quarta-feira, 25 de julho de 2012

Ivan Ribeiro, o poeta


by Ricardo Queiroz Pinheiro


Trabalhar em bibliotecas tem suas vantagens e desvantagens, como em todo trabalho. Estar no meio de livros de das várias possibilidades de informações pode ser visto como grande privilégio. Mas tendo a cachaça, também há que se ter os tombos. Falta de recursos, de uma política definida, abandono, problemas estruturais, busca de uma identidade, estas são algumas das dificuldades enfrentadas numa biblioteca pública.
Mas ainda existem as pessoas...
Hoje fui a trabalho num espaço que existe há 11 anos, criado e gerido pela Divisão de Biblioteca de SBC. O Troca Livro, que fica no centro da cidade. Trata-se de uma espécie de sebo público, explico melhor: neste espaço você pode trocar seu livro, cd, LP, revista usados por algum do acervo que lhe agradar. Como não há fim lucrativo, esta troca funciona no um por um e obedece a certos critérios de relevância e estado físico do material trocado. É um serviço que tem excelente resposta do público Política pública.
O Troca Livro foi só mote.
No meio da tarde ouvi uma fala animada, um tanto ansiosa, de um rapaz que é frequentador do espaço. Aos poucos fui sabendo quem era. Ivan Ribeiro, 30 anos, que veio da Bahia muito pequeninho (segundo ele) para São Bernardo do Campo. Ivan contava de uma forma engraçada de como tinha sido atropelado recentemente.
Ouvi aquilo, saí da sala contígua e fui conversar com ele. Ivan se confessou um poeta distraído que anda pela cidade. O atropelamento foi numa dessas distrações e entrou na cota de sua poesia.  Embalamos um papo no começo meio torto, naquela desconfiança mútua.
O rapaz conta que entrou e saiu de várias instituições de tratamento psiquiátricas durante a vida. Conta pela metade, não importa, não quero detalhes, tampouco ele quer dizer. Sua mãe tem problemas de saúde e os dois moram juntos, de algum jeito um cuida do outro. Vida dura.
Ele diz certeiro que não quer cozinhar as palavras no passado. Olhar pra frente. Ivan tem muito que fazer na vida e tem talento, bastante.
Falei do blog, do meu blog, citei o nome Klaxonsbc, brilho diferente no olhar do poeta Ivan detectou Oswald. E diz ter um poema que dialoga com inspirador do nome do meu blog. Ivan tem o seu próprio blog onde se expressa, onde conserva seus poemas:  Na Toca do Noturno.

Em digressão voltamos, ele fala da luta social, o movimento antimanicomial no qual milita da resistência, começo a enxergar a integridade do poeta. Não pelo engajamento em si, mas pelo projeto, vida.
Nada desse papo da arte que salvou, da cultura que salvou. A força da experiência e as agruras sim deram a poesia, o seu relato, a sua força. A poesia se apropriou da historia de vida do Ivan.
E a nossa fala entrecortada, dois ansiosos, voltou ao Oswald, ao blog, comento um texto que escrevi sobre a Cracolândia. De novo a afinidade, Ivan diz que dialogou com Oswald, especificamente com o poema "Pronominais", trocando o tema original do cigarro pelo tema contemporâneo, o crack.
O erro de português formal com seu novo relevo.
E o papo virou de velhos camaradas, e reforça o que eu disse no começo do texto: mais do que estar entre livros e informações, o que importa em trabalhar numa biblioteca pública é encontrar as pessoas e com elas trocar as idéias que afinam ou desafinam as nossas convicções, pessoas que fazem valer a pena lutar pela manutenção dos espaços públicos de convivência.
Poetas, calados, sonoros, discretos, prolixos, incômodos, incógnitos, gente que vem e que vai. Muitos dos quais frequentam anos a fio as bibliotecas e mal sabemos o nome, outros que encontramos nestas tardes perdidas e ficamos sabendo tanto deles. Estas surpresas que só podem nascer das pessoas.
Pronominais
Oswald de Andrade
Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro ''
e a versão do camarada Ivan:
Prô! No Minais?
Dê-me um careta
Diz à grama... Tica,
De professora foi
Há tempos, hoje é
Aluna da vida...
Um careta! Só um
Careta dar-lhe-ia à
 Dona Tica, uma
Grama... Ah, Tica!
 
