quarta-feira, 30 de novembro de 2016

O QUE O PARKINSON E A FORÇA DE MINHA AVÓ ME ENSINARAM SOBRE A VIDA


“Meus cadernos de poesia, por favor.” Todas as manhãs, em mantra diário, minha avó faz o pedido à minha tia. Lorna cumpre o ritual. Busca os escritos, os coloca sobre o colo de minha avó e a ajuda a folhear as páginas amareladas preenchidas à mão com versos de Drummond, Augusto dos Anjos, Casimiro de Abreu… algumas vezes recitam juntas, em emoção pujante, a genialidade das rimas que clareiam a alma. Outras tantas, apenas silêncio. Minha avó olha os cadernos, certifica-se de que estão em bom estado e se acalma na certeza de que ali, em folhas empoeiradas, permanece intacta a ponte que a liga a um passado menos duro que os dias atuais. Sem conseguir escrever mais, ela respira um pouco de saudade, revive um pouco de beleza.

Há duas maneiras de se encarar o fim. Uma é morrendo. A outra é recusando a primeira. Minha avó escolheu a recusa e tem bancado a escolha. Há 20 anos minha família se viu obrigada a conviver com a palavra “degeneração”. A nós, no entanto, foi destinada a parcela menos severa do problema. Minha avó foi forçada a aceitar a convivência de fato dolorosa. E aceitou. Não se trata de resignação. Esse termo não combina com quem resolveu lutar todos os dias pela vida, como se esta ainda fosse uma opção divertida. Mas até em gente assim, que consegue animar a mente enquanto o corpo dá adeus, o Parkinson é avassalador.
O mundo, então, começou a tremer. Cortar a carne, segurar o copo, abotoar a camisa… as tarefas mais triviais foram interrompidas. Tudo começou a cair. Os objetos das mãos, o corpo diante do primeiro obstáculo mais rígido que seus movimentos. Eu vi a mulher vigorosa, que aos 60 anos jogava vôlei comigo, curvada na cama, pele agarrada aos ossos, pernas pedindo ajuda para encontrar uma posição que amenizasse a dor. Rapidamente falar também se tornou um desafio. O mais penoso para a outrora oradora da turma, mãe comunicativa, amante incorrigível do deboche propalado em alto e bom som. A batalha passou a ser o esforço constante para abrir a garganta, desenrolar a língua.
Mas se o Parkinson lhe roubou o paladar, o ritmo e o equilíbrio, por favor, que não lhe roube a fala. E isso vó Cida não tem permitido. Como conversa! E como ri… de si, dos outros, da vida, mesmo quando tudo está na contramão. Às vezes canta: “reconhece a queda e não desanima. Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima”. Malabarista na corda bamba das dores físicas e emocionais, dribla o peso que o destino impôs ao optar pela leveza do humor frouxo. Com unhas pintadas e lenço colorido no pescoço, pede para passear. Durante o trajeto — de um quarto ao outro na cadeira de rodas — acena com mãos trêmulas a quem estiver no caminho, feliz por sair do sofá. Feliz por ser quem é e estar onde está dentro das possibilidades presentes.
Às vezes chora, em expressão inevitável das angústias que sente. Mas, na maior parte do tempo, extrai do que sobrou o melhor que consegue, sendo autora e não refém da própria história e nos fazendo entender que a vida é escolha. Sem força para levar comida à própria boca, sempre repete que quando eu for visitá-la fará meu doce preferido. Também diz que vai comprar um cachorro e cuidar dele. Para mim, não há sinais de insanidade nos anseios que ela alimenta, incompatíveis com sua condição física. Para mim, são exatamente eles que configuram a vontade que ela tem de viver, agarrada a suas referências afetivas mais preciosas.
Sabemos que as dores têm aumentado e o Parkinson — ainda sem cura — piorado. Isso levando-se em conta o que se sabe. Muito provavelmente o que sente de pior minha vó guarda em segredo altruísta. E entre abraços nos netos, palavras de afeto, piadas, poemas e entusiasmo contagiante, ela tem salvado nossos dias azedados pela ineficiência que temos em lidar com nossas limitações mais bestas. Com sua força, ela tem nos ensinado a ser mais fortes também.
