domingo, 30 de abril de 2017

O maior projeto militar da história do Brasil, com custo previsto em R$ 32 bilhões, abasteceu o PT e até a conta do “Amigo” Lula


SAMANTHA LIMA E HUDSON CORRÊA - EPOCA





20.000 léguas de propina no projeto do submarino nuclear brasileiro
Estaleiro em construção em Itaguaí (RJ).Os submarinos só devem  começar a a sair  em 2018,mas a propina já jorrou (Foto:  Stefano Martini/ÉPOCA)
Quando o projeto ainda estava na superfície, os executivos da Odebrecht foram procurados por José Amaro Pinto Ramos. Veterano lobista, José Amaro atuou, segundo vários delatores da Odebrecht, no submundo de negócios que envolveram governos tucanos e empresas francesas no ramo do metrô. Historicamente, José Amaro tem conexões na França, para onde vai com frequência. Em suas delações, os executivos da Odebrecht contam que o conheciam dessas obras tucanas. José Amaro foi citado como titular de contas na Suíça, usadas para repassar e 8 milhões a José Serra, entre 2006 e 2009. A participação dele no caso do submarino, no entanto, não fica clara pelos depoimentos dos executivos. Eles afirmam que o lobista chegou como representante da DCNS, era um elemento de fora do circuito petista. A empresa francesa fez um pedido inusitado: que a Odebrecht arcasse com os pagamentos a José Amaro, pois, como é estatal, não tinha meios de justificar tal gasto. De acordo com os executivos delatores, José Amaro cobrou e 40 milhões, pagos em conta em um banco no paraíso fiscal de Antígua. Os delatores afirmam que José Amaro repassaria parte do dinheiro, mas não sabem dizer a quem. Há a suspeita de que ele tenha distribuído a propina no exterior. José Amaro ainda não foi chamado a depor.  
Os ex-presidentes Lula e Nicolas Sarkozy em 2008.Hoje ambos são investigados por corrupção (Foto:  Sergio Moraes/REUTERS)
Obviamente, José Amaro não seria o único. Tempos depois, o Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht recebeu pedido para fazer pagamentos também ao almirante Othon Luiz da Silva Pinheiro. Além de marinheiro, Pinheiro foi presidente da Eletronuclear. Tido como uma sumidade nacional em temas nucleares, era ágil como um elétron na corrupção. Foi à Odebrecht e apresentou-se como idealizador do projeto dos submarinos ainda na década de 1970, o que faria jus a uma remuneração. Preocupado com o fato de a Odebrecht não ter experiência com projetos nucleares – afinal, fora escolhida por ser parceira do PT –, o executivo Benedicto Junior achou conveniente ter o almirante na órbita e autorizou o pagamento. Pinheiro, segundo os delatores, recebeu um total de e 2 milhões, entre 2012 e 2014, por meio de repasses em contas de operadores na Suíça e também em dinheiro vivo, entregue no conforto de sua casa. Também recebeu dinheiro de José Amaro, segundo os depoimentos. Condenado pela Justiça Federal em julho por propinas relacionadas à construção da usina atômica de Angra 3, Pinheiro cumpre pena de 43 anos de cadeia.
Mas esses foram preâmbulos periféricos. Segundo os delatores, o grosso do dinheiro sujo do Prosub foi parar no caixa do PT e bancou o ex-presidente Lula. Por sua importância e grandiosidade, o projeto era tratado por Marcelo Odebrecht com interlocutores graduados do governo e do partido. O primeiro foi o ex-ministro Antonio Palocci, o “Italiano”. A partir de 2012, Palocci foi substituído por Guido Mantega, o “Pós-Itália”, seu sucessor no Ministério da Fazenda. Como se tratava de um projeto especial, a propina derivada tinha de ter uma destinação especial. Marcelo decidiu vinculá-la à conta “Italiano”, destinada a Palocci, e depois à “Pós-Itália”, relativa a Mantega. Marcelo Odebrecht calcula que as contas “Italiano” e “Pós-Itália” consumiram R$ 300 milhões entre 2008 e 2014.
Desse valor, R$ 50 milhões vieram do Prosub. Dos registros da planilha “Italiano” consta uma linha atribuída à conta “Amigo”, que Marcelo Odebrecht explica em sua delação ser destinada a gastos da empresa com o ex-presidente Lula. Segundo seu relato, depois da eleição de 2010, houve um acerto com Palocci segundo o qual os restos da conta “Italiano”, cerca de R$ 35 milhões, seriam convertidos em crédito para a conta “Amigo”. “Teve pagamentos que eram pedidos em dinheiro por Palocci, dizendo que era para abater da conta Amigo, mas não consigo dizer qual foi o destino, porque foi tirado em espécie”, disse. O dinheiro do Prosub, portanto, segundo os delatores, ajudou a bancar gastos de Lula.
