortos. E na pior rebelião no Maranhão este ano, o que houve? A capital parou, lojas fechando, com os boatos de arrastão. Há ordens de crimes vindas de dentro da cadeia. O problema prisional não é só do detento e de sua família, é da sociedade.
Como seria uma intervenção do tipo?
Quem passa a gerir o sistema estadual é o governo federal. Triagem de presos, revisão de benefícios, tudo passa para administração e responsabilidade federal.
Além de intervenção, quais outras medidas urgentes podem ser tomadas?
Mudanças no Fundo Penitenciário, por exemplo. Hoje, há um valor de aproximadamente R$ 1,2 bilhão reservado para melhorias e principalmente construção de unidades prisionais. Mas, desde que o Fundo foi criado (em 1994), nem um terço foi utilizado, liberado. É dinheiro subutilizado. Um dos motivos são as exigências rígidas do governo federal aos estados para liberar o recurso, como já possuir um terreno para a unidade e, principalmente, ter um projeto arquitetônico que, na minha opinião, cobra-se que tenha um padrão alto demais de hotelaria. Precisa haver revisão dessas exigências e da própria gestão do Fundo.

FELIZ ANO VELHO: 83.500 VAGAS FORAM PROMETIDAS EM PRESÍDIOS PELO GOVERNO FEDERAL, MAS NENHUMA ENTREGUE


A presença de visitantes ilustres, como o ex-ministro José Dirceu e o ex-deputado federal José Genoino, descortinou o mundo caótico do sistema prisional no Brasil, conhecido bem só pelos profissionais que nele trabalham ou quem o estuda. Quando os primeiros mensaleiros foram presos no Complexo Penitenciário da Papuda, advogados se apressaram em bradar as ilegalidades.
A primeira delas, alocar detentos de regime semiaberto em unidade fechada, evidencia uma das principais mazelas do setor: a falta de 240 mil vagas para abrigar 548 mil apenados. O problema da superlotação poderia ser menor caso o governo federal, chefiado nos últimos 11 anos pelo partido dos detentos mais célebres do caso, tivesse cumprido os dois planos lançados para a área carcerária, com a promessa de 83,5 mil vagas. Desse total, nenhuma foi entregue até agora.
GOVERNO LULA
A primeira investida no setor foi dada ainda pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No bojo do Programa Nacional de Segurança com Cidadania (Pronasci), ele incluiu a abertura de 41 mil vagas em unidades de jovens e adultos. A ideia era separar os presos por idade, crime cometido, periculosidade, reincidência. Nada foi criado e a tal separação, imprescindível para uma boa gestão do sistema, só é cumprida, hoje, por cerca de 30% dos estabelecimentos prisionais do país, de acordo com pesquisa feita pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Lula passou o bastão para a atual presidente, Dilma Rousseff, que reembalou a promessa em 2011, falando em 42,5 mil vagas para mulheres e presos provisórios. Por enquanto, nada saiu do papel.
As 32 mil vagas que surgiram no período das promessas presidenciais não cumpridas, de 2008 para cá, foram criadas pelos estados, que têm responsabilidade sobre a questão penitenciária. O fato de nada do que foi anunciado em 2011 pelo governo federal ter sido entregue, segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), ligado ao Ministério da Justiça, tem a ver com a complexidade do processo de contratação das obras.
Em nota, o órgão afirma que é “preciso o estado elaborar o projeto, o Depen e a Caixa (Econômica Federal), na condição de mandatária da União, precisam aprová-lo (obedecendo a legislação pertinente), o estado precisa dar início ao processo licitatório, e assim por diante”. O Depen acrescentou que há cinco obras iniciadas no Ceará, Sergipe e Goiás, totalizando 1.790 vagas. Outros quatro projetos já foram licitados e os demais estão em fase inicial de análise.