Certa vez, tremendo muito, minutos depois de sentir uma forte dor nos braços, minha vó me perguntou como eu estava. Eu disse: “estou ótima”. “Pois então estamos quites”, ela emendou, de forma sincera. Não por se esquecer da doença ou da peleja diária que o Parkinson impõe. Não por ser imune ao drama de perder autonomia e liberdade enquanto a degeneração avança. Mas por conseguir, com sabedoria rara, desfrutar da felicidade acessível antes de lamentar a que escapou das mãos.

Terroristas Islâmicos não são Pobres e Analfabetos, são Ricos e Educados


  • "Quanto mais os jovens estiverem integrados maior a chance deles se radicalizarem. Esta hipótese é sustentada por uma série de evidências". — De um relatório realizado por pesquisadores da Universidade Erasmus em Roterdã.
  • "A proporção de administradores (do Estado Islâmico) e também de combatentes suicidas aumenta com o grau educacional", segundo o relatório do Banco Mundial. "Além disso, aqueles que se propunham se tornar homens-bomba se situavam, em média, no ranking do grupo mais educado".
  • O MI5 da Grã-Bretanha revelou que "dois terços dos suspeitos britânicos têm um perfil de classe média e aqueles que querem se tornar homens-bomba são muitas vezes os mais educados".
  • Os pesquisadores descobriram que "quanto mais ricos forem os países maior a probabilidade deles fornecerem mais recrutas estrangeiros ao grupo terrorista (ISIS)".
  • O Ocidente parece ter dificuldade em aceitar que os terroristas não são movidos pela desigualdade e sim pelo ódio à civilização ocidental e aos valores judaico-cristãos do Ocidente.
  • Para os nazistas a "raça inferior" (judeus) não merecia existir, para os stalinistas os "inimigos do povo" não tinham direito de continuar vivendo, para os islamistas é o próprio Ocidente que não merece existir.
  • Foi o antissemitismo, não a pobreza, que levou a Autoridade Palestina a dar o nome de Abu Daoud, arquiteto do massacre de atletas israelenses nas Olimpíadas de Munique, a uma escola.
"Há uma convicção preconcebida de que os jovens da Europa que deixam o continente para irem para a Síria são vítimas de uma sociedade que não os aceita e não lhes oferece suficientes oportunidades... Outra convicção preconcebida muito comum em curso na Bélgica é a de que, apesar das pesquisas que refutam isso, a radicalização ainda é muito frequentemente, de forma equivocada, interpretada como um processo resultante da malograda integração... Por esta razão, ouso dizer que quanto mais os jovens estiverem integrados, maior a chance deles se radicalizarem. Esta hipótese é sustentada por uma série de evidências".
Esse foi o resultado de uma pesquisa holandesa, de extrema importância, conduzida por um grupo de acadêmicos da Universidade Erasmus, em Roterdã. Os terroristas parecem ser modelos de integração bem sucedida, por exemplo: Mohammed Bouyeri, o terrorista marroquino-holandês que em 2004 baleou e matou o cineasta Theo van Gogh e em seguida o esfaqueou e cortou sua garganta. "Ele (Bouyeri) era um cara educado, com boas perspectivas de vida", salientou Job Cohen, prefeito do Partido Trabalhista de Amsterdã.
Os terroristas parecem ser modelos de integração bem sucedida Mohammed Bouyeri (esquerda), o terrorista marroquino-holandês que em 2004 baleou e matou o cineasta Theo van Gogh (direita) e em seguida o esfaqueou e cortou sua garganta. "Bouyeri era um cara educado, com boas perspectivas de vida", salientou Job Cohen, prefeito do Partido Trabalhista de Amsterdã.
O levantamento holandês foi seguido por outro realizado na França, aumentando ainda mais as evidências que sustentam a tese que vai contra a crença liberal segundo a qual para derrotar o terrorismo a Europa precisa investir em oportunidades econômicas e em integração social. Dounia Bouzar, diretora do Centro de Prevenção, Desradicalização e Acompanhamento Individualizado (CPDSI), uma organização francesa especializada em radicalismo islâmico, estudou os casos de 160 famílias cujos filhos tinham deixado a França para lutar na Síria. Dois terços pertenciam à classe média.
Estas constatações desmantelam o mito do proletariado do terror. De acordo com um novo relatório do Banco Mundial "recrutas do Estado islâmico são mais educados do que seus compatriotas".