O dinheiro do Prosub ajudou a bancar, de acordo com Marcelo, pagamentos – com ordem de Palocci – ao marqueteiro João Santana, responsável pelas campanhas de Dilma à Presidência em 2010 e de Fernando Haddad à prefeitura de São Paulo em 2012, em contas no exterior, a inúmeros candidatos petistas e ao partido. Alguns saíram como doações oficiais e outros como caixa dois. Há, ainda, um pagamento de R$ 12 milhões relacionado a “prédio IL”, de Instituto Lula. A Odebrecht comprou um terreno para construir a sede da entidade, mas a obra não foi realizada, e a área foi vendida depois. A conta “Pós-Itália” também bancou gastos da campanha de Dilma em 2014.
O empreiteiro Marcelo Odebrecht é conduzido pela PF (Foto:  Paulo Lisboa/Folhapres)
Como queria receber em dia, a Odebrecht atrelou a propina do Prosub às contas mais caras à cúpula do PT. “Por que Prosub? Era aquele (projeto) que demandava maior agenda. Então, novamente dentro daquela lógica: se o Guido está me liberando R$ 1 bilhão, R$ 700 milhões, é obvio que na cabeça dele e do Palocci que cria uma expectativa em função disso.” Deu certo. Em 2011, 2012 e 2013, a Marinha atrasou pagamentos à Odebrecht. Avisado por Benedicto Junior, Marcelo recorreu a Palocci e a Mantega e conseguiu a liberação dos milhões devidos: R$ 239 milhões em 2011, R$ 700 milhões no ano seguinte e R$ 676 milhões no outro. “Tenho consciência de que a priorização dada ao seu orçamento tinha como uma de suas motivações nosso elevado volume de pagamentos ao PT/governo federal, acordados com Antonio Palocci e Guido Mantega na qualidade de interlocutores dos governos Lula e Dilma”, afirma Marcelo.
O projeto do submarino nuclear nasceu há quase uma década, quando o então presidente Lula defendia a ideia de que o Brasil precisava reforçar sua defesa marítima, devido à exploração do petróleo no pré-sal, a 200 quilômetros da costa. Em 2009, o então presidente francês, Nicolas Sarkozy, visitou o Brasil e assinou com Lula o acordo, que prevê transferência de tecnologia. Lula hoje é réu na Lava Jato, acusado de crimes relacionados à corrupção. Sarkozy desistiu de ser novamente candidato à Presidência na França, por ser suspeito de corrupção. O futuro político deles é incerto. O dos submarinos também. Pela programação, entre 2018 e 2022, os submarinos convencionais serão lançados. O de propulsão nuclear submerge em 2027. Mas o abalo da corrupção deverá atrasar as coisas.
O Instituto Lula afirma que “jamais recebeu qualquer terreno da Odebrecht” e que recebeu doações de dezenas de empresas e indivíduos diferentes, todas registradas. Sobre a conta “Amigo”, o instituto diz que esta é a “mais leviana das ilações”. “Se for verdadeiro o depoimento, Marcelo Odebrecht teria feito, na verdade, um aprovisionamento em sua contabilidade para eventuais e futuros transferências ou pagamentos”, o que seria, de acordo com o instituto, uma decisão da empreiteira.
O advogado de José Amaro Pinto Ramos, Eduardo Carnelós, diz que seu cliente foi remunerado por serviços prestados a uma empresa privada e que não teve interlocução com agentes públicos. Diz considerar “absurdas” as acusações de “envolvimento com a prática de lobby e corrupção” feitas a José Amaro e que o cliente nunca teve negócios com o PSDB. Por meio de nota, o senador José Serra disse que “jamais recebeu vantagens indevidas da Odebrecht e sempre pautou sua carreira política na austeridade em relação aos gastos públicos”. Afirmou ainda apoiar a abertura das investigações, para comprovar “a lisura de  sua conduta”. A DCNS informou que “respeita as regras brasileiras e internacionais, as mais altas normas de controles internos e os termos do contrato do Prosub”. Nega ter orientado, instruído ou solicitado pagamentos ilícitos. A Marinha nega terem ocorrido atrasos em pagamentos relacionados ao Prosub, como diz a Odebrecht, e afirma desconhecer qualquer irregularidade envolvendo o projeto. As defesas de Dilma Rousseff, Guido Mantega, Antonio Palocci e do almirante Othon Pinheiro não responderam aos pedidos de entrevista.

