domingo, 7 de setembro de 2014

PANDORA - MIRANDA SÁ


by Miranda Sá

MIRANDA SÁ (E-mail: mirandasa@uol.com.br) 

Na sua tendência mórbida para o logro, Lula da Silva – o “Metalúrgico” – fundiu umas limalhas colhidas num ferro-velho e arremedou um poste, que chamou de “Gerentona”, elegendo-a presidente da República. Oportunista, quis dar seqüência à sua participação no poder com seus pelegos e aliados, os piores politiqueiros do País.
Foi um desastre essa macaqueação. O que se assistiu foi o Brasil ser sucateado pelos desmandos da incompetência e infectado pela corrupção desenfreada de ministros, diretores de estatais e assessores de coisa nenhuma...
Não há exemplo maior do definhamento dos valores nacionais do que a tomografia computadorizada dos escândalos da Petrobras, nascida dos reclamos do povo brasileiro na histórica campanha do “petróleo é nosso”, e criada por Getúlio Vargas nos idos de 1950.
Considerada um ícone da economia nacional, a estatal de economia mista e capital aberto – tendo o governo como acionista majoritário – pouco chama atenção na Bolsa de Valores, exceto pelos acionistas individuais burlados e roubados pelos pelegos lulo-petistas que a privatizaram por interesses peculiares. Frequenta inadequadamente as páginas policiais da imprensa.
Hoje, a Petrobras tem um ex-diretor preso, Paulo Roberto Costa, e vários colegas de diretoria com os bens bloqueados pela Justiça, a pedido do Tribunal de Contas da União. A sua presidente, Graça Foster, escapou dessa punição, blindada pelo acumpliciamento do Poste de Lula, também envolvida na desastrosa condução da empresa.
O assalto à Petrobras envolve reprováveis e criminosas compras de refinarias no Exterior: a Nansei Sekyiu no Japão e a Pasadena, nos EUA. Ambas acarretaram prejuízos inumeráveis ao patrimônio nacional. Delas, já se esgotaram as denúncias que estão presentes em comissões de inquérito no Congresso; uma de mentirinha e outra que não sai do lugar por sabotagem orientada pelo PT-governo.
Um escândalo imenso se encontra em território nacional, as obras superfaturadas da Refinaria Abreu e Lima, uma maracutaia de Lula da Silva associado ao finado ditador venezuelano Hugo Chávez. Esta associação criminal revolta qualquer um que tenha conhecimento dos seus subterfúgios para esconder o sobre-preço e a roubalheira descomedida.
Os ponteiros do relógio marcam a hora do maior abalo na opinião pública: A revelação de um formidável esquema de propinas envolvendo ministro, governadores e parlamentares: a delação premiada de um pupilo de Lula da Silva, Paulo Roberto Costa, tratado carinhosamente pelo Pelegão de “Paulinho”.
Esta abominável situação enterra Petrobras com a cumplicidade do “Poste”, levando-nos à mitologia grega. A passagem que conta como Júpiter amassou um pouco de lama e amoldou um objeto à imagem de mulher. Minerva vestiu essa coisa com uma atraente túnica branca e ornamentos de sedução. Fez dela, na expressão de Hesíodo, possuidora da “arte da mentira e das palavras enganosas”, e batizou-a de Pandora.
Júpiter presenteou a mulher com um pequeno cofre, cujo conteúdo ela deveria ignorar e estaria proibida de abri-lo. Ensinou-lhe como encontrar Epimeteu, irmão do titã Prometeu que roubou o fogo dos deuses para dar aos homens. Pandora seria levada por Epimeteu até eles para dar início à Humanidade.
No caminho, por curiosidade, a mãe do gênero humano, descerrou a tampa da arca e, ao fazê-lo, todos os males se espalharam pelo mundo; fechou imediatamente o cofrinho, porém o mal estava feito: só restou na caixa a Esperança.
É a Esperança que sobra para nós, patriotas brasileiros, livrarmo-nos dos males soltos por Dilma Rousseff, a Pandora de Lula...

O fato novo - MERVAL PEREIRA


O GLOBO - 07/09

Não podia ter chegado em pior momento para a presidente Dilma a bomba sobre o esquema de corrupção de políticos montado na Petrobras durante 8 anos em governos petistas. A presidente esboçava uma reação para resistir à investida de Marina, e agora está novamente travada pelos fatos.

Marina tem no episódio a prova material de que a “velha política” transformou o Congresso em um balcão de negócios, mas a confirmação de suas denúncias veio junto com a inclusão do ex-governador Eduardo Campos na lista dos beneficiários das negociações do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa.

Esse é um empecilho e tanto para a exploração do caso, mesmo que esteja implícito que a candidata não tem nada a ver com os fatos acontecidos antes de ela, por constrangimentos políticos que lhe foram impostos, aderir ao PSB, inclusive o jato que veio junto, ao que tudo indica, nesse mesmo pacote.

Se fosse a candidata da Rede Sustentabilidade, Marina estaria hoje livre, leve e solta para empunhar a bandeira da nova política em contraponto às nebulosas transações que seus adversários comandam nos bastidores políticos de Brasília. Mas terá que pisar em ovos para usar a artilharia pesada que lhe caiu no colo sem que o fogo amigo a atinja.

Quem poderá se beneficiar da situação é o candidato do PSDB Aécio Neves, que precisava de um fato novo para turbinar sua campanha, e ele chegou pela delação premiada do ex-diretor da Petrobras. Não é possível dizer agora se mais essa denúncia de roubalheira institucional será suficiente para recolocá-lo na disputa, mas ele tem a vantagem no momento de poder atacar tanto Marina quanto Dilma, reforçando a ideia central de sua campanha de que ele é a mudança segura.

A presidente Dilma dificilmente perderá votos do núcleo duro petista, que vota nela mesmo de olhos e narizes fechados, e considera normais esses esquemas corruptos. Veremos agora de que tamanho é o apoio da candidata Marina Silva, e qual a intensidade da revolta de eleitores que estavam fora da eleição por vontade própria e retornaram devido à sua presença.

Aécio poderá tentar retomar eleitores que foram para Marina, que também receberá eleitores que voltaram para Dilma e poderão ficar sensíveis a mais esses escândalo. Tudo dependerá de como Marina usará esse episódio.

Quem é Marina de fato, desde a eleição de 2010, já estará convencido de que ela foi apanhada em uma armadilha montada pela “velha política” de que Eduardo Campos se utilizava antes de romper com o governo petista. E a perdoará por isso, entendendo que não tem condições de romper agora com o esquema político que a acolheu em momento difícil.

Ainda mais tendo como vice um político orgânico do PSB. Muitos que foram para ela em busca de um refúgio poderão se convencer de que Aécio Neves é a melhor oposição, e muitos outros podem desistir mais uma vez de votar, convencidos pelos fatos de que são todos farinha do mesmo saco.

O certo é que a presidente Dilma, que ensaiava uma reação levada pela máquina partidária e pelos militantes petistas, está novamente enredada em um esquema político deletério. Se é verdade que ensaiava retirar do fundo da gaveta a imagem da faxineira ética do início de seu governo para reforçar o combate à corrupção, agora vai ter que desistir da ideia.

Já era uma proposta desesperada, pois as contradições são evidentes entre a faxineira e a atual presidente que colocou de volta no ministério praticamente todos os que enxotara, e agora é inviável.

Também fica sem sentido a tentativa do presidente do PT Rui Falcão de insinuar que Marina pretende privatizar a Petrobras e os bancos públicos, uma acusação reciclada que por si só mostra a falta de argumentos do partido na disputa política com Marina.

O novo escândalo da Petrobras vai reviver a ideia de Aécio Neves de reestatizar a Petrobras, que foi tomada de assalto por forças políticas da base aliada governista, sob o comando do PT.

Como disse muito bem o presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves, aliás um dos acusados de estar envolvido no esquema de corrupção, “a Petrobras é petista”.