 
Pois a boa preta a
Boa branca; damas
Da Nação mal parida,
 Choram do dia à noite
 Sem preocuparem-se  
Como é ser dama, pois
Preocupam-se é com
A grama,...Tica, diz aos
Seus alunos;...
Pô, meu! Pára com isso
Me dá um careta, aí!?
 
 
_Fêssora,... Cê tá é
Brisando!... Cê tem
Bic aí pro careta?
 
 
Deixa disso aluno,
Me manda logo o Bic;
É que eu quebrei a
Pedra! Tem outra, aí?
Se, tem! Sua nota é dez!
 
 
               Ivan Ribeiro
“Com licença poética, ó meu caro
Oswald de Andrade!”



A moral do moral Respeitar a moral é atributo cultural, manter o moral é qualidade do líder



Eugênio Mussak (redacao.vocesa@abril.com.br)  

Crédito: Ilustrações: Sandro Castelli
 - Crédito: Ilustrações: Sandro Castelli
A palavra moral vem do latim morale, que significa "relativo aos costumes". Trata-se de um verbete bem conhecido e muito aplicado nas relações humanas em geral e no ambiente corporativo em particular. O que muitas vezes nos escapa é que moral é um substantivo que muda de sentido ao mudar de gênero. 

Se for feminino, será relativo ao conjunto de regras consideradas boas e éticas em um grupo humano ("Aqui na empresa não concordamos com atitudes que ofendam a moral e os bons costumes..."). Já, se for masculino, refere- se a algumas qualidades do comportamento, como brio, determinação, força de vontade, perseverança ("O importante é manter alto o moral da tropa..."). 

Ainda que estejam conectados, os dois conceitos de moral têm diferentes tratamentos e aplicações. Quando se trata de respeito à moral, estamos falando de um traço cultural, uma qualidade da organização como um todo, que percebe que a conduta ética é condição para que se construam uma reputação sólida e uma empresa capaz de se perenizar. 

Mas, quando falamos do moral dos funcionários, do time, estamos nos referindo a um conjunto de qualidades que motivam as pessoas a permanecer firmes apesar dos solavancos do caminho. Enquanto respeitar a moral é atributo cultural, manter o moral é qualidade do líder. A moral é definida e praticada pelos diretores e seguida por todos na organização. 

O moral é mantido pelos gerentes, os responsáveis por gerir diretamente as equipes de trabalho. Este assunto me foi colocado por um gerente. Os gerentes podem ser definidos como a liderança intermediária nas empresas. Enquanto os diretores se ocupam com a estratégia, cabe aos gerentes criar a tática para transformar a estratégia em operação. 

São suas palavras: "A mim cabe manter alto o moral da equipe. Mas eu pergunto: como faço para manter meu próprio moral? Você não acha imoral que eu esteja entre a pressão das exigências dos diretores e a resistência dos funcionários, ainda que ambos tenham razão?". E afinal, qual a moral desta história? Que não se mantém o moral se não se respeitar a moral.

O que vale mais, o escritor ou o livro?