BRASIL NÃO PODE ENTRAR 2014 NA CONTRAMÃO DA HISTÓRIA COM TENTATIVA DE CENSURAR O STF


Carlos Newton
Projeto de lei que pretende acabar com a transmissão ao vivo dos julgamentos do Supremo Tribunal Federal pela TV Justiça, protocolado no último dia 18 pelo deputado Vicente Cândido (PT-SP), pretende, segundo o deputado, diminuir a exposição da corte e o “sensacionalismo exacerbado por parte de ministros”.
Essa iniciativa, coincidindo com o julgamento do Mensalão e com as prisões decretadas, pode parecer até uma espécie de retaliação ao tribunal, com desvio de finalidade do Parlamentar, o que por si só é grave. No entanto, conforme podemos acompanhar no cenário internacional, a tendência global é no sentido inverso, qual seja, a de ampliar a publicidade e transparência dos julgamentos dos Tribunais com transmissões pela televisão e internet. Não cabe ao Congresso interferir no funcionamento do STF nesse grau de detalhamento.
Reportagem de João Ozório de Melo no site Conjur mostra que os ministros da Suprema Corte dos EUA são os únicos que resistem às câmeras. Ao contrário do Brasil, congressistas americanos estão se empenhando em aprovar legislação que, de certa forma, “obrigue” a Suprema Corte dos EUA a liberar a transmissão ao vivo de suas audiências. O Comitê Judiciário do Senado elaborou um projeto de lei que, a qualquer momento, pode chegar ao plenário da Casa para votação.
ATRASO TECNOLÓGICO
A crítica de maior peso foi publicada dia 28/12, em artigo assinado nos jornais Los Angeles Times e Boston Herald, pela presidente da Suprema Corte de Ohio, ministra Maureen O’Connor. Ela escreveu que a Suprema Corte dos EUA é a única grande instituição da civilização ocidental que ainda não entrou no Século XXI, tecnologicamente.
De acordo com a ministra, as Supremas Cortes de todos os estados já permitem transmissões ao vivo por TV ou pela internet. Os tribunais de recurso estão adotando a medida progressivamente, a seu critério, liberando transmissões de audiências do plenário pleno — e não do painel de três juízes. O último foi o tribunal federal de recursos de São Francisco (Califórnia), que já começou a transmitir seus procedimentos.
No artigo, a ministra criticou alguns dos argumentos dos ministros da Suprema Corte, a começar pela defesa que fazem de seu direito de se manter longe das câmeras, porque são avessos à ideia de se tornarem figuras públicas e porque preferem a privacidade. “Eles não têm nenhum problema com a perda da privacidade, quando aparecem em frente a câmeras para promover um de seus livros”, ela afirmou.
No entanto, disse a ministra, o público tem todo o direito de ver os membros da Suprema Corte em ação, quanto o de escrutinar seus prefeitos, governadores e parlamentares. “A população tem uma expectativa de que, se alguma coisa é realmente importante, deve ser testemunhada em primeira mão”, ela escreveu.
“Praticamente todas as instituições de governos democráticos, em todo o mundo, responderam a essa expectativa da população, permitindo a transmissão de seus procedimentos por TV ou online. Menos a Suprema Corte dos EUA. Hoje em dia, mesmo julgamentos em fóruns criminais podem ser vistos até em smartphones, a 10 mil metros de altura”, afirmou.
“Está na hora de os tribunais darem um passo à frente e abrir seu sistema judicial historicamente opaco ao público, com a liberação de todos os tipos de câmeras”, escreveu.

CHARGE DO SPONHOLZ


DA SÉRIE ‘COISAS QUE NÃO CONSIGO ENTENDER’ - Percival Puggina



Estou lendo o livro de Romeu Tuma Junior, “Assassinato de Reputações”, que apenas anteontem consegui receber da Saraiva. Do pouco que já li não entendo como Lula, até agora, se manteve calado como se o livro não existisse.
Não imagino que alguém no Brasil, qualquer que seja seu nível de formação e informação, ainda tenha ilusões sobre o caráter de Lula. Mas o livro conta que a nação vem sendo iludida e que o país acabou presidido por um perfeito canalha. Canalha desde sempre, desde moço, para quem o passar dos anos não fez mais do que alargar os círculos nos quais aplica, com destreza, o conjunto de seus defeitos morais.
Um livro desses, cem anos atrás, acabaria em duelo. Hoje, não tem como não acabar em indignada entrevista (à imprensa) ou em demolidora audiência (na Justiça). O silêncio de Lula quando flagrado em suas estripulias é costumeiro. Que o digam Rose e Marisa Letícia. Mas o silêncio de Lula, também perante o livro do Tuminha, precisa ser gritado à nação. Talvez com força suficiente para despertá-la.

ECONOMISTAS ERRARAM FEIO NAS PREVISÕES PARA 2013. O OTIMISMO NÃO SE CONCRETIZOU.


Ligia GuimarãesValor Econômico
Na visão do boletim Focus, do Banco Central, a realidade frustrou a expectativa em 2013. Em janeiro, os cerca de cem analistas e instituições financeiras consultados pela autoridade monetária previam que a economia brasileira e a produção industrial iriam crescer mais de 3%. O câmbio terminaria o ano abaixo de R$ 2,10 e a taxa Selic em 7,25%. A balança comercial, segundo o Focus, manteria o ritmo aquecido dos últimos anos e teria superávit de US$ 15 bilhões.
A maioria dessas projeções não se concretizou. “Houve mais inflação, menos crescimento, mais câmbio, tudo foi um pouco pior”, diz o economista-chefe da Votorantim Asset Management, Fernando Fix, instituição que integra a lista Top 5 do Focus – das que mais acertam projeções.
Quando o ano começou, o que se pensava era que, após um 2012 fraco, este seria um ano de crescimento ainda modesto e sem altas na Selic, já que o juro baixo era uma das principais bandeiras do governo Dilma Rousseff e o mercado questionava se havia ingerência política sobre as decisões do BC. Tudo mudou em maio, quando o Fed (Federal Reserve, o banco central norte-americano) sinalizou que poderia reduzir seu programa mensal de compra de títulos, enxugando a liquidez global.A partir daí, notícias relacionadas à economia dos EUA tornaram-se cruciais para o comportamento dos indicadores econômicos no Brasil: o dólar subiu em relação ao real, aumentando a pressão sobre a inflação – que já vinha alta com o choque de alimentos observado no início do ano (1,99% em janeiro, com alta de 26% no preço do tomate) e chegava a arranhar a popularidade de Dilma.
Outra projeção que passou longe do acerto foi a da balança comercial: o superávit deve terminar o ano próximo a US$ 1 bilhão, nas projeções atuais – previsão bem mais modesta que os US$ 15 bilhões estimados em janeiro. A economia global cresceu menos e a China desacelerou no primeiro semestre, mas a decepção que fez a diferença nas projeções foi a produção de petróleo no Brasil.No caso da Tendências, a previsão em janeiro era que o superávit comercial no ano chegasse a US$ 12,5 bilhões, com déficit de US$ 17,2 bilhões na balança de petróleo. A projeção mais recente da consultoria caiu para déficit de US$ 24,1 bilhões na conta-petróleo, o que levará a balança comercial a superávit próximo a zero.