sábado, 29 de abril de 2017

“A Lava Jato mostrou que todos os partidos estão unidos pelo crime”, diz Fernanda Montenegro


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Em raro desabafo, a atriz Fernanda Montenegro afirmou estar decepcionada com o PT e incrédula com os que ocuparam seu lugar. “Esses corruptos invadiram Brasília feito ETs e dominaram o país. Sempre votei no Lula, mas minha decepção começou há tempos, em 2012, quando ele visitou Paulo Maluf para pedir apoio à candidatura de Fernando Haddad à prefeitura de São Paulo, bem antes da Lava-Jato. Ali, a máscara caiu, e ele virou um anti-herói”, diz.
Sobre a hipótese de Lula ser preso, diz a atriz: “O momento é tão surpreendente que não sabemos o que vai acontecer amanhã. Brasília continua como se nada estivesse acontecendo. A equipe do Temer está toda envolvida com corrupção. Mas, quando gritam ‘Fora, Temer’, não temos quem colocar no lugar. A Lava-Jato nos mostrou que todas as tendências partidárias e correntes ideológicas estão unidas no crime. A propina conseguiu algo incrível: unir esquerda e direita.” Fernanda diz que não vê esperança neste governo. “E o pior é que nem começamos a passar as coisas a limpo. Ainda estamos na fase de pôr as cartas na mesa. Muitas descobertas virão à tona. Vivemos uma tragédia.”E explica por que entoou o coro “Fora, Temer” no Festival de Teatro de Curitiba: “Acho que o Temer tinha de ter saído junto com a Dilma, já que era uma chapa só. Eles foram cúmplices, coniventes, aderentes.”
Fonte: Veja

quinta-feira, 27 de abril de 2017

Coisas da polícia de choque




A criação e o fardamento

A Guarda Civil, desde a sua criação, rezava o discurso, deveria se pautar “dentro dos princípios da polícia preventiva, branda, maneirosa e assistencial...”, mas cuidando de reforçar, também, o aspecto da força, declarando “... sem prejuízo de ação firme, quando necessária ela se tornasse.”

A partir de 1938, já em tempo da ditadura, o Estado Novo assumindo sua face autoritária-policialesca, vem exigir uma ampliação das responsabilidades da corporação, preparando-a para a repressão violenta das manifestações de rua contrárias aos interesses do regime. É criado dentro da Guarda um grupo especial que se encarregaria, especificamente, desse trabalho. Ganharia o nome de “Policia de Choque”, e mesmo que, depois, viesse a mudar a denominação oficial, assim seria conhecida, enquanto existiu, pelos porto-alegrenses. Que, aliás, ao contrário das simpatias que manifestavam pela Guarda Civil, detestavam profundamente esse grupo, com o qual tantas vezes se envolveria em episódios violentos. Tinham uniformes diferentes dos demais guardas. Usavam, invariavelmente, a cor cáqui, que também era a cor dos uniformes de verão dos outros guardas. Seu quepe era vermelho; tinham cinturão por cima da bata russa, abotoada até o alto. Alguns o chamavam de “Cardeais”, mas o povo os chamava de “cabeça de tomate” ou “cabeça de pica”.