Pobreza e privação não são, segundo ressaltou John Kerry, "as causas fundamentais do terrorismo". Estudando os perfis de 331 recrutas de um banco de dados do Estado Islâmico, o Banco Mundial constatou que 69% pelo menos concluíram o ensino médio, ao passo que um quarto é formado em uma faculdade. A grande maioria desses terroristas tinha um emprego ou profissão antes de se juntar à organização islamista. "A proporção de administradores e também de combatentes suicidas aumenta com o grau educacional", segundo o relatório do Banco Mundial. "Além disso, aqueles que se propunham se tornar homens-bomba se situavam, em média, no ranking do grupo mais educado".
Menos de 2% dos terroristas são analfabetos. O estudo também aponta para os países que abastecem o ISIS com o maior número de recrutas: Arábia Saudita, Tunísia, Marrocos, Turquia e Egito. Ao analisar a situação econômica desses países, os pesquisadores descobriram que "quanto mais ricos forem os países maior a probabilidade deles fornecerem mais recrutas estrangeiros ao grupo terrorista".
Outro relatório explica que "os países mais pobres do mundo não têm níveis excepcionais de terrorismo".
Apesar das evidências, um mantra progressivo vive repetindo que o terrorismo islâmico é o resultado da injustiça, miséria, depressão econômica e agitação social. Esta afirmação não tem absolutamente nada a ver com a realidade. A tese de que a miséria gera terrorismo é muito difundida hoje no Ocidente, desde o economista francês Thomas Piketty ao Papa Francisco. Ela é provavelmente tão popular porque cai como uma luva no sentimento coletivo de culpa do Ocidente, buscando racionalizar o que o Ocidente parece ter dificuldade em aceitar: que os terroristas não são movidos pela desigualdade e sim pelo ódio à civilização ocidental e aos valores judaico-cristãos do Ocidente. Quanto a Israel isso significa: o que os judeus estão fazendo na terra que - embora por 3.000 anos vem sendo chamada Judeia - nós achamos deve ser dada aos terroristas palestinos? Os terroristas provavelmente perguntam a si mesmos porque deveriam negociar se podem ter tudo o que quiserem sem oferecer nada em troca.
Para os nazistas a "raça inferior" (judeus) não merecia existir, mas devia ser morta nas câmaras de gás, para os stalinistas os "inimigos do povo" não tinham direito de continuar vivendo e tinham que morrer no trabalho forçado e frio do Gulag, para os islamistas é o próprio Ocidente que não merece existir e tem que ser explodido.
Foi o antissemitismo, não a pobreza, que levou a Autoridade Palestina a dar o nome de Abu Daoud , arquiteto do massacre de atletas israelenses nas Olimpíadas de Munique, a uma escola.
Os atentados de Paris, cujo aniversário foi lembrado há poucos dias na França, foi um golpe desencadeado por uma ideologia que não procura lutar contra a pobreza e sim conquistar o poder através do terrorismo. É a mesma ideologia islamista que massacrou os jornalistas da revista Charlie Hebdo e policiais que estavam em serviço para protegê-los, que forçou o escritor britânico Salman Rushdie a se esconder por uma década, que cortou a garganta do Padre Jacques Hamel, que massacrou passageiros em Londres, Bruxelas e Madrid, que assassinou centenas de judeus israelenses em ônibus e restaurantes, que matou 3.000 pessoas nos Estados Unidos no 11 de setembro, que assassinou Theo Van Gogh em uma rua de Amsterdã por ele ter feito um filme, que cometeu estupros em massa na Europa e massacres nas cidades e desertos da Síria e do Iraque, que explodiu 132 crianças em Peshawar e que mata normalmente tantos nigerianos que ninguém mais presta nenhuma atenção a isso.
É a ideologia islamista que impulsiona o terrorismo, não a pobreza, a corrupção ou o desespero. São eles (terroristas), não nós.
Toda a história do terror político é marcada por fanáticos com educação avançada que declararam guerra contra suas próprias sociedades. O genocídio comunista do Khmer Vermelho no Camboja saiu das salas de aula da Sorbonne em Paris, onde seu líder Pol Pot, estudou os textos dos comunistas europeus. As Brigadas Vermelhas na Itália eram um projeto de meninas e meninos privilegiados e ricos da classe média. Entre 1969 e 1985 o terrorismo na Itália matou 428 pessoas. Fusako Shigenobu, o líder do grupo terrorista japonês Exército Vermelho, tinha um elevado nível de formação em literatura. Abimael Guzman, Fundador do Sendero Luminoso no Peru, um dos grupos guerrilheiros mais cruéis da história, lecionou na Universidade de Ayacucho onde concebeu uma guerra contra "a democracia das barrigas vazias." "Carlos, o Chacal, "o terrorista mais famoso da década de 1970, era filho de um dos advogados mais ricos da Venezuela, José Altagracia Ramirez. Mikel Albizu Iriarte, líder dos terroristas bascos do ETA, veio de uma família rica de San Sebastián. Sabri al-Banna, o terrorista palestino conhecido mundialmente como "Abu Nidal", era filho de um rico comerciante natural de Jaffa.