Cartas de Nova Iorque: O fim da era Bloomberg e a escola de Blasio


Luisa Leme
Neste ano novo, uma mudança foi certa em Nova York: com a chegada de 2014, a cidade também ganhou um novo prefeito. É o fim da era Bloomberg.
Antes de ser juramentado por Bill e Hillary Clinton nessa semana, o novo líder da cidade Bill de Blasio anunciou um dos sinais mais concretos para o fim desta era: a novachanceler das escolas públicas.
O cargo funciona como um “ministro da educação para a cidade”, e representa a filosofia do prefeito diante do setor. Bill de Blasio escolheu Carmen Fariña para a tarefa: a primeira professora com experiência no sistema a ganhar o cargo em 14 anos. A educadora que estava aposentada após trabalhar como professora, diretora e vice-chanceler por décadas, personifica as propostas de Blasio durante sua campanha sobre uma Nova York dividida em duas cidades.
O novo prefeito prometeu acesso universal à creches até os quatro anos de idade, programas extra curriculares para o ensino fundamental, e o fim de avaliações focadas em testes padronizados – um incômodo que tem unido pais nova-iorquinos, ricos e pobres.

Carmen Fariña e o novo prefeito de Nova Iorque, Bill de Blasio

Durante o anúncio sobre o cargo, Fariña, filha de imigrantes espanhóis, falou sobre a reavaliação de várias políticas da era Bloomberg, e disse que mudanças devem acontecer em conjunto com as pessoas e não de maneira arbitrária, prometendo mais dialogo com pais da cidade.
Em perfeito espanhol (mais uma novidade em comparação ao espanhol do prefeito Bloomberg, que gerou até humor no Twitter) ela prometeu que as escolas de Nova York não iriam negar o valor de duas línguas e outras culturas, e que além de aprender fatos para uma prova, alunos “devem aprender a pensar para viver a vida”.
Durante mais de uma década, Mike Bloomberg mudou muita coisa no sistema educacional e várias de suas políticas públicas tornaram-se modelo nacional. Explicando em uma insuficiente linha, Nova York é pioneira em priorizar a performance de alunos em testes de matemática e leitura para determinar a qualidade de professores em sala de aula e escolas como um todo.
A performance nos testes acaba determinando a qualidade das escolas e decisões sobre onde verbas públicas devem ser aplicadas – gerando um debate mais do que polêmico que também está presente hoje no Brasil.
Durante a prefeitura de Bloomberg, muitas escolas da cidade foram fechadas por receber uma nota baixa, dando espaço a escolas menores, mais segmentadas (e com processo seletivo), e instituições charter – escolas que funcionam com dinheiro público mas são administradas por instituições privadas muitas vezes dentro do prédio de escolas que foram fechadas. O resultado é que estudantes que não têm bons resultados nos testes acabam ficando em escolas públicas que não recebem tantos recursos e muitas vezes são fechadas.
Blasio e Fariña querem acabar com o sistema de avaliação que dá notas para as escolas. A nova administração não vai poder mudar todo o sistema, já que o foco em testes padronizados depende de leis estaduais e federais. Mas o plano é tomar decisões distintas das de Bloomberg. O próximo ano letivo só começa em setembro por aqui, mas as escolas de Nova York serão com certeza diferentes em 2014.

Luisa Leme é jornalista e produtora de documentários. Passou pela TV Cultura e TV Globo em São Paulo, e pelas Nações Unidas em Nova York. Mora nos Estados Unidos há sete anos e fez mestrado em relações internacionais na Washington University in St. Louis. Escreve aqui sempre às quintas-feiras. Mantém o blog DoubleLNYC com imagens e impressões sobre Nova York. Twitter: @luisaleme

2014, o ano bipolar

el país


O próximo ano será marcado por campos contraditórios no Brasil: de um lado, a alegria da Copa e de outro a revolta com os gastos

As eleições serão marcadas pela reafirmação política e também pela sua negação

      

Manifestantes em protesto ocorrido em 2013. / BOSCO MARTÍN
Se o ano de 2013 foi surpreendente e passou como um furacão no Brasil, com uma série de manifestações que surgiram sem aviso em todos os cantos do país, 2014 deverá ser um ano marcado pela “bipolaridade”, segundo especialistas ouvidos pelo EL PAÍS. Em um dos polos estará a “felicidade coletiva”, trazida pela Copa do Mundo. No outro, o descontentamento, que deve se refletir nos protestos contrários aos gastos com o Mundial. Será também o ano em que, de um lado, se discutirá a necessidade de um novo discurso na política, que poderá ter efeitos nas urnas durante as eleições presidenciais e governamentais, em outubro. Mas, também, haverá a negação da política, refletida em um aumento de votos nulos nas urnas de pessoas cooptadas, em parte, pelo discurso anarquista propagandeado pelos Black Blocs durante os cinco meses de 2013 em que o grupo destruiu “símbolos do capital” como os bancos e rechaçou a existência dos partidos nas manifestações.
Veja abaixo a opinião de quatro especialistas ouvidos pelo EL PAÍS sobre como o que aconteceu em 2013 vai influenciar 2014.

Fernando Abrucio, professor de ciências políticas da Fundação Getúlio Vargas (FGV)


As pessoas estão com uma maior capacidade de cobrança e querem mais e melhor do Estado brasileiro. Isso tudo tem relação com as mudanças sociais vividas nos últimos 15 anos: há uma maior escolarização, um aumento da renda, mais gente com casa própria, grandes transformações sociais. Os políticos se sentiram acuados e a sociedade mais capaz de pressionar. Mas as manifestações aos poucos foram perdendo o apoio e o processo foi associado com a violência. Se as manifestações sociais perto da Copa aparecerem com violência terão rejeição social muito grande. Com a Copa também haverá um clima mais difuso de alegria, felicidade coletiva. Há dois cenários possíveis: se houver manifestações, elas serão mais violentas. Com choques entre grupos sociais, entre Black Blocs e torcidas organizadas, que vão defender seus estádios. Ou teremos manifestações menores, sem muito apoio, caso a vida das pessoas continue como está hoje em termos sociais e econômicos e não haja nenhum grande catalisador. Em 2013, o que impulsionou os protestos, aumentou a adesão, foi a incompetência da Polícia Militar. Não é simples manter vivas essas chamas, as pessoas se desmobilizam muito facilmente. Elas querem cobrar o Estado brasileiro, mas não se organizaram. Passados seis meses [dos primeiros protestos], não surgiu nenhum partido vinculado às manifestações e não houve nenhum grupo capaz de organizar as demandas estruturais que estavam debaixo da onda. O que vão conseguir mudar?

Juca Kfouri, jornalista esportivo



WIKIMEDIA
Eu não tenho dúvida de que 2014 vai ser um ano importantíssimo para o Brasil. Vamos ter uma Copa do Mundo absolutamente bipolar, com muita festa dentro dos estádios e manifestações nas ruas. Às vezes se fala que aqueles que estão dentro dos estádios seriam alienados, mas na Copa das Confederações tudo aquilo que estava acontecendo embalou a seleção, como no hino cantado à capela (nos estádios, quando a seleção brasileira se perfilava antes do jogo). Acho que a Copa vai ter alguma importância para a reeleição da Dilma. Mas estamos falando de hipóteses. Acho que ela se reelege e o Brasil é o principal favorito para ganhar a Copa do Mundo. Acho que (a decisão sobre posições no Campeonato Brasileiro nos tribunais) pode ter algum peso (nas manifestações), mas nada será maior que a sacada do tal padrão Fifa, e que se comete até uma injustiça. A Fifa não pediu para o Brasil sediar a Copa. O combinado não sai caro, não sai barato. É um problema de governos. A Fifa paga muito o preço da sua imagem, que transborda para a imagem da CBF.

Fábio Malini, doutor em comunicação pela UFRJ e pesquisador do Laboratório de estudos sobre Imagem e Cibercultura da UFES


