domingo, 26 de março de 2017

A Estátua do Laçador - Por Ricardo Chaves



Conheça a história da estátua do Laçador

Criada por Antônio Caringi,
a obra foi inaugurada em 20 de setembro de 1958,
tendo sido tombada e considerada patrimônio de Porto Alegre.


Prefeito Leonel Brizola com o escultor Antônio Caringi, em 1958:
Foto: Acervo Família Caringi


No contexto político do Estado Novo (1937-1945), que se caracterizou pelo nacionalismo e pela centralização do poder, Getúlio Vargas (1882-1954) chegou a dizer: “Não temos mais problemas regionais; todos são nacionais, e interessam ao Brasil inteiro”. Com isso, as bandeiras dos Estados chegaram a ser queimadas e os símbolos regionais, assim como os partidos políticos, foram extintos.

É provável que, devido ao seu caráter regional, o projeto do prefeito Loureiro da Silva (1902-1964) de inaugurar, em 1940, uma estátua do artista plástico Marcos Bastos tenha sido inviabilizado. Premiado no Centenário Farroupilha (1935), atualmente, não se tem notícia desse artista, e a sua maquete em gesso, O Bombeador, que representava um gaúcho a cavalo, está desaparecida. Dezoito anos haviam se passado quando, pelas mãos do artista pelotense Antônio Caringi (1905-1981), o ideal de erigir um monumento à figura do gaúcho finalmente se concretizou.



O escultor Caringi e o tradicionalista Paixão Côrtes,
que serviu de modelo para a confecção da estátua:
Foto: acervo da família Caringi.


Inaugurado em 20 de setembro de 1958, O Laçador marcou as comemorações do 123º aniversário da Revolução Farroupilha (1835-1845). De acordo com o saudoso pesquisador Rodrigues Till, com quatro metros e 40 centímetros de altura e pesando, em bronze, 3,8 mil quilos, o monumento teve várias denominações: Bombeador, Boleador e, finalmente, Laçador.

Criado no Rio de Janeiro, no atelier de Caringi, O Laçador esteve exposto no Parque Ibirapuera, no Pavilhão do Rio Grande do Sul, em 1954, durante as festividades do IV Centenário de São Paulo. Depois de ser adquirido pela prefeitura de Porto Alegre, o monumento foi instalado e inaugurado na entrada da Avenida Farrapos. Seu criador, Antônio Caringi, inspirou-se no homem campeiro, tendo sido o seu modelo o tradicionalista João Carlos D'Ávila Paixão Côrtes, nascido em Livramento no dia 12 de julho de 1927.


Festa de inauguração, em 20 de setembro de 1958.
Foto: reprodução / “Jornal do Dia” de 23 de setembro de 1958:
Acervo Musecom.


Considerado patrimônio da cidade, pela lei complementar nº 279, de 17 de agosto de 1992, O Laçador foi tombado pela Secretaria Municipal da Cultura, de acordo com edital publicado na imprensa em 17 de julho de 2001. Em 1991, por votação popular, o monumento já havia sido eleito símbolo oficial de Porto Alegre, confirmando a expressão Vox populi vox Dei (A voz do povo é a voz de Deus).

Durante a cerimônia de inauguração d'O Laçador, em 20 de setembro de 1958, o prefeito Leonel de Moura Brizola (1922-2004) discursou na Praça do Bombeador, destacando a grandeza do Rio Grande, seu povo e sua tradição. Suas palavras emocionaram a multidão presente. Há consenso de que seu discurso inaugural foi fundamental para alavancar sua campanha para governador do Estado pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). A banda marcial do Colégio Gonzaga, convidada pela prefeitura da Capital, veio de Pelotas para abrilhantar as comemorações da data farroupilha.

Em 11 de março de 2007, o monumento foi transferido para o Sítio do Laçador, localizado em frente ao antigo terminal do Aeroporto Internacional Salgado Filho, a uma distância de 600 metros do seu antigo local. O Laçador encontra-se numa elevação que recebeu a denominação de Coxilha do Laçador. Os custos foram de R$ 1 milhão, e o motivo de sua transferência foi a construção, naquele local, do Viaduto Leonel Brizola. Como símbolo de Porto Alegre, O Laçador segue, ao longo dos anos, recebendo quem chega à nossa cidade. Como um velho amigo, ele abraça a todos com o laço da hospitalidade do nosso Estado, cuja capital, fundada, em 26 de março de 1772, completou 245 anos em 26 de março de 2017.

Parabéns, Porto Alegre!


Colaboração de Carlos Roberto Saraiva da Costa Leite, pesquisador e coordenador do setor de imprensa do Museu de Comunicação Hipólito José da Costa.


(Ricardo Chaves em Almanaque Gaúcho de Zero Hora)

Filho processa a mãe por tomar seu celular? Ah, vá estudar, moleque!