A batalha perdida do “Choque”

Lá por volta de 1945 e num lugar muito especial: a rua Cabo Rocha (Atual rua professor Freitas de Castro, Bairro azenha). Era um tempo que o “Choque” ainda tinha o “Bagre”, o “Xingu”, o Hiturbes, o Viafone, o fiscal Gamaliel... E foram eles, junto com outros que nunca soubemos os nomes, os personagens da maior briga já travada contra os marítimos (Esses homens eram estivadores, homens fortes acostumados a levantar peso todos os dias no trabalho diário. A lenda diz que a briga foi contra os marinheiros, mas não é verdade). Foi num cabaré, que existiu lá pela metade da rua, o “Gato Preto”. Cabaré já antigo, com uma certa tradição de lugar correto, de boas profissionais e de pouca briga. Tinha até uma freguesia cativa entre o pessoal dos marítimos, já que a casa pertencia a um ex-embarcado. O dono do “Gato Preto” não queria saber de “leões-de-chácara”. Se a coisa engrossava, chamava a polícia e pronto. Pois foi o que aconteceu naquela noite: a coisa engrossou e o dono chamou a polícia. A 2ª Delegacia mandou um guarda civil. Geralmente era o suficiente. O pessoal respeitava a Guarda, mas aquela noite seria uma noite de exceções.O guarda chegou e já saiu sendo desacatado, xingado, enxotado...Azar do guarda. Apanhou porque foi lá no dia errado.

“Chama o Choque!” E foi o que o delegado mandou fazer, tão logo ouviu o relato do guarda. “Eles vão lá e cagam a pau esses sem-vergonhas que não sabem me respeitar o guarda.” Não demorou muito, já se ouviu a sirene do caminhãozinho do “Choque”, fazendo a curva da Azenha, nem parou na 2ª Delegacia – foi direto para o cabaré da Cabo Rocha.

Já desceram dando borrachadas em tudo que se movia ou respirava. Era a famosa “cordialidade” do “Choque”. Pau e pau. Mas então, outra exceção, os marítimos não se intimidaram e partiram para a retribuição das gentilezas. Mais pau e pau. O negócio foi ficando feio, o tempo foi passando, o “Choque” não ganhava, os marítimos se organizavam. Era hora de pedir reforços. E nem podia ser diferente, se não resolvessem a parada no ataque inicial, no primeiro pulsão, perdiam o fôlego e tinham que buscar reforço. O fiscal mandou o motorista buscar reforço. Não demora muito e vem outra leva, ainda que menor, dos homens do “Choque”. Juntam-se a eles os guardas dos setores próximos. Os marítimos vão, aos poucos, cedendo terreno. Começam a recuar. Ainda estão em maior número, mas a diferença é pequena e os homens do “Choque” estão mais bem equipados. Hora de chamar reforço, também. Um carro de praça parte rápido para buscar mais gente no centro. Tinha gente nos bares da Mauá e nos do Mercado, nos bordéis do início da Voluntários, nas dezenas de espeluncas e botecos dali mesmo, nas chatas da doca das Frutas, nos navios ancorados no porto, enfim em todos os lugares para quem soubesse procurar. Em poucos minutos, velhos Chevrolets e Fords, da praça do Mercado vão ficando abarrotados de uma horda truculenta de brigões sedentos pra dar porrada! Juntavam-se estivadores, arrumadores, ajudantes de caminhão, gente que trabalhava na faixa portuária. Freqüentadores de botecos do Mercado, da Voluntários, enfim todo mundo que tinha alguma diferença com o “Choque”. Tinha até um “General” comandando a operação, era o Pacheco, homem do Sindicato dos estivadores e de quem se dizia, a boca pequena, ter vinculações com o Partido Comunista e com a campanha “queremista”. Seja lá como fosse, o Pacheco, do alto de sua imensa barriga, com aquele vozeirão grave que lhe era marca registrada, transmitia, resoluto, as ordens arregimentadoras: “Ligeiro, camaradas, nossos irmãos necessitam de nossa solidariedade. Embarquem todos, não podemos permitir que as forças da repressão massacrem os trabalhadores. Disciplina revolucionária, camaradas. Esmaguem os inimigos do operariado. Embarquem rápido, camaradas!”

O “front” era uma pancadaria generalizada. Há muito já tinha extrapolado os limites do “Gato Preto” e tomava conta de boa parte do meio da rua. Os contendores mantinham-se agrupados e se enfrentava em linha, como falanges macedônicas. A gritaria era infernal. Todos berravam as mais tenebrosas imprecações. Já tinha guarda com o cacetete de borracha partido em dois. Batiam de mão fechada, então. Na realidade, aquela era uma batalha campal organizada. Tinha regras, lutavam mesmo a soco, nenhum tiro havia sido disparado e nem seria até o final.