Em 2013, a mudança fundamental foi a exigência de um outro modelo de democracia. E isso nasceu de um rompimento com certa inércia da relação entre sociedade civil organizada e o Estado. As revoltas globais serão cada vez mais "beta permanentes", igual a um aplicativo de celular que está sempre sendo atualizado. Os protestos de 2013 estão atualmente em fase de desenvolvimento. E já irão ser atualizados com uma nova versão. Porque o governo Dilma e os Governos estaduais e municipais ainda não conseguiram resolver os grandes “memes” políticos da indignação de 2013, a saber: os direitos indígenas, a violência policial contra os pobres, a reforma política, tarifa zero no transporte público, os gastos excessivos com a Copa e os direitos LGBT. São cadáveres no armário desse e dos outros Governos no país. E ajudam no update desse mega aplicativo chamado "jornadas de junho". Hoje há cinco tipos políticos atuando com força nas redes sociais. O primeiro deriva de uma concepção de que a política deve servir aos interesses dos pobres contra todo tipo de desigualdade. E todos os meios (até uma "pequena" corrupção) justificam o fim. É uma subjetividade que acredita mais no Estado do que na sociedade. O segundo tipo defende os valores individuais contra o Estado. Querem menos impostos, menos gastos públicos e combate duro contra a corrupção (como um discurso antiestatal mais do que de transparência dos gastos). Esses dois grupos, naturalmente opostos, bipolares, predominavam até 2012. É possível identificar três novos tipos políticos: os indignados, os niilistas e as celebridades. Os indignados possuem um debate tenso sobre os métodos de atuação social: se se deve fazer mais ou menos ações radicais para fazer valer suas pautas. O niilista considera que não temos saída política, com um desprezo por essa política que está aí. É um tipo em alto crescimento, faz defesa da anulação do voto para que a democracia perceba que chegamos num limite institucional. E, por último, há as celebridades, o tipo popular espetacularizado na internet, com forte autoridade política em pautar seus fãs nas redes sociais. É nesse jogo de subjetividades políticas que a guerra eleitoral de 2014 acontecerá.

Maria do Socorro Sousa Braga, professora de ciências políticas da UFSCAR (Universidade Federal de São Carlos)


O sistema político brasileiro está consistente, estável, apesar dos novos partidos. Mas a presidência está polarizada entre PT e PSDB e acredito que estes partidos vão continuar predominantes em 2014, com uma terceira força que é a Marina Silva ou o Eduardo Campos, do PSD. Não consigo imaginar esses novos partidos se lançarem como alternativa às candidaturas já consolidadas, como foi em 1989, com Fernando Collor de Mello. Mesmo porque as manifestações não tinham o objetivo de lançar novas forças políticas. As manifestações só ocorreram justamente porque a democracia chegou a uma grande estabilidade. Também não acredito que nenhum desses quadros traga alguma proposta revolucionária, grandes mudanças, como o transporte público gratuito, pedido nas manifestações, que não fazem sentido em um país democrático capitalista. Essa terceira força, da Marina Silva, pode trazer alguma discussão de sustentabilidade, até porque precisa se diferenciar e se não tiver essa alternativa não consegue sustentar o argumento. O Aécio Neves (PSDB) já começou uma tentativa de se aproximar dos jovens, que foram os que foram às ruas. É uma estratégia de marketing. E a Dilma deve vir com um discurso diferente dos demais, mais voltado para os segmentos populares, que estão mais satisfeitos com o governo. O discurso deve ser de melhorar o que já está bom. É ela quem vai enfrentar a maior dificuldade de tentar passar a imagem de mudança esperada por esse setor da classe média que foi às ruas. Depois das manifestações, ela enfrentou redução da popularidade e o segmento que foi às ruas se mantém muito crítico ao governo. Deve aumentar o número de votos brancos e nulos, especialmente no Congresso Nacional, uma das casas mais criticadas pelos fatos envolvendo corrupção e desvio de dinheiro.

PSICANÁLISE DA VIDA COTIDIANA - A passagem do Tempo

CARLOS VIEIRA
No calendário romano o ano muda no primeiro de janeiro. Marca a passagem do tempo. O tempo que se move indiferente à vontade de todos; o tempo que traz sempre uma reflexão sobre a vida, sobre a finitude da existência e como estamos aproveitando ou desperdiçando nossos dias.
O tempo do passado é presentificado na memória, e só existe no presente, pois o passado passou e jamais voltará. O tempo do primeiro grito de terror e a alegria quando se nasce; o tempo do anseio de ser nutrido: de alimento e de afeto; o tempo da primeira palavra, da capacidade sempre complicada, de distinguir o eu do outro; o tempo do comer com sua própria mão, o tempo do começo da independência. A memória traz a saudade, e só se tem saudade quando a experiência vivida com as coisas e pessoas queridas, são experiência de amorosidade. Quem vive mergulhado no ódio, no ressentimento e na queixa, não pode ter a lembrança da presença na ausência: a saudade.
O tempo da primeira professora, o tempo do primeiro olhar e do primeiro namoro. O tempo da dor da perda da namorada, tempo do choro, do desalento e do desamor. O tempo da escola, da faculdade, o tempo da entrada no mercado profissional. O tempo sofrido, da perda de um pai, de uma mãe ou de um irmão. O tempo corroído pelas queixas de experiências não vividas, de arrependimentos por tê-las deixado para depois. É difícil viver integralmente o tempo presente. O presente é o único tempo que temos, segundo o fantástico escritor J.L.Borges. Verdade, só temos o presente, tanto no passado presentificado como no futuro imaginado, tudo é no presente. Viver o presente é saber da nossa finitude, da nossa existência finita. Viver o presente é viver vinte e quatro horas por dia; não sabemos se acordaremos no outro dia! O presente é alegre, prazeiroso e doloroso, mas só se aprende na vida se pudermos usufruir daquilo que temos.
O presente é hoje; é acordar, sair da preguiça depressiva, usar nossa agressividade útil para expandirmos a cada dia a nossa experiência. O presente é agora, pois não sabemos nada do tempo futuro, e o futuro do tempo é daqui há pouco mas nada dele podemos conhecer.
O futuro é incognoscível, é o desconhecido, aquilo que dói, ainda que não tenhamos consciência dessa dor. E é por que dói, que temos o hábito de preencher com fantasias e sonhos, para nos distrair de sofrer com nossa limitação psíquica. Não saber é uma experiência de impotência que raramente é tolerada. O futuro é assim, não se sabe, não há certeza de nada. J.Keats, poeta inglês, escrevendo sobre a genialidade de W. Shakespeare disse que o “homem de êxito” é o homem que pode tolerar a dúvida, a incerteza e o mistério sem necessariamente querer chegar a fato ou razão. O futuro só se sabe nas fantasias conscientes do presente; nos sonhos, projetos e expectativas. O futuro desafia a limitação da inteligência humana! Só nos restam, conjecturas, dúvidas, incertezas e esperança de realizações.
Celebremos o tempo do amor, das conquistas realizadas, do encontro desacreditado, de amar o amante que estava na fantasia, de ver nascer no filho a continuidade da vida, a única experiência que se pode dizer “infinita”. É nos filhos que sabemos que viveremos para sempre! Celebremos a passagem do ano, passagem metafórica, pois toda hora é a passagem do tempo. Guimarães Rosa, nas palavras de Riobaldo, no Grande Sertão, dizia que não era morrer que tinha medo, o maior medo é de nascer. Por isso que nosso destino é o presente das “travessias”. É na travessia que se vive, e travessia é consciência do tempo presente, é ter a capacidade de aprender no tempo vivido.
Lendo o livro de João Cabral de Melo Neto – “A Educação Pela Pedra” (1962-1965) dou de cara com um poema: “Habitar o Tempo”, e o descrevo aqui pensando na passagem do tempo, poema dedicado a F. A. Bandeira de Melo:

“Para não matar seu tempo, imaginou:/ vivê-lo enquanto ele ocorre, ao vivo;/ no instante finíssimo em que ocorre,/ em ponta de agulha e porem acessível;/ viver seu tempo: para o que ir viver/ num deserto literal ou de alpendres;/ em ermos, que não distraiam de viver/ a agulha de um só instante, plenamente./ Plenamente: vivendo-o de dentro dele;/ habitá-lo, na agulha de cada instante,/ em cada agulha instante: e habitar nele/ tudo o que habitar cede ao habitante.
E de volta de ir habitar seu tempo:/ ele corre vazio, o tal tempo ao vivo;/ e, como além de vazio, transparente,/ o instante a habitar passa invisível./ Portanto: para não matá-lo, matá-lo;/ matar o tempo, enchendo-o de coisas;/ em vez de deserto, ir viver nas ruas/ onde o enchem e o matam as pessoas;/ pois, como o tempo ocorre transparente/ e só ganha corpo e cor com seu miolo(o que não passou do que lhe passou),/ para habitá-lo: só no passado, morto.”
Carlos.A.Vieira, médico, psicanalista, Membro Efetivo da Sociedade de Psicanálise de Brasília e de Recife. Membro da FEBRAPSI e da I.P.A - London

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO




“Vamos entrar em 2014 para ganhar 2014”
Governador e presidenciável Eduardo Campos (PSB-PE), otimista em relação à eleição


MAIS PUBLICIDADE, MENOS PREVENÇÃO

Apesar da crônica anunciada que é a tragédia com as chuvas de fim do ano, o governo do Espírito Santo gastou mais com publicidade do que com prevenção. Segundo o Portal da Transparência, foram empenhados R$ 23,4 milhões, em 2013, ao programa Prevenção, Proteção

e Socorro a Desastres, dos quais apenas R$ 7,7 milhões foram pagos. O valor equivale a 10% do que foi liberado para área de Comunicação.

GRANA ALTA

O governo do ES empenhou R$ 114,8 milhões para a Comunicação Social nas diversas áreas, sendo que R$ 74,8 milhões já foram pagos.

IMPORTÂNCIA ZERO

Enquanto isso, destinou para a formação de profissionais da educação apenas R$ 753 mil, dos quais só foram desembolsados R$ 527 mil.

QUE DROGA

As despesas com gestão de política sobre drogas também ficaram bem abaixo do valor gasto com publicidade: R$ 928 mil.

PIOR RANKING

Na sequência dos programas com menos verba estão o de redução de homicídios (R$ 1 milhão) e habitação de interesse social (R$ 8 milhões).

EQUIPE TAPEIA DILMA

Na tentativa de evitar aborrecimentos e arranca-rabos com a presidente Dilma, a equipe de apoio presidencial desenvolveu uma série de ações rotineiras para fingir obedecer suas ordens “sem noção”. Segundo fontes palacianas, quando Dilma perde a paciência e decola antes dos assessores, pilotos já estão orientados a voar mais devagar, para dar tempo de a equipe chegar na frente e deixar tudo arrumado.

JOGO DOS...