Por José Roberto Torero em 24/07/2012 na edição 704
Reproduzido da Agência Carta Maior
Se você está escrevendo seu primeiro livro, aconselho a gastar menos tempo com o texto e mais com sua autobiografia. Invente algo bem criativo. Diga que tem dois sexos, que é especialista em magia negra, que sua mãe assassinou seu pai e que foi amamentado por lobos. E, se der uma entrevista, não esqueça de uivar no final.
O que é mais importante, o criador ou a criatura? Eu prefiro a criatura. Não me importa muito se um autor tem 18, 68 ou 118 anos, se é um office-boy, um acadêmico ou uma stripper, se nasceu na Mooca, em Londres ou em Pokhara, a cidade-lago do Nepal. O que me importa é o livro. Mas muitos preferem o escritor.
É claro que tem o seu sabor saber quem escreve uma obra. Eu mesmo, quando pego um livro na livraria, dou aquela olhada na orelha para ver a foto do autor e ler sua biografia. Mas isso deve ser apenas a cereja do bolo, não seu recheio; deve ser apenas uma nota de rodapé, não a cabeça da reportagem. O culto à personalidade tem crescido tanto que em várias resenhas você fica sabendo onde nasceu o escritor, com quem ele é casado e o escândalo que deu em sua adolescência, mas quase nada sobre a obra. A orelha está sendo mais valorizada do que as páginas do livro.
O mais importante
O cartunista Laerte, por exemplo, é brilhante desde os tempos da editora Oboré, quando fazia ilustrações para sindicatos, mas nunca ganhou tanto destaque quanto depois de praticar o crossdressing. João Ubaldo é provavelmente nosso melhor romancista vivo, mas nos últimos anos lembro mais de reportagens sobre seu problema com álcool do que críticas a seus livros. Uma imensa injustiça. Dalton Trevisan e Rubem Fonseca são escritores excelentes, dois dos nossos melhores contistas. Mas sempre são lembrados pelo fato de não darem entrevistas, de serem um tanto reclusos. Ou seja, não quererem ser notícia que os transforma em notícia. É como se a crítica estivesse mais para revista Caras do que paraJornal de Resenhas.
Este culto à personalidade do autor não é exclusividade do Brasil. Lá fora acontece o mesmo. Talvez até mais. Um bom exemplo é JT LeRoy. Ou Jeremiah Terminator LeRoy. A história é a seguinte: Laura Albert, uma ex-punk, já passada dos trinta anos, queria ser escritora. Mas percebeu que sua persona era pouco interessante. Então inventou JT LeRoy para assinar seus livros. Ele seria um jovem de quinze anos, ex-viciado em heroína, que teria sofrido abuso sexual na infância e se prostituído para sobreviver. Os dois primeiros livros de JT fizeram bastante sucesso. No começo, ele (ou melhor, Laura) só dava entrevistas por telefone. Mas logo ela arranjou uma modelo (sua cunhada Savannah Knoop) para se passar por JT. Assim a personagem passou a aparecer em público, a falar com celebridades e a ir a festas, muitas festas. Até para a Flip JT foi convidado.
Dez anos depois, quando a farsa foi descoberta, um diretor de cinema que tinha comprado os direitos para filmar um de seus livros quis desfazer o negócio. Seu argumento foi de que, mais importante que a história, era a persona de seu autor que traria sucesso à produção. E ele ganhou a causa.
Não esqueça de uivar
Claro que se trata de um caso extremo. Mas os casos extremos servem para evidenciar o que é um tanto sutil, um tanto subterrâneo.
Creio que muito deste culto ao autor é culpa dos autores românticos, que buscavam o mito de escritor maldito, de serem bafejados pelos deuses (ou pelos demônios). Eles devem ter conquistado muitas senhoritas assim. Mas, de quebra, deram ao escritor uma aura que o deixa diferente dos outros mortais. Uma bobagem.
Não se quer saber a biografia do médico que nos opera, do marceneiro que fez nossa mesa, nem do professor que ensina nossos filhos (o que seria bem mais importante). Mas do escritor, sim. E ela não tem a menor importância. Pelo menos, não literariamente.
De qualquer forma, se você está escrevendo seu primeiro livro, aconselho a gastar menos tempo com o texto e mais com sua autobiografia. Invente algo bem criativo. Diga que tem dois sexos, que é especialista em magia negra, que sua mãe assassinou seu pai e que foi amamentado por lobos.
E, se der uma entrevista, não esqueça de uivar no final.
***
[José Roberto Torero é formado em Letras e Jornalismo pela USP, publicou 24 livros, entre eles O Chalaça(Prêmio Jabuti e Livro do ano em 1995), Pequenos Amores (Prêmio Jabuti 2004) e, mais recentemente, O Evangelho de Barrabás. É colunista de futebol na Folha de S.Paulo desde 1998. Escreveu também para oJornal da Tarde e para a revista Placar. Dirigiu alguns curtas-metragens e o longa Como fazer um filme de amor. É roteirista de cinema e TV, onde por oito anos escreveu o Retrato Falado]