Aos guardas, juntaram-se as últimas reservas disponíveis no quartel. Agora, se houvesse necessidade de mais reforço, só apanhando os que estavam de serviço nos setores espalhados pela cidade. E isso seria uma desmoralização para os homens do “Choque”. Uma nódoa em sua ilibada reputação. Nada disso, agora era uma questão de honra – lutariam com os recursos disponíveis até o final. Problema era o “vigor da mão proletária”. E que vigor!

E continuaram brigando ao longo de toda a madrugada, sem trégua, sem parada para descanso ou para pedir clemência. Desistiram pouco depois do amanhecer quando não agüentavam mais. Ambas as facções. Cansados, estropiados, todos arrebentados e em frangalhos, com hematomas disseminados por todo o corpo, foram arrefecendo a fúria e a luta foi perdendo o ímpeto naquela longa noite da Cabo Rocha.        

No dia seguinte, na sede do Sindicato, Pacheco afirmava convicto: “Foi a Stalingrado deles. As forças populares souberam honrar a palavra de ordem da Passionara, “no passarán”, e eles não passaram. Vitória do proletariado organizado.”

Pelo visto, o único perdedor foi o dono do “Gato Preto” que teve sua casa completamente destruída. Por muitos meses foi obrigado a manter uma espécie de imposto sobre o “mixê”, a coisa que desagradava muito as “trabalhadoras” da casa. Ele se defendia dizendo aos gritos; “E aí, o que é que vocês querem. A casa tem de ser consertada ou então vai todo mundo trepar nas moitas!” Tinha alguma lógica...

§ § § § §

Livro consultado:
 “Os Vigilantes da Ordem”,
guarda, cachaça e meretrizes,
de Rejane Penna e Luiz Carlos da Cunha Carneiro.
Editora Fotoletras

quarta-feira, 26 de abril de 2017

RATOEIRA DESPOVOADA


Coluna Carlos Brickmann – 26 de abril

CARLOS BRICKMANN
Carlos Brickmann

Diziam os políticos que, quando o poder chega ao fim, até o cafezinho, quando vem, vem frio. As coisas mudaram: hoje, quando se acaba a capacidade de ofertar agrados, nem há para quem servir o café. E o pessoal tem bom faro – percebe com antecedência a hora de abandonar o navio.

Dia 21: o governador mineiro Fernando Pimentel, o último seguidor de Dilma, faria farta distribuição de Medalhas da Inconfidência. Faria: os governadores do Maranhão, Flávio Dino; do Acre, Tião Viana; e da Bahia, Rui Costa, não apareceram. Marieta Severo, Wagner Moura, Camila Pitanga e Gregório Duvivier, artistas petistas ativistas, não apareceram. Lula faltou à cerimônia. São amigos, mas sabem o que lhes convém.

 

 

Dia 24: a Procuradoria Geral da República pediu ao Superior Tribunal de Justiça que abrisse inquérito sobre Fernando Pimentel, em consequência das delações premiadas do pessoal da Odebrecht. Pouco depois, a Polícia Federal indiciou a jornalista Carolina Pimentel, esposa do governador, por participação em lavagem de dinheiro e crime eleitoral. O indiciamento teve base na Operação Acrônimo, que desde maio de 2015 investiga a possibilidade de tráfico de influência na liberação de empréstimos do BNDES e esquemas de lavagem de dinheiro em campanhas eleitorais.

 

 

E pensar que, não faz muito tempo, quando jorravam as benesses, o navio mal se aguentava com o peso de tantos obscuros habitantes do porão!

 

 

Há quem queira

É maldade dizer, entretanto, que todos os políticos condecorados por Fernando Pimentel se esquivaram da homenagem. Os petistas e o comunista Dino, sim. Mas Renan Calheiros Filho pegou sua condecoração.

Bola com Dilma

A ex-presidente Dilma Rousseff sempre disse que nada tinha a ver com a corrupção, e que tudo aquilo não era de seu conhecimento. Mas a delação premiada de seu marqueteiro, João Santana, e de sua esposa e sócia, Mônica Moura, é clara: ambos afirmam que Dilma, em 2014, sabia dos pagamentos ilícitos para sua campanha. Santana diz que conversou com Dilma, em maio de 2014, sobre repasses de verbas na caixa dois; Mônica Moura diz que atrasos nos pagamentos foram tratados, por ordem de Dilma, com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o tesoureiro da campanha, Edinho Silva. Em conversa, completa Mônica, Dilma até quis saber se era seguro utilizar uma conta no Exterior.

Com a delação premiada de Santana e Mônica Moura, o problema de lavagem de dinheiro, caixa 2 e pagamento de propina como doação de campanha cai no colo da ex-presidente.

Lula x Moro

Por que a Polícia Federal e a Secretaria da Segurança do Paraná teriam pedido que o depoimento de Lula perante o juiz Sérgio Moro fosse adiado? A versão inicial, de que seria necessário mais tempo para organizar a segurança, não é verossímil: o depoimento foi marcado por Moro com 60 dias de antecedência. Quem não conseguiu planejar a segurança de um depoimento em dois meses, de quantos precisará a mais para organizar-se?

Talvez a delação premiada do empresário Léo Pinheiro, da OAS, exija investigações complementares. Talvez. Mas Léo Pinheiro já tinha feito uma delação premiada, que o procurador Rodrigo Janot suspendeu, irritado com um vazamento. Será que, dela, ninguém tivesse investigado nada até hoje?

A única hipótese aceitável seria a de que alguma nova prova, sólida e substancial, esteja a ponto de ser concluída. Porque, se aceitarmos a tese de que o objetivo do adiamento é impedir que petistas de todo o Brasil se reúnam em Curitiba e tumultuem o julgamento, isso significará que o Estado brasileiro não tem poder sequer para garantir a Justiça. É mau.

Palocci e sua hora

O jornalista Marco Piva, da ala pensante petista, discorda da nota desta coluna sobre o depoimento do ex-ministro Antônio Palocci. Na íntegra:

“Alô, Carlinhos! Anota aí: Palocci não traiu o PT. Não vai fazer delação, premiada nem sem prêmio, contra o partido, que já está bastante chamuscado. Publicamente, ele preparou as condições para ampliar o foco da operação em cima de outras empresas e instituições, no caso os bancos e alguns membros da Justiça, que estavam na moita até agora. Ele tem arquivado muito mais coisa que os 77 delatores da Odebrecht juntos.

“Nesse sentido, deu um trucaço no Moro, obrigando-o publicamente a ir atrás das informações. Se não fizer isso, o juiz será visto como alguém que está protegendo outros envolvidos na Lava Jato, cujos nomes ele e a PGR já sabiam faz tempo, mas ainda não haviam investigado (por qual motivo, não faço a menor ideia). Portanto, novos lances da operação.

“Prepare a coluna para tempos calientes. Muito chumbo gordo pela frente”.

 

 

COMENTEcarlos@brickmann.com.br

Twitter: @CarlosBrickmann   

terça-feira, 25 de abril de 2017

Brasil utiliza tecnologia israelense para tratamento de esgoto


Brasil utiliza tecnologia israelense para tratamento de esgoto

Até o ano que vem, muitas plantas brasileiras de tratamento de esgoto vão incorporar sistemas da Lodologic para transformar resíduos em fertilizantes sem odor para plantações.
Atualmente, 60% dos 6.8 milhões de litros de lama de depuração gerados diariamente no Brasil é despejado de volta para natureza sem tratamento. E isso é um grande progresso em relação a situação de cinco anos atrás.
Mas agora o país está determinado a solucionar seu problema de esgoto usando uma invenção israelense capaz de transformar estes resíduos em fertilizantes esterilizados e sem odor.
Lodologic foi criada por um grupo de empresas brasileiras em parceria com a Paulee CleanTec em Israel.
“Ninguém sabe o que fazer com a enorme quantidade de lodo gerada todos os dias”, diz Ilan Levy, CEO da Paulee CleanTec. “A solução comum é descarta-lo em aterros. Nós estamos mudando a lógica transformando o lodo em algo em valor”.
Paulee CleanTec tem um processo para oxidar resíduos orgânicos. Nós vamos aplicar este processo para o tratamento do lodo,” disse Gabriel Kainuma, CEO da Lodologic.
“Nós misturamos um reagente químico com o lodo e misturamos este mix em uma câmara de alta velocidade que elimina todos os patógenos do lodo, transformando-o em fertilizantes seguros, acessíveis e eficientes”, ele diz. “Até 2018 nós esperamos estar operando em pelo menos seis plantas. Existem mais de 400 estações de tratamento no Brasil, então é um mercado enorme para explorar”, completa.
Leia a reportagem completa em ISRAEL21c.

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Fim Do Mundo, Novo Mundo. Por Fernando Gabeira



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Fim do mundo, novo mundo

Por Fernando Gabeira

… Foi graças às investigações e sólidas provas da Lava Jato que a imprensa conseguiu avançar, contribuindo com seu esforço para desvendar a engrenagem que sufocava o Brasil. O interessante é a crítica pendular que ela sofre…

 PUBLICADO ORIGINALMENTE NO ESTADÃO, "OPINIÃO", E NO SITE OFICIAL DE FERNANDO GABEIRA, WWW.GABEIRA.COM.BR, 21 de abril de 2017

A delação dos dirigentes da Odebrecht não trouxe tantas novidades para quem leu os vazamentos. No entanto, a forma como se apresentou – vídeos dos delatores, riqueza de detalhes e algumas surpresas – trouxe grande impacto mesmo para os que conheciam os dados principais da trama.

Para começar, alguns obstáculos técnicos: as denúncias não foram hierarquizadas e divididas em blocos. E o áudio das delações era bastante sofrível. Aliás, a qualidade do áudio é uma crítica que faço não apenas à Lava Jato. Parece que vivemos numa era pré-estereofônica, na contramão de uma tecnologia cada vez mais acessível.

Percebo à distância que grandes peixes passaram quase em branco, como o negócio dos submarinos com a França. Aliás, dos 200 depoimentos ainda em sigilo, quase todos tratam de aventuras internacionais e da participação do BNDES, algo que me interessa na proporção em que se esforçam para escondê-los. Nesse oceano de informações, algumas dolorosas, porque trazem também decepção sobre certas pessoas, escolhi uma frase de Emílio Odebrecht para comentar, aquela em que ele diz que a corrupção existe há 30 anos e ele não entende a surpresa da imprensa, que não a teria denunciado.

Reconheço que mostrar-se surpreso e ser ao mesmo tempo um observador da vida política nacional é contraditório. Só posso entender esse movimento de alguns comentaristas pelo desejo de empatia com seus leitores ou espectadores, estes, sim, sem o mesmo nível de informação, estupefatos com os bastidores das relações entre políticos e empreiteiros.

Percebo à distância que grandes peixes passaram quase em branco, como o negócio dos submarinos com a França. Aliás, dos 200 depoimentos ainda em sigilo, quase todos tratam de aventuras internacionais e da participação do BNDES, algo que me interessa na proporção em que se esforçam para escondê-los...

Não é verdade que o sistema de corrupção, ao longo dos anos de redemocratização, não tenha sido denunciado. A própria Odebrecht confirma isso ao confessar que sofisticou o processo depois da CPI dos Anões do Orçamento. O jornalista Jânio de Freitas foi um pioneiro ao desmascarar licitações fraudadas na Ferrovia Norte-Sul. Grandes operações da Polícia Federal, como a Castelo de Areia, morreram na praia porque a Justiça anulou as provas, algo que o ministro Gilmar Mendes chegou a sugerir para a Lava Jato.

O que a CPI não tinha nem a imprensa conseguiu foi o detalhe revelado agora pela delação: num dos maços de notas destinados a comprar o dossiê contra Serra havia uma etiqueta de uma empresa da cervejaria Itaipava. No contexto atual, o caso seria esclarecido a partir desse detalhe, desprezado nas investigações…

E posso me concentrar num episódio que conheço bem, para contestar parcialmente a fala de Emílio Odebrecht. Refiro-me ao caso que ficou conhecido, graças à esperteza de Lula, como o dos aloprados do PT. É a história dos petistas detidos com R$ 1,6 milhão em dinheiro, nas eleições de 2006. Eu era o relator da CPI dos Sanguessugas incumbido desse caso.