O 'verdadeiro' mensalão - JOÃO BOSCO RABELLO


O ESTADÃO - 07/09

A história política no Brasil não deixa dúvidas quanto aos danos eleitorais provocados por denúncias de corrupção, especialmente aquelas com elementos que lhes dotam de consistência, ainda que dependente de investigações mais aprofundadas.

Não só nas campanhas esse efeito se verifica. Atinge também governos já eleitos, com maior ou menor intensidade, durante ou após seus mandatos, como no impeachment de Fernando Collor e no mensalão, que enterrou o sonho de reeleição no primeiro turno acalentado pelo PT, para ficar nos exemplos recentes.

A campanha atual, já nos seus 30 dias finais, é alcançada pelas primeiras consequências de uma investigação sob condução judicial, que o governo tentou a todo custo, com êxito, sustar na instância parlamentar, obstruindo a CPI da Petrobrás.

As informações prestadas pelo ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa, sob o regime da delação premiada, tem potencial devastador e sua influência na eleição começa agora. O dano só poderá ser medido após conhecida a extensão de suas denúncias.

Pelo que já se sabe, o que Costa narra aos seus inquiridores é que a operação montada dentro da Petrobrás reproduz o mecanismo do mensalão, em volume bem maior, com os mesmos partidos da base governista - PT, PP e PMDB -, que tiveram dirigentes condenados e presos.

Por isso, nos meios políticos , o esquema da Petrobrás é tratado como uma extensão do mensalão, por reproduzir meios, fins e personagens envolvidos em desvios de recursos públicos para financiamento de campanhas e também para enriquecimento pessoal.

O processo do mensalão foi conduzido pelo ex-ministro Joaquim Barbosa com base em valores amplamente comprovados, o que reduziu significativamente o montante real desviado. Foi uma opção por trabalhar judicialmente com o que efetivamente se tinha e não com aquilo que se sabia, mas que demandaria mais tempo para materializar.

Por essa razão, o que desponta das investigações na Petrobrás, tem dimensão muito maior que o escândalo de compra de apoio parlamentar. Já vinha sendo chamado de "o verdadeiro mensalão" nos ambientes políticos da capital.

É bastante provável que o temido depoimento de Costa, finalmente iniciado, atinja em cheio a candidatura governista, ampliando o apoio à candidata do PSB, Marina Silva.

A menos que a menção do ex-diretor a Eduardo Campos se desdobre em revelações graves sobre o ex-governador, a partir da refinaria de Abreu e Lima.

A campanha, já influenciada pelo acidente aéreo de Campos, pode recomeçar pela segunda vez, para vertigem geral de partidos e candidatos.

CHARGE DO SINFRONIO

Esta charge do Sinfrônio foi feita originalmente para o

Gilmar Mendes: “O Distrito Federal não tem sequer dignidade para ter autonomia política”


A frase dura, pronunciada pelo ministro Gilmar Mendes, durante sessão do TSE que barrou o registro do candidato Arruda ao governo do DF, reflete a opinião média que prevalece em todo o país, com relação à emancipação política de Brasília, fixada de maneira ligeira e oportunista na Constituição de 1988. ...

Gilmar Mendes foi impiedoso e certeiro com relação à política do Distrito Federal. Durante a leitura de seu voto, o ministro classificou o tipo de política que vem sendo feita aqui de rastaquera, expressão que tanto pode ser usada como fuleira e baixa, como relativa a ostentação, própria dos novos ricos, no caso no DF.

E ao fazer uma reflexão, me veio a cabeça a entrevista concedida por José Roberto Arruda em 28/09/2010 no Correio Braziliense.  De pouca educação ou delicadeza, oportunista ou não, falando a verdade ou não, mentindo ou não, Arruda foi enfático “Eleger Roriz é mostrar que o crime compensa”. 

Naquela dia ao ler a entrevista, diante de um amigo, o clã da família, Joaquim Roriz chorou. O mesmo Roriz que hoje dá apoio a candidatura de Arruda. Sua filha Jaqueline Roriz nada falou. Arruda, em 2010 declarou apoio a Agnelo Queiroz. 

No governo de Arruda, não foram poucos os rorizistas que reclamaram que eram perseguidos e ameaçados. Segundo eles, Arruda queria destruir a todos. Se Arruda, naquela oportunidade, tinha razão, ninguém sabe. Hoje Arruda diz que é o único com condições de unir todos os grupos e juntou-se outra vez a família Roriz. Hoje ele, Arruda fala mal de Agnelo.

Na entrevista concedida ao jornalista Marcelo Tokarski, o ex-governador Arruda rompia o silêncio de quase um ano depois da Operação Caixa de Pandora, que o levou a prisão. 

Arruda afirmou em 2010 que votar em Weslian Roriz significaria dizer que o crime compensa, “é a vitória do coronelismo, a vitória das piores práticas políticas que o Brasil já assistiu. A vitória do clã Roriz significa dizer: o crime compensa..” Além disso, chamava Roriz de quadrilheiro, de atrasado, de incompetente, de destruidor de Brasília.

Para quem não sabe o ministro Gilmar Mendes, é umas das maiores autoridades em Direito Público de nosso país. Sabe tanto o que fala, que divide os seus conhecimentos por meio do IDP - Instituto de Direito Público, e  ao pronunciar a frase que sintetizou a política do DF, talvez nem se recordasse da entrevista concedida por Arruda, que transcrevemos abaixo, caso contrário, "rastaquera" teria soado como elogio aos podres poderes.
Entrevista abaixo.

Às vésperas de completar um ano do escândalo político que abalou o Distrito Federal, o ex-governador José Roberto Arruda, que ficou preso por dois meses e teve o mandato cassado pela Justiça Eleitoral, decidiu romper o silêncio. Ao justificar o fim da “reclusão”, como classifica seu isolamento, Arruda argumenta que não poderia se omitir diante do cenário eleitoral do DF. “Pensei muito antes de romper esse silêncio e essa reclusão a que me impus. Mas chegou um momento que eu cheguei à seguinte conclusão: Ou eu falo agora ou mais tarde poderei ser acusado do pior dos atos, que é a omissão”, afirmou.
Para o ex-governador, a eleição de Weslian Roriz (PSC) nada mais seria do que uma manobra para a volta de seu marido, Joaquim Roriz, ao poder. “Meu voto é contra o Roriz e tudo o que ele representa. Contra essa tentativa desesperada de indicar alguém da família para continuar no poder, contra esse nepotismo atrasado que tenta dissimular uma ambição sem limites”, afirmou. Na avaliação de Arruda, uma eventual vitória do clã Roriz nas urnas representaria a volta do coronelismo. “A eleição do Roriz é a eleição do Durval (Barbosa, ex-secretário de Relações Institucionais e pivô do escândalo), é a eleição do (Édson) Sombra (jornalista envolvido na suposta tentativa de suborno que levou o Superior Tribunal de Justiça a decretar a prisão de Arruda), é a vitória do coronelismo, a vitória das piores práticas políticas a que o Brasil já assistiu. A vitória do Roriz significa dizer o seguinte: o crime compensa”, afirmou.

Questionado se estaria defendendo o voto no petista Agnelo Queiroz — que tem como vice em sua chapa Tade Filippelli (PDMB), ex-aliado de Roriz e do próprio Arruda —, o ex-governador preferiu contemporizar. “Acho que o Agnelo está longe de ser o candidato dos meus sonhos. Mas a eleição é plebiscitária. Depois de toda a tristeza que se abateu sobre a cidade, e eu sou em grande parte responsável por isso, depois de toda a frustração, eu não tenho o direito de induzir ou pedir voto para ninguém, mas eu tenho a obrigação moral de dizer o meu: eu voto contra o Roriz.”

