terça-feira, 12 de novembro de 2013

Ofícios revelam esforço de deputados para liberar verba de obras da Máfia do Asfalto

ESTADÃO

Congressistas mandavam cartas para ministérios das Cidades e do Turismo determinando onde o dinheiro deveria ser gasto

12 de novembro de 2013 | 0h 20

Seis deputados federais de São Paulo direcionaram ao menos R$ 5,9 milhões para obras tocadas por empresas acusadas de envolvimento na chamada Máfia do Asfalto. Documentos obtidos pelo Estado mostram o esforço dos congressistas para que os ministérios das Cidades e do Turismo liberassem dinheiro de emendas do Orçamento a municípios que, mais tarde, contratariam as empreiteiras Demop Participações e Scamatti & Seller Infraestrutura - em muitos casos, com dispensa de licitação.
A Procuradoria-Geral da República investiga o possível envolvimento de deputados com o esquema, que foi identificado em abril pela Operação Fratelli, da Polícia Federal. O inquérito que tem congressistas como alvo foi autorizado pelo Supremo Tribunal Federal com base na contabilidade das construtoras enviada pelo Ministério Público paulista, que já denunciou pelo menos 30 pessoas - entre empresários, lobistas e agentes públicos municipais.
Cinco dos seis deputados federais que se esforçaram para destinar as emendas a obras do interior paulista são citados em planilhas apreendidas pela Polícia Federal em posse de um contador do grupo acusado e do empreiteiro Olívio Scamatti, sócio das empresas e apontado como chefe do esquema suspeito de atuar em 78 municípios.
O documento secreto do empreiteiro sugere pagamentos mensais, entre 2011 e 2013, para políticos e servidores públicos. Para o Ministério Público paulista, as anotações sugerem um "indicativo de pagamento de propina". Boa parte das emendas foi proposta nesse mesmo período.
A maioria dos deputados que destinou as emendas a obras tocadas por empreiteiras investigadas negou qualquer irregularidade no procedimento. Um dos congressistas não respondeu aos pedidos de entrevista.
‘Guarda-chuva’. Para direcionar os recursos do Orçamento da União, os deputados apresentaram primeiro as chamadas emendas "guarda-chuva" - que especificam apenas o tipo de investimento a ser feito, sem dizer exatamente onde o dinheiro precisa ser gasto.
Depois, enviaram ofícios aos ministérios das Cidades ou Turismo pedindo que o dinheiro fosse liberado para os municípios, comandados por seus aliados políticos. As prefeituras, então, contrataram as empresas do grupo Scamatti.
Só o deputado Devanir Ribeiro (PT) pediu o repasse de pelo menos R$ 2,7 milhões para três cidades paulistas. Num dos ofícios, de 2011, direcionou R$ 2,4 milhões do orçamento do Turismo para pavimentar um anel viário no município de Adolfo. No ano seguinte, a prefeitura da cidade firmou contrato com a Demop por R$ 2,6 milhões.
O petista teria recebido R$ 45 mil em agosto e novembro de 2011, segundo as anotações na planilha apreendida pela Polícia Federal. Ele é citado em conversas dos irmãos Scamatti, nas quais tratam de valores.
Outro citado, Jefferson Campos (PSD) pediu às Cidades e ao Turismo o envio de mais R$ 2 milhões para obras tocadas pela Demop e a Scamatti & Seller em Ibirá, Oswaldo Cruz e Andradina. Com base na planilha, o Ministério Público vê "indício" de pagamento de propina a ele, no valor de R$ 97 mil, entre abril e maio do mesmo ano.
‘Amigo’. Também fizeram gestões nos dois ministérios Eleuses Paiva (PSD), padrinho de R$ 300 mil para Jales; e João Dado (SDD), que destinou R$ 573,3 mil para o mesmo município, Santa Albertina e Ouroeste. Os dois também são citados na planilha. "Senhor prefeito e amigo", oficiou Dado em fevereiro de 2010 ao prefeito Humberto Parini, de Jales, acrescentando que seu mandato seria "exercido e compartilhado em consonância com a profícua gestão" do administrador local. Cândido Vaccarezza (PT) pediu o envio de R$ 505 mil para Lavínia, Herculândia e Auriflama.
Já o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT), indicou R$ 150 mil para obras em Guzolândia. "Venho solicitar providências no sentido de destinar recursos da emenda de minha autoria para o município", escreveu ele ao Turismo, em 13 de abril de 2011. No ano seguinte, a Demop assinou contrato de R$ 130,9 mil com a prefeitura da cidade para recapear várias ruas e instalar sinalização turística. Segundo o documento, Chinaglia teria sido beneficiário de R$ 40 mil em 2011 e Vaccarezza, de R$ 355 mil entre 2011 e 2012.

Candidatos petistas dizem que houve compra de votos em eleição para presidente do partido

GERMANO OLIVEIRA - O GLOBO

  • Opositores a Rui Falcão, que deve ser reeleito, afirmam que mensalidades de 311 mil filiados foram pagas para que mais votos fossem contabilizados a favor da situação

O presidente do PT e candidato a reeleição Rui Falcão, ao chegar para votar em São Paulo Foto: MichelFilho / Agência O Globo
O presidente do PT e candidato a reeleição Rui Falcão, ao chegar para votar em São Paulo MichelFilho / Agência O Globo
SÃO PAULO - Enquanto o PT ainda conta os votos da eleição direta para a direção do partido em todas as instâncias, inclusive presidente nacional, candidatos a presidente já derrotados, pois o deputado estadual Rui Falcão (SP) deve se reeleger com 70% dos votos, denunciaram nesta segunda-feira que há suspeita de "compra" de votos para uma das maiores eleições internas do partido. Valter Pomar, da "Articulação de Esquerda", e Markus Sokol, da ultraesquerdista "O Trabalho", de formação Trotskista, disseram que "é fato" que no último dia da habilitação dos candidatos aptos a votar, foram pagas mensalidades atrasadas de 311 mil filiados, dos 806 mil em dia com os pagamentos para que pudessem votar no domingo. Essa regularização teria sido encarada como "compra" de votos, mas a assessoria do PT nacional nega corrupção no processo e diz que a regularização dos pagamentos inclui eleitores de todas as tendências, inclusive a dos candidatos da esquerda.

— O Processo de Eleição Direta (PED) é viciado. Durante a campanha eleitoral, pedimos o fim do PED. No último dia para a regularização dos habilitados a votar, foram quitadas as dívidas em boletos de 311 mil petistas votantes. É evidente que o processo beneficia quem tem mais recursos dentro do partido e que domina a maioria do partido - disse Sokol, se referindo às "forças majoritárias" dentro do partido.
Praticamente essa é a mesma reclamação de Valter Pomar.
— Um total de 806 mil petistas foram regularizados para votar no domingo. Desses, apenas 480 mil compareceram para votar (menos do que os 510 mil de 2009, a última eleição do PED). Isso significa que em torno de 300 mil tiveram a situação regularizada, com os pagamentos de boletos no último dia do processo, mas não compareceram para votar. Talvez nem soubessem que estavam em dia e que podiam votar - disse Valter Pomar, que pretende denunciar o caso ao Diretório Nacional do partido, que se reúne no próximo dia 18, em São Paulo.
Ele também atribui ao grupo de Rui Falcão o poderio dentro do partido.
— Eles arregimentaram um exército eleitoral de reserva, mas não foi preciso usar todo mundo - disse Pomar.
A direção do PT nacional, no entanto, disse que a quitação das mensalidades, ou a "regularização coletiva", é um instrumento do PED e que pode ser utilizada pelos diretórios municipais para a quitação de débitos.
— O sistema beneficia tanto os eleitores do Rui Falcão, quanto dos eleitores dos demais candidatos da esquerda que agora reclamam. Mas se houve alguma irregularidades, o diretório nacional tem uma comissão formada para dirimir todas as dúvidas e denúncias — disse a assessoria do diretório nacional do partido em Brasília.
Falcão deverá ser o coordenador da campanha da reeleição da presidente Dilma Rousseff. Até a tarde desta segunda-feira, foram apurados 28% dos votos em que todos os cinco candidatos da esquerda, incluindo Sokol (com 1,48%) e Pomar (com 6,62%) somavam 30% dos votos (os outros três candidatos à esquerda de Rui Falcão estão o deputado Paulo Teixeira (18,31%), Renato Simões (3,13% e Serge Goulart (0,65%). Falcão está com 69,81% dos 480 mil votos. A eleição deve terminar nesta terça-feira.

Cartas de Berlim: Uma vida sem catracas, por Albert Steinberger


As plataformas dos trens, bondes e metrô alemães são praticamente uma extensão da calçada. Nada divide o espaço de quem espera o transporte do local onde passam os transeuntes. Nada impede que o usuário suba no trem sem pagar.
Sim, há de pagar. A ausência de catracas por aqui não significa que o transporte público seja de graça. Um bilhete que vale por duas horas, em Berlim, custa 2,60 euros, cerca de 7,20 reais. Um preço caro, mas aqui o mais normal é que as pessoas comprem cartões que tem validade de um mês, ou até mesmo de um ano, e permitem usar qualquer meio de transporte público dentro de Berlim. Um cartão mensal custa 79 euros, quase 240 reais.
"Isto nunca funcionaria no Brasil", é o comentário de muitos amigos que me visitam. Provavelmente, mas aqui funciona, por vários motivos.
Em primeiro lugar, é claro que é uma questão cultural. As pessoas mal sabem o que é uma catraca por aqui. Geralmente o alemão descobre a existência de catracas em viagens ao exterior. Mesmo assim, todos desde pequeno aprenderam que há de pagar para usar o transporte.


Mas um outro ponto importante é que o sistema de transportes está integrado com o funcionamento da economia. Se você é contratado por uma empresa, geralmente, recebe um cartão mensal de transporte que garante o ir e vir. O conhecido vale-transporte, mas que não é contado por unidades, tipo 50 viagens de ida, mas sim pelo tempo, um mês. Até os estagiários costumam ter esse tipo de benefício. Já os estudantes, pessoas com mais de 65 anos e desempregados têm desconto na compra de bilhetes mensais.
Além disso, o portador de um cartão mensal tem direito a levar um acompanhante depois das oito horas da noite e nos fins de semana. Há muitas regras e situações especiais - e eu, no início, fiquei completamente perdido.
E ainda existem esquemas do tipo tíquetes especiais para pessoas que usam o transporte depois das 10 horas da manhã. Esses são mais baratos para desincentivar o uso dos trens e bondes em horário de rush.
Outro caso interessante é que se você fez uma viagem de trem de longa distância, como por exemplo Hamburgo-Berlim, o bilhete do trem inclui o traslado da estação de trem até a sua casa, ou hotel.
O único controle é feito por alguns funcionários da empresa de transporte à paisana que pedem os bilhetes assim que as portas da condução fecham. Quem está sem o devido comprovante passa pelo vexame de ter que descer e pagar uma multa de 40 euros, cerca de 120 reais. Eu fui controlado somente quatro vezes nos últimos oito meses, o que não é muito.
Mas independentemente do controle, a impressão que eu tenho é que o transporte aqui trata os usuários não como consumidores (pagou, pode entrar), mas como cidadãos que tem os seus deveres e direitos baseados em regras claras.

Albert Steinberger é repórter freelancer, ciclista e curioso. Formado em Jornalismo pela UnB, fez um mestrado em Jornalismo de Televisão na Golsmiths College, University of London. Atualmente, mora em Berlim de onde trabalha como repórter multimídia para jornais, sites e TVs.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO


“Não dá para comparar banana com laranja”
José Serra (PSDB) evitando comparações entre ele e o presidenciável Aécio Neves


‘IMOBILIÁRIA EXÉRCITO’ TEM MAIS DE 19 MIL IMÓVEIS

A Marinha do Brasil pode ser uma mãe, mas o Exército briga para ser um pai no ramo imobiliário: são mais de 19 mil imóveis do Exército com a designação de “Próprio Nacional Residencial” (PNR), ou seja, com o propósito de serem distribuídos em todo o território nacional a seus integrantes, que pagam apenas uma taxa de ocupação de valor reduzido. Um sargento, por exemplo, paga no máximo 5% do soldo.

NO INTERIOR

A 4ª região (Tocantins, Goiás, Brasília e parte de Minas) é responsável por mais de 25% das unidades residenciais do Exército: 4,8 mil.

PATRIMÔNIO

Além das casas, a “imobiliária Exército” ainda contabiliza seus próprios operacionais, além de escritórios, fazendas etc.

PRAZO

Depois de reformados, os militares ganham prazo elástico de 180 dias para desocupar a unidade residencial onde residam.

TRANSFERÊNCIAS

As Forças Armadas acham necessários tantos imóveis, por serem frequentes as transferências dos militares para unidades militares.

PMDB PRETENDE LANÇAR CLÉSIO ANDRADE EM MINAS

O presidente do PMDB, Valdir Raupp (RO), reafirmou em Caratinga que o partido deve lançar candidatos próprios e que o senador Clésio Andrade é hoje o principal nome para o governo de Minas, e não o empresário 
Josué Alencar, filho do falecido vice José de Alencar, um mineiro que sempre viveu em São Paulo, não conhece o eleitorado e teria dificuldades até de formular uma plataforma eleitoral para 2014. 

MINAS O QUÊ?

Josué Alencar disse que vai a um encontro do PMDB, dia 23, em Montes Claros e Diamantina. Periga se perder no caminho.

TOMA LÁ, DÁ CÁ

Para barrar projetos que impliquem em gastos, a ministra Ideli Salvatti prometeu liberar emendas para a base aliada, e até para a oposição.

POÇO DE MÁGOAS

O presidente do PPS, Roberto Freire, topa se aliar a Aécio ou Eduardo Campos, mas Marina Silva, que o preteriu, é taxativo: sem chance.

ÁRABES NA ÁREA

O príncipe herdeiro de Abu Dhabi, Mohamed bin Zayed disse ao vice Michel Temer que enviará comitiva de governo para tratar de negócios envolvendo portos, aeroportos, rodovias e ferrovias no Brasil, em 2014.

EIS A QUESTÃO

Correndo o risco de extinção em 2014, o DEM não sabe ainda se lança Ronaldo Caiado (GO) ou apoia Aécio Neves (PSDB-MG) à Presidência. A cúpula teme que candidatura própria dificulte a eleição de deputados.

TIRO NO PÉ

Osmar Terra (PMDB-RS) desceu a lenha, em audiência na Comissão de Saúde do Senado uruguaio, na decisão do país de legalizar a maconha: “Só aumenta o tráfico de outras drogas, inclusive ao Brasil”.

OS RIGORES DA LEI

Após meses tentando audiência, o governador Beto Richa (PSDB-PR) será, finalmente, recebido pela presidente Dilma para tratar do “excesso de rigor” na liberação de empréstimos para seu estado.

NOME É SECRETO

O governador Jaques Wagner (PT-BA) e o ministro Fernando Pimentel participam em Camaçari, nesta quarta, do lançamento do primeiro carro criado no Brasil, com transmissão ao vivo para Ford de vários países.

ACORDO TUCANO

A provável candidatura Pimenta da Veiga ao governo de Minas, em 2014, é vista na política mineira como compromisso do senador Aécio Neves com FHC, de cujo governo ele foi ministro das Comunicações.

PLANOS POLÍTICOS

Com o pé no PSB de Eduardo Campos, a ministra Eliana Calmon (STJ) disse, em conversa com o prefeito ACM Neto (DEM-BA), que a fascina a ideia de disputar a Câmara ou Senado, possivelmente por Brasília.

PALAVRA DA RECEITA

A Receita Federal nega o sumiço de multas aplicadas, e informa que impugnações são apreciadas na Delegacia de Julgamento e depois pelo conselho de Recursos Fiscais. E que o ex-subsecretário de Fiscalização Caio Cândido deixou o cargo “por motivos pessoais”.

LUTA DE RAÇAS

Além da cota de 20%, a presidente Dilma criou o Disque Igualdade, para denúncias. Brancos ou que assim se
dizem poderão reclamar ao bispo.


PODER SEM PUDOR

UM TÁXI NA FILA

Deputado estadual no Paraná, o ex-ministro Rafael Greca participava ativamente da organização da bênção anual de animais, na tradicional festa Ordem de São Francisco, no centro histórico de Curitiba. Certa vez, numa fila cheia de crianças com cães e gatos, alguém apareceu com um enorme elefante. Devia ser de algum circo. Pais, mães e crianças ficaram inquietos, alguns entraram em pânico. Greca resolveu intervir, aos gritos:

- Calma, calma, não se assustem! Na Índia, é táxi!…

É necessária forte reafirmação das UPPs - EDITORIAL O GLOBO


O GLOBO - 12/11
A mais bem-sucedida política de segurança pública executada no Rio de Janeiro em décadas, a instalação de Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), não pode ser entendida como solução única e definitiva para o problema da violência e criminalidade. Mas, sim, o início de um projeto mais amplo de resgate pelo Estado de amplos territórios subjugados pelo crime, para, a partir daí, haver a efetiva integração destas comunidades ao mundo formal da cidade, com o acesso a todos os serviços públicos, etc. A começar pelo Rio até se estender pela Baixada Fluminense e o restante do estado.
Sequer deve ser cobrado das UPPs o fim do tráfico de drogas, meta que nem os Estados Unidos, o país mais bem aparelhado em termos militares e policiais, conseguiram atingir. Realista, o objetivo da UPP, como diz o nome, é a pacificação das favelas, o que implica o banimento das armas pesadas e do comércio atacadista de drogas.

As UPPs, em funcionamento em 34 localidades, em que residem 1,5 milhão de pessoas, tiveram e têm grande impacto na redução dos índices de criminalidade, com destaque para os homicídios. A cidade do Rio chegou a ter, em 2000, cerca de 50 assassinatos por grupo de 100 mil habitantes; hoje, se encontra na faixa pouco acima dos 20, próximo à média nacional.

Porém, se o programa não for gerenciado com a devida atenção, há o perigo de um desastroso retrocesso - desastroso para a sociedade. Reportagem de domingo do Extra traz informações preocupantes sobre o retorno de traficantes bem armados para áreas de UPPs.

No Pavão-Pavãozinho, Copacabana/Ipanema, a polícia já não entra na localidade chamada de Vietnã , como era no passado. Na Rocinha, estourou uma guerra entre remanescentes da quadrilha do traficante local, preso; e um grupo grande de pessoas com armas pesadas foi visto atravessando a Estrada da Gávea de madrugada. Situação semelhante ocorre no Complexo do Alemão (Parque Proletário, Vila Cruzeiro). Há outros casos. De forma organizada ou não, estão em curso ações de tentativa de retomada de territórios por traficantes, um ataque grave a um dos pilares do programa das UPPs - a manutenção do controle das áreas reintegradas aos cuidados do Estado.

No momento, importa menos discutir as possíveis causas desta pressão sobre as unidades de pacificação - até mesmo previsíveis - do que o poder público organizar uma resposta à criminalidade, firme como deve ser.

Não seria possível imaginar que quadrilhas há tanto tempo incrustadas nessas comunidades desistiriam de seus negócios . Cabe, então, aos governos estadual e federal repetirem as forças-tarefas que, com absoluto êxito, libertaram o Alemão, a Rocinha e outras comunidades, para retomar as áreas reocupadas por bandidos. A resposta do Estado precisa ser rápida e dura, para desestimular novas ações.

A sociedade de confiança - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR


GAZETA DO POVO - PR - 12/11

A baixa taxa de confiança, derivada de um complexo fator cultural, responde pelo atraso e pela falta de progresso


Por que algumas nações se desenvolvem e oferecem elevado padrão de bem-estar social médio a sua população, enquanto outras – muitas vezes mais ricas em recursos naturais – vivem em estado de elevada pobreza e baixo padrão de vida? Esse é um dos temas mais pesquisados e um dos mistérios não compreendidos. Aplicada ao Brasil, essa questão chega às raias do paradoxo: tendo tudo para ser rica e oferecer a seu povo elevado nível socioeconômico, a nação brasileira insiste em chafurdar na miséria, na pobreza, na violência urbana, na precária saúde pública e no baixo nível educacional de grande parte de sua população.

Nunca é demais examinar as causas da pobreza deste país, pois a pobreza ocorre sobre um território privilegiado, com recursos naturais abundantes, vocação para o pacifismo internacional e uma mistura de raças que, a princípio, deveria ser fator de promoção do desenvolvimento econômico e social. Na tentativa de encontrar explicações, merece atenção o estudo feito pelo sociólogo e cientista político Alain Peyrefitte, em sua obra A Sociedade de Confiança. As análises e os argumentos ali expostos são de grande valia para a compreensão dos fenômenos sociais, políticos e econômicos que atrasam o desenvolvimento do Brasil.

O autor francês afirma ter acumulado leituras e observações em viagens por cinco continentes e nas experiências vividas como político e como ministro por mais de quatro décadas. Sua tese central é de que a confiança é um elemento-chave para o desenvolvimento econômico e social de qualquer nação. A confiança recíproca entre as pessoas, a confiança de uma sociedade em suas instituições, o cumprimento de regras não escritas de respeito mútuo e um comportamento capaz de minimizar a incerteza levam os indivíduos a saber o que esperar dos outros e das instituições, e são elementos vitais e decisivos para promover os negócios, os empreendimentos, os contratos, o progresso material e o desenvolvimento social.

Alain Peyrefitte faz uma observação interessante. “Foi o conhecimento do Terceiro Mundo que me convenceu de que o capital e o trabalho – considerados pelos teóricos do liberalismo e do socialismo como os fatores do desenvolvimento econômico – eram na realidade fatores secundários; o fator principal do desenvolvimento é um terceiro, o qual chamei de terceiro fator imaterial, ou seja, o fator cultural.” Lembrando ser difícil provar a existência desse terceiro fator imaterial, não há dúvida de que a baixa taxa de confiança, derivada de um complexo fator cultural, responde pelo atraso e pela falta de progresso.

Segundo o autor da obra, a sociedade de confiança é uma sociedade em expansão, na qual se pratica o jogo do ganha-ganha: o indivíduo confia na autoridade, a população confia no governo, as pessoas acreditam na Justiça, a lei protege os contratos juridicamente perfeitos, os cidadãos cumprem as regras – muitas vezes sem precisar de fiscalização ou de punição –, a corrupção é pequena, o governo é razoavelmente eficiente e a população se sente representada pelos políticos que elege. Em uma sociedade de confiança, um idoso não precisa de um cartão para estacionar em vagas a eles reservadas, pois a lei é sempre cumprida, da mesma forma que um fiscal representando o poder público não se corrompe e as obras públicas não são superfaturadas nem usadas para desvio de dinheiro dos tributos.

Contrariamente, em uma sociedade na qual impera elevada desconfiança geral, o desenvolvimento não se faz, recursos são desperdiçados, pessoas seguem na miséria e a vida torna-se precária, sofrida e violenta. Nessa sociedade impera o medo e a angústia cotidiana; as casas tornam-se prisões autoimpostas, pois o simples ato de manter abertas portas e janelas ou andar à noite pelas ruas das cidades transforma-se em atitude perigosa, e as cidades deixam de ser espaços públicos usufruídos por adultos e crianças.

Na sociedade de desconfiança, a população não acredita nas autoridades, não confia no governo e não espera que a Justiça funcione; os serviços governamentais são eivados de ineficiência e a corrupção é elevada. Nessa sociedade, a pobreza e a violência urbana continuam, pois o crescimento econômico e a produtividade do trabalho, tão necessários para romper o atraso social, não passam de uma promessa jamais cumprida. Eis o retrato claro do Brasil.

Meta refeita, de novo - EDITORIAL FOLHA E SP


FOLHA DE SP - 12/11

Governo quer afrouxar, pela quinta vez, compromisso de economia nas contas públicas, o que rebaixa ainda mais a credibilidade federal


É tentador para o governante ter à mão uma máquina de fazer dinheiro, capaz de atender às novas demandas por despesa. Sem contrapeso social, político e institucional, o governo sempre elevaria os tributos e a dívida pública, fosse qual fosse a ideologia do partido no poder.

Hoje campeões na retórica da moderação fiscal, os tucanos só colocaram freio na gastança, fixando metas para o chamado superavit fiscal, no final do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso. Foram movidos não pela consciência, mas pela necessidade de um país quebrado em moeda estrangeira, às portas do FMI.

A ideologia apenas muda o sinal da justificativa para o aumento do gasto público. Tucanos o faziam em nome da estabilidade monetária, cuja conta inevitável acreditavam ser juros exoticamente altos. Petistas torram dinheiro do contribuinte como se o Estado fosse o motor da economia.

Mas o fazem, estes últimos, dentro de um traje institucional herdado da penosa estabilização brasileira --imposto aos governantes como freio a sua vocação gastadora. Embora não creia nas virtudes do modelo, a presidente Dilma Rousseff é obrigada a perseguir uma meta de poupança pública --o superavit primário-- que não leva em conta as despesas com juros.

O atual governo respondeu ao dilema com uma série de artimanhas, contábeis e legais, para vestir o velho "desenvolvimentismo" com a roupagem da disciplina fiscal. Atordoado pelo péssimo resultado das contas públicas de setembro, que na prática inviabilizou o cumprimento da meta de poupança deste ano, o Executivo prepara novo rebaixamento do objetivo a ser cumprido em 2013.

Voltou a tramitar no Congresso o projeto de lei que desobriga o Tesouro Nacional de cobrir a parte da poupança que Estados e municípios deixam de perfazer. Seria a quinta versão do objetivo fiscal de 2013. A esta altura, é de perguntar qual a razão para tanto malabarismo, dado que ninguém mais acredita no compromisso do governo federal com o controle de gastos.

Se controles institucionais estão sendo minados pela ação do Planalto, outros contrapesos na sociedade permanecem ativos. Os juros na praça terão de subir ainda mais para compensar os efeitos do consumismo e do descrédito do Tesouro, que põe lenha na fogueira da inflação e do deficit externo, além de elevar a dívida pública.

Os efeitos negativos dessa conduta do governo petista, contudo, serão sentidos no país inteiro, na medida em que exaurem o fôlego do investimento produtivo e alongam o período, já exasperante, de crescimento anêmico da economia.