Certa vez, Dilma percebeu que o helicóptero dos assessores estava ultrapassando o seu. Irritada, logo soltou: “Mas que m** é essa”.

...SETE ERROS

Como Dilma não tem paciência para esperar as malas, pilotos também enrolam o desembarque, para dar tempo de descarregar a bagagem.

MOTIVO DE BRIGAS

Segundo assessores, assim que desce do avião, Dilma nunca espera pela bagagem, mas cobra que tudo esteja lá assim que chega no hotel.

ISOLA O PSB

A cúpula nacional pressiona o PMDB de Pernambuco a se aliar ao senador petebista Armando Monteiro, que disputará o governo estadual em 2014, ou a lançar candidato próprio. O nome mais cotado é o do prefeito de Petrolina, Júlio Lóssio.

A SAGA CONTINUA

Quase um ano após ter sido denunciado por assédios moral e sexual no Consulado do Brasil, o embaixador Américo Fontenelle continua em Brasília, morando em apartamento funcional e recebendo em dólares, como se ainda estivesse em Sydney (Austrália), onde foi acusado.

MATÉRIA DE MEMÓRIA

Além de paraíso offshore, o Panamá – sede da empresa proprietária do Hotel St. Peter, de Paulo Abreu, tem cassinos, que lembram bingos, que lembram “laranjas” e Waldomiro Diniz, ex-assessor de José Dirceu.

PROBLEMÃO

Levantamento encomendado pelo PSDB à Consult Pesquisa revela que mais de 40% dos entrevistados consideram a segurança o maior problema enfrentado nas cidades de João Pessoa e Campina Grande, na Paraíba.

FALTA DAR...

Líder do PDT, André Figueiredo (CE) enviou requerimento de indicação à presidente Dilma sugerindo que ela estenda para cargos de confiança sua proposta de 20% de cotas para negros em concursos públicos.

...O EXEMPLO

Para Figueiredo, a iniciativa também deveria partir do prefeito Fernando Haddad (PT-SP), que apressou-se em aprovar lei municipal de cotas para negros antes mesmo de Dilma: “É uma questão de coerência”.

HONORIS JERICO

A presidente Dilma sancionou lei proibindo venda de produtos imitando cigarros, para reduzir o número de fumantes. Ainda não se sabe o formato dos cigarrinhos de maconha, caso a droga seja liberada.

COPA DA BANDIDAGEM

O inglês Daily Star alertou que bandidos armados, próximos ao estádio do Corinthians, ameaçam “arrastão” de torcedores ingleses na abertura em São Paulo, em junho. O chefão explicou ao jornal: “são ingênuos e têm mais grana”. Eles pretendem “arrecadar” uns R$ 100 mil.

PENSANDO BEM...

...2014 estreia hoje, mas só começa mesmo depois de fevereiro.


PODER SEM PUDOR

ASSÉDIO NO GABINETE

Jânio Quadros era governador de São Paulo quando recebeu em seu gabinete, na tarde de 3 de setembro de 1955, a funcionária Diva Pereira de Lima, que reivindicava a readmissão no Departamento de Saúde. Papo vai, papo vem, segundo relato de Diva, Jânio partiu para o ataque, abraçando-a e tentando entrar com ela num armário, o "ninho". Ela recusou, ele desistiu:

- Foi melhor, Diva... Foi melhor você ter me resistido.

E nunca mais a recebeu.

A geografia da criminalidade - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 01/01/14

Com a redistribuição da renda nacional e da atividade econômica, ocorrida no período de 2000 a 2010, mudou também a geografia da criminalidade no País, levando a violência urbana a migrar do Sudeste para as Regiões Norte e Nordeste. Essa é uma das conclusões de um estudo do diretor de Estado, Instituições e Democracia do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o economista Daniel Ricardo de Castro Cerqueira, cuja tese de doutorado sobre as causas e as consequências do crime no Brasil foi vencedora da última edição do Prêmio BNDES de Economia. O trabalho foi elaborado com base na análise das estatísticas do Ministério da Saúde.

Segundo o estudo, Estados que historicamente lideravam as estatísticas de homicídios, como São Paulo e Rio de Janeiro, registraram na década de 2000 queda de 66,6% e de 35,4% no número de assassinatos por 100 mil habitantes, respectivamente. Já o índice de homicídios cresceu 339,5% no Estado da Bahia, no mesmo período. No Estado do Maranhão, o aumento foi de 373%. Na Região Norte, o Estado do Pará registrou uma elevação de 258,4%.

Além da migração da violência de Estados mais ricos para áreas mais pobres dos Estados menos desenvolvidos, o estudo do diretor do Ipea aponta a tendência de interiorização da violência, com quedas em mortes nas capitais e elevação em municípios menores. O ranking das cidades com maior número de assassinatos é liderado por Simões Filho, uma cidade de 130 mil habitantes, vizinha a Salvador, e Ananindeua, situada na região metropolitana de Belém.