Luz, câmera, esculhambação Por João Ubaldo Ribeiro em 24/07/2012 na edição 704



Reproduzido do Estado de S.Paulo, 22/7/2012; intertítulos do OI
Meu avô de Itaparica, o inderrotável coronel Ubaldo Osório, não era muito dado a novas tecnologias e à modernidade em geral. Jamais tocou em nada elétrico, inclusive interruptores e pilhas. Quando queria acender a luz, chamava alguém e mantinha uma distância prudente do procedimento. Tampouco conheceu televisão, recusava-se. A gente explicava a ele o que era, com pormenores tão fartos quanto o que julgávamos necessário para convencê-lo, mas não adiantava. Ele ouvia tudo por trás de um sorriso indecifrável, assentia com a cabeça e periodicamente repetia “creio, creio”, mas, assim que alguém ligava o aparelho, desviava o rosto e se retirava. “Mais tarde eu vejo”, despedia-se com um aceno de costas.
O único remédio que admitia em sua presença era leite de magnésia Phillips, assim mesmo somente para olhar, enquanto passava um raro mal-estar. Acho que ele concluiu que, depois de bastante olhado, o leite de magnésia fazia efeito sem que fosse necessário ingeri-lo. Considerava injeção um castigo severo e, depois que as vitaminas começaram a ser muito divulgadas, diz o povo que, quando queria justiçar alguma malfeitoria, apontava o culpado a um preposto e determinava: “Dê uma injeção de vitamina B nesse infeliz.” Dizem também que não se apiedava diante das súplicas dos sentenciados à injeção de vitamina, enquanto eram arrastados para o patíbulo, na saleta junto à cozinha, onde o temido carcereiro Joaquim Ovo Grande já estava fervendo a seringa. (Naquele tempo, as seringas eram de vidro e esterilizadas em água fervente, vinha tudo num estojinho, sério mesmo.)
“Amoleça a bunda, senão vai ser pior!”, dizia Ovo Grande, de sorriso viperino, olhos faiscantes e agulha em riste, numa cena a que nunca assisti, mas que não devia ser para espíritos fracos.
Um furtivo pecadilho
Sim, mas acabo fazendo a biografia de meu avô e não chego ao assunto que, pelo menos quando me sentei faz pouco para escrever, tinha a ver com fotografia. O coronel não evitava codaques, nome por que chamava indistintamente qualquer máquina fotográfica, mas só admitia ser fotografado se houvesse a preparação que ele considerava essencial. Nada do que então se chamava “instantâneo”. Ele fazia a barba, tomava banho, vestia paletó e gravata, botava perfume e posava imóvel como uma rocha, diante da codaque. Daí a um mês, mais ou menos, as fotos voltavam, reveladas e copiadas, de um laboratório da cidade – e sua chegada era uma espécie de festa, que reunia parentes, amigos e correligionários.
Se o coronel estivesse vivo hoje, acho que acabaria tomando o leite de magnésia. Aproxima-se o dia em que seremos filmados, fotografados e monitorados em absolutamente todas as circunstâncias, inclusive no banheiro. Claro, reconheço que deliro um pouco, mas somente um pouco, quando imagino que, num futuro em que a água será escassa, cada morador terá cotas para todo tipo de uso da água e sofrerá penalidades diversas, se ultrapassá-las. Facilmente, a monitorização saberia quantas vezes e com que finalidade o freguês usou o vaso, estatística talvez considerada indispensável para a formulação de políticas sanitárias e de saneamento básico. Não saberemos como teremos vivido sem isso, até então.
Entrando em elevadores, dei para perceber gente olhando para as câmeras e se ajeitando como se fosse entrar no ar dentro de alguns instantes. Algumas moças chegam mesmo a passar a mão na nuca e ajeitar faceiramente os cabelos com um movimento de cabeça, como nos comerciais de xampus. Foi-se a manobra, tão praticada em gerações pretéritas, em que, tendo-se a sorte de encontrar no elevador a dadivosa e adrede acumpliciada vizinha do 703, apertava-se o botão de emergência, parava-se a cabine entre dois andares e davam-se os dois a um furtivo e inesquecível pecadilho da carne. O clipe já estaria no YouTube assim que ambos chegassem em casa, com dezenas de “visualizações”, inclusive do marido e da família da vizinha.
“Desta vez eu saio no Fantástico
Antigamente, a gente só tinha que dizer “que gracinha”, “que beleza” ou “muito interessante” umas duas ou três vezes por amigo de boteco, no máximo. Era quando ele mostrava a foto da última neta, o retrato de toda a família junta ou um documento velho. Hoje a gente assiste a várias dezenas de clipes de celulares e sucessões de slides por dia, enquanto todo mundo fotografa e filma todo mundo, o tempo todo.
E outro dia, num noticiário de TV, apareceu a notícia de um sequestro-relâmpago em que um dos sequestradores filmou tudo com seu celular. Fico querendo adivinhar qual a razão para isso e me ocorre que, em muitos criminosos, suas ações talvez despertem um certo orgulho autoral e eles agora têm muitos recursos para documentar seus feitos para a História. De qualquer maneira, presenciamos o primeiro making of de um ato criminoso e espero somente que algum filósofo francês não saiba disso e publique um livro designando essa atividade como uma nova forma de arte, para que depois um porreta de uma agência governamental qualquer ache isso científico e premie com absoluta impunidade qualquer assalto, ou semelhantes, para o qual o seu autor haja preparado um making of de qualidade, gerando empregos e estimulando a arte. É bom viver onde o seguinte diálogo pode ocorrer:
“Então, como se foi de assalto hoje?”
“Ah, legal. Só faltou me levar as calças, mas em compensação a crítica considera esse cara o melhor diretor de filmagem de assalto do Brasil, tablete de 12 megapixels, tudo muito profissional. Desta vez eu saio no Fantástico com certeza.”
***
[João Ubaldo Ribeiro é jornalista e escritor]