O verdadeiro absurdo - EDITORIAL O ESTADÃO


O ESTADO DE S. PAULO - 12/11
Para a presidente Dilma Rousseff, é "um absurdo" paralisar obras públicas, como recomendou há pouco o Tribunal de Contas da União (TCU). Dilma considera a interrupção das obras "algo extremamente perigoso", pois ninguém arcará com os custos nem se responsabilizará pelos danos que a interrupção causar. A obra "para e ninguém ressarce o que foi perdido", disse ela. Mas a interrupção de obras recomendada pelo TCU ao Congresso, longe de ser um ato absurdo, como supõe a presidente, é uma providência necessária para evitar lesões irreparáveis ao erário e, assim, proteger o interesse dos cidadãos.
A paralisação de obras públicas tem, de fato, consequências de diversas naturezas, pois ela pode implicar gastos não previstos com a manutenção de canteiros de obras e a preservação do que já foi construído, além de retardar os benefícios que elas podem trazer para a população. Apesar de também poder produzir consequências desse tipo, no entanto, a recomendação do TCU está longe de ser um absurdo, pois ela comprova a persistência, na administração pública, de práticas que geram custos adicionais para os contribuintes e, por isso, precisam ser combatidas com rigor.

Se há algum absurdo nisso é que, a despeito de frequentemente o TCU apontar irregularidades na contratação de obras e em outros atos da administração pública, o governo continua a praticá-las.

No balanço que, por lei, faz anualmente sobre a situação das obras públicas - apontando ao Congresso aquelas que devem ter sua execução interrompida pela existência de indícios de irregularidades graves o TCU recomendou a suspensão de sete obras do governo federal. Dessas, quatro fazem parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que ajudou a eleger Dilma em 2010 e que ela parece disposta a utilizar i como ferramenta eleitoral também i em 2014. Para outras obras, incluindo várias do PAC, o TCU recomendou a retenção dos recursos públicos até que as irregularidades sejam sanadas.

Ao considerar a suspensão de obras um "absurdo", a presidente, que participava de uma solenidade no Rio Grande do Sul, citou uma em particular - a implantação e pavimentação da Rodovia BR-448, no trecho de 22,3 quilômetros entre Porto Alegre e Sapucaia do Sul, chamada de Rodovia do Parque. "Eu não perco a inauguração por nada", disse ela, referindo-se à obra, que chamou de "emblemática" para qualquer governo.

Há motivos para ela ser considerada um emblema do governo do PT. Orçada em mais de R$ 1 bilhão, a obra já integrou listas anteriores do TCU de obras que deveriam ser para! Usadas. Como em relatórios anteriores, no referente a 2013 é apontada a persistência de suspeita de sobrepreço, com a observação de que os responsáveis haviam assumido o compromisso de sanar as irregularidades no ano passado, mas não o fizeram. A origem do problema seriam falhas no projeto básico da obra, que, por utilizar técnicas defasadas, encareceria a construção.

É um problema comum em obras do governo federal. Projetos mal elaborados ou incompletos dão margem a atrasos, a necessidades de recálculo do valor do contrato e, em resumo, a aumentos exorbitantes do custo final da obra. Isso ocorre até mesmo em áreas consideradas críticas pelo governo para a melhoria da infraestrutura e para a expansão dos investimentos, como ferrovias, portos e aeroportos, além das rodovias.

Há também falhas administrativas - que retardam a contratação, a fiscalização e o pagamento das obras má gestão financeira e despreparo técnico do pessoal do serviço público, que induzem as empresas contratadas a reclamar pagamentos adicionais ou geram sobrepreço e até corrupção.

Não é uma anomalia nova, reconheça-se. Mas a maneira como o PT vem lidando com os recursos públicos a tornou mais frequente e visível. A atuação do TCU, a atenção dos cidadãos e a ação de parte do Congresso têm evitado o agravamento do problema, mas ele persiste, e precisa ser enfrentado, até com paralisação de obras. Ainda que não seja do agrado da presidente, é medida necessária para proteger o dinheiro público.

Picadinho à brasileira - JANIO DE FREITAS


FOLHA DE SP - 12/11

Lula ilustrou bem o que é o PT atual, ao pedir que o outrora partido da juventude saia à caça de jovens


O miserê da política brasileira exposto em um só acontecimento, a eleição de novos/velhos dirigentes do PT. Um ato que mostrou a mesma coisa por diferentes maneiras: o PT, que foi a organização mais parecida com um partido programático no pós-ditadura, não tem mais absolutamente nada a dizer. O que está evidenciado tanto na tranquila continuidade do imobilismo, como na ausência de ao menos uma palavrinha nova e interessante até entre os derrotados, que deveriam ser contestadores.

Lula ilustrou bem o que é o PT atual, ao pedir que o outrora partido da juventude saia à caça de jovens. Com que ideias, com que ação política que não seja a mera prestação de serviço ao governo? Silêncio.

Como se diz no futebol, a eleição no PT foi só para cumprir tabela.

2) A crítica de Dilma Rousseff ao Tribunal de Contas da União não mereceu maior interesse. Mas se justifica, e não por pouco. A paralisação de obras, sete dessa vez, é contumaz no TCU, quando encontrados indícios ou evidências de irregularidades. Mas não é preciso paralisar obras, por tempo indeterminado e em geral longo, para investigar, corrigir e eventualmente punir, por exemplo, irregularidades financeiras.

Foi o próprio autor do relatório aprovado para as novas suspensões, Walton Rodrigues, a dizer que nesses casos "predominam achados de sobrepreço, restrição ao caráter competitivo da licitação e atrasos injustificados nas obras". A solução de sobrepreço e de atraso não impede a continuidade de obra, cuja sustação tem alto custo para os cofres públicos.

E "restrição ao caráter competitivo da licitação" é o que, até agora, se vê o TCU impor ao leilão dos aeroportos previsto para o dia 22.

3) O problema de José Serra está longe de ser Aécio Neves. É, sim, a disposição de Fernando Henrique e Geraldo Alckmin de impedir sua candidatura à Presidência. O governador, por conveniência pessoal e de sua corrente no partido; o ex-presidente, por velhas convicções e observação atual.

O problema de Fernando Henrique e Geraldo Alckmin está longe de ser José Serra. É, sim, a inconvincente determinação de Aécio Neves de levar adiante sua candidatura. Daí a insistência de Fernando Henrique em que Aécio assuma a posição de candidato do PSDB já em dezembro, no máximo, e não em março como combinado com Serra.

Fernando Henrique não está equivocado quanto à aparente pré-candidatura de Aécio Neves.

4) Ao menos para consideração futura, pelo Supremo ou pelo Congresso, faz sentido o argumento agora apresentado por alguns advogados: dizem eles que a exigência de quatro votos favoráveis, para que certos réus do mensalão ganhem direito a novo recurso, não se justifica se o tribunal fez a condenação quando desfalcado de um ou de dois ministros.

Diz a Constituição, art. 101, que "o Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros". Se não tem onze, o tribunal ainda "compõe-se" de acordo com a Constituição?

Quatro em onze são uma proporção; em dez ou nove são outra, mais desfavorável ao réu.

Nisso está presente, também, a falta de prazo para indicação de novos ministros pela Presidência da República. Dilma Rousseff foi de lentidão injustificável, que impôs muito atraso a numerosas causas.

É possível uma educação pública de qualidade? - HERMAN VOORWALD


BRASIL ECONÔMICO - 12/11

Sim, é possível. Não há dúvida. Experiências recentes, dentro e fora do país, têm demonstrado que é possível. Trabalho, retidão nos princípios norteadores de todo e qualquer programa, de toda e qualquer ação, e conhecimento aprofundado do tema são pontos de partida desejáveis para serem tomados por todos aqueles que se lançam em tarefa tão importante.

Desejáveis como ponto de partida, não bastam,no entanto, para a formação de uma plataforma segura de onde devemos atuar com a máxima eficiência e eficácia possível. São necessários, a partir daí, elementos e ferramentas que atendam à questão da organização,do planejamento, da gestão de recursos, da gestão pedagógica e, certamente, da atenção direta necessária para com os alunos.

No estado de São Paulo, a gestão eficiente dos recursos tem nos possibilitado atender a um número maior de necessidades, investindo no que é fundamental, ampliando as margens para descentralização, imprimindo um ritmo mais ágil para o aproveitamento desses mesmos recursos e o encaminhamento de soluções.

Aqui também, a gestão pedagógica tornou-se sinônimo de programas e projetos que consolidam o currículo por meio de formação continuada, de avaliação em processo, que monitora muito de perto o processo de ensino e aprendizagem de nossos alunos, lançando mão de ações de recuperação e reforço de forma muito mais ágil.

A gestão pedagógica,no estado de São Paulo, tornou-se também sinônimo de parcerias exitosas, como a que, de forma simultânea, como programa Residência Educacional,abre a oportunidade de universitários e suas escolas de origem participarem da rica experiência do dia a dia das salas de aulas, ao mesmo tempo em que apoiam professores e alunos em suas atividades.

Por sua vez, a alfabetização aos 7 anos de idade - programa que se inicia -, passará, ainda em 2013, pelo seu primeiro teste,no momento em que os segundos anos serão avaliados pelo SARESP - Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo. A escola de ensino integral vem consolidando de forma surpreendente o protagonismo juvenil, sobretudo quando cria as condições para que os alunos construam seus projetos de vida, como apoio constante de sua unidade escolar e de seus professores e tutores.

