quinta-feira, 2 de março de 2017

Entidade patronal da agricultura de SP favorece presidente e filhos


Charles Sholl - 20.fev.2017/Futura Press/Folhapress
S√O PAULO,SP,20.02.2017:TEMER-AGRO+SP - Presidente da FAESP, F·bio Meirelles participa do lanÁamento da etapa paulista do Agro+, no WTC, em So Paulo (SP), na manh desta segunda-feira (20). O programa busca a modernizaÁo do agronegÛcio para reduzir o custo das atividades do setor e combater a ineficiÍncia gerada pela burocracia. (Foto: Charles Sholl/Futura Press/Folhapress) ***FOTO COM CUSTO EXTRA E CRDITOS OBRIGAT"RIOS***
O presidente da Faesp (Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo), Fábio Meirelles
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Sob o mesmo comando há quatro décadas, a Faesp (Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo) vem sendo utilizada para atender aos interesses dos cinco filhos de seu presidente, Fábio Meirelles, 88, deputado federal pelo então PDS de 1991 a 1995.
Representante de empresários rurais do Estado, a Faesp é bancada principalmente pela contribuição sindical obrigatória. Em 2016, o repasse foi de R$ 16 milhões.
Meirelles comanda ainda o conselho do Senar-SP (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural), mantido pelo chamado "sistema S", também sustentado com contribuições compulsórias recolhidas pelas empresas. O Senar-SP recebeu em 2015, segundo o Tribunal de Contas da União, R$ 119,3 milhões.
Procurada pela Folha, a Faesp não respondeu às perguntas da reportagem.
FAMÍLIA
Para fazer a cobrança administrativa de empresários e proprietários rurais que não pagaram a contribuição sindical espontaneamente, a Faesp contratou a empresa Connect, que pertence a uma filha do presidente da federação, Telma Meirelles.
O contrato entre a Faesp e a Connect, obtido pela Folha, mostra que desde 2001 a empresa recebe, para enviar as guias de cobrança, 15% do imposto dos contribuintes.
O percentual é superior ao que a Faesp paga a advogados para receber os atrasados pela via judicial (12,5%).
A Connect foi criada, conforme registro na Receita Federal, três meses antes de ser contratada, em endereço vizinho ao da federação.
Outra filha, Tânia, dona da RLZ Decorações, presta serviços ao condomínio em que fica a sede da Faesp, na região da praça da República, centro de São Paulo.
A Faesp ocupa quase todo o prédio e, por isso, banca a maior parte do condomínio. A federação não informou quanto Tânia ganha nem que serviços presta.
No apartamento dela, a 400 metros da sede da Faesp, uma das copeiras contratadas pela entidade trabalha no período da manhã.
Como verificou a Folha na quarta-feira (22), a funcionária chegou à Faesp antes das 8h. Às 9h27, após bater o ponto e vestir o uniforme, saiu e caminhou até o prédio em que Tânia mora, onde entrou às 9h32, permanecendo pelas horas seguintes.
Além da empresa de decorações, Tânia é dona desde 2013 da S.O.S. Sertanejo, firma que agencia shows do cantor Eduardo Araújo (ex-Jovem Guarda), contratado para eventos da Faesp e de sindicatos rurais.
Danilo Verpa - 22.fev.2017/Folhapress
SAO PAULO - SP - 22.02.2016 - 09h32 - Sede da Faesp onde a copeira, Gleice, bate cartao todos os dias s 8h30 no predio da federação, sai de la de uniforme e vai trabalhar na casa de Tania, filha de Meirelles.. (Foto: Danilo Verpa/Folhapress, PODER)
Contratada pela Faesp, copeira chega ao prédio de filha de presidente da entidade, na quarta (22)
CARGOS E INDICAÇÕES
Há outros sinais de mistura com interesses privados. Meirelles preside a federação desde 1975.
Em maio do ano passado, a Faesp firmou contrato de R$ 20 mil com o Iate Clube para alugar três salões de festa, no bairro de Higienópolis, em São Paulo, para um "evento corporativo" –como consta do contrato de locação– em 10 de julho. Nessa data, Meirelles celebrou suas bodas de diamante no local.
No Senar-SP, um filho de Meirelles, Tarso, trabalha como supervisor desde 1995, com salário de R$ 17 mil.
Já o CNPC (Conselho Nacional da Pecuária de Corte) é presidido por Tirso, outro filho de Meirelles. O CNPC é independente, mas recebe repasses da Faesp, como um de R$ 500 mil para o período de julho a dezembro de 2016.
Um quinto filho de Meirelles, Fábio Filho, foi indicado em 2016 para representar a Faesp no Instituto Pensar Agropecuária (IPA), que fornece dados à bancada ruralista no Congresso. Neste ano, ele assumiu o comando do IPA.
Em São Paulo, quem atua pela Faesp junto de deputados da Assembleia Legislativa é um sobrinho de Meirelles, Roberto Meirelles Junior. Pelo contrato, obtido pela Folha, ele ganha R$ 15 mil por mês, além de verbas para deslocamentos e hospedagens.
A Faesp representa empresários rurais, médios e grandes proprietários paulistas, reunindo 237 sindicatos.
Neste ano, dois diretores, José João Auad Júnior e Angelo Benko, passaram a questionar a gestão Meirelles. O advogado de Benko, Ricardo Campos, pediu à Justiça que obrigue a gestão Meirelles a abrir os balanços financeiros. Nesta quarta (1º), obteve uma liminar favorável.
OUTRO LADO
Procurada na quinta (23) e na sexta (24), por meio de sua assessoria, a Faesp não respondeu às perguntas da reportagem. Inicialmente, a entidade solicitou mais um dia para enviar as informações. O prazo foi concedido.
Nesta quarta-feira (1º), a assessoria afirmou que não conseguiu contato com a presidência da Faesp, que entrou em recesso até a próxima segunda (6), e que não tinha as informações.

