quarta-feira, 14 de agosto de 2013

PSICANÁLISE DA VIDA COTIDIANA Alice no País do Vazio


CARLOS VIEIRA
Alva, clara, de olhos esverdeados, quando anda traz movimentos leves como se fosse uma manequim. Graduada em Arquitetura mas nunca soube de fato o que almejava ser. Joga tênis, e religiosamente comparece a uma academia de ginástica de modo obsessivo. A vaidade é uma virtude que ultrapassa o cuidado afetivo consigo mesma. Aliás, diga-se de passagem se Alice tem algum afeto com ela mesma! Quando diante do espelho, objeto sem disfarces, sente defeituosa, feia, incompleta e malfeita de nascença, lembrando Shakespeare em Ricardo III. 
Aos olhos alheios é uma jovem linda, corpo provocante, pernas longas, curvas perfeitas e um jeito de estrela de cinema. Pena que a moça não enxerga, ou melhor, só enxerga o que gostaria de ser e ter. É o não ter, a sua angústia de existência. Estuda línguas, três: inglês, espanhol e mandarino. Pergunto o que Alice pretende com isso! No dia a dia de sua estrada de vida, não trabalha, filha de pais altamente abonados. Amigos, amigas e ficantes somente para o consumo. Fica, fica, nunca namora, nunca estabelece uma consistência afetiva em suas relações. Ás vezes, em seus solilóquios se questiona: “gosto de alguém? Sente-se superficial. 
Na intimidade de seu travesseiro lhe vem uma tristeza, ainda que não compreendida, mas uma tristeza e uma sensação de “futilidade” e “vacuidade”. Confesso que tenho dúvida se Alice tenha tido algum dia uma percepção maior, mais profunda da sua existência. Vive, consome, flutua como seus passos em mares mornos, sem cor, sem ondas turbulentas nem acalmias cálidas e belas. Alice é um personagem, vários personagens, ou como disse Luigi Pirandello: é um personagem em busca do autor. Personagens as pessoas vivem é claro, mas refiro-me aqui de personagens como formas de encobrir a natureza de uma pessoa. Somos e temos vários personagens em nossas vidas, mas sabemos, ou quem sabe não sabemos, que somos autores, responsáveis pelas várias facetas e funções nessa nossa existência. Alice não, Alice é perdida em si mesma, mesmo dentro da beleza externa e da aparente moça de classe alta, estudada, formada, socialmente presente na sociedade pós-moderna onde o Ter substitui o Ser. 
Essa minha Alice obviamente não é nem será a Alice do país das maravilhas. Aquela viveu o pão que o diabo amassou e aproveitou de metamorfoses da vida, tirando proveito quando caiu no buraco e descobriu o horror e a beleza da existência humana. A minha Alice está perdida sem saber que se perdeu. Outro dia, de súbito, teve uma crise de pânico! Que pânico foi o dela? O pânico do vazio de sua vida – a caída no buraco da vida liquida, amorfa, sem sentido e fadada a uma futura depressão. Depressão em sintomas mais objetivos pois deprimida ela já é sem saber. 
O que sempre me chama atenção nessa ninfeta é o desamor – a falta de amor por si própria (a autoestima imprescindível para suportar os trancos da vida) e a ausência de amorosidade por alguém. Os outros na vida de Alice são objetos, abjetos, não são pessoas. São “drogas” usadas para obtenção de prazer pelo prazer; não são parcerias que expandem a vitalidade e produzem a alegria de viver. O mundo pós-moderno se transformou num cenário da “drogadição” às pessoas, pessoas como drogas, além das drogas propriamente ditas. Viver drogado é um desespero da incapacidade de amar a si e aos demais, e a ânsia constante em ser amada. É trocar a parceria por uma vida “autista”, falsamente independente e profundamente dolorosa. 
Alice não tem amigos, não tem “brinquedos de adultos” que dão uma tonalidade e consistência afetiva à vida. Alice é um caos em silencio, um vulcão que nunca tem a ousadia de erupção para transformações fecundas e gravídicas. 
A minha metáfora(Alice) é a evidência do risco que a juventude atravessa nessa época de uma vida narcísica, consumista, vazia e abortiva. Alice é a dor que tem urgência em ser atendida. Atendida por seus pais (ausentes), atendida pela comunidade e por, quem sabe, um processo intenso de uma psicoterapia profunda. Alice é a “insustentável leveza de ser”, é o grito de uma juventude perdida, sem referenciais, sem governo, sem ética e sem fé, nesse mundo onde os valores éticos e humanos urge serem resgatados. 
A história de Alice trouxe à memória de um poema de Álvaro Alves de Faria em seu livro “Trajetória Poética”, Ed. Escrituras.
A Catástrofe
“Os gafanhotos brancos de asas de celuloide 
Arrasam o cafezal e comem os olhos das pombas. 
Antes devoram os bois 
E afugentam os cavalos que enfeitam a tarde. 
A noite era ainda um pomar, 
Até que os gafanhotos e os grilos 
Viraram gigantes 
E de tão grandes se engoliram a si mesmos 
Prédios e automóveis e um trem que ia para Curitiba. 
Ninguém soube notícia 
E nada mais havia a dizer.”
Carlos.A.Vieira, médico, psicanalista, Membro Efetivo da Sociedade de Psicanálise de Brasília e de Recife. Membro da FEBRAPSI e da I.P.A - London.

A charge de Amarildo



Doação de imóvel com reserva de usufruto elimina burocracia do inventário e preserva a herança




Priscilla Garcez tinha apenas 16 anos quando recebeu de sua avó de criação a doação de um imóvel em usufruto. Na época, pouco entendia sobre o que o termo significava. Hoje, aos 25, sabe que a intenção de dona Dagmar, de 96, era evitar as burocracias de um inventário, escolhendo, em vida, para quem queria deixar sua herança.

“Minha avó estava lúcida, aos 85 anos, quando decidiu doar um imóvel para minha mãe e deixar outro para mim, com reserva de usufruto para ela própria. Como eu era nova, ela temia que eu o vendesse. Fez isso justamente para que, caso sofresse algo, eu e minha mãe ficássemos seguras financeiramente. Hoje, ela tem 96 e sofre de mal de Alzheimer, mas já deixou tudo resolvido”, explica Priscilla, que recebe o aluguel do apartamento.

Doador protegido - Questões ligadas à doação de bens com reserva de usufruto estão entre as principais dúvidas dos leitores. Para o advogado Hamilton Quirino, especialista em Direito Imobiliário, o ato é mesmo aconselhável para quem quer evitar burocracias de um inventário e decidir em vida o destino dos bens, mas sem ficar desprotegido.

“É muito comum um casal querer doar um imóvel para um filho em vida, mas tendo a garantia de que o herdeiro não poderá vender o bem nem expulsá-los dele. Sendo assim, o doam com reserva de usufruto vitalício para eles próprios. A gente conhece os filhos, mas não os futuros genros”, afirma Hamilton Quirino.

Herdeiros legítimos têm direito a 50% - O imóvel não precisa ser doado necessariamente a um parente. O advogado Hamilton Quirino explica que os herdeiros diretos do doador não podem contestar a doação nem a reserva de usufruto. Mas os pais apenas podem dispor de metade de seus bens a quem não for filho.

” Um pai que briga com o filho não pode doar todos os bens a um terceiro ou a um único filho. Se ele o fizer, o herdeiro direto não privilegiado poderá requerer na Justiça a sua metade de direito”, explica o advogado.

Para doar um imóvel com reserva de usufruto, o proprietário do imóvel precisa pagar o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), que corresponde a 2% do valor do bem, ao estado (o tributo é pago à prefeitura apenas em negociação de compra e venda), mais as custas do cartório, que giram em torno de R$ 1.600.

“É um procedimento cada vez mais comum, principalmente de pais para filhos. Eles querem evitar as burocracias do inventário”, diz Edson de Carvalho, dono do cartório do 20 Ofício de Notas.

Fonte: Revista Zap 

Brasileiros financiam imóveis nos EUA com juros de 5% ao ano


by Felipe R. Magalhães

Regras para o crédito imobiliário ficaram mais rígidas no país após o estouro da bolha, mas os juros para estrangeiros continuam baixos em relação ao financiamento no Brasil

Mais brasileiros deixaram de comprar à vista para financiar imóveis nos Estados Unidos, depois que os bancos americanos voltaram a permitir o financiamento imobiliário para estrangeiros, há cerca de um ano e meio. O crédito havia sido congelado após o estouro da bolha imobiliária de 2008.
Empreendimento Paradise Palms, perto de Orlando, possui moradias com piscina, cinema e lazer a partir de US$ 268 mil. Foto: Lennar Corporation
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Em 2012, cerca de 90% dos brasileiros enviaram remessas com o valor total do imóvel – ou seja, compraram à vista. Já em 2013, metade deles transferiram 30% da entrada exigida para financiar, segundo dados dos clientes brasileiros da Moneycorp, que faz transações de câmbio em Orlando, na Flórida.
Mas as regras para obter crédito nos EUA ficaram mais rígidas após a crise, assemelhando-se ao mercado brasileiro, avalia Juliana Scolari, gerente de negócios da Moneycorp. "Hoje os bancos analisam a origem dos recursos e a possibilidade do pagamento, e exigem uma entrada maior que antes da crise, quando nem era preciso comprovar renda em alguns casos”.
Antes de aceitar o financiamento, o banco costuma exigir duas cópias do Imposto de Renda, holerites ou uma carta de comprovação da renda dos últimos dois anos, extrato bancário dos últimos três meses, certidão negativa de débito e um documento que mostre que o investidor possui ao menos seis meses das prestações financiadas em uma conta bancária ou aplicação.
O prazo para o banco aprovar o financiamento dura em média 45 dias e o investidor precisa estar presente nos EUA no dia da assinatura do contrato. A possibilidade de financiar o imóvel é geralmente informada pelo corretor, que dá as orientações ao interessado.
A opção mais comum de financiamento nos EUA, e a preferida dos brasileiros, permite parcelar o pagamento em 30 anos, com uma taxa média de juros que varia de 5% a 6% ao ano. No Brasil, os juros do crédito habitacional variam entre 8% e 10% ao ano no mesmo prazo.
Brasileiros também podem financiar imóveis nos EUA em 15 anos, a uma taxa média anual de 5%. “Antes da crise, os juros para estrangeiros eram mais altos do que para cidadãos americanos, mas hoje eles são praticamente iguais”, compara Juliana.
Gastos adicionais
Apesar dos juros relativamente baixos, o brasileiro que quiser financiar deve levar em conta não apenas estas taxas, mas os custos embutidos na operação. Há uma despesa para o fechamento do financiamento que oscila entre 5% e 7% do valor total do imóvel.
É preciso considerar, também, os custos da transferência financeira para os EUA. O processo é feito exclusivamente pelo Banco Central do Brasil, para o qual o investidor deve informar a origem dos recursos e o motivo da transferência do dinheiro.
É o BC que autoriza ou nega a remessa ao exterior após analisar as últimas declarações do Imposto de Renda do investidor. “Para facilitar o processo, é recomendável abrir uma conta bancária nos EUA”, orienta a executiva da Moneycorp.
O câmbio praticado na conversão do real para o dólar pode variar bastante de um estabelecimento para outro. Por isso, Juliana recomenda pesquisar a melhor taxa antes de fechar a transação – ainda mais com a recente alta da moeda americana, cotada a R$ 2,28 nesta terça-feira (30). Depois, o prazo para a chegada dos dólares ao banco pode demorar de 15 a 20 dias.
Além disso, os bancos podem exigir também uma documentação traduzida e o atendimento pode ser confuso e burocrático, alerta Juliana, da Moneycorp. “Para reduzir as dores de cabeça, um especialista em transferência internacional pode ajudar”.
Preços dos imóveis
Lennar Corporation
Condomínio Paradise Palm, com casas a partir de US$ 268 mil
Um estudo da S&P/Case-Shiller divulgado no fim de maio apontou que os preços dos imóveis residenciais nas 20 maiores cidades americanas sofreram uma alta anual de 10,9% em março deste ano. O aumento foi o maior desde 2006 no país.
Em Orlando, onde a procura de brasileiros por imóveis é expressiva, o valor médio dos imóveis subiu 23,95% em abril deste ano, ante o mesmo período de 2012, de US$ 117 mil para US$ 145 mil, segundo dados da Orlando Regional Realtor Association.
Apesar da alta expressiva dos preços dos imóveis, eles continuam convidativos para brasileiros, na opinião da corretora de imóveis Rosana Almeida, da Florida Connection. “Ainda há muito espaço para valorização”, afirma.
Para a corretora, muitos americanos que se endividaram com a crise estão com dificuldade em financiar imóveis e passaram a optar pelo aluguel, abrindo oportunidade para brasileiros que queiram investir. Segundo Rosana, 51% da população de Orlando aluga seus imóveis.
Uma casa de 205 metros quadrados em um condomínio fechado de Park Shore Beach District, na Flórida, com valor de compra de US$ 655 mil, pode render um aluguel de cerca de US$ 38 mil por ano para o investidor.
Invista com a maior entendedora do mercado americano, presente há mais de 100 anos, invista com a Coldwell Banker Brasil em http://www.cbdobrasil.com.br
Fonte: IG

Economista gaúcho avisa que Tarso está quebrando o Estado


Aviso que passa o economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos aos ouvidos moucos dos atuais governantes do RS, na esperança de que interrompam a atual gestão temerária e evitem a quebradeira do Estado, replicando o que relatou o Tribunal de Contas sobre as contas de 2012, mas sem coragem para desaprová-las:

- O maior problema é a situação deficitária do Estado, que é histórica, mas que foi aprofundada no atual governo, que acabou deteriorando mais ainda as já cambaleantes contas públicas. Faço isto como um alerta, porque, entre o corrente exercício e o próximo, o déficit acumulado será  de R$ 4,5 bilhões, valor dos depósitos judiciais baixados para o caixa único no início do ano. Sem margem de endividamento, com os depósitos judiciais quase esgotados, sobrarão para o próximo governo, quando os déficits serão maiores, medidas drásticas e impopulares!

Um olhar estrangeiro sobre Ipanema


Casal francês declara sua paixão pelo Brasil

13/08/2013 | POR REDAÇÃO; FOTOS RODRIGO AZEVEDO/ DIVULGAÇÃO5
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  (Foto: Rodrigo Azevedo/ divulgação)
O Brasil tem seu charme. Por ele, diversos estrangeiros já se apaixonaram, desde 1500. E a história não para de se repetir. Não foi diferente com o casal detentor deste amplo apartamento, de 700 m², que descansa plácido frente à praia de Ipanema, no Rio de Janeiro. Ela, uma francesa autêntica e ele, descendente indireto da mesma pátria – mas brasileiro, de fato. O deslumbre pelo cenário nacional domina a decoração do lar, que o par compartilha com dois filhos.
O apartamento, que possui pé-direito de 3,3 m, mais alto que os demais do edifício (dessas coisas inexplicáveis que só há no Rio), sofreu ampla reforma. O responsável pela transformação radical foi Chicô Gouvêa. A morada integrada e elegante que se vê hoje era antes dois apartamentos independentes. Depois da união, a casa ficou com seis dormitórios, além das salas de estar, jantar, de televisão, da grande cozinha com bancadas da Roma Mobili e cuba e metais Franke, e da área de serviço.
No décor, um – extenso – elemento foi a âncora de todo o projeto. Os moradores quiseram ter como protagonista o painel com paisagens brasileiras pintadas à mão, da marca francesa Zuber. A solução foi desmembrá-lo, tornando-o destaque de não apenas um ambiente, mas de vários. 
Para valorizar tais pinturas, inspiradas nos desenhos de viajantes do século 19, o arquiteto explorou o contraste. Buscou móveis contemporâneos, como sofás geométricos de tons neutros e itens que esbanjam um vermelho vivo. No piso, optou pelo mármore e pela ausência de tapetes. Já as paredes receberam um verde escolhido com base nas tonalidades presentes nos painéis.
De modo geral, trata-se de um projeto limpo, que dá ênfase às peças de linha clássica que a família já possuía, como os móveis Luís XVI reformados. Outro foco, talvez mais importante que os demais, foi dar o devido destaque à vista. E que vista! Por isso, para recobrir as janelas, há apenas suaves persianas da Orlean. Deste modo, o Rio de Janeiro nunca está ausente, nem que entre só um pouco, quando as telas são baixadas.
  (Foto: Rodrigo Azevedo/ divulgação)

  (Foto: Rodrigo Azevedo/ divulgação)

  (Foto: Rodrigo Azevedo/ divulgação)

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  (Foto: Rodrigo Azevedo/ divulgação)

  (Foto: Rodrigo Azevedo/ divulgação)

  (Foto: Rodrigo Azevedo/ divulgação)

  (Foto: Rodrigo Azevedo/ divulgação)
  

Em uma sociedade de analfabetos, ser inteligente na adolescência virou crime


O fato de alguém ser adolescente não implica carimbar o passaporte para a consumição impunível do lixo cultural — como se o cérebro do jovem permanecesse atrofiado até a maioridade
Muito já se disse sobre a adolescência. Na verdade, o entendimento desse período da formação humana tem sido um dos temas abordados amiúde por psicólogos e psicanalistas. As opiniões são as mais variadas: de “luto da infância” à correntia “fase de transformação biológica e emocional”, é possível encontrar definições para todos os gostos e tamanhos. Até um clichê já se cunhou para classificar o momento: “aborrecente” — termo usado na confluência das noções de “aborrecido” e do sujeito que adolesce.
Imediatamente, identifico dois problemas nessa situação. O primeiro, e mais óbvio deles, é que a assimilação conceitual de uma “ideia de adolescência” dá-se, em geral, por pais sem nenhum preparo científico para compreender o conceito com o qual estão a lidar. Isto mesmo: a maioria dos pais educa seus ignorando a psicologia e a psicanálise.
Logo, para pais-educadores que desprezam reflexões de ordem educativa, é natural “comprar” o ideário vendido nos livros de autoajuda — que quase nunca analisam a juventude desde uma perspectiva crítica, optando em tratá-la qual um “rito de passagem” inócuo ao mundo adulto. Isso para não falar daqueles pais extremosos que se deixam enganar por discursos oportunistas, visto que desprovidos de qualquer cientificidade, a apresentar fórmulas para “domar” a juventude — indo dos “manuais sobre como tornar seu bebê tão inteligente quanto Einstein fazendo-o ouvir música erudita mozartiana no berço até lavar o cérebro do microinfante” aos adeptos das sempre condenáveis práticas herdadas de uma tradição de violência ditatorial (a “pedagogia da palmada”). “Adolescentes”, esses livros frequentemente ensinam, são pessoas em “fase de transformação”. E é natural “ser” assim um tanto atabalhoado, um tanto desnorteado, para não dizer displicente mesmo com a própria formação intelectual. O conhecimento vulgar trata o adolescente como uma folha de papel de impressão delével, que só se começa a colorir mui tardiamente com as tintas permanentes da paleta da cultura e da intelectualização.
Obviamente, estudiosos sérios de um assunto sério, como é a adolescência, hão de repelir essas vulgaridades conceptuais. Recorrendo à historiografia, alguns mitos são facilmente degringolados. O primeiro deles é acreditar na ideia de uma adolescência anistórica e atemporal. Quem assim crê ignora que a puberdade, entendida como maturação sexual, nem sempre esteve acompanhada da “ideologia adolescente”. Adolescência é, na verdade, uma “invenção” moderna.
É nesse sentido que se manifesta Contardo Calligaris: “Nossos adolescentes amam, estudam, brigam, trabalham. Batalham com seus corpos, que se esticam e se transformam. Lidam com as dificuldades de crescer no quadro complicado da família moderna. Como se diz hoje, eles se procuram e eventualmente se acham. Mas, além disso, eles precisam lutar com a adolescência, que é uma criatura um pouco monstruosa, sustentada pela imaginação de todos, adolescentes e pais. Um mito, inventado no começo do século 20, que vingou sobretudo depois da Segunda Guerra Mundial”.
Uma vez inventado o mito da “adolescência”, passamos ao segundo dos problemas — decerto o mais grave. Trata-se da concepção segundo a qual a fase de transformações psicofisiológicas, no curso da qual o sujeito adolesce, tende a absolver toda e qualquer forma de experimentação cultural desorientada ou deficiência de formação intelectiva. Nesse prisma, o jovem estaria livre para participar das mais distintas experiências no campo da cultura — podendo até mesmo prescindir da intelectualização prematura. Em princípio, numa sociedade idealizada, não haveria problema nisso.
Poderia ser salutar ao jovem o contato com distintas influências, alargando seus horizontes de entendimento vital.
Mas o problema reside justamente nisto: não vivemos numa sociedade “ideal”. Vivemos, isto sim, numa sociedade de massas direcionada à consumição do kitsch. E a adolescência afigura-se como a vítima ingênua — e praticamente indefesa — da indústria cultural capitalista que não reclama raciocínio ou inteligibilidade.

Estupidificando a juventude

No campo da cultura produzida em escalas industriais, quando se pensa na adolescência “moderna”, no jovem da “era digital-globalizada”, descreve-se logo a imagem de um sujeito desapercebido do mais comezinho senso crítico. É que “quem está na fase de transformações” pode tudo: de dançar as músicas analfabetas de Mr. Catra a permanecer horas diante da tela da televisão consumindo patéticos melodramas novelescos (das seis, das sete, das oito, das nove, das dez horas); de ver seguidas sessões de blockbusters hollywoodianos caça-níqueis a “torcer” pelas vítimas da acefalia que participam da “nave louca” dos reality shows, tudo é “fase”, “logo passa”. Afinal, na cartilha capitalista escrita para o público consumidor jovem, “aproveitar a juventude” é expressão sinônima de “estupidificar a juventude”.
A indústria cultural, no entanto, diferentemente de boa parte dos pais, sabe o significado do mito da adolescência moderna. Ultrapassando as pretensas crises emocionais que decorrem do período, as quais são deixadas para reflexão dos psicólogos e dos psicanalistas, cuida-se logo de “empurrar goela abaixo” o estereótipo estupidificante do adolescente bestializado, um “trapo humano” jovem e insensível. Despreza-se a leitura, tida como “tarefa chata da escola”, travestindo de “poesia” os “ex-my love” da vida — como se pudesse haver perenidade artística em algo tão ruim e de criatividade equivalente a de uma bactéria anaeróbia.
No mundo da música, surge a fórmula dos astros sob a forma de boys band: rapazes de boa aparência, hábeis na dança, cantando músicas com refrões mais açucarados que refrigerante de groselha, caem fácil no gosto das adolescentes que iniciam a convivência cíclica com a menarquia. Há também as cantoras “pop” do nível de Britney Spears e Miley Cyrus, que “inspiram” toda uma geração com o seu “talento” em provocar escândalos, usados espertamente para disfarçar a limitação vocal que as torna desafinadíssimas e, portanto, inaceitáveis a quem tenha um mínimo de inteligência musical auditiva.
Em geral, a reação dos pais consiste em manter-se “equidistante” das partes no conflito (o jovem e sua formação cultural). Deixam o adolescente ser orientado pela televisão (no Brasil, a escola há tempos não constitui o núcleo fomentador intelectual da sociedade), jogando-o no way of life da “Malhação”, novela televisiva que há décadas apresenta o melodrama de jovens da classe média carioca mais preocupados com quem vão transar nas baladas do que em passar no vestibular (se é que existem universidades nesse mundo fictício do tédio juvenil). Há ainda os pais de “espírito jovem”: “Embarcam na onda” e chegam ao cúmulo de reviver (ou seria viver?) a adolescência perdida — tomada na sua conotação mais ignóbil. Ei-los, então, ao lado dos filhos, lançados ao abrigo de barracas improvisadas na porta de shows cujos artistas apresentar-se-ão dali a meses! “É só uma fase”, dizem, buscando justificar a injustificável falta de senso crítico que os leva a dar com as canastras na água. “Logo passa.”

Bullying anti-inteligência

Toda essa complacência é incapaz de esconder, contudo, a decadência cultural que daí advém. O jovem, tomado nesse plano, consome programas de TV e letras de músicas que só acentuam o já acentuadíssimo grau de analfabetismo funcional da sociedade brasileira. E a coisa não para por aí. Há também o surgimento do bullying contra aqueles que negam o estereótipo estupidificante da adolescência. Se um jovem, por exemplo, põe-se a ler as partituras eruditas, há logo de ser chamado de “anormal”, “esquisito”; sim, pois todos os seus amigos que tocam o mesmo instrumento estão a dedilhar acordes entoando versos de canções que rimam “cantar” com “amar” ou contando as “estrelas lá no céu que vão buscar”. Claro, há também que lembrar das odes aos “praieiros e guerreiros que estão solteiros” — esses heróis da tragédia pós-moderna da intelectualidade. Da mesma maneira, se o adolescente é flagrado a ler obras de Machado de Assis ou José de Alencar, tomado por uma milagrosa inteligência inata que o impulsiona incontornavelmente ao conhecimento, deve tomar cuidado ao proceder em público. Uma atitude subversiva dessa ordem, nos moldes de leitura espontânea de literatura brasileira, sem a interveniência de imposição escolar para exames ou provas, pode gerar uma série de represálias discriminatórias, que vão dos conhecidos epítetos de “CDF” ou “nerd”, pechas que nenhum adolescente sente orgulho em carregar, podendo até atingir, em casos mais graves, o píncaro da bestialidade infanto juvenil manifestada num gesto abrutalhado de agressão ao jovem intelectual. Se esse mesmo jovem admitir-se, então, leitor de filosofia, aí a liberdade de pensamento periclita: não surpreenderia ver os pais do adolescente, hipnotizados pelo mito da adolescência moderna estereotipada desde um viés estupidificante, buscar em juízo alguma medida de interdição, se possível, internando-o num manicômio judiciário, onde estará a salvo de toda e qualquer reflexão filosófica.
Mas essas consequências a que aludo são previsíveis. Em uma sociedade de analfabetos funcionais, ser inteligente na adolescência virou “crime”. A conduta deve, portanto, ser vigiada e punida, para evitar, pela disciplina do corpo e da mente, que se rompam esses grilhões, engendrando uma “revolta cultural” contra a tecnologia da alma que converteu em prisão o mito de ser adolescente contemporaneamente.
“O que estava em jogo não era o quadro rude demais ou ascético demais, rudimentar demais ou aperfeiçoado demais da prisão, era sua materialidade na medida em que ele é instrumento e vetor de poder; era toda essa tecnologia do poder sobre o corpo, que a tecnologia da ‘alma’ — a dos educadores, dos psicólogos e dos psiquiatras — não consegue mascarar nem compensar, pela boa razão de que não passa de um de seus instrumentos.” (Foucault).
Há, em conclusão, um movimento coordenado da indústria cultural voltada ao público teen. A adolescência, enquanto “invenção” moderna, é um nicho mercadológico rentável como qualquer outro. Para ela, são forjados cantores de playback que lotam estádios, romances de bruxos infantis e vampiros, revistas que elegem “o colírio” ou “a mais gatinha”. Nesse “mundo adolescente”, ser “modelo” é a profissão dos sonhos, o cinema blockbuster de Michael Bay é mais importante que o de Ingmar Bergman e é normal ser um fã histérico acampando na porta de casas de espetáculos ou um fanático religioso mirim que se predispõe, com uma bíblia debaixo do braço, a “exorcismar o mal” da humanidade sem nenhum senso crítico.
Felizmente, como sói acontecer com toda a regra, também a pubescência apresenta suas exceções. A história registra casos de grandes nomes das artes cujo talento manifestou-se ainda cedo. Isto é, na adolescência.

O exemplo de Rimbaud

Rimbaud
Na literatura, dentre os possíveis exemplos, o mais notável deles é, indubitavelmente, o de Arthur Rimbaud. O grande representante da poesia simbolista francesa construiu sua obra magna ainda na adolescência. E, da mesma forma que colocou cedo seu nome no panteão dos grandes literatos, cedo deixou de escrever poesia, abandonando o ofício artístico quando contava apenas 20 anos. É, até hoje, o “adeus” mais triste da história da Li­teratura. Um gênio precoce, um gênio que quis superar a si próprio, inclusive por abandonar a poesia.
Como bem esclarece Ivo Barroso: “Sua ânsia de superação, em tudo — mas principalmente de auto-superação — faz com que ele, consciente embora do quanto havia conseguido conquistar de território poético, largue tudo de mão para ir desbravar os territórios do não-poético, do apoético, sem deixar no entanto de consagrar a essa nova aventura o mesmo fervor com que se entregara à poesia. Um verdadeiro fenômeno de precocidade? Espantoso caso de predestinação? Uma vida em duas etapas que se completam? Direi: um ser que conseguiu viver duas vidas, ambas com total e profunda intensidade. Enfim, um homem que passou duas vezes pelo Inferno!”
O problema de exemplificar “inteligência na adolescência” com Rimbaud é a constatação de que o poeta francês pertence a um outro século e, portanto, a uma sociedade estruturada de maneira substancialmente diversa da nossa. Por isso, escolhi o exemplo atual de uma cantora muito jovem que, apesar de “pop”, demonstra que é possível ser adolescente sem comprometer a própria sofisticação.

O exemplo de Birdy

Na música pop, tenho como exemplo digno de talento adolescente precoce a cantora Jasmine van den Bogaerde. Nascida em 1996 em Lymington, Hampshire, Inglaterra, ela é mais conhecida como Birdy — a alcunha que recebeu, ainda criança, dos pais. Pois foi usando desse nome artístico que Birdy gravou um ótimo disco quando tinha apenas 15 anos.
Lançado em novembro de 2011, o álbum homônimo “Birdy” compõe-se, basicamente, de um repertório de covers. O detalhe é que as versões foram elaboradas, em geral, a partir de canções retiradas de bandas do chamado movimento “indie rock” — boa parte delas desconhecida do grande público brasileiro. O risco de que um disco nesses moldes produzido viesse a descambar para a pieguice adolescente brejeira era grande: bastaria um tom apelativo e teríamos mais uma cantora teen de sucesso comercial, alegrando a saúde financeira de produtores e empresários da indústria fonográfica. Mas o que se ouve em “Birdy” é algo completamente distinto. Há uma cantora jovem — muito jovem, por sinal — executando lindamente seu piano com uma voz madura e de timbre mui elegante.
A faixa de abertura “1901” demonstra claramente que o refinamento de Birdy está muito além da limitação auditiva a que a maioria dos adolescentes encontra-se aprisionado. Com muita maturidade, Birdy consegue recriar a canção originalmente gravada pela banda “Phoenix” com uma distinção vocal ímpar — rara de se ver hoje em dia na música pop.
Poderia ser um lampejo feliz de um debut. Mas a desconfiança rapidamente cessa pela ouvida das faixas seguintes. Tanto em “Skinny Love” quanto em “Shelter”, cujas gravações originais pertencem, respectivamente, a Bon Iver e The xx, fica claro que a produção musical do álbum soube conduzir muito bem o talento da menina, destacando a delicadeza de seu timbre vocal numa sonoridade melancólica, porém agradável.
Especialmente em “People Help The People” do Cherry Ghost, Birdy demonstra uma maturidade excepcional numa faixa de boníssimo gosto, podendo-se divisar claramente os acordes do seu piano, mesmo quando da entrada dos demais instrumentos no acompanhamento (bateria, baixo e violoncelo), em nada comprometendo a emotividade de sua interpretação. O piano solo de Birdy ganha ainda destaque em faixas como “Terrible Love”, do The National, e “The District Sleeps Alone”, do The Postal Service. Aí se pode perceber que, além de cantora competente, a inglesa domina bastante o seu instrumento (nem surpreende, se considerarmos que sua mãe é uma pianista profissional).
E, mesmo quando Birdy se arrisca a recriar versões de nomes mais conhecidos do show business — como “Fire and Rain”, de James Taylor, e “Farewell and Goodnight” , do The Smashing Pumpkins —, a cantora consegue colocar sua marca pessoal nas versões: um vocal delicado e emotivo na medida certa.
Aos que desejarem apreciar em toda a inteireza o talento de Birdy e a riqueza de sua voz doce, recomendo comparar as versões cover da cantora inglesa com aquelas originalmente pertencentes ao repertórios das bandas de indie rock de onde foram extraídas. Nessa comparação, excetuando-se “Con­forting Sounds” do Mew (muito boa já na sua versão original com a guitarra elétrica em destaque), fica evidente a capacidade extraordinária dessa artista em recriar essas canções. Arrisco-me inclusive a dizer que, não fosse pela intervenção magistral do piano de Birdy, eu não teria o apreço que tenho hoje por essas composições. É provável que algumas delas sequer eu conhecesse!

Talento, senso crítico e sofisticação

Como um bem sucedido debut de covers, é natural que a crítica musical imponha a Birdy o desafio costumeiro a todo artista no mundo da música: a de apresentar um próximo álbum de inéditas, priorizando composições próprias. No entanto, a pergunta que se põe, consistente em saber se a jovem inglesa será capaz de compor tão bem quanto toca o piano ou canta com emoção, já começou a ser respondida nesse mesmo álbum, pois ela assina a autoria da faixa “Without a Word”.
Devo confessar que a elegância vocal de Birdy, misturada a um quê de inarredável melancolia, agradou-me sobretudo pela facilidade com que me remeteu a uma das minhas cantoras favoritas: a estadunidense Fiona Apple. Até mesmo na maturidade precoce atingida na carreira, ambas se assemelham. Afinal, Fiona Apple lançou o brilhante “Tidal” (1996) quando contava com apenas 19 anos. E Birdy, ainda adolescente, já desponta como um grande talento da novíssima geração de cantoras que se pretendem fazer respeitadas num ambiente cada vez mais inóspito à qualidade musical, tal qual o é o gênero da música pop.
Diante de artistas como Rimbaud, na poesia, e Birdy, na música, é inevitável pensar novamente na adolescência. Como po­dem, ain­da muito jo­vens, atingir um grau de sofisticação artística tão admirável? Por acaso teriam sido imunizados contra o estereótipo estupidificante da adolescência? Ou seria um mero “golpe de sorte” no mundo das artes?
De minha parte, quero crer que o “segredo” está na iconoclastia. Derrubar o estereótipo estupidificador da adolescência pressupõe compreender, no mundo contemporâneo, o sentido filosófico da invenção desse mito, especialmente nos limites do que propõe a indústria cultural. De fato, inexiste impedimento para que um adolescente venha a se tornar um prodígio precoce no campo das artes ou no da intelectualidade — embora neste último seja algo raríssimo de acontecer. O que se deve ter em mente é que o fato de alguém ser adolescente não implica carimbar o passaporte para a consumição impunível do lixo cultural — como se o cérebro do jovem permanecesse atrofiado até a maioridade. É preciso, ao revés, que os pais entendam aquilo que a filosofia está a pregar faz séculos: talento, senso crítico e sofisticação cultural independem de idade biológica. Aliás, quanto mais cedo se atingir esses patamares, tanto melhor será para a juventude como para a sociedade que nela deposita as esperanças de um porvir menos miserável culturalmente. Um porvir mais digno. Um porvir mais inteligente.

Sobreviventes da boate Kiss têm dificuldades para conseguir remédios



Posted: 13 Aug 2013 08:23 PM PDT

Sobreviventes do incêndio da Boate Kiss em janeiro em Santa Maria (RS) enfrentam dificuldades para conseguir remédios de graça pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Eles reclamam da demora e contam que precisam entrar na Justiça para ter acesso à medicação. Jarlene Spitzmachir, que estava na boate na noite da tragédia, tem bronquite asmática e dificuldades para caminhar. Ela precisa tomar 10 remédios diferentes por dia, mas desde que teve alta do hospital, em fevereiro, nunca conseguiu os medicamentos pelo SUS. “Já mandei diversas vezes toda a papelada para eles, mas nunca consegui nada. Ligo para lá e eles nunca sabem de nada”, disse.

Outra sobrevivente do incêndio, Naiara Neuenfeldt desistiu de pedir ao SUS os remédios para combater uma inflamação no pulmão. “No início do tratamento, a minha mãe esteve na 4ª Coordenadoria de Saúde, mas disseram que para conseguir as medicações apenas pela via judicial”. Segundo os médicos, a demora em tomar a medicação põe em risco a saúde dos pacientes que sofrem de doenças pulmonares, como é o caso das pessoas que inalaram fumaça tóxica durante o incêndio na Kiss. Se o tratamento for interrompido, sintomas que já haviam sido controlados podem voltar. 

A Coordenadoria de Saúde de Santa Maria afirma que medicamentos que constam na lista do Estado são fornecidos em até 20 dias. Para fornecer outros remédios, os pacientes precisam entrar na Justiça. “Temos seis meses já da tragédia e o cuidado aos sobreviventes já entrou no fluxo normal do SUS”, afirmou Flávia Costa da Silva, da Coordenadoria.
(Fonte: Terra)

CHARGE DO MARIO - Juízes Federais não pagarão Imposto sobre 1/3


Esta charge do Mario foi feita originalmente para o

As ratazanas



por Ronaldo Gomlevsky – Nesta hora em que aparentemente o barco faz água, ratos são vistos abandonando o navio e tentando lançar responsabilidade, apenas sobre as largas costas dos timoneiros. É mais fácil explicar o porquê do abandono e sair na boa, do que tentar entender o que está se passando, quem, quando, fez o quê, e a partir daí, tirar conclusões inteligentes, cautelosas e por isto mesmo, mais precisas e mais aproximadas da realidade.
Estou me referindo aos efeitos relativos às manifestações do povo brasileiro, nas ruas de todo o país, já há mais de dois meses. No Brasil, a CORRUPÇÃO, os MALFEITOS, a FALTA DE VONTADE POLÍTICA e o DESCASO com a necessidade pública (do povo) não chegaram, apenas, nas últimas eleições. São eternos conhecidos de nossa sociedade e geradores de danos a ela, que além de irreparáveis,parecem ser perenes, como uma doença terminal que não conhece remédio.
Fazem parte da “vita brasillis” e estão presentes por aqui, desde que Pero Vaz de Caminha identificou por escrito, onde tinha conseguido amarrar a nave do rei comedor de frangos assados inteiros (quem não gosta?). Aliás, por falar em família imperial, imagine você, quantos séculos de abusos, de rapinagem, de esbulho e de desmandos foram praticados nesta terra, em nome da tal Coroa?
O brasileiro, tido como passivo, vai às ruas e acaba com a popularidade de governantes que foram eleitos e reeleitos com esmagadora votação, pouco tempo antes. Em menos de quinze dias, tal qual um efeito contrário ao da absurda alta da inflação nos tempos de Sarney, os detentores de belas performances em pesquisas de popularidade, viram sua bola murchar e seus índices despencarem com uma rapidez só mesmo vista nas pistas internacionais de Fórmula 1. Os governantes mais atacados, certamente, não são os inventores das mazelas pelas quais são acusados. São na pior das hipóteses, os herdeiros de um comportamento que o povo não mais aceita.
No caso do governador do Estado do Rio, os índices de investimento em tudo o que se refere à melhoria de qualidade de vida povo, não ficam nada a desejar, se comparados com governantes do mesmo estado, em épocas passadas. O que está acontecendo hoje no Brasil é o mesmo que acontece com uma represa cheia d’água que transborda. Por outro lado, mesmo que ainda não esteja muito claro, parece que se perdeu o controle do que se passa nas ruas. Existem os manifestantes que lutam por qualidade de vida nacional, estadual e municipal, de forma pacífica. Aqueles que querem mais educação, mais saneamento, mais segurança, mais educação, e, por isto mesmo, irreprimível e irretocável, sua conduta.
Escondidos em seu meio, ou melhor, mascarados no meio de quem é do bem, existem os vagabundos, chamados “vândalos” que não passam de aproveitadores de ocasião, prontos para quebrar e assaltar, furtar, roubar tudo o que for possível de dentro dos estabelecimentos indefesos, depredados por eles mesmos, numa flagrante prática criminosa e que está deixando uma pulga atrás da orelha de quem está assistindo.
A ação da OAB, da PM, de certas ONGS, do MINISTÉRIO PÚBLICO, é fundamental para que os protestos legítimos não só tenham consequência, como a baderna que está em vigor no ato das passeatas e manifestações seja devidamente reprimida. Não é o que se vê! Além do bem maior que é a melhoria da qualidade de vida do povo e que precisa ser buscada diariamente, as propriedades pública e privada, também precisam ser garantidas.
O medo que todos temos é o de deixar escapar o rumo democrático que tomou a vida nacional. É hora de definições. Que país você quer? Eu quero um país em que as pessoas sejam respeitadas, tenham qualidade de vida, cumpram a lei dentro de um sistema de garantias à livre iniciativa, à propriedade privada, ao bem público, com saúde, segurança e educação para todos os cidadãos!
Ronaldo Gomlevsky é Editor Geral da Revista MENORAH

100% satisfaction - MARTHA MEDEIROS


ZERO HORA - 14/08


Quem acompanha meus textos sabe que arrasto um trem pelos Beatles, ainda que os Rolling Stones tenham igualmente sonorizado minha adolescência. Na hora de responder à pergunta clássica – Beatles ou Stones? –, eu cravava Beatles sem meio segundo de vacilação.

As coisas mudaram. Hoje, se me fizessem de novo a mesma pergunta, desconversaria, pois a comparação não procede. Apesar de serem bandas contemporâneas e conterrâneas, a guitarra de um não bate com a guitarra do outro. Isso só ficou evidente pra mim quando, no último dia 13 de julho – Dia do Rock! – tive a sorte e o privilégio de assistir a um show dos Stones em pleno Hyde Park, em Londres, num início de noite ainda com céu claro e calor intenso.

Eles entraram no palco às 20h30min e o meu queixo tremeu, o olho marejou, e mesmo me conscientizando ali de que estava diante de quatro pessoas de extrema importância na minha vida, coloquei a culpa do meu faniquito na idade – a deles, claro. Me emociono com os perseverantes.

O fato é que durante as duas horas exatas em que a banda apresentou seus hits mais contagiantes com uma qualidade de som que eu nunca tinha escutado ao vivo e um pique que jamais caiu, me dei conta de que a matéria-prima do rock é a testosterona – e nada menos sexual do que os Beatles.

Mick Jagger seduz com todos os instrumentos de que dispõe: voz, corpo, guitarra, gaita de boca, e a boca, ela própria. Perdoe a vulgaridade do termo, mas não encontro jeito mais suave de expressar: cada música é como se fosse uma trepada com a plateia. Sai-se esgotado da experiência, eles ainda mais do que nós. Se depois de um show assim vigoroso dá vontade de acabar a noite acendendo um cigarro e tomando um uísque, não tenho dúvida de que para eles a noite acaba no hospital tomando soro. Mas com a missão cumprida.

Já os Beatles passam longe do obsceno. Fundadores de um estilo único, experimental, poético e sofisticado, conquistaram o pódio com sua extraordinária inventividade – nunca um disco igual ao outro. O que eles fizeram em apenas 10 anos de carreira ninguém chegou nem perto. Não era rock. Eles criaram um gênero musical chamado... Beatles.

Rolling Stones são definitivamente roqueiros. Há 50 anos oferecem mais do mesmo, e nenhum problema em não mudar. O mundo em volta é que mudou. Em 1969, quando tocaram no Hyde Park pela primeira vez, a plateia era formada por simpatizantes do flower power, todos curtindo paz e amor, muitos em viagem de ácido.

Em julho de 2013, a plateia era formada por simpatizantes do Steve Jobs, todos assistindo ao show pelo monitor do seu iPad, iPhone e tuitando com uma obsessão de viciado. Milhares de cinegrafistas amadores reunidos a fim de documentar o que estavam – estavam? – vendo.

Só o meu queixo tremido é que ninguém viu nem filmou. Ficou sem registro digital. Minha emoção segue totalmente analógica.