Ele tinha relação com a CPI porque José Serra, supostamente, seria denunciado pelos principais acusados de superfaturar ambulâncias.

Tentei desvendá-lo ouvindo depoimentos, era o instrumento que tinha. Os petistas estavam eufóricos com a reeleição de Lula. Não davam pistas.

A imprensa trabalhou muito. Dois repórteres da Veja chegaram a ser detidos na Polícia Federal de São Paulo. O então diretor da revista, Mário Sabino, foi indiciado por tentar informar os seus leitores.

O que a CPI não tinha nem a imprensa conseguiu foi o detalhe revelado agora pela delação: num dos maços de notas destinados a comprar o dossiê contra Serra havia uma etiqueta de uma empresa da cervejaria Itaipava. No contexto atual, o caso seria esclarecido a partir desse detalhe, desprezado nas investigações.

Não quero afirmar que a imprensa tenha sido uma combatente heroica da corrupção, sobretudo porque sob esse conceito mais geral há comportamentos muito distintos. Quero afirmar apenas suas limitações. Ela não pode quebrar sigilos bancários e telefônicos, muito menos realizar entrevistas seguidas de condução coercitiva.

O que mudou essencialmente o quadro foi a eficácia da Lava Jato. Ela evitou todas as armadilhas em que caíram as operações derrotadas pelo poderoso sistema de corrupção.

Foi graças às investigações e sólidas provas da Lava Jato que a imprensa conseguiu avançar, contribuindo com seu esforço para desvendar a engrenagem que sufocava o Brasil. O interessante é a crítica pendular que ela sofre. Quase sempre foi acusada de inventar denúncias. Recentemente, o PT qualificava os escândalos que o envolvem como uma “conspiração midiática”. Emílio Odebrecht a acusa-a de ter silenciado ao longo dos anos e fazer agora um grande estardalhaço. Mas a verdade é o quanto tanto a PF como os procuradores evoluíram com o tempo e com os fracassos relativos. E a própria imprensa se tornou mais cautelosa ao se mover em terreno tão delicado.

Alguns fatores tornaram a corrupção conhecida de quem observava friamente o processo, mais vulnerável que no passado. Um desses fatores é a maior transparência impulsionada também pela revolução digital…

Alguns dos mais importantes vazamentos foram em blogs, que têm uma estrutura mais leve e, por causa disso, ousam mais. O que Emílio Odebrecht não considerou em sua fala foram os enormes avanços havidos no Brasil, enquanto empreiteiras e políticos vivam num mundo à parte.

A experiência de vida mostra que muitas coisas que eram proibidas no passado passam a ser permitidas com o tempo, como, por exemplo, o divórcio e a união de gays. Mas história é mais complicada. Muitas coisas, antes toleradas, passam a ser proibidas com o tempo, como o assédio sexual por exemplo.

Alguns fatores tornaram a corrupção conhecida de quem observava friamente o processo, mais vulnerável que no passado. Um desses fatores é a maior transparência impulsionada também pela revolução digital. Outro aspecto importante, talvez inspirado pela Justiça americana, é a tática de rastreamento do dinheiro de propinas através dos labirintos do sistema financeiro internacional.

Finalmente, certas mudanças de atitude, como a da Suíça, foram fundamentais. A Suíça se abriu, a polícia brasileira mudou, a tolerância das pessoas comuns mudou, foram tantas mudanças que é bastante compreensível que a bolha tenha estourado agora, e não antes, apesar de inúmeras tentativas frustradas.

Mesmo sem me importar com os risos pragmáticos, diria que Emílio poderia aprender com o escândalo uma lição mais valiosa que sua fortuna: a impermanência de tudo, o constante processo de mudanças.

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10458485_1376891839298406_6201929245490399277_nFernando Gabeira*– é escritor, jornalista e ex-deputado federal pelo Rio de Janeiro. Atualmente na Globo News, onde produz semanalmente reportagens sobre temas especiais, por ele próprio filmadas (no ar aos domingos, 18h30, e em reprises na programação). Foi candidato ao Governo do Rio de Janeiro. Articulista para, entre outros veículos, O Estado de S. Paulo e O Globo, onde escreve aos domingos.