O horror na fronteira - travessia México, EUA



Claudio Goulart, serralheiro, 45 anos, enfrentou uma travessia 
arriscada para entrar nos Estados Unidos com "coiotes" em 2002

query_builder 1º mar 2017, 18h50


Em 1995, decidir morar nos Estados Unidos. Vendi minha moto, comprei a passagem e, com 80 dólares no bolso, desembarquei no aeroporto JFK, em Nova York. Mas a vida nos EUA não era nada do que eu havia imaginado. Sofri muito no começo. Trabalhava na construção civil quinze horas por dia, sete dias por semana. Emagreci muito. Conforme aprendia o idioma, abri minha própria empresa de instalação de pisos de madeira e comecei a ganhar dinheiro. A cada dois anos, eu vinha visitar a família para matar a saudade.
No fim de 2001, depois do atentado às torres gêmeas, o cerco apertou. Havia blitze por todos os lados. Resolvi passar uma temporada no Brasil até as coisas se acalmarem. Em março de 2002, quando desembarquei de volta em NY, fui deportado.
Toda a minha vida estava nos Estados Unidos. Meu carro, minhas roupas, minha empresa. Por isso eu decidi entrar pelo México. Desembarquei no aeroporto de Guarulhos e nem voltei para minha cidade, Buritama, no interior de São Paulo. Comprei uma passagem para a Cidade do México e embarquei sem ter a menor ideia do que iria acontecer.
Nenhuma obra de ficção consegue descrever o horror que é essa travessia. Da capital mexicana, peguei o ônibus para uma cidade na fronteira chamada Reynosa. Logo na entrada da cidade, policiais mexicanos pararam o ônibus, viram que eu era estrangeiro e queria atravessar a fronteira. Aquilo é uma máfia. Fui levado para uma sala sem cadeira nem banheiro. Depois de dar 100 dólares para cada policial, ganhei água gelada, cadeira, ventilador. Os próprios policiais me levaram até o centro da cidade e me mandaram procurar um homem com uma flanelinha vermelha. Esse rapaz me levou para um sobradinho sujo de dois quartos e um banheiro, onde já estavam umas cinquenta pessoas.
No meio da segunda noite, um mexicano acordou todo mundo gritando “Vamos! Sem mochila! Sem mochila!”. Para não ser confundido com traficante, tive que deixar para trás minhas roupas, câmera fotográfica, perfume e outros objetos pessoais.
Cinco caminhonetes nos deixaram no meio de uma estrada. Acompanhados de três “coiotes”, caminhamos no escuro em fila, dentro de um pasto, por quatro horas até um rio de uns 80 metros de largura, com uma correnteza forte. Fiquei preocupado, porque nosso grupo tinha idosos e crianças. Cada um ganhou uma câmara de pneu e um saco de lixo para guardar as roupas. Fazia muito frio. Na outra margem do rio, vi passaportes jogados no chão e corpos de pessoas que haviam se afogado. O cheiro de corpos em decomposição era forte.
"Na outra margem do rio, vi passaportes jogados no chão e corpos de pessoas que haviam se afogado. O cheiro de corpos em decomposição era forte"
Depois de mais quatro horas andando e escalando cercas, alcançamos a cidade americana de McAllen. Fomos levados para uma casa grande, afastada da cidade, onde estavam umas 100 pessoas. A fila do banheiro era enorme. Ninguém podia sair da casa, porque a cidade é muito pequena e a polícia sabe quem é imigrante.
A casa era uma espécie de QG dos “coiotes”, que escolhiam alguns para fazê-los de reféns. Eles obrigam os imigrantes a ligarem para a família pedindo 5.000 dólares e não deixam a pessoa sair da casa enquanto não recebem. Um goiano estava preso na casa havia quatro meses porque a família não tinha dinheiro para mandar.
Saímos da casa no meio da madrugada, em caminhonetes que levam até o meio do mato. O grupo teve que andar 140 quilômetros por três dias e duas noites. Cada pessoa tem que escolher entre levar uma lata de comida ou um galão de água. Foi um sofrimento horrível. Andamos dia e noite, sob o sol quente, em um lugar cheio de carrapato, cobras venenosas. Nesse trecho também vimos corpos em decomposição, de imigrantes que foram picados por cobras e ficaram pelo caminho. No meu grupo havia um idoso bem magrinho que eu carregava nas costas quando ele não aguentava andar. As crianças tomavam remédio para dormir e os pais levavam no colo.
Quando finalmente chegamos em Houston, cada um seguiu sua vida. Eu peguei uma van que iria até Massachusetts e passei mais dois dias na estrada. Minha família e meus amigos ficaram uma semana sem notícias minhas. Quando consegui falar com eles, não sabia se ria ou se chorava.
Depois de cinco anos dessa experiência que eu nunca vou esquecer, e sem poder visitar a família, a saudade do Brasil apertou demais e eu voltei para minha terra natal. Morro de vontade de voltar para os Estados Unidos, mas nunca mais dessa forma.
Depoimento colhido por Daniela Macedo
Foto por Célio Messias/VEJA.com

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