As drogas e aqueles que se comportam como se estivessem acima da lei mesmo no exercício de um cargo público



Vamos nos divertir um pouco. Este post traz, ali abaixo, um vídeo. Antes, algumas considerações.
Alguns leitores afirmam que errei ao afirmar que Pedro Abramovay, o, por assim dizer, cérebro da campanha “É Preciso Mudar”, foi demitido da Secretaria Nacional de Justiça por defender o fim da prisão de pequenos traficantes. “Foi da Secretaria Nacional de Políticas Sobre Drogas (Senad)”, alertam. Mais ou menos ou quase. Ele estava ainda na de Justiça e já havia sido indicado para a Senad quando deu aquela declaração infeliz. Foi imediatamente desautorizado pelo ministro José Eduardo Cardozo (Justiça), por determinação da presidente Dilma Rousseff.
Eu pago um preço relativamente alto por ser claro, por evitar ser “ambíguo e anfíbio”, para citar um membro da ABL num embate com um confrade seu. E, por isso, sou bastante duro com certas áreas pastosas do pensamento e da militância. Cada um arque com o peso do que pensa, sem dar truque. A campanha “É Preciso Mudar” tem de deixar claro o que pretende aos milhões de brasileiros que a ela estão expostos. Aquele chororô lacrimoso que já foi banido, felizmente, até das novelas da Globo engana, trai a confiança dos desavisados. O cara do outro da tela tem o direito de saber qual é a proposta. E não sabe.
Um dos presentes ao lançamento da campanha diga-se, era Carlos Minc, atual secretário do Meio Ambiente do Rio. Declarou o seguinte no dia: “Apoio o mandato da Dilma, mas acredito que, nesse assunto, ela não deu bons passos”. Huuummm… POIS É! EU NÃO APOIO O MANDATO DE DILMA E ACREDITO QUE, NESSE ASSUNTO, ELA DEU AO MENOS UM BOM PASSO: DEMITIR ABRAMOVAY!
Minc estava lá, é? Faz todo sentido. No dia 10 de setembro de 2009, publiquei um post sobre esse senhor. Fossem as leis seguidas no Brasil, ele poderia estar prestes a deixar a cadeia.  Por quê? Reproduzo parte daquele texto. Ele ainda era ministro do Meio Ambiente. Os novos leitores talvez o ignorem. No fim, tem filminho, que não deve ser visto por crianças.
*
Houvesse juízes no Brasil em número – e coragem – suficiente, o ministro Carlos Minc, do Meio Ambiente, seria condenado à pena de um a três anos de cadeia. Se iria em cana ou não, bem, aí dependeria de um conjunto de fatores: eu seria tentado a trocar a punição por trabalho. Isto: Minc seria obrigado à maldição bíblica. Teria de ganhar o pão com o suor do próprio rosto. So pra saber como é.
Cana por quê? Ele tem de ser enquadrado no parágrafo 2º do artigo 33 da Lei 11.343, que trata do combate às drogas. No domingo, no show de um grupo de reggae chamado Tribo de Jah, na cidade de Alto Paraíso, perto da Chapada dos Veadeiros, em Goiás, o valente subiu ao palco para pregar a descriminação da maconha. Pregou só a descriminação? Ora, vejam o vídeo vocês mesmos. Minc fazendo um discurso daquele na Chapada dos Veadeiros vale por uma celebração metalinguística.
Algumas pessoas ficam com a voz embargada de emoção. Minc é do tipo que fica com a voz pastosa. Engrolando aