O Estado brasileiro extrai dos setores produtivos da sociedade em torno de 41% de toda a riqueza por eles gerada. O ser humano sempre buscará atender a seus próprios interesses em primeiro lugar e da melhor maneira possível. E o resultado da soma dessas duas premissas é o comportamento típico do brasileiro em busca de seus objetivos, visto que ele já entendeu há décadas que a melhor forma de “se dar bem” na vida não é trabalhar e produzir bens e serviços genuinamente demandados pelos consumidores, mas sim buscar fazer jus a uma fatia maior deste enorme bolo de recursos concentrados nas diferentes estâncias governamentais.
É a lei do menor esforço (e risco) combinada com o demasiado poder político e financeiro dos entes estatais que acaba por gerar uma demanda de certos indivíduos por tratamento diferenciado (mais benéfico) por parte da administração pública. E tanto mais fácil torna-se atingir tal meta quanto maior for a expertise destas pessoas no jogo de bastidores da política e quanto mais livre for seu trânsito pelos corredores do poder.
E é justamente neste cenário de simbiose entre “grupos de pressão” (como bem os definiu F.A Hayek) e Estado que surgem as empresas de assessoria parlamentar. Observem o menu de serviços oferecidos por uma delas, notadamente aqueles em destaque, para começar a entender como a banda toca em Brasília e nas demais casas legislativas:
Interessante: o que esta empresa oferece, em síntese, são os meios para acelerar a aprovação de projetos de lei e diplomas legais congêneres que beneficiem setores econômicos ou categorias profissionais específicos. Ela possui as ferramentas, o know-how e os contatos que possibilitam o monitoramento e a aceleração do processo legislativo.
Tipo assim: os fabricantes de automóveis instalados no país estão bastante preocupados com a entrada de veículos produzidos no México, os quais estão superando em preço e qualidade aqueles aqui fabricados, devido aos custos minorados de produção no país da América do Norte. Solução paternalista: correr atrás de protecionismo em forma de normas emanadas do Congresso Nacional, tais como uma regra de “conteúdo nacional”, tributações diferenciadas ou artifícios similares que venham a encarecer os carros mexicanos.
O mesmo se aplica aos produtores rurais¹, vinicultores e a diversos outros segmentos do empresariado que adoram correr para debaixo da asa governamental tão logo algum estrangeiro ouse agradar os consumidores nacionais. E, para garantir que o Diário Oficial da União trará as boas novas rapidamente, contrata-se uma assessoria parlamentar, a qual manterá os interessados atualizados sobre o andamento processual da proposta que lhes agracia (e prejudica o restante da população), providenciando reuniões com Deputados e Senadores, provendo dados e estatísticas que possam convencer os legisladores da importância da proposição, e por aí vai.
Outros clientes fiéis deste pessoal influente são os sindicatos de categorias profissionais. Interessado em aprovar o pagamento de adicional de periculosidade para seus afiliados? Querendo obter jornada de trabalho menor para seus representados sem alterar a remuneração? Visando garantir uma reserva de mercado para uma determinada profissão? Pretende assegurar um aumento gordo para alguns poucos felizardos funcionários públicos em um momento de recessão no qual todos apertam os cintos? Então é hora de contratar uma assessoria parlamentar, a qual pavimentará o caminho para que sua casta seja privilegiada em relação a todos os demais trabalhadores do país.
E o que sobra para os empresários e cidadãos que não contam com tal capacidade de articulação junto àqueles que intervem não apenas na economia mas em todos os aspectos de nossas vidas? Contratar tais serviços especializados, afinal, não é livre de honorários. Sim, resposta correta: sobrou o bagaço da laranja. É um ciclo perverso com aqueles empreendedores e indivíduos mais humildes e desprovidos de influência política, o qual começa com os fiscos extorquindo o povo, continua com aqueles que sabem chorar melhor mamando maiores retribuições deste espólio, e termina com a escumalha desorganizada – desde o peão da obra até o Manoel da padaria da esquina com três empregados – pagando o pato por esta relação promíscua.
No conflito entre os vários grupos de pressão, não prevalecem, pois, os interesses daqueles mais pobres e numerosos; muito pelo contrário. O status de um grupo mais prestigiado, ao final e ao cabo, sempre resta ainda mais elevado sobre os demais. É o legítimo arranjo “o de cima sobe e o de baixo desce”, curiosamente esta uma acusação que o capitalismo costuma receber de seus críticos.
Convém enfatizar que esta empresa de consultoria não faz nada mais do que atender a demandas surgidas em decorrência de como as coisas funcionam em nosso país (o que não se restringe à capital federal, sendo este o modus operandi em assembleias legislativas e câmaras municipais também), explorando honestamente este nicho de mercado. Muito injusto, mas dentro da lei – como quase tudo em terra brasilis. A culpa não é delas, e sim da concentração de poder político e financeiro nas mãos de poucos e pilantras. Auxiliar interessados em obter “direitos” especiais a atravessarem o labirinto de engravatados dos plenários e chegarem àqueles portadores da caneta mágica que podem concedê-los não é crime nem contravenção, afinal.
Especialmente em tempos de crise econômica, “farinha pouca, meu pirão primeiro” – nem que isso implique em ficar amigo e bajular os donos do moinho, e ainda que seja necessário pagar para ser apresentado a eles.