Durante uma hora e meia em que recebeu o Correio em sua casa, onde diz só sair a cada 15 dias para ir ao médico ou resolver alguma questão pessoal, Arruda relembrou, sempre ao lado da mulher, Flávia, os dias na prisão, se disse vítima de um complô executado pelo ex-secretário de Relações Institucionais — mas “arquitetado” por Joaquim Roriz — e afirmou estar retomando aos poucos sua vida, mas longe da política. “Quero voltar a ser engenheiro. Estou me preparando para isso, devagar, me reciclando. Tenho 56 anos. Quero viver de maneira mais simples, mais tranquila, longe do poder.” Leia a seguir os principais trechos da entrevista concedida com exclusividade ao Correio.
“A eleição da mulher do Roriz é a eleição do Durval”

O que mudou na sua vida? Como o senhor viveu nos últimos meses?
É a primeira vez que eu falo, depois de 60 dias preso e cinco meses e tanto em casa. Estou rompendo o silêncio. O que eu estou passando é a terapia da dor, do sofrimento. Eu não desejo para ninguém, mesmo para os meus algozes, ter que passar pelo que eu, a Flávia e a minha família temos passado. Em primeiro lugar, fiquei 60 dias preso num cubículo menor do que essa mesa em que estamos, sem janela, sem banheiro. Eu, para usar o vaso sanitário, era escoltado por dois guardas fortemente armados e não podia sequer fechar a porta do box. Sofri todas as humilhações, todas as pressões psicológicas que um ser humano pode sofrer. Comecei a sentir dores no coração e picos de pressão muito fortes, e só 12 dias depois é que foi permitida a presença de um cardiologista. E aí eu fui submetido a um cateterismo. Depois repousei na UTI até as 5h da manhã e fui levado de volta ao cárcere. Nos cinco dias seguintes sequer conseguia levantar da cama. Como tinha uma cama-beliche, e como a luz não apagava nem de noite, a maneira que eu tinha de dormir, poucas horas por noite, era colocando um cobertor na parte de cima da beliche para tentar tampar pelo menos a incidência direta da luz. E mesmo com medicamentos era muito difícil eu dormir. Eu tinha apenas 15, 20 minutos por dia de oxigênio, quando a Flávia me levava o almoço. Era o tempo que ela podia estar comigo. E é o único contato que eu tinha com o mundo externo. Era proibido de ler jornal, de ver televisão, de qualquer comunicação com o meio externo.

E como foi quando saiu da prisão?

Depois que eu voltei para casa, tanto eu quanto a Flávia, e a nossa família, que me deu muito apoio, e os poucos amigos, poucos e verdadeiros amigos que restaram, eu me impus a uma reclusão. Então, há mais de cinco meses que eu praticamente não saio de casa, com raríssimas exceções, para ir ao médico, resolver algum assunto, mas passo 10, 15 dias sem sair de casa. E tudo isso faz parte da terapia do sofrimento. Acho que a dor ensina mais do que a alegria, a derrota ensina mais do que a vitória.

O que aprendeu com tudo isso?

Em primeiro lugar, estou num processo de aprimoramento humano, de dar mais valor às questões espirituais. Para mim, a política, a vida profissional, a ambição, a vaidade, tudo isso era minha prioridade. Hoje, minha prioridade é minha família, minha vida pessoal, a saúde. Estou aprendendo a conviver com o abandono, com a ingratidão, com a traição, sem raiva, sem mágoa, sem julgar ninguém. De cada 100 amigos que eu imaginei que tinha, um apareceu para me dar um abraço. Não fico contando os outros 99. Fico apenas relacionando aqueles poucos e verdadeiros que estão presentes num momento tão difícil. E também não fico julgando aqueles que não vieram — uns por medo, outros por covardia, outros por oportunismo. Cada um tem suas razões. Não julgo ninguém. Eu, que era tão cartesiano, materialista, hoje sou uma pessoa muito mais próxima de Deus. Vou fazer uma figura de imagem que talvez não seja de bom gosto, mas é a que melhor representa o que eu sinto: Deus está me dando o privilégio de assistir ao meu próprio velório. E aí eu vejo quem apareceu, quem chorou de verdade, quem gosta de mim, quem foi apenas para cumprir uma missão social, os que foram com ironia, os que não apareceram, os que fingiram que não me conheciam. Mas o mais interessante é que Deus está me dando ainda outro privilégio. Terminando o velório, ele está dizendo: ‘Agora você levanta e pode continuar vivendo um pouquinho mais’. São raras as pessoas que conseguem ter alegrias tão grandes quanto eu tive e tristezas tão profundas. É um grande aprendizado.

Estamos a poucos dias da eleição. Como o senhor avalia a candidatura de Weslian, mulher de Roriz?

Em primeiro lugar, quero dizer que pensei muito antes de romper essa reclusão a que me impus. Há quase nove meses me impus a esse silêncio. Mas chegou um momento, face à questão política e às questões jurídicas envolvidas, que cheguei à conclusão: ou falo agora ou me calo para sempre. Ou falo agora ou mais tarde poderei ser acusado do pior dos atos, a omissão. O que eu penso, e aí não vai nenhum sentimento de vingança, de ódio, com todo o respeito por todas as pessoas, inclusive pelo Roriz, eu acho que a eleição da mulher dele é a eleição do Durval, é a eleição do Sombra, é a vitória do coronelismo, a vitória das piores práticas políticas que o Brasil já assistiu. A vitória do clã Roriz significa dizer: o crime compensa.

Qual foi o seu grande erro?
O grande erro do meu governo foi ter permitido que não apenas o Durval, mas alguns outros rorizistas, que vinham no poder há 20 anos, de forma oportunista, quando viram que eu ia ganhar, quando viram que a derrota da Abadia era inevitável, pularem para o meu barco na última hora, e eu, generosamente, ingenuamente, os mantive depois no governo. Para você ter uma ideia, os mesmos deputados distritais que quando eu ganhei a eleição me fizeram pressão para eu deixar o Durval no governo, porque eu não queria deixá-lo — embora ele tivesse me ajudado na campanha —, fizeram pressão e eu acabei cedendo. E aí cometi um erro. Mesmo tendo deixado ele num cargo assim meio honorífico, sem gestão financeira, a verdade é que eu deixei ele no meu governo. Vendo hoje o filme, eu tinha que ter cortado o mal pela raíz.

Essa pressão dos distritais incluiu cobrança de mensalão?

Hoje fica claro por que tantos deputados gostavam dele (Durval). Parece evidente que houve mensalão em Brasília, mas foi o mensalão do Roriz, e não meu. As imagens (dos vídeos) são todas anteriores ao meu governo.

Esses rorizistas que o senhor deixou no governo já tinham a intenção de miná-lo depois?
Você acha que é por acaso que, na única vez em que eu fui ao gabinete desse Durval, em 2005, a única vez em que eu o visitei, fiquei lá (no gabinete da Codeplan) 20 e poucos minutos, será que é coincidência o Roriz ter me ligado? Exatamente naquela hora? E eu pergunto: por que cortaram isso da fita? Graças a Deus, agora, um ano depois, é a Polícia Federal, é a perícia oficial que vem confirmar o que dissemos antes, que as fitas foram editadas, manipuladas para enganar a opinião pública. Fitas de 2003, 2004, 2005 e 2006, quando o governador era o Roriz, foram apresentadas de maneira violenta na mídia como se tivessem sido no meu governo. Será que era eu que tinha que ter sido preso? O Durval responde a 32 processos por corrupção, todos, eu repito, todos, sem exceção, corrupção praticada no governo Roriz, quando ele era presidente da Codeplan. O que eu tenho com isso? Ele não responde a nenhum processo no meu governo. Até porque, embora eu tenha cometido o erro de ter deixado uma figura com esse tipo de formação, de deformação de caráter, eu não posso esquecer que ele (Durval) tem um irmão deputado (Milton Barbosa), aliás candidato à reeleição com uma campanha caríssima. Eu cedi a essas pressões, esse foi o meu grande erro. E ele ficou no governo, sorrateiro, bajulador, até o momento de dar o golpe. Foi na verdade uma armação bem arquitetada. Há uma frase interessante, que é bíblica, que os filhos das trevas são mais perspicazes que os filhos da luz. Então, essas pessoas que se dedicaram a arquitetar o mal o fizeram com tal competência que convenceram a sociedade, através da mídia, com aquele bombardeio de imagens agressivas, que toda aquela corrupção que se passou no governo Roriz na verdade teria sido no meu governo. Porque não aparecia a data (nos vídeos).

