"Já estive em regiões de conflito armado e é isso que estamos vivendo aqui, em São Paulo. A mesma apreensão permanente"
Esta semana desancorei da bancada do “Jornal da Record” para gravar, na rua, a mensagem de fim de ano da emissora. Fomos a uma das mais populares ruas de comércio de São Paulo, a José Paulino. Minha missão era saber das pessoas aquilo que mais desejavam para 2013. Sem surpresa, constatei que oito em cada dez entrevistados pediam paz. Segurança. O fim da violência na cidade. Não sou especialista em segurança pública e moro num dos bairros mais protegidos de São Paulo. Mas sou jornalista. Repórter. Dessas que saem por aí entrevistando gente e diagnosticando angústias e medos. Tenho experiência suficiente para saber que aqueles pedidos para o Ano-Novo não eram um discursinho para as câmeras. Aquelas pessoas estão de fato assustadas e descrentes.
Escrevo como cidadã e minhas impressões não têm nenhuma pretensão de referenciar qualquer medida de combate ao crime organizado. Mas vivo em São Paulo há pouco mais de uma década e adotei a cidade como minha, como tantos outros migrantes encantados com a força e o magnetismo da metrópole. Portanto, como qualquer dos meus entrevistados da José Paulino, considero que tenho, sim, autoridade para desabafar minha incapacidade de mais acomodação. Já estive em regiões de conflito armado e é isso que estamos vivendo aqui, em São Paulo. A mesma apreensão permanente. Os sobressaltos no meio da noite. O susto no coração. As vítimas expostas todos os dias em telejornais como o que eu apresento. A profissional Ana Paula não gosta das notícias que vão ao ar nos telejornais. Mas adianta não falar sobre o tema?, eu me pergunto.
Quando cheguei, vinda de uma boa temporada em Londres e, depois, Nova York, estranhei a necessidade do carro. Acostumada a andar a pé para quase tudo e a usar o transporte público, constatei que a vida aqui seria diferente. Depois de dois anos de resistência e muitos amigos assaltados à luz do dia capitulei e passei a usar um carro blindado, situação ultrajante que só tinha experimentado em países em guerra. Fiz inúmeras reportagens em bairros periféricos e violentos. Em todas essas ocasiões foi necessário pedir permissão aos chefes do tráfico local para filmar ali, ainda que o tema das histórias nada tivesse a ver com eles. Exatamente como em qualquer região do mundo onde a guerrilha manda. Entrei em vários presídios e casas de detenção provisória. Degradantes. E desejar que todos os detentos ali dentro morram como animais também não resolve nosso problema.
São Paulo está em guerra porque o poder público não está onde deveria. Para que uma cidade seja segura é preciso mais do que policiais armados garantindo a integridade física de quem está nas ruas. É preciso boas escolas, praças, quadras de esporte, ciclovias, bibliotecas, lugares públicos onde o público deseje estar. É preciso gente na rua, ocupando a cidade que é sua. Sua e não deles. Dos criminosos, estejam eles no tráfico ou fardados. Quando o Estado fecha os olhos para o rigor da lei só incita mais atos ilícitos. Daí para a barbárie é apenas um tiro a mais. Um morto a mais na revoltante e superficial contabilidade das vítimas que levamos ao ar nos telejornais, todos os dias.
Ana Paula Padrão é jornalista e apresentadora
Escrevo como cidadã e minhas impressões não têm nenhuma pretensão de referenciar qualquer medida de combate ao crime organizado. Mas vivo em São Paulo há pouco mais de uma década e adotei a cidade como minha, como tantos outros migrantes encantados com a força e o magnetismo da metrópole. Portanto, como qualquer dos meus entrevistados da José Paulino, considero que tenho, sim, autoridade para desabafar minha incapacidade de mais acomodação. Já estive em regiões de conflito armado e é isso que estamos vivendo aqui, em São Paulo. A mesma apreensão permanente. Os sobressaltos no meio da noite. O susto no coração. As vítimas expostas todos os dias em telejornais como o que eu apresento. A profissional Ana Paula não gosta das notícias que vão ao ar nos telejornais. Mas adianta não falar sobre o tema?, eu me pergunto.
Quando cheguei, vinda de uma boa temporada em Londres e, depois, Nova York, estranhei a necessidade do carro. Acostumada a andar a pé para quase tudo e a usar o transporte público, constatei que a vida aqui seria diferente. Depois de dois anos de resistência e muitos amigos assaltados à luz do dia capitulei e passei a usar um carro blindado, situação ultrajante que só tinha experimentado em países em guerra. Fiz inúmeras reportagens em bairros periféricos e violentos. Em todas essas ocasiões foi necessário pedir permissão aos chefes do tráfico local para filmar ali, ainda que o tema das histórias nada tivesse a ver com eles. Exatamente como em qualquer região do mundo onde a guerrilha manda. Entrei em vários presídios e casas de detenção provisória. Degradantes. E desejar que todos os detentos ali dentro morram como animais também não resolve nosso problema.
São Paulo está em guerra porque o poder público não está onde deveria. Para que uma cidade seja segura é preciso mais do que policiais armados garantindo a integridade física de quem está nas ruas. É preciso boas escolas, praças, quadras de esporte, ciclovias, bibliotecas, lugares públicos onde o público deseje estar. É preciso gente na rua, ocupando a cidade que é sua. Sua e não deles. Dos criminosos, estejam eles no tráfico ou fardados. Quando o Estado fecha os olhos para o rigor da lei só incita mais atos ilícitos. Daí para a barbárie é apenas um tiro a mais. Um morto a mais na revoltante e superficial contabilidade das vítimas que levamos ao ar nos telejornais, todos os dias.
Ana Paula Padrão é jornalista e apresentadora