Li ontem no site de temática  jurídica Jusbrasil uma notícia assaz eloquente por si própria:
Um adolescente de 15 anos processou a própria mãe depois que esta lhe tomou o celular para que ele parasse de jogar e se concentrasse nos estudos.
O caso aconteceu em Almería, na Espanha. Era 28 de fevereiro, quando se comemora o Día de Andalucía e, portanto, feriado. O site La Voz de Almería reporta que María Angustias H. H, de 37 anos, queria que o filho largasse o aparelho; como ele não o fez, ela decidiu pelo confisco, o que fez com uso “leve” de força, segundo afirma.
O caso foi parar nas mãos de Luis Miguel Columma, magistrado do Penal 1, que não só absolveu a mãe como ainda lembrou que a lei exige que ela tome atitudes como aquela, já que é dever dos responsáveis garantir que as crianças e adolescentes do país tenham boa educação.
“Ela não seria uma mãe responsável se permitisse que seu filho se distraísse com o celular e falhasse nos estudos”, afirmou Columma na sentença.
Muy bien, meritíssimo! O movimento de escala global que busca retirar dos pais – e transferir para o Estado – a responsabilidade pela educação de nossos filhos precisa tomar umas pauladas desse tipo com mais frequência.
Sim, é da família a incumbência de transmitir valores às próximas gerações. E a ela é facultado, por conseguinte, impor proibições, determinar limites e aplicar punições se necessário. O rebento indisciplinado não quer cessar a diversão e fazer seus deveres escolares?  Nada que um puxão de orelha não possa resolver. Opressão? Até parece: respeito às figuras materna e paterna é algo de tal sorte importante que mesmo uns bons beliscões justificam-se no caso.
É desse aprendizado, afinal, que brotará o cidadão cumpridor de regras, o bom funcionário, o indivíduo ciente de que o mundo não gira ao seu redor, a pessoa que sabe distinguir o certo do errado, o adulto capaz de reconhecer as ocasiões em que deve refrear suas vontades e agir pensando nas consequências de seus atos.
O amadurecimento experimentado sob a tutela familiar é, pois, o que permite manter intacto o arcabouço moral que nos trouxe ao estágio atual de civilização e desenvolvimento, e que nos diferencia dos animais – os quais, a cada nova ninhada, partem do zero seu aprimoramento como espécie. Nossa avançada linguagem nos permite aprender muito com os que pisaram neste mundo antes de nós, possibilitando enxergar longe apoiado em seus ombros de gigante. Mas, para isso, por vezes é necessário que o gigante fale grosso – ou de nada servirá sua altura, e os ensinamentos que ele poderia passar adiante perdem-se de forma irrecuperável.
Admira-me muito a cara-de-pau do advogado que representou este menor em juízo. Decerto pretendia que o judiciário deixasse claro, em sua decisão, que filhos não devem obediência a seus genitores e que só precisam estudar, portanto, se assim lhes aprouver – contribuindo tanto para desestabilizar os núcleos familiares quanto para formar seres humanos mimados e totalmente despreparados para as agruras da vida (e muito burros, claro).
Retirar a autoridade dos pais é impossibilitá-los de restringir as atitudes dos filhos, resultando em um cenário esquizofrênico: são eles os legalmente responsáveis pelos desvios de condutas cometidos pelos adolescentes antes da idade de dezoito anos; mas como será possível, então, orientá-los e mantê-los na linha se até olhar feio der azo à processos judiciais?
Já não fosse suficiente a famigerada Lei da Palmada intervindo na criação dos filhos, agora também o “uso leve de força” será visto como reprimenda desproporcional e inadequada ao mundo “progressista” em que vivemos? Castigos sem video-game passarão a justificar multa e perda da guarda da criança, e seu envio a um orfanato estatal? É bom nem dar idéia.
Está ficando tão complicado educar a prole conforme os próprios desígnios sem desagradar o padrasto governo que tal conjuntura acaba gerando uma forte sensação de medo de ter filhos, como se fosse a situação mais difícil do mundo de encarar. E adivinhe se esse sentimento – somado à libertinagem sexual (ela também fruto da falta de uns cascudos) e às decorrentes gravidezes indesejadas e precoces em profusão – contribui para que ocorram mais ou menos abortos?
Percebam como a distorção da realidade que afeta esses “senhorzinhos satisfeitos” descritos por Ortega y Gasset – e que os previne de constatar que a comida em sua mesa não surge por materialização espontânea – atingiu um nível tal que o dependente aciona o Estado para cobrar dinheiro daquele que o sustenta. Caso tivesse sido atendido em sua postulação, poderia até mesmo vir a faltar…comida em sua mesa, como consequência. E aí a solução seria qual? Ingressar com nova ação judicial alegando maus tratos, quem sabe? Vejam só a insanidade que se pode produzir quando resolvemos solicitar a agentes estatais que lavem nossa roupa suja.
Lamentável o episódio narrado, amenizado tão somente pelo arrazoado do magistrado espanhol. Theodore Dalrymple, em sua obra “Podres de Mimados – as consequências do sentimentalismo tóxico”, aponta o Estado de bem-estar social como culpado pela infantilização dos indivíduos, que são tratados como crianças irresponsáveis, dissociando os conceitos de direito e dever. Passos na contramão deste processo de involução da humanidade são sempre muito bem-vindos, portanto.
Mas não pensem que esse povo que vê a família como inimiga número um da felicidade geral da nação – muito embora nenhum deles tenha sido criado em chocadeira – vai desistir fácil. A próxima petição já está em vias de ser protocolada na vara de justiça: indenização por não deixar a menina de dez anos ir ao baile funk, caracterizando incontestável cárcere privado. Por falar em vara, que falta uma de marmelo faz nessas horas…
Ah, o dever de casa era de Sociologia, Karl Marx e mais valia? Devolve o celular aqui para o rapaz então. Tá liberado!