Mas por que essa “armação”? Por quem ela foi arquitetada?

Vínhamos num projeto de governo com ampla aprovação, tínhamos duas mil obras em execução, tínhamos tirado as vans irregulares da cidade, tirado os camelôs, acabado com as invasões. Eu fazia um governo de ruptura, colocava ordem na cidade. E quando tudo isso estava indo tão bem, quando Brasília estava garantindo o privilégio de fazer a abertura da Copa de 2014, quando tinha 200 escolas de educação integral, as vilas olímpicas aí, o maior conjunto de obras no sistema viário desde a construção da cidade, quando tudo isso estava dando certo, vem essa armação dos interesses contrariados. O Roriz é um grande líder dos interesses contrariados. O Roriz reúne hoje todos aqueles que invadiam terras, que operavam o transporte irregular, que faziam o comércio irregular, que desejam aumentar a área de Brasília para fazer mais loteamentos, para acabar mais com a qualidade de vida. Ele reúne todos esses interesses que o meu governo contrariou.

O Roriz diz que o suposto esquema operado pelo Durval pode ter começado no governo dele, mas que ele não sabia. É possível?

Quem sou eu para julgar os outros? O que eu tenho absoluta certeza, e parece que sobre isso não paira dúvida na cidade, é que Durval e Sombra são braços armados do Roriz. Vão lá, armem uma arapuca para tirar esse Arruda da minha frente. Será que se eu fosse candidato à reeleição o quadro político era esse? Ele sabia que não.

Por que então manter o Durval no seu governo?
A pressão política que eu aceitei foi manter o Durval num cargo sem gestão financeira. Ele não responde a nenhum processo por ato que praticou no meu governo, porque no meu governo ele não praticou ato nenhum. No meu governo ele era aspone mesmo, é isso. Toda vez que eu precisava do voto do irmão dele eu pedia para ele. Agora, ninguém me pediu para manter esquema de corrupção porque não tiveram coragem de fazê-lo.

Mas então ele manteve à revelia algum esquema de corrupção?

Acho que o Durval manteve, residualmente, algum poder. Primeiro, pelo dinheiro que acumulou nos oito anos do governo Roriz. Segundo, pelos grandes empresários que ele representava. Você acha que ele estava sozinho? Imagine uma empresa que faturava R$ 100 milhões por ano e que no meu governo passou a faturar zero. Eu estou dizendo uma coisa que naquele momento da comoção ninguém conseguia ver. Há uma coisa interessante: a ligação do Durval e do Roriz é muito mais antiga. Foi o Durval quem fez o vídeo da Estrutural que derrotou o Cristovam (Buarque) em 1998. Ele era o (delegado) titular da 3ª DP do Cruzeiro, foi ele que filmou o que se intitulou depois de “massacre da Estrutural”, que, exibido no programa eleitoral, foi responsável pela derrota do Cristovam. Em 2002, o Durval foi o braço armado do Roriz para mais uma vez derrotar o (Geraldo) Magela com as urnas da Linknet, ou nós já esquecemos disso? Quem armou a farsa das urnas da Linknet? Doutor Durval. Em 2006, quando eles viram que não conseguiam ganhar com a Abadia, vêm para o meu lado de maneira oportunista e preparam o golpe para me derrubar em seguida para asfaltar a volta do Roriz. Quer dizer, estas pessoas que se reúnem em torno do Roriz, não é a primeira vez em que eles atacam alguém, não sou a primeira vítima.

Mas e a prisão do senhor?
Foi a armação mais clara possível. Eles viram que, apesar de toda a delação que tinham feito, não estavam conseguindo me derrubar, e eu continuava bem avaliado pela sociedade, que no mínimo desejava que eu terminasse o meu governo, que eu concluísse as obras. Quando eles viram que estavam perdendo, inventaram então o segundo golpe. Chega a ser ridículo: duas pessoas que compartilhavam o mesmo escritório, que trabalhavam juntas. Um era o diretor comercial e outra era o presidente do mesmo jornal, aliás, um veículo de informação pouquíssimo conhecido, mas sempre muito bem aquinhoado com verbas públicas. Essas duas pessoas, que trabalhavam no mesmo escritório, resolvem um entregar proprina para o outro, e em vez de fazê-lo no escritório que ambos frequentavam, ou de fazer na casa de um deles, que ambos frequentavam — como está fartamente documentado em vídeos feitos por ele (Sombra) mesmo —, eles resolvem se encontrar numa lanchonete no Sudoeste. Foi um falso flagrante que me levou à prisão. E, tendo me levado à prisão, me calaram a boca. E enquanto eu estava amordaçado, os mesmos que haviam me pedido a nomeação do Rogério Rosso para o lugar do Durval na Codeplan, os mesmos que elegeram o Rosso como preposto do Durval e do Roriz, me agrediam no Legislativo. Fácil, né, chutar cachorro morto? Todo este plano diabólico deu certo. Vamos reconhecer a competência deles. São pessoas capazes, acostumadas a trafegar nos subterrâneos da política. E que portanto, lá, são imbatíveis.

Como o senhor avalia o fato de Roriz ter renunciado e colocado a mulher no lugar?

Como é triste ver pessoas que sempre tiveram o meu respeito naquela imagem melancólica, fraudulenta, tão bem traduzida pela filha do casal: “Meu pai indicou minha mãe”. É a oligarquia consciente, o contrabando da candidatura, o abuso da confiança dos cidadãos, o desrespeito à Justiça. Mas, vindo do Roriz, nada mais assusta, pela sua capacidade infinita de trapacear, de jogar sujo.

E ela pode ganhar nas urnas?

Claro. Na política, com as atuais regras, o poder econômico, o jogo sujo é ferramenta da maior utilidade no processo eleitoral. Não é à toa que o coronelismo sobrevive em vários estados e até na capital do país. Não vai aqui no meu coração nenhum sentimento de vingança, de ódio, nada pessoal. Eu estou apenas cumprindo uma responsabilidade que tenho, uma responsabilidade pública, como ex-governador. O que está em jogo são dois projetos diferentes para Brasília. Um projeto que eu liderava, que era um projeto de mudança, de ruptura. Demiti 15 mil servidores sem concurso. Vocês se lembram dos camelódromos no Setor Comercial? Se lembram dos esqueletos que implodi, das 5 mil vans que tirei das ruas? Vocês sabem que o meu governo foi o único na história de Brasília que nunca deu aumento na passagem de ônibus, e ainda assim eu obriguei os empresários a comprar 1.950 ônibus novos? O meu governo terminou a obra do metrô de Ceilândia, parada há 13 anos. O meu governo fez mil salas de aula, 200 escolas integrais. Este governo de ruptura, que proibia as invasões, que prendeu grileiros, regularizava os condomínios, colocava ordem na cidade. E com isso eu contrariei objetivamente os interesses daqueles que querem a bagunça, e que são liderados pelo Roriz. O Roriz está aí em campanha, e ele não esconde de ninguém. Ele é a favor das vans, do comércio irregular, nunca coibiu as invasões de terra, as construções irregulares, e é por isso que Brasília vem se tornando essa bagunça. Eu dei uma freada de arrumação e, quando tudo isso estava sendo feito, alguém nos derruba. São projetos diferentes. O que está em jogo não é nada pessoal. O que está em jogo é o seguinte: Brasília quer voltar ao passado da bagunça e da desordem ou quer insistir na organização da cidade?

O Agnelo leva essa bandeira?
O Agnelo está longe de ser o candidato dos meus sonhos. Mas a eleição é plebiscitária. Depois de toda a tristeza que se abateu sobre a cidade, e eu sou em grande parte responsável por isso, não tenho o direito de induzir ou pedir voto para ninguém, mas tenho a obrigação moral de dizer o meu: eu voto contra Roriz.