O VENCE - programa que articula o Ensino Médio ao Ensino Técnico, seja na forma integrada ou concomitante-tem nos revelado dados surpreendentes sobre a empregabilidade de seus formandos. E o Centro de Estudos de Línguas (CEL) alcança milhares de alunos, reforçando seus projetos de Formação profissional e proporcionando a todos um pouco mais de cultura. Quanto mais a sociedade estiver perto da escola - todos sabemos! -, mais ela será segura e de melhor qualidade.

O programa Escola da Família já organizou e organiza, desde sua criação,muitas atividades que buscam consagrar essa parceria e ampliar os laços de atuação. Pois bem, como quadro parcial de realizações até aqui descrito, talvez seja já o bastante para dar a todos uma ideia da complexa rede que envolve e inter-relaciona pessoas, recursos e programas. São cerca de 300 mil funcionários e 4,3 milhões de alunos.

Os números são grandiosos, tal qual os desafios diários inerentes da rotina das mais de 5 mil escolas. Talvez seja o bastante para demonstrar o grau de dificuldade com que nos deparamos quando nos propomos à elaboração e execução de políticas em diferentes áreas, sobretudo na Educação. Com isto,uma pergunta fundamental nos impulsiona, antes que qualquer outra: alguém é capaz de imaginar que tudo o que aqui foi descrito e muito mais possa existir sem o professor?

Certamente não. Há muitas décadas, governos e administrações vêm trabalhando com base em princípios norteadores que se diferem no tempo e no espaço. Nesse governo e nessa gestão, não nos acomodaremos enquanto não for feito tudo o que estiver ao nosso alcance para que o professor se sinta efetivamente valorizado, efetivamente reconhecido.

Não tenham dúvida de que é o aluno na sala de aula, em particular,e a sociedade, em geral, que sairão ganhando. Esperamos, assim, que as pessoas identifiquem, reconheçam na figura desse profissional um aliado na formação geral e positiva de seus filhos, e que devem, sempre, como registro de reconhecimento, dedicar-lhe todo respeito.

Os donos da história - ARTHUR POERNER


O GLOBO - 12/11

A memória dos grandes vultos e personalidades do país, inclusive da área artística, é propriedade pública, parte inalienável da identidade nacional



Sempre acho bom evitar a personalização nos debates e controvérsias, porque ela acaba desviando as atenções do tema principal, mas, na polêmica das biografias não autorizadas, por envolver alguns dos mais renomados músicos do país, já não é possível dissociar posições dos que as defendem. De modo que, como autor, me vejo obrigado, pela primeira vez, a discordar do Chico, do Caetano e do Gil, líderes do grupo Procure Saber, com os quais sempre me senti irmanado quanto ao essencial, às matérias de relevância nacional como esta. O mesmo já não posso dizer do outro protagonista no noticiário sobre o caso, o Roberto Carlos, que nunca nos deu a oportunidade de concordar ou discordar dele, simplesmente porque se desconhece o que pensou até agora, inclusive quanto à ditadura. E vago e impreciso continuou sendo na badalada entrevista ao “Fantástico”.

Penso que a memória dos grandes vultos e personalidades do país, inclusive da área artística, é propriedade pública, parte inalienável da identidade nacional, e, como tal, não pode ficar à mercê ou depender da vontade, do capricho, das idiossincrasias ou, como ocorre com mais frequência, da cobiça dos seus herdeiros; a estes cabe, sim, parcela já regulamentada dos lucros financeiros decorrentes do culto a essas memórias, da venda das suas obras, pois são, afinal, legatários do prestígio dos seus antepassados.

A experiência vem demonstrando que é nas vantagens pecuniárias que se concentra e fundamenta a maioria das objeções e exigências dos familiares, como tão bem exemplifica o caso de “Estrela solitária”, a excelente biografia do Garrincha escrita pelo Ruy Castro, relatado pelo seu editor, Luiz Schwarcz, da Companhia das Letras, no Segundo Caderno do GLOBO de 17 de outubro.

O Brasil é um dos poucos países em que ainda vigora essa aberrante forma de censura prévia, a autorização de biografias, uma flagrante violação do direito constitucional à liberdade de expressão, incompatível com a democratização em curso, muito embora os abusos e infrações no exercício deste direito já estejam até previstos legalmente, inclusive com a cominação das respectivas punições.

Em suma: ou completamos e modernizamos a nossa legislação nessa área, com a aprovação do projeto que tramita na Câmara Federal, ou convoquemos a família imperial, para integrar as bancas universitárias que julgam as dissertações e teses de pós-graduação em História do Brasil referentes aos seus ilustres antepassados.

UPPs no divã - LETÍCIA SANDER


FOLHA DE SP - 12/11

RIO DE JANEIRO - Há um ano ou mais, não havia conversa sobre as eleições de 2014 no Rio que não terminasse no nome de José Mariano Beltrame. Ele era cortejado para ser o candidato à sucessão de Sérgio Cabral, era o vice dos sonhos de Luiz Fernando Pezão, era referência indispensável até para candidatos de oposição, que se apressavam em garantir que a política de criação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) estava garantida. Agora que a disputa começa a esquentar, soa um tanto irônico que o próprio governo Cabral comece a tirar a principal marca de sua gestão da vitrine.

O desabafo feito pelo comandante das UPPs, coronel Frederico Caldas, para quem a morte, sob tortura, do pedreiro Amarildo de Souza "destruiu a confiança dos moradores", é simbólico. Assim também é a intrigante "promoção" do delegado que iniciou as investigações sobre o desaparecimento do pedreiro. Encerradas as apurações que levaram 25 colegas à cadeia, Orlando Zaccone, há 14 anos na polícia, foi tirado da Gávea para assumir um posto em Ricardo de Albuquerque, na zona norte, quase na Baixada Fluminense...

Soa injusto, porém, colocar na conta do destino do ex-pedreiro toda a crise de credibilidade que ronda as UPPs. A impressão que se tem, isto sim, é a de que, após Amarildo, o programa começou a ser visto com outra lupa. A sequência de tiroteios em favelas como a da Rocinha e a do Complexo do Alemão, com comércio fechado e relatos de moradores apreensivos, prova isso tanto quanto o ranking elaborado pelas próprias chefias das UPPs mostrando que só duas mereceram um "verde", de nível bom.

A revelação, por esta Folha, de que o governo Cabral decidiu "congelar" a criação de novas unidades pelos próximos sete ou oito meses não prova nenhum fracasso. É evidente que a política das UPPs trouxe uma série de ganhos ao Rio. E repensá-la, mais do que salutar, é preciso.

Há bens que vêm para o mal - ARNALDO JABOR


O Estado de S.Paulo - 12/11

A frase que mais me impressionou na semana foi escrita pelo Comando Vermelho em sua "constituição", em seu estatuto de regras: "O crime nos dá a convicção de que nossas bravuras são pelo progresso, por nosso esforço e mérito. Farão de nós vitoriosos. Pois nós somos o lado certo da vida errada". É extraordinário: "nós somos o bem do mal".

Citei o CV e agora cito Jean Pierre Dupuy, filósofo da Escola Politécnica de Paris e da Universidade de Stanford que escreveu em seu livro Por um Catastrofismo Esclarecido: "Sempre o Mal esteve relacionado com as intenções de quem o comete. Os horrores do século 20 deviam nos ter ensinado que isso é uma ilusão. O absurdo é que um mal imenso possa ser causado por uma completa ausência de malignidade, que uma responsabilidade monstruosa possa caminhar junto com uma total ausência de más intenções. (...) a catástrofe ecológica maior com que nos deparamos e que põe em perigo toda a humanidade será menos o resultado de um mal dos homens ou mesmo de sua estupidez. Terá sido mais por uma ausência de pensamento ('thougthlessness' )(...) Hoje, um sem número de decisões de toda ordem, caracterizadas mais pela miopia do que pela malícia ou pelo egoísmo, compõem um todo que paira sobre elas, segundo um mecanismo de autoexteriorização ou de autotranscendência. O mal não é nem moral nem natural. É um 'mal' do terceiro tipo, que chamarei de 'mal sistêmico'."

O mal é o bem ou o bem é o mal? Antigamente, era mole. O mal era o capitalismo e o bem o socialismo.

Agora, os intelectuais, os bondosos de carteirinha, os cafetões da miséria, os santos oportunistas, estão em pânico. Se não houver um mal claro, como seremos 'bons'? No mundo inteiro, há uma reviravolta ética, um cinismo que nos acostuma com o inaceitável. E também renasce, com descaro, a boçal divisão guerreira entre "esquerda" e "direita". Ninguém aguenta conviver com singularidades. Há uma fome bruta por "universais". Mas, como escreveu Baudrillard: "Hoje não há mais o universal; só temos o singular e o mundial".

Quem é o mal: o assaltante faminto ou o assaltado rico? Ou nenhum dos dois? Como praticar o bem? Apenas se horrorizando com o mal? Como inventar uma "práxis" do bem?

O Mal é sempre o outro. Nunca somos nós. Ninguém diz de fronte alta: "Eu sou o mal!" Ou: "Muito prazer, Diabo de Almeida".

Como disse Hannah Arendt, na frase que virou lugar comum: o mal ficou banal. Tanto que o mal dos terroristas e jihadistas consiste em injetar no Ocidente o seu "bem", o arcaico no moderno, neste inferno "clean" que o capital inventou. Em nome de uma razão ideológica, de uma finalidade futura, os soviéticos assassinaram milhões pelo "bem" do Homem Total. A fé excessiva no Sentido e na finalidade prejudicaram muito o pensamento, mais do que a gente imagina. Hoje em dia, a esperança é mais remota, mas talvez esse vazio seja o início de uma reflexão mais à altura de nossa mediocridade finita, de um "geist" mais vagabundo.

Quem é o planejador do mal? O Japão vai parar de produzir robôs, para empregar a mão de obra faminta da Somália? Quem controla o mal? A Al-qaeda, o Putin, o Assad? Ou eles são agentes de um "mal" histórico-concreto inevitável? E cito mais uma vez Baudrillard, tão criticado pelas academias porque tinha imaginação e brilho: "Hoje, contra o mal, só temos o fraco recurso dos direitos humanos".

Talvez um caminho seja, como escreveu Louis Dumont, nos Ensaios sobre o Individualismo (apud Dupuy): "O bem deve englobar o mal, mesmo sendo seu contrário".

(Arghh, quanta citação!)

O bem está virando um luxo e o mal uma necessidade social. Sem participar do mal, não conseguimos viver. Como ser feliz olhando as crianças empilhadas na Síria, no Iraq, nos grotões do Brasil feudal: Maranhão, Alagoas, etc.? Temos de fechar os olhos. "Sou feliz se conseguir manter os olhos fechados." Ser feliz é não ver. Como praticar o bem? Apenas se horrorizando com o mal? Não vale ficar "tristinho", nem lançar apelos à razão ou à caridade. "Eu fiz tudo para ser um homem de bem. Serei um canalha?" Todos se acusam, todos querem ser o bem. Durante a ditadura, todos éramos o bem. O mal eram os milicos. Acabou a dita e as "vitimas" (dela) pilharam o Estado. O que é o "bem" hoje? É lamentar com certo prazer uma impotência, é um negror melancólico, é um elogio da morte? Ou o bem é ser pragmático, frio? É uma identificação mecânica com as desgraças ou um desejo "protestante" de melhorar na vida?

O pensamento aspira à totalidade. O bem será um desejo de harmonia, de Uno ou o bem é suportar heroicamente o múltiplo, o incontrolável, a impotência "democrática"? O bem hoje é aceitar os limites do "possível histórico" ou persistir em utopias, apenas pelo prazer de se sentir acima da insânia da vida? Pensamos com o corpo, queremos que o mundo seja um "todo harmônico", como o nosso organismo. A ideia de "fragmentário" gera angústia, porque lembra a morte. Por isso, a aceitação do fragmentário se reergue em nova totalidade e começa tudo de novo. A democracia é muito complicada, lenta e está deixando todo mundo impaciente - somos todos totalitários. Ao denunciar o Mal, vivemos dele. Eu ganho a vida denunciando o que eu acho o "mal".

O mal no mundo atual é o "incompreensível". Também, nós sabemos desses perigos todos, mas não cremos neles. A catástrofe talvez já tenha acontecido, mas a gente não acredita. No Brasil, o grande Mal não tem importância. O perigo aqui é o pequeno mal, enquistado nos estamentos, nos aparelhos sutis do estado, nos seculares dogmas jurídicos, nos crimes que são lei. O mal aqui está nos pequenos psicopatas que, quietinhos, nos roem a vida. Aqui o grande canalha serve para camuflar os pequenos, que são os grandes canalhas. O mal do Brasil não está na infinita crueldade dos torturadores ou das elites sangrentas, está mais na sua cordialidade. No Brasil, o mal nos engana. Aqui, o perigo é o Bem.

O jogo político na Educação - JOSÉ CASADO


O GLOBO - 12/11

Plano de Lula, balizado por lobbies setoriais e políticos, foi posto em rediscussão pelo governo Dilma e já está em exumação no Senado



Vem aí a segunda Conferência Nacional de Educação (Conae). Vai acontecer em fevereiro, em Brasília. O ciclo preparatório terminou há uma semana com 11 mil propostas coletadas em 2.800 reuniões, com participação de 600 mil pessoas, segundo o Ministério da Educação. É recorde.

A primeira conferência, em 2010, resultou no Plano Nacional de Educação. A de 2014 debaterá o impacto desse plano “na articulação do sistema — participação popular, cooperação federativa e regime de colaboração”.

Assim, em quatro anos, o governo terá patrocinado três mil assembleias, com quase um milhão de pessoas, e extraído um acervo de 14 mil sugestões sobre como resolver a crise da educação.

Na tarde de quarta-feira, 15 dezembro de 2010, sete meses depois da primeira conferência, Lula mandou o plano ao Congresso. Era para ser decenal, mas, como só faltavam duas semanas para troca de guarda no Palácio do Planalto, optou-se por fixar nove anos de prazo para execução (2011-2020). Aprovado na Câmara 22 meses depois, chegou ao Senado em projeto de lei com 12 mil palavras e 56 páginas.

Em meados deste ano, o Senado tentou acelerar a tramitação, mas o governo Dilma Rousseff resolveu mudar o projeto. E a Conae-2014 já tem mais 11 mil sugestões para mudanças.

É filme conhecido, com frustração da plateia no final. Na última década foram estabelecidas mais de 300 “metas” e, no entanto, a crise educacional se agravou, lembrou o professor Claudio de Moura Castro em recente debate no Senado:

— O Ideb mostra, o Pisa mostra, o Saeb já mostrou e o Enem mostra que se aprende muito pouco. Há evasão no ensino básico e, sobretudo, 50% de evasão no ensino médio.

O plano de Lula, balizado por lobbies setoriais e políticos, foi posto em rediscussão pelo governo Dilma e já está em exumação no Senado. Ali, parlamentares apelam aos convidados: “O que é possível fazer para salvar o plano?”

Confrontado, Castro foi direto:

— Analisar uns cinco ou dez pontos, que são críticos. Há muita coisa lá que não é errada, ideias muito boas perdidas numa salada de irrelevâncias e de equívocos. Esqueçam o resto. Não tem jeito.

— O que nós temos? — argumentou. — Por exemplo, a grande crise no ensino brasileiro hoje é a do ensino médio. No plano só um artigo trata do ensino médio. É o artigo que fala da padronização dos ônibus escolares, proposta sonhadora, pois como é que se vai obrigar o prefeito a escolher ônibus daquela marca e daquele tamanho? Temos excesso de disciplinas (escolares) e a formação de professores tem teoria e ideologia demais. O “como implementar” é confuso. Em alguns casos, impossível: pede-se 90% de (meta de) conclusão no ensino superior. Os Estados Unidos têm 50% de deserção no ensino superior, então, como é que nós vamos conseguir 90% de conclusão?

Na Conae-2010 Castro apresentou um “sumário” da educação brasileira, que repetiu no Senado:

— Etapa um, ensino ruim para poucos; etapa dois, no presente, ensino ruim para muitos.

Nunca antes na história deste país houve tanto debate sobre Educação. É saudável e pode até resultar em boas alternativas. O risco está no assembleísmo, onde cada reunião é apenas um prelúdio para a seguinte. Por coincidência, sempre em anos de eleição presidencial.

Choque de realidade - MERVAL PEREIRA


O GLOBO - 12/11

Na mesma semana em que o PT dá mais uma demonstração de unidade, reelegendo com larga margem o deputado Rui Falcão, candidato de Lula e Dilma, para sua presidência nacional, o PSDB repete comportamento autodestrutivo, exibindo suas divergências ao respeitável público a menos de um ano da eleição presidencial que pode ser a mais difícil para os petistas, mas que os tucanos teimam em facilitar para o adversário.

Não é que os petistas tenham escondido suas divergências, ao contrário. Há muito tempo o governo Dilma não era tão criticado pelas diversas correntes em que se divide o partido. E houve até mesmo quem defendesse o fim da aliança com o PMDB, o maior trunfo que o governo Dilma tem no momento para tentar a reeleição. Os críticos, no entanto, a partir deste fim de semana, terão que se recolher à sua insignificância, pois a maioria se pronunciou.

O ex-governador José Serra, obcecado com uma candidatura à Presidência da República, que já tentou duas vezes sem sucesso, exibe a frustração pessoal de não poder tentar uma terceira vez, fazendo críticas públicas à legenda que ajudou a fundar.

Todos sabem, até mesmo Serra, que a maioria do PSDB considera que em 2014 a vez é do ex-governador mineiro Aécio Neves. Ao decidir permanecer no PSDB, em vez de se jogar em uma aventureira candidatura à presidência pelo PPS, tudo indicava que o ex-governador aceitara a realidade política que tem pela frente: encerrar sua carreira como deputado federal ou senador, mantendo o prestígio dentro do partido. Ia tudo dentro do script combinado com as lideranças tucanas, entre elas, a maior de todas, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que já lhe dissera em particular o que declarou em recente entrevista: Serra tem que dar um tempo, a vez é de Aécio. O próprio Aécio saiu em sua defesa, dizendo que ele tem todo o direito de sair pelo país fazendo palestras, e que sua imagem nacional só ajudaria o PSDB.

Mas, na última semana, a receita desandou. Em uma palestra para a juventude do PSDB, Serra simplesmente chutou o pau da barraca. Disse que o PSDB tem necessidade de ser aceito pelo PT . E deu uma explicação psicológica adaptada às circunstâncias: (...) o problema da Madame Bovary é querer ser aceita pelo outro lado. Ela vai à loucura, quebra a família e trai o marido com Deus e todo mundo para ser aceita. O PSDB tem um pouco do bovarismo .

Serra tem até certa razão, e basta lembrar que nem ele nem Geraldo Alckmin usaram as conquistas do PSDB para se opor ao PT quando foram candidatos à Presidência, até mesmo escondendo o ex-presidente FH. Alckmin com aquele ridículo colete cheio de logos de empresas estatais é uma imagem inesquecível.

Mas, mesmo se a definição correta de bovarismo fosse a dada, a comparação não ficaria bem para ele. Afinal, quem foi que iniciou a campanha presidencial de 2010 querendo fazer-se passar por amigo de Lula, pensando em receber os votos petistas descontentes com a candidatura de Dilma? Após usar o nome do ex-presidente em jingle na propaganda eleitoral ( Quando o Lula da Silva sair, é o Zé que eu quero lá ), sua campanha exibiu imagens em que Serra e Lula se abraçam.

Mas bovarismo, no sentido mais amplo que o psicólogo Jules de Gaultier deu em 1892, não é a tentativa de ser aceito pelo outro, ou pelo menos não é só isso. Na verdade, o bovarismo passou a designar fenômeno psíquico produzido pelo choque entre as aspirações de uma pessoa e a realidade que está acima de suas possibilidades. É justamente o que ocorre hoje com Serra, político de inegáveis qualidades, que tem todo o direito de querer ser presidente, mas não aceita a realidade que o impede de atingir o objetivo. O psiquiatra Joel Birman identifica na irritabilidade de Serra sintoma desse mal-estar provocado pela impossibilidade de realizar sonho que acalenta desde a juventude.

No ringue - ELIANE CANTANHÊDE


FOLHA DE SP - 12/11

BRASÍLIA - A relação entre Fernando Haddad e Gilberto Kassab passou ao largo do campo diplomático, saiu do estritamente político e descambou para um pugilato verbal. Ponto para a Folha, que escancarou o ringue e a tensão entre sucessor e sucedido, sem subterfúgios e sem intermediários.

Na edição de domingo, Haddad disse, sem citar nomes, que encontrou uma situação de "descalabro" e de "degradação", com "nichos instalados e empoderados".

Na de ontem, Kassab deu o troco, e não foi com luvas de pelica, mas de boxe. Para ele, além de o real "descalabro" ser o primeiro ano da gestão Haddad, o descalabro é duplo. E meteu no meio o final da gestão Marta Suplicy, da qual Haddad participou.

Eles, que conhecem a prefeitura da maior e mais rica cidade brasileira, com um dos maiores orçamentos do país, que se entendam. Para nós, olhando de fora, ninguém tem ainda razão. A única certeza é que descalabro há, havia e, muito provavelmente, ainda vai continuar havendo. Mas quem é o pai dessa criança? E quem a embalou mais ou menos?

Haddad, que precisa compensar a falta de jeito com o aumento do IPTU e a interferência do padrinho Lula, arroga-se o fato de ter criado a controladoria e de ter aberto todo o processo de investigação na sua gestão. Sem explicar, claro, onde entra o seu secretário citado na confusão toda.

Já Kassab, que está mal na fita e na troca de socos, defende-se dizendo que os esquemas já vinham de administrações anteriores à sua (pois ninguém "se torna desonesto de uma hora para outra") e que as investigações começaram quando ele ainda era prefeito. Sem explicar, claro, a fita em que um dos envolvidos diz, em bom português, que ele mandou arquivar as denúncias.

Quanto mais os dois se atacarem em público, mais os podres continuarão saindo. Só não vale, no final, Kassab apoiando Padilha e abraçado a Haddad e a Maluf --o grande e disputado aliado de ambos.

Uma agenda de propostas - RODRIGO CONSTANTINO


O GLOBO - 12/11

Programas de ajuda aos mais pobres podem existir, desde que de forma descentralizada e sem se configurar compra de voto. Ou seja, devem ser estaduais, não federais



O debate político brasileiro anda muito empobrecido, especialmente por conta dessa hegemonia da esquerda que monopoliza as virtudes e rotula os oponentes, em vez de focar nos argumentos. É “direita hidrófoba” pra cá, “rotweiller” pra lá, e nada de rebaterem os pontos abordados pelos liberais e conservadores.

Na tentativa de superar essa barreira ideológica, gostaria de apresentar uma agenda de propostas que, creio, seriam fundamentais para colocar o Brasil na rota do crescimento acelerado e sustentável, ao contrário desses voos de galinha medíocres que vemos hoje. Não importa a cor do gato, desde que ele pegue o rato. Vejamos:

1) Reforma tributária: ninguém aguenta mais tantos impostos e, principalmente, tamanha complexidade de tributos. Leva-se 2.600 horas para pagar impostos por aqui, e trabalhamos até maio só para bancar o estado. É preciso simplificar e reduzir a carga tributária, urgentemente. Para tanto, é necessário cortar gastos públicos;

2) Reforma previdenciária: nosso modelo atual é uma bomba-relógio, e não há elo algum entre o que foi poupado e o que é recebido de aposentadoria, especialmente no setor público. Precisamos de contas individuais em um modelo de capitalização, de preferência privado, como é no Chile. Os brasileiros precisam ser sócios do capitalismo;

3) Reforma trabalhista: nossas leis trabalhistas são anacrônicas, ultrapassadas e inspiradas no fascismo. É hora de flexibilizá-las, de dar mais autonomia para os acordos individuais entre trabalhadores e patrões, enfrentando as máfias sindicais com coragem e tornando a adesão aos sindicatos voluntária, sem o imposto indecente que pagamos;

4) Privatizações: é preciso retomar o projeto de privatizações, que foi tão importante para nossa economia. O atual governo criou mais estatais, e as privatizações que fez foram malfeitas. É preciso pulverizar o capital da Petrobras, do Banco do Brasil, dos Correios, da Eletrobrás e da Caixa entre o povo brasileiro. Afinal, o petróleo é nosso ou não é?

5) Reforma educacional: o modelo atual custa caro e não educa quase ninguém. Precisamos de vales-educação que garantam a liberdade de escolha dos mais humildes, que passariam a colocar seus filhos em escolas particulares. A meritocracia precisa ser adotada também. Os melhores professores devem receber mais, e os melhores alunos devem se destacar, sem o fardo dessa mentalidade igualitária dos fracassados, que querem nivelar tudo por baixo. É hora de acabar com as cotas raciais também, pois a segregação apenas fomenta o racismo;

6) Segurança: não dá mais para o país ser refém dessa visão ideológica que trata bandidos como se fossem vítimas da “sociedade”. Há que se cobrar responsabilidade individual pelos atos de cada um, e punir com severidade aqueles que desrespeitam as leis. A impunidade é o maior convite ao crime. Bandidos mascarados que fingem ser jovens idealistas também precisam ser enfrentados com todo o rigor da lei, não importa o quanto recebam de apoio dos artistas e intelectuais da esquerda caviar;

7) Reforma política: nosso federalismo existe apenas no nome, e o governo central concentra poder demais. É preciso devolver o poder para mais perto dos cidadãos, retirando-o de Brasília. O voto deve ser distrital e facultativo. Deve-se acabar com o financiamento público de campanha que existe por meio de “horário gratuito” e “fundo partidário”. Somente indivíduos devem financiar partidos. Empresas não votam;

8) Paternalismo: o Estado não é papai de ninguém, e o povo não é súdito. É necessário acabar com essa tutela paternalista do Estado, e delegar mais liberdade, cobrando responsabilidade. Não cabe ao governo nos proteger de nós mesmos, mas sim de terceiros;

9) Assistencialismo: programas de ajuda aos mais pobres podem existir, desde que de forma descentralizada e sem se configurar compra de voto. Ou seja, devem ser estaduais, não federais, e programas de Estado, não de governo. Deve ter uma clara porta de saída. É absurdo celebrar um programa que, a cada ano, incorpora mais dependentes das esmolas estatais;

10) Política externa: o Mercosul virou uma camisa de força ideológica, atrasando nossa abertura comercial. É preciso fechar vários acordos bilaterais, reduzir as barreiras protecionistas e mergulhar, de vez, na globalização, abandonando esse infantil ranço antiamericano.

Essa agenda faria a economia brasileira deslanchar, não tenho dúvidas. O problema é que nenhum partido chega perto de defendê-la. Todos pregam ainda mais Estado. E ainda tem gente que coloca a culpa da miséria do debate na direita!

Exército do surfe - DORA KRAMER


O Estado de S.Paulo - 12/11

Pesquisa do Ibope publicada em 3 de novembro no Estado mostra que a perda de pontos na avaliação do governo de junho para cá foi mais acentuada, e a recuperação bem menor, entre os eleitores de menos idade, maior escolaridade, faixa de renda acima de cinco salários mínimos, residentes em cidades médias e grandes.

O radar do ex-presidente Lula da Silva captou a mensagem e transformou parte dela no tema principal do discurso feito no dia da eleição para a presidência do PT, defendendo uma reaproximação do partido com os jovens.

Juventude esta um tanto desencantada com o petismo e sensível às inovações propostas pela ex-senadora Marina Silva.

Os números realmente apontam para a existência de pedras no caminho. Em junho, antes dos protestos, todas as faixas - de 16 a mais de 55 anos de idade - davam à presidente Dilma Rousseff mais ou menos o mesmo índice de aprovação, 56%. Em julho, apenas 27% dos pesquisados entre 16 e 24 anos mantinham essa posição; em novembro eram 32% - recuperação de cinco pontos porcentuais.

Na faixa dos 24 aos 34 anos de idade, 28% tinham uma avaliação positiva em julho e 34% em novembro; acréscimo de seis pontos porcentuais. Ambos os índices muito distantes (mais de 20 pontos) da expectativa do setor de propaganda do governo que imaginava reaver todo o patrimônio perdido nesses quatro meses.

Derramado o leite, Lula não ajoelha no milho nem se detém sobre o equívoco de avaliação: trata de convocar o partido a investir na recuperação do prejuízo. Conforme demonstram os dados, ele tem razão no diagnóstico.

Na mesma ocasião, porém, o partido não deu sinal de que já tenha encontrado a maneira de sair da teoria à prática. A não ser a convocação ao discurso "renovador", nada do que se falou tinha aroma de novidade. O partido continuou referido na lógica meramente eleitoral, com Lula repetindo que a prioridade do PT é reeleger Dilma e tirar São Paulo das mãos dos tucanos e foi só.

Os jovens, ao que pareceu, ficaram para uma etapa posterior. Rui Falcão, o candidato favorito, discorreu sobre a bandeira do partido para eventual segundo mandato de Dilma. Qual mesmo? "Reforma tributária". Convenhamos, um tema que não sensibiliza a juventude, o "exército do surfe", numa denominação cantada nos versos da Jovem Guarda.

Em dez anos de poder o PT não demonstrou disposição de arbitrar as divergências federativas inerentes a uma reforma no sistema de pagamento e arrecadação de tributos. Se tiver agora a intenção de enfrentar o problema, antes tarde. Mas, tudo depende da concepção. Segundo Rui Falcão, o PT tem simpatia por uma reforma que contemple aumento de alíquota do imposto de renda e taxação das grandes fortunas.

Em suma: aumento de impostos. Assunto que não mobiliza os jovens, mas irrita sobremaneira o eleitorado da faixa etária de 40 ou 55 para cima, justamente aquela mais simpática à presidente, que nessa toada pode vir a deixar de ser.

Efeitos especiais. Que o governo federal patrocine a exumação do corpo do presidente deposto em 1964, João Goulart, e faça a homenagem póstuma que os militares impediram quando da morte em 1976, está tudo certo: recupera-se uma injustiça e se esclarece se há fundamento nas suspeitas de que Jango foi assassinado ou se morreu de infarto.

Desnecessário, porém, e até mesmo inadequado, pois recende a exploração política, é o Planalto mobilizar partidos e entidades simpatizantes para tentar transformar a exumação em um acontecimento artificialmente popular, com cortejo do translado dos restos mortais em São Borja (RS) e Brasília.

Determinadas ocasiões requerem um toque de sobriedade e a contenção do impulso de transformar todo e qualquer fato em festim ideológico/governista.

A autonomia do Banco Central basta - ANTÔNIO DELFIM NETO


VALOR ECONÔMICO - 12/11

Na frustrada tentativa de dar independência jurídica ao Banco Central do Brasil na manobra da taxa básica de juros (Selic) para manter a expectativa inflacionária, e a taxa de inflação ela mesma, em torno da meta de 4,5%, argumentou-se que a medida seria semelhante à de Tony Blair. Ele tomou posse sob forte desconfiança dos mercados (acostumados ao liberalismo do período Thatcher) e a dissipou instantaneamente concedendo independência ao Banco da Inglaterra.

Salvo melhor juízo de historiador mais informado, o que Blair fez, na sua primeira medida do novo governo, foi retirar o controle da taxa de juros básica do chancellor of the Exchequer (o mais pomposo nome que já se inventou para ministro da Fazenda), para um novo Monetary Policy Committee (MPC), ou Comitê de Política Monetária.

É óbvio que os mercados precisariam ter muita fé, ou muita ingenuidade, para acreditar que um comitê criado pelo governo, cujos membros são nomeados por ele, que trabalha para atingir um objetivo fixado por ele, é independente dele!

Concretamente, o governo (o presidente) do Banco da Inglaterra, e também do MPC, escreveu várias cartas ao ministro da Fazenda explicando os desvios da meta: 1) o aumento do custo da energia; 2) a desvalorização da libra em 2007-08 e o aumento do seu pass-through ; e 3) o efeito da redução do imposto sobre valor adicionado (VAT) de 2,5% de 12/2009 a 12/2010. Tudo muito semelhante a um país que todos conhecemos, com exceção que eles estão hoje com uma inflação de 2,6%, muito parecida com a meta.

O mundo assistiu há menos de dois meses uma guerrilha para a nomeação do novo presidente do Fed (o banco central dos EUA), que deixou Obama numa situação muito delicada. Alguém pode acreditar que ele (ou melhor, ela) será independente, ou mais sutilmente, indiferente ao lado ganhador? Mais severa, por exemplo, com a taxa de desemprego do que com a taxa de inflação? Absolutamente, não. Mas não será para atender a interesses ou por maldade, mas sim porque não existe uma ciência monetária no sentido de ciência dura , em que o universo é relativamente estável e as mesmas ações tendem, em geral, a produzir as mesmas respostas . Seu universo não é ergódico: o futuro é essencialmente incerto, tende a não repetir o passado e, mais ainda, recusa submissão a leis probabilísticas. Trata-se no fundo de um processo de alta complexidade, em que as emergências (as rupturas, as crises) são certas, mas imprevisíveis.

Isso está longe de sugerir que os precários conhecimentos de que dispomos e o aperfeiçoamento de nossos modelos são inúteis. Pelo contrário, eles evidenciam a sua própria necessidade e indicam que devemos ter a maior humildade diante dos terríveis sacrifícios que podemos impor aos pacientes de nossas recomendações.

Entende-se facilmente por que, para os clássicos (Adam Smith, Karl Marx, Marshall, Maynard Keynes, Veblem e outros menores), a economia, se for alguma coisa, há de ser uma disciplina moral , não para apenas fazer o bem, mas para evitar o mal que seus erros podem produzir.

É mais do que claro que as políticas monetárias postas em prática desde a crise do Lehman Brothers apenas evitaram o pior e que o ajuste fiscal que as acompanhou destruiu as finanças dos países cuja administração foi corrompida pela aceitação irresponsável de incentivos aos derivativos financeiros.

Esses instrumentos pareciam estimular o desenvolvimento econômico, enquanto escondiam, atrás de uma sofisticação matemática, consequências macroeconômicas que nem a sociedade, nem os governos e seus bancos centrais entendiam. Elas produziram a maior crise do capitalismo desde os anos 30 do século passado.

A prova disso está nas declarações do pragmático Alan Greenspan (o El-Maestro de 2006) quando declarou, honestamente, em 2011, que talvez tenhamos tido maior crença nos mercados financeiros e nas teorias que o sustentavam do que deveríamos , e na confissão de Ben Bernanke, um teórico reconhecidamente competente, que explorou como ninguém as consequências da crise de 1930 e que disse, em 2013, que estamos navegando sem bússola, em noite escura e mar revolto . As recentes indefinições dos bancos centrais são apenas uma manifestação das incertezas que assombram os formuladores da política econômica em todo o mundo.

É cada vez mais claro que os efeitos do quantitative easing perderam eficiência na margem, mas que retirá-los (o tapering ) não é uma tarefa trivial. O Federal Reserve está enrascado no problema de como realizá-lo sem produzir um terremoto nos mercados financeiros mundiais.

Por outro lado, a política de anunciar o comportamento do banco central ( forward guidance ) não limitada a condicionalidades físicas, mas apenas ao calendário da sua execução, pode apresentar problemas (como é o caso de nossa política cambial).

Em poucas palavras, não precisamos de novidades na política monetária. O necessário é auxiliá-la com uma política fiscal adequada, que se comprometa de forma crível a reconduzir a expectativa da inflação para a meta de 4,5%, num horizonte aceitável. Como ninguém sabe muito bem como fazê-lo, é preciso de disposição firme do governo, muito cuidado e alguma paciência.