Alguns dos terroristas britânicos que se juntaram ao Estado Islâmico vêm de famílias ricas e estudaram nas escolas de maior prestígio do Reino Unido. Abdul Waheed Majid fez a longa viagem desde a cidade inglesa de Crawley à Aleppo, na Síria, onde detonou uma bomba presa ao corpo. Ahmed Omar Saeed Sheikh, arquiteto do sequestro e assassinato do jornalista americano Daniel Pearl, era graduado pela London School of Economics. Kafeel Ahmed que entrou com um jipe repleto de explosivos no aeroporto de Glasgow, havia sido presidente da Sociedade Islâmica da Queen's University. Faisal Shahzad, o terrorista fracassado de Times Square, em Nova Iorque, era filho de um alto funcionário do exército paquistanês. Zacarias Moussaoui, o vigésimo homem dos ataques do 11 de setembro, era Ph.D em Economia Internacional da Universidade de South Bank de Londres. Saajid Badat, que queria explodir um voo comercial, estudou optometria na Universidade de Londres. Azahari Husin, o terrorista que preparou as bombas em Bali, estudou na Universidade de Reading.
MI5 da Grã-Bretanha revelou que "dois terços dos suspeitos britânicos têm perfil de classe média e aqueles que querem se tornar homens-bomba são muitas vezes os mais educados". A maioria dos terroristas britânicos também tinha esposa e filhos, ridicularizando a falsidade de outro mito, o de que terroristas são vítimas da sociedade. Mohammad Sidique Khan, um dos homens-bomba do 7 de julho de 2005, estudou na Leeds Metropolitan University. Omar Khan Sharif tinha uma bolsa de estudos no King's College antes de realizar um atentado suicida no calçadão da orla marítima de Tel Aviv em 2003. Sharif não estava procurando redenção econômica e sim o massacre do maior número de judeus possível.
Praticamente todos os chefes de grupos terroristas internacionais são filhos do privilégio, que levaram vidas douradas antes de se juntarem às fileiras terroristas. Quinze dos dezenove terroristas suicidas do 11 de Setembro vieram de famílias proeminentes do Oriente Médio. Mohammed Atta era filho de um advogado no Cairo. Ziad Jarrah, que derrubou o voo 93 na Pensilvânia, pertencia a uma das famílias libaneses mais ricas do país.
Nasra Hassan, que retratou um brilhante perfil dos homens-bomba palestinos para a revista The New Yorker, explicou que "dos 250 homens-bomba nenhum era analfabeto, miserável ou deprimido". Os desempregados, ao que parece, são sempre os menos propensos a apoiarem ataques terroristas.
A Europa e os Estados Unidos deram tudo a estes terroristas: oportunidades de educação e emprego, entretenimento popular e prazeres sexuais, salários e bem-estar social e liberdade religiosa. Esses terroristas, como o "homem-bomba da cueca", Umar Farouk Abulmutallab, filho de um banqueiro, não viu um dia de pobreza em sua vida. Os terroristas de Paris rejeitaram os valores seculares de Liberté, Egalité, Fraternité, os jihadistas britânicos que cometeram atentados em Londres e agora combatem ao lado do Califado rejeitaram o multiculturalismo, o islamista que matou Theo van Gogh em Amsterdã repudiou o relativismo holandês e Omar Mateen o soldado do ISIS que transformou o Pulse Club de Orlando em um matadouro, disse que queria purgar o que ele achava ser libertinagem e, ao que tudo indica, seus próprios desejos homofóbicos.
Se o Ocidente não entender a verdadeira origem desse ódio e sucumbir a falsos pretextos como a pobreza, não irá vencer essa guerra que está sendo travada contra nós.
Giulio Meotti, Editor Cultural do diário Il Foglio, é jornalista e escritor italiano
.