A delação de Durval começou em setembro de 2009, época em que havia o movimento para tirar Roriz do PMDB. Foi a gota d’água?
Não tenho dúvida de que a saída dele do PMDB foi a gota d’água, até as datas coincidem. Ele saiu do PMDB em 16 de setembro e a delação foi feita no dia 19. E um dia antes o TJDFT tinha aceitado uma denúncia contra o Durval.

Não fosse a saída de Roriz do PMDB o senhor acha que eles teriam levado adiante esse plano a que o senhor se refere?
É difícil saber, porque eu não sei pensar com a cabeça deles. Eu estou dizendo o que eu penso do Roriz abertamente. Ele nunca diz, ele usa os braços armados para me atacar. O Roriz nunca teve coragem de me enfrentar diretamente. Em 1994, eu tinha sido secretário de Obras do governo dele, ele não me queria candidato a senador. Escolheu a Márcia Kubitschek e o Pedro Teixeira. Eu tive que bater voto na convenção para ganhar a disputa e depois ser candidato ao Senado. Em 1998, disputei a eleição contra ele, que nunca compareceu a um debate onde eu estava, nunca teve coragem de debater comigo. Em 2002, ele apoiou fortemente outros candidatos para tentar ver se eu não seria eleito deputado federal e eu fui o mais votado. Em 2006, ele também se acovardou. Quando viu que eu estava com a candidatura mais forte do que a da Abadia, se afastou dela. Ele nunca me enfrenta diretamente, ele escala esses seus braços armados para fazer um tipo de jogo sujo que não tem coragem de fazer.

Dizem que o senhor teria muita coisa contra Roriz e que implodiria a candidatura do grupo ligado a ele. É verdade?
Primeiro, não tenho. Segundo, todas as vezes em que tentaram me oferecer, eu rechacei. Não tenho vídeo, não faço gravação de ninguém, acho isso hediondo, uma prática terrivelmente suja. Não tenho absolutamente nada, nenhum tipo de arma, nem contra o Roriz nem contra ninguém. A minha diferença com o Roriz não é apenas na forma de governar. Eu tentei fazer um governo de ruptura, que organizava a cidade. O Roriz tem uma visão diferente: é o governo da desorganização, da bagunça, da invasão de terra, da ilegalidade. Essa é uma diferença. Mas as nossas diferenças não param aí, as nossas diferenças também são na maneira de fazer política. O Roriz usa todas as armas, acha que os fins justificam os meios. Se há um obstáculo intransponível, destrói-se o obstáculo. Ele só decidiu me destruir quando descobriu que, fora do PMDB e com o nível de aprovação que eu estava, teria dificuldades para voltar ao poder.

Em depoimento ao Ministério Público Federal, o senhor falou que foi achacado pela promotora Deborah Guerner. E depois o próprio Durval confirmou que entregou dinheiro a Deborah a mando de Roriz. Essas pressões vinham também do MP do DF?
Vinham. E nunca passou pela minha cabeça que esses 20 anos de desmandos que o Roriz comandou em Brasília tivessem criado raízes nos outros poderes. As coisas que eu encontrava erradas no governo eu tomava a medida que me cabia, que era enviá-las ao MP. E lá elas paravam, sei lá por que. Só no fim soube-se a razão. Então, infelizmente, e a constatação não é minha, é deles próprios: se o Durval confessa que entregava dinheiro a uma procuradora a mando do Roriz, e se ela própria me diz que recebia esses recursos, em função disso três anos depois da renúncia do Roriz no Senado ele não havia sequer sido processado. Então o assunto é muito mais grave do que se imagina. Sinceramente, nunca passou pela minha cabeça que esses tentáculos do poder de corrupção do Roriz tivessem penetrado tanto em outras esferas. Infelizmente, tenho que reconhecer que isso ocorreu.

Mas Durval agia sozinho?
Seria ingenuidade da minha parte, a essa altura da vida, dizer que o Durval estava sozinho nisso. Ele é apenas um bem mandado de um esquema muito maior, liderado pelo Roriz, que tem braços no poder econômico. E que desejam que as facilidades voltem. Eu acabei com elas. É verdade que eu errei ao aceitar pressões. Agora, o Durval tem um irmão que é deputado, tinha voto. E tinha outros deputados que eram muito gratos a ele, hoje se sabe até porque. Tive que aceitar isso, mas confesso que aí cometi um erro. E não por falta de aviso de que deveria tirá-lo do governo.

Logo no início?
Antes de tomar posse. E eu, depois das pressões políticas, tomei uma medida que julguei muito salomônica: deixo ele num cargo no governo, mas tiro dele o poder de presidir a Codeplan. Só que minha ingenuidade foi grande. O mesmo grupo que apoiava o Durval me traz alguns nomes para eu analisar para a Codeplan. O primeiro era do atual governador, que tinha recebido 54 mil votos (como candidato a deputado) no PMDB, um homem muito educado, bem preparado, e eu aceitei. E o que os fatos hoje demonstram? Que ele foi para a Codeplan como preposto do Durval. Hoje ele é um governador que, por melhores que sejam suas intenções, tem uma limitação, é refém do Durval. Não é segredo para ninguém das ligações das pessoas mais próximas ao Rogério Rosso hoje que despacham com o Durval, que obedecem as suas ordens. Brasília pode até não saber, mas o governador de fato hoje é o Durval. E eleger o Roriz é outra vez eleger o Durval, o Sombra e esse grupo de pessoas que tanto mal tem feito a Brasília. E agora tudo isso se confirma, quando o Rosso vem apoiar a mulher do Roriz.

O senhor teve seu julgamento político. Como lida com a Justiça?
Num primeiro momento, com o bombardeio de vídeos, com o tamanho do escândalo que se montou, eu entendo as decisões que foram tomadas, tanto no âmbito do Ministério Público quanto no Poder Judiciário. Mas a gente não pode subestimar nem o MP e nem a Justiça. O aprofundamento das investigações está levando, naturalmente, a outros caminhos. E cada vez mais essa armação está ficando clara. É a Polícia Federal que, um ano depois do episódio, dá a público a primeira perícia. E qual o resultado? Que a fita foi cortada, editada criminosamente para proteger alguém. Os meus advogados me pedem que não entre no detalhe dessas questões, mas o que eu posso dizer é que hoje já existem provas contundentes da edição, do corte. Vocês sabem que o dinheiro na meia, o dinheiro na bolsa, o dinheiro sei lá mais aonde aconteceu no governo do Roriz, e não no meu. E mais: se eu tivesse cedido às chantagens do Durval, ele teria me denunciado? Ele estaria feliz da vida comigo. Ele buscou montar essa denúncia no momento em que seus interesses foram contrariados. E não apenas o interesse dele, o interesse dele era contrariado no mesmo momento em que o interesse político do grupo que o Roriz representa era contrariado, que interesses econômicos poderosos eram contrariados. Infelizmente, eu tenho que constatar que todos esses interesses econômicos estão aí com as suas candidaturas para domingo que vem. O irmão do dono de Linknet é candidato, o irmão do Durval é candidato. São dezenas de candidatos com chances grandes de eleição que representam interesses econômicos claros, contratuais com o GDF. Grande parte do nosso poder político busca eleição para defender interesses econômicos e contratuais diretos com o GDF.

O senhor fala de atuais deputados que são candidatos…
Atuais… (Falo) de personagens da política local. Os grupos econômicos de Brasília começam pequenininhos, vão crescendo e, na hora em que querem dar um pulo para ficar enormes, elegem um deputado. Para defender o quê? Os seus interesses. Essa mistura da vida política com os contratos do GDF é explosiva, muito ruim para a vida da cidade. Procurei combater, com muitas dificuldades. Hoje eu entendo por que demorei mais de dois anos para fazer a concorrência do lixo. E por que todo edital que eu mandava para o MP não servia.

Além de Deborah, que o senhor já citou, o Leonardo Bandarra, ex-procurador-geral do MP do DF, tinha participação nesse esquema?
Não julgo ninguém. A única coisa que eu constato é que forças internas do MP atuavam no sentido de que eu não conseguisse fazer a licitação do lixo, porque, quando consegui, o preço diminuiu 17%. Portanto, alguém era beneficiado antes, enquanto os contratos eram emergenciais. Forças internas no MP pegaram o processo da bezerra de ouro e colocaram na gaveta por três anos. Forças internas não analisaram a auditoria de Corumbá IV, que é o megawatt/hora mais caro da história do Brasil. Tudo isso está lá no Ministério Público local, devo dizer. Então, alguma coisa acontecia. Como e por que eu não sei responder. Quanto ao Bandarra, ele foi um dos que me avisou que eu deveria tirar o Durval e sempre se houve comigo com toda a correção.

O senhor fez delação premiada com o MP Federal?
Não existe essa possibilidade. Só faz delação quem é criminoso, quem tem culpa. Eu não tenho. Não faço nada escondido de ninguém. Tudo o que tenho que falar eu estou falando aqui, com gravador ligado, pode ser publicado no jornal. Agora, o que eu sinto, nos poucos depoimentos que tive, no âmbito do Ministério Público Federal e no próprio Poder Judiciário, é que há um desejo muito claro de esclarecer a situação como um todo, fora daquele clima de comoção dos dias do escândalo.

E daqui para a frente?
Só consigo ver nesse momento o curto prazo. Nossas prioridades aqui em casa são: primeiro, retomar a minha saúde. Hoje eu tenho um artéria entupida, estou com uma carga de medicamentos muito grande, estou voltando a fazer meus exercícios físicos de maneira ainda muito lenta. Enfim, a primeira prioridade é recuperar a saúde. A segunda é recuperar a cabeça. E o que envolve essas duas prioridades é a vida familiar. A minha prioridade é ser feliz com a minha mulher, a minha filha. Isso é muito mais importante do que vida pública, do que qualquer outra coisa. Eu cumpro aqui esse meu dever de dizer as coisas que penso com muito respeito às opiniões divergentes, mas louco para virar essa página e voltar para a minha reclusão, porque, com essas regras, não volto para a política. A política hoje não exerce sobre mim nenhum fascínio.

E o poder?
O poder… Eu experimentei os dois lados do poder. Graças a Deus, quando fui governador, não mudei para a casa oficial, continuei dirigindo meu carro nos fins de semana, poucas vezes usava gravata. Não tirei os pés do chão. Sob esse aspecto, o baque não é grande. Agora, o lado negativo do poder dói muito. O lado do abandono, da ingratidão… Há dois tipos de sofrimento. Um é o pessoal, nosso. Nós dois aqui (referindo-se a ele e a mulher, Flávia) somos pessoas comuns. Há um ano a gente não vai a um restaurante, a um cinema. Sabe por quê? A gente tem vergonha na cara. Nós nos impusemos essa reclusão, em respeito a tudo o que aconteceu. Eu não saio de casa, recebo pouquíssimas pessoas, não interferi no processo político, fiquei quieto. Sofri todas as traições e os abandonos, as ingratidões que um homem público pode sofrer. O meu partido nacional, eu era o único governador, eu os ajudei sempre em tudo o que me pediram, e me abandonaram na primeira curva. Sofri todo tipo de execração pública, de humilhação. Mas esse é o meu, o nosso sofrimento pessoal. Mas ele é muito pequeno, e menos importante, do que o sofrimento da cidade. Nas poucas vezes que saio dirigindo o meu carro… Eu vou confessar uma coisa: me dá um nó na garganta. Eu às vezes choro de tristeza, porque é duro ver obras paradas. É muito duro ver obras concluídas sem terminar. Aquelas marginais que eu fiz ali perto do zoológico, não conseguiram fazer uma graminha no canteiro central nem postes de iluminação. Há pistas de 8km duplicadas que falta uma ponte de 10 metros e eles não conseguem fazer. A Linha Verde era para ter inaugurado em junho e está aí até hoje, enrolando. As vilas olímpicas estão prontas e com cadeado no portão. À exceção da de Samambaia, que eu tive tempo de inaugurar. As crianças podiam estar fazendo esportes, nadando, fugindo das drogas. Me dói muito ver as invasões de terra voltarem, nas nossas barbas. As vans piratas na rua. Os camelôs voltando para o centro da Ceilândia, para o Conic. Isso me dói. Era um projeto de cidade que estava sendo construído e aprovado e que está sendo destruído. Essa é uma dor muito profunda. Mas volto a dizer: não acredito em crime perfeito.

O senhor sofreu algum tipo de hostilidade na rua?
Não, graças a Deus, não.

E manifestações positivas?
Muitas. Mas eu também tenho tido, nós dois temos tido, muito respeito pela opinião pública. Uma pessoa que passa o que eu passei não pode ficar se exibindo. Eu me impus a uma reclusão. Eu raramente vou a algum lugar. Esses dias eu fui a um enterro de um amigo querido e falaram mal do morto… Então é melhor não ir a lugar nenhum. Estou aprendendo a ter paciência, tranquilidade. Tem uma frase de um personagem do Guimarães Rosa que diz assim: “a esperteza quando é muito vira bicho e come o dono”. Tem muito esperto pela cidade comemorando o crime perfeito antes da hora.

Essa primeira entrevista é o início de uma saída desse período de reclusão?
Não, eu volto para a reclusão. Porque eu acho que a reclusão a que nós nos impomos é respeitosa em relação às investigações. É saudável para nossa vida pessoal, nós precisamos voltar a ter paz. Eu tenho lido muito, escrito, pensado, conversado muito, e faço hoje uma constatação. Agora, em 15 de novembro, faço 35 anos como formado de engenheiro. Vai ter até uma festa lá na minha escola de engenharia em Itajubá (MG), que eu também não vou. Nesses 35 anos, a metade do tempo eu fui engenheiro. Na outra metade entrei na política. Fui muito mais feliz profissionalmente como engenheiro. E eu quero voltar a ser engenheiro. Estou me preparando para isso, devagar, me reciclando. A partir do ano que vem quero retomar minha vida de engenheiro. Tenho 56 anos, uma filha de 2 anos. Quero viver de maneira mais simples, mais tranquila, longe do poder.

Política nunca mais?
Com essas regras políticas que estão vigentes eu não mais serei candidato. Tem que mudar muita coisa: financiamento público de campanha, voto facultativo, voto distrital misto. Sem isso, é loucura. Não sou eu que estou deixando a política não. Pimenta da Veiga, um dos grandes políticos de Minas Gerais, não disputou mais eleição. Roberto Brant não quis mais disputar eleição. O ministro Nelson Jobim me disse uma vez que o exercício correto do mandato era impeditivo para uma nova eleição. Ser candidato com as atuais regras é quase uma roleta russa. Não há campanha política, em nenhum estado brasileiro e em nenhum partido, que seja imune a uma verificação séria das suas contas. Com as atuais regras, você pega alguma coisa errada ali ou alguma coisa errada aqui. Mas em todo lugar tem coisa errada. Basta ver a atual campanha em Brasília. É tudo claro, não vê quem não quer. É só sair contando as placas na cidade que você vê quanto custa. Já fui senador, deputado, governador, e eu tenho uma responsabilidade pública que independe do mandato. Por isso estou falando. Essa responsabilidade pública não me dá o direito de pedir voto para ninguém nem de induzir voto para ninguém, mas ela me dá a obrigação de dizer o que penso. Por isso o meu voto é contra tudo o que o Roriz representa. Não é nem contra ele ou sua mulher, mas contra tudo o que eles representam.

O senhor está escrevendo um livro?
Dizem que sim…


Para ministro de Dilma, 'não há quem controle corrupção'


Ao tratar do megaescândalo de corrupção na Petrobras, Gilberto Carvalho liga o caso ao financiamento privado de campanhas - cujo fim interessa ao PT

Gabriel Castro, de Brasília
O ministro Gilberto Carvalho: a culpa é do financiamento privado de campanhas
O ministro Gilberto Carvalho: a culpa é do financiamento privado de campanhas (Pedro Ladeira/Folhapress/VEJA)
O ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, admitiu neste domingo que o governo é incapaz de combater a corrupção - e continuará sendo, na avaliação dele, enquanto não houver uma reforma política que ponha fim ao financiamento empresarial de campanhas.
A afirmação foi dada após uma pergunta sobre a delação premiada de Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras. Conforme revelou VEJA nesta semana, ele citou os políticos beneficiados pelo esquema de corrupção na estatal em depoimento à Polícia Federal. Costa afirmou que políticos da base aliada à presidente Dilma e o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, que disputava a Presidência da República ao lado de Marina Silva, receberam dinheiro do esquema. O rol de citados pelo delator inclui três governadores, seis senadores, um ministro de Estado e pelo menos 25 deputados federais embolsaram ou tiraram proveito de parte do dinheiro roubado dos cofres da estatal. De acordo com depoimento de Paulo Roberto Costa, o esquema funcionou nos dois mandatos do ex-presidente Lula, mas também adentrou a atual gestão da presidente Dilma.
"Enquanto houver financiamento empresarial de campanha e as campanhas tornarem-se o momento de muita gente ganhar dinheiro e de se mobilizarem muitos recursos, eu quero dizer: não há quem controle a corrupção enquanto houver esse sistema eleitoral. Isso é com todos os partidos. Não há, infelizmente, nenhuma exceção", afirmou o ministro, após o desfile de 7 de Setembro, em Brasília. Não por acaso, o financiamento público de campanha é de grande interesse do PT. Com o fim do financiamento privado, a maior parte do dinheiro teria de sair dos cofres públicos. E a divisão seria feita de acordo com o tamanho das bancadas, o que favoreceria os maiores partidos. A presidente Dilma Rousseff chegou, inclusive, a colocar o tema na lista de perguntas de seu fracassado plebiscito em resposta às manifestações de junho do ano passado.
Gilberto Carvalho afirmou também que o Planalto vai aguardar as informações oficiais para decidir quais providências tomar diante do caso. "O governo não pode tomar conhecimento de uma denuncia que é, por enquanto, sem nenhuma comprovação", afirmou. O petista declarou ainda que, sem detalhes do que Costa contou à Polícia Federal, não há razões para crer que a campanha será afetada. "Eu não acredito que uma simples notícia com o alarde que ela ganha possa interferir no destino da eleição", disse ele. Carvalho também confirmou que, a partir de segunda-feira, vai tirar férias para se dedicar à campanha. Ele diz acreditar em uma vitória "dura" e "calejada" de Dilma.

Os candidatos que "farão pela saúde, pela educação e pelos idosos"


Promessas genéricas não acabam com as filas do SUS. De onde sairá o dinheiro para financiar os serviços com que os brasileiros sonham?

CRISTIANE SEGATTO
29/08/2014 16h18 - Atualizado em 29/08/2014 16h59

Poucos hits da internet traduzem tão bem o vazio de ideias e o deboche do horário eleitoral gratuito quanto o vídeo “Programa Político”, estrelado pelo ator Fábio Porchat, no canal Porta dos Fundos. É uma maravilha:

“Vote naquele que fará pela saúde, pela educação, pelos idosos”, diz o candidato. “Ah, pelos idosos...” E cai na gargalhada. Não vou contar o final para não estragar a surpresa, caso alguém ainda não conheça esse retrato perspicaz dos maus hábitos da nossa política.
 
Subestimar a inteligência do eleitor é uma prática disseminada. Não sei até quando ela vai funcionar. Mesmo com os imensos déficits de educação do Brasil, hoje qualquer pessoa com acesso à internet pode confrontar afirmações levianas e promessas sem pé nem cabeça com fatos e números. E quem tem disposição e habilidades suficientes para consultar as fontes corretas pode facilmente se transformar num multiplicador de conhecimento por meio das redes sociais. 
 
Sucessivas pesquisas demonstram que a saúde é a maior preocupação dos cidadãos. O que me intriga, eleição após eleição, é a falta de coragem dos candidatos de enfrentar as discussões duras e objetivas sobre o financiamento do sistema de saúde. Ele não vai melhorar enquanto os brasileiros continuarem caindo no conto das medidas emergenciais e eleitoreiras.
 
O SUS foi criado em 1988 com a melhor das intenções. Se funcionasse como o previsto na Constituição, seria um belíssimo instrumento de justiça social. Para ser justo e universal, para oferecer tudo (todo e qualquer tipo de tratamento) para toda a população (dos mais pobres aos mais ricos), o SUS precisa receber mais dinheiro. E, ainda assim, talvez não fosse possível oferecer todas as novas e caríssimas soluções criadas pela indústria farmacêutica. Nenhum país do mundo consegue fazer isso.

Os cerca de 9% do PIB que o Brasil aplica em saúde (somando-se os recursos públicos e privados) não sustentam o sistema imaginado em 1988. Como resolver a equação? Nesta eleição, ressurgiu a promessa de aplicar em saúde 10% do orçamento da União.
Isso é defendido por muitos especialistas desde os anos 80. É uma ideia justificável. O gasto público do país por habitante (US$ 474, segundo dados de 2010 reunidos pela OMS) é inferior ao gasto da Argentina (US$ 851), do Chile (US$ 562), da França US$ 3.075) e do Reino Unido (US$ 2.857).

Adoraria que o aumento do investimento em saúde pelo governo federal virasse realidade, mas é o tipo de promessa que tem grandes chances de ficar pelo caminho. Ela só poderia acontecer se houvesse um crescimento econômico espetacular – algo distante da realidade brasileira.
 
Os candidatos que fazem essa promessa precisam dizer com todas as letras como pretendem fazer isso. Vão aumentar impostos? Tirar dinheiro de outros ministérios? A discussão não deve ficar só no dinheiro. O que vão fazer para melhorar a gestão do SUS?
 
Há medidas impopulares no horizonte, como limitar o atendimento público a determinadas faixas de renda? Garantir o acesso a um determinado pacote de programas, tratamentos e drogas -- e só a eles? O que pretendem fazer para reduzir as ações judiciais de cidadãos que exigem todo e qualquer recurso de saúde – independentemente do preço e de estar ou não disponível no SUS?
 
Ninguém é capaz de assumir o ônus político de dizer que medidas impopulares podem ser necessárias para tornar o SUS verdadeiramente justo e universal. Sobra emoção e falta racionalidade quando se discute os rumos da saúde.

Se queremos um SUS melhor, precisamos nos armar de calculadoras. Fazer contas, mergulhar em planilhas, cobrar resultados e desprezar os políticos que só dizem generalidades.
 
São muitas as medidas necessárias para melhorar a assistência à saúde. Uma delas é garantir a correta distribuição dos recursos públicos entre as regiões. Um bom começo é investir na construção de um mapa das reais necessidades de cada região. Isso permitirá que o investimento seja feito de forma correta, na área que mais precisa dela.

Só com organização de alto nível é possível conter desperdício e transformar dinheiro em qualidade de vida. Em alguns estados do Nordeste, por exemplo, o número de mamógrafos disponíveis no SUS encontra-se acima do parâmetro adequado. Mesmo assim, a quantidade de mamografias realizadas está abaixo do esperado. Como isso é possível?

“Muitas mulheres faltam ao exame agendado porque não têm dinheiro para pagar o transporte”, diz o médico David Souza, professor de gestão em saúde do Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo.
 
Não há dúvida de que os recursos da saúde são escassos, mas a falta de racionalidade nos três níveis de gestão (governo federal, estados e municípios) produz desperdício sem melhorar a vida das pessoas. Racionalizar, segundo a definição de David Souza, significa o seguinte:
• Fazer um diagnóstico preciso das necessidades de saúde da população
• Construir protocolos de conduta que permitam oferecer o cuidado necessário prioritariamente a quem mais precisa dele
• Regular o acesso a serviços e tratamentos com base nesses protocolos
• Capacitar os profissionais das redes de saúde para que eles possam fazer uma boa gestão dos recursos disponíveis
• Monitorar regularmente a efetividade de todo o processo de regulação
 
Hospital do Subúrbio, em Salvador (BA) (Foto: Márcio Lima/ÉPOCA)
“Todo médico precisa saber que os recursos são limitados. Isso vale para qualquer sistema de saúde do mundo”, diz Souza. “O exame que ele pede para um paciente faltará a outro”. Por isso, é fundamental que a solicitação seja feita com base em critérios claros e objetivos.
Faremos, daremos, construiremos são os verbos mais usados pelos candidatos quando se referem à saúde. Quem for sincero o suficiente para assumir as mudanças impopulares e necessárias para reorganizar o SUS perde a eleição.
 
Enquanto os brasileiros não estiverem preparados para ouvir as verdades duras e valorizar os políticos que as defendem, o sistema de saúde vai continuar na mesma. Assim como a balela dos candidatos que “farão pela saúde, pela educação e pelos idosos”.
  
Que o voto consciente traga um futuro melhor e mais saudável. Com esse texto, me despeço e entro em férias. A coluna volta a ser publicada em outubro. Até lá e boa eleição para todos nós!
(Cristiane Segatto 

A estranha pouca indignação dos políticos denunciados por Paulo Roberto Costa e suas “relações institucionais” com o ex-diretor da Petobras


PRC: explosivo
PRC: explosivo
Além de negarem qualquer envolvimento com esquemas na Petrobras, os políticos denunciados por Paulo Roberto Costa têm um padrão comum de comportamento.
Quase todos garantem que mantinham com o homem-bomba “relações institucionais” – seja lá o que isso signifique para essa turma.
Ninguém mostrou indignação a ponto de bancar que processarão PRC por calúnia e difamação. Todos enfiaram suas respectivas violas no saco.
Por Lauro Jardim

O descaso do estado com o médico e o doente brasileiros


Medina é vocação. Enfrentar a tensão da responsabilidade pela vida do doente não é para qualquer um. Desde o juramento de Hipócrates que os médicos colocam, ao menos em tese, a vida do paciente acima de seus próprios interesses pessoais muitas vezes.
Muitos se formam na difícil faculdade sonhando com a prática, acreditando que farão diferença na vida de muita gente, podendo salvar aqueles que, sem seu auxílio, encontrariam certamente a morte. É uma profissão diferenciada, bela e valiosa.
Mas não é valorizada pelo estado. Muitos jovens mergulham no mercado de trabalho nos hospitais públicos cheios de expectativa, esperança, utopia. O tempo se encarrega de esfregar em suas caras a dura realidade de nosso sistema público abandonado e apodrecido.
Foi o caso com o carioca Marcio Maranhão, cirurgião torácico que ingressou na atividade medicinal repleto de sonhos, e foi sendo expelido ao longo dos anos pelo próprio sistema, por não lhe oferecer o mínimo de condição para trabalhar com dignidade.
Sua trajetória é relatada no livro Sob pressão: A rotina de guerra de um médico brasileiro, lançado este mês pela editora Foz. Mostra bem como é absurdo o quadro do Sistema Universal de Saúde (SUS) em nosso país.
É leitura que nos deixa indignados, como o próprio médico ficou a ponto de abandonar sua tão sonhada posição de médico do estado e ter de desabafar em depoimentos à jornalista Karla Monteiro. Seu livro é mais uma tentativa de ajudar os doentes brasileiros, dessa vez denunciando a incompetência e a má administração que levaram o sistema ao atual cenário de ruínas.
Imbuído de romantismo ao se formar, Marcio foi logo tendo que se deparar com a realidade trágica do Souza Aguiar, imerso no caos das filas infindáveis à espera de um leito ou tratamento. A rotina do médico era completamente surreal, mas não incomum para a profissão. Chegava a fazer 14 ou 15 plantões por mês, correndo entre três hospitais diferentes sem dormir.
Fosse “apenas” a correria, as noites não dormidas ou o queijo-quente como única refeição, tudo bem. Mas tudo isso era nada se comparado ao que ele tinha de enfrentar nos hospitais, em termos de precariedade das instalações e falta do básico para o exercício de suas funções.
Marcio descreve a verdadeira tragédia que o país vive na área de Saúde. “O Brasil faz política na saúde em oposição à política de saúde. Faz-se política de governo em vez de uma política de Estado”, diz. Sua experiência atesta o completo descaso do estado, das diferentes esferas de governo. Falta uma política integrada, planejamento, cobrança, responsabilidade, falta tudo!
Os médicos, em meio a esse caos, ficam enxugando gelo, correndo entre os corredores fétidos, lotados, tendo que improvisar o tempo todo, apelar às gambiarras, ao jeitinho, correr riscos de imprudência para tentar salvar a vida daquelas pessoas desesperadas, entre a vida e a morte. Tudo, absolutamente tudo na saúde pública era repulsivo para o jovem cirurgião.
O livro conta casos pitorescos, que seriam até engraçados com o devido afastamento, visto como em um filme de comédia pastelão. Mas estamos falando da vida dos brasileiros, morrendo por falta de atendimento, por falta do básico, de um dreno, de um fio para sutura, de sangue para transfusão. É muito sofrimento causado pela negligência estatal.
E como esses bravos médicos são recompensados por seu esforço homérico para tentar mitigar o caos do sistema? Em um dos hospitais públicos em que Marcio trabalhou por oito anos, realizando complexas cirurgias, seu salário líquido era de apenas R$ 1.372,67. No período todo, teve aumento de menos de R$ 100. Como cobrar desses médicos comprometimento e determinação?
A grande preocupação dos burocratas da medicina é com as horas semanais, que devem ser cumpridas. O importante é bater ponto. É tudo feito para se resguardar politicamente ou judicialmente, não para atender aos doentes. O doente não pertence a ninguém nessa loucura toda, não tem “dono”, responsável. O médico também costuma ficar solto no sistema, apenas cumprindo suas horas e muitas vezes se esquivando com base na justificativa – legítima – de que faltaram condições para uma cirurgia qualquer.
O SAMU foi uma das experiências mais bizarras do autor, que chegou a percorrer em um dia 250 quilômetros com um senhor à beira da morte em busca de um leito em hospital público. Enfrentar traficantes nas perigosas favelas cariocas sem um pingo de infraestrutura é realmente análogo ao que fazem os Médicos Sem Fronteiras em clima de guerras. O salário para um plantão de 24 horas no SAMU? R$ 500.
Falta um plano de carreira estatal para os médicos, que ficam largados nessa confusão toda, e depois acabam usados como bodes expiatórios pelos governantes para se isentarem de qualquer culpa pela caótica situação do SUS. Como ponta final entre o sistema e o paciente, é o médico que leva a culpa. A propaganda negativa ajuda a quebrar a confiança da sociedade na classe médica, o que é perigoso.
Não há solução fácil. Mas sem dúvida ela não passa pelo programa sensacionalista Mais Médicos, ou pelo discurso populista de que basta jogar mais recursos públicos no setor. Há muita corrupção, desvio, falta de accountability, falhas estruturais. Marcio Maranhão jogou a toalha. Não aguentou. Foi mais um soldado que abandonou a batalha após dedicar seu suor a uma luta perdida.
Ainda deposita esperança no SUS, um modelo igualitário e “socialista” de saúde. Alguns países desenvolvidos, é verdade, conseguem oferecer uma saúde pública de qualidade, ainda que a um custo elevado. Sou mais cético: a ideia de que caberá ao estado cuidar da saúde de todos de uma forma digna parece um tanto utópica, ao ignorar o mecanismo de incentivos inadequado.
Mas não resta dúvida de que o estado poderia, ao menos no básico, fornecer condições bem mais razoáveis para que esses médicos, funcionários de carreira do estado, pudessem tratar dos pacientes mais pobres e salvar milhares de vidas que hoje se perdem por total negligência.
Rodrigo Constantino