O estudo mostra ainda que as taxas de homicídios nos municípios considerados pequenos pelo Ipea - com menos de 100 mil habitantes - tiveram um crescimento médio de 52,2%, entre 2000 e 2010. Já as cidades consideradas grandes - com mais de 500 mil habitantes - registraram uma queda de 26,9% no mesmo período. Nas cidades de porte médio - com população entre 100 mil e 500 mil habitantes - a taxa de homicídios aumentou 7,6%. Entre as 20 cidades com maior índice de mortes violentas, 10 são pequenas, 9 são de porte médio e apenas 1 - Maceió, na sexta posição - é considerada grande.

As mudanças na geografia da criminalidade, ocorridas no decorrer da década de 2000, foram provocadas por diversos fatores - alguns de alcance nacional e outros com especificidade regional. Entre os fatores de alcance global, o estudo destaca o impacto do I Plano Nacional de Segurança, que aumentou o repasse de verbas da União para a expansão do sistema prisional federal e estadual, e do Estatuto do Desarmamento, que entrou em vigor em 2003. Também ressalta as mudanças ocorridas no mercado de drogas, que acompanhou a expansão econômica das cidades situadas fora dos eixos metropolitanos. "Essas localidades passaram a se tornar mais atrativas para o tráfico porque, com mais renda, o consumo de drogas tende a aumentar. Esse mercado ilegal é acompanhado da violência. O crescimento fica comprovado com o aumento no número de mortes por overdose em oito vezes no País, no período de 2000 a 2010", afirma Daniel Cerqueira.

Entre os fatores de caráter local e regional, o estudo do Ipea destaca a associação entre crescimento econômico e atividades criminosas em áreas de fronteira, desmatamento e extração ilegal de madeira. Destaca, igualmente, a formulação de novos padrões de política pública em matéria de segurança e assistência social, como a instalação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) nas favelas dominadas pelo narcotráfico na cidade do Rio de Janeiro, a partir de 2008, e a estratégia adotada pelo Estado de São Paulo, que intensificou operações e investigações com base na expansão dos serviços de inteligência e na utilização de estatísticas para planejar as ações preventivas e repressivas das Polícias Civil e Militar.

O estudo do Ipea fornece informações valiosas, mostrando como a combinação entre mais eficiência dos órgãos policiais com melhoria de serviços públicos pode ser decisiva para a redução da violência.

Sucursais do inferno - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE


CORREIO BRAZILIENSE - 01/01/14
Não se debita à retórica a declaração do ministro da Justiça a respeito das cadeias nacionais. "Prefiro morrer", disse José Eduardo Cardozo em novembro, "a cumprir pena em presídios brasileiros." As masmorras espalhadas de norte a sul do país se tornaram cenários de horror que superam o inferno que Dante magistralmente descreveu na Divina Comédia.
Celas não isolam pessoas. Superlotadas, enjaulam homens e mulheres em condições que a Sociedade Protetora dos Animais não aceitaria como abrigo dos seres irracionais que representa. A degradação chega a tal ponto que nem Papai Noel acreditaria que apenados tenham a menor chance de recuperação. Ao contrário. Transformam-se em feras.

Não surpreendem, por isso, as notícias que vêm do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís. Em 2013, nada menos de 59 detentos perderam a vida, três por decapitação - número quase cinco vezes maior que o registrado no ano anterior. A violência, porém, não se restringe aos encarcerados. Atinge os familiares.

Um dos relatos mais chocantes informa que mulheres viraram moeda de troca. Para evitar que o detento seja assassinado, mulher, companheira, irmã ou filha são estupradas por líderes de facções. Tudo se passa sob o olhar complacente das autoridades encarregadas da segurança das cadeias. A conclusão só pode ser uma - o Estado é cúmplice dos bandidos.

A tragédia hoje encenada no Maranhão teve outros palcos e terá novos sem dúvida. Em 1982, a barbárie brasileira cobriu o país de vergonha internacional. A imagem dos 111 cadáveres do massacre de Carandiru rodou o mundo. Começou aí a série de processos abertos no Sistema Interamericano de Direitos Humanos, da OEA, por violações no sistema carcerário. Trata-se de atestado de incapacidade dos governos estaduais e federal de fazer o dever de casa.

Apesar do vexame, não se vislumbra luz no fim do túnel. Nos últimos 11 anos, o governo federal lançou com alarde dois planos para a área carcerária. Entre as propostas neles apresentadas, figura a promessa de criação de 83,5 mil vagas. Nenhuma foi entregue. As unidades da Federação, também responsáveis pelo setor, abriram 32 mil. A superlotação ocorre em todos os regimes.

 O diagnóstico é amplamente conhecido. Mas falta vontade de aviar a receita. Ela passa necessariamente por duas vias. Uma é a da remediação. Condenados que precisam ser encarcerados têm de receber tratamento humano, apto a reconduzi-los ao convívio da sociedade. É necessário criar condições de ressocialização para evitar reincidências.

A outra, a da prevenção. Urge evitar o aumento da População carcerária. Investimentos em educação, segurança e lazer mantêm os jovens no sistema e, consequentemente, mais protegidos dos riscos que rondam os que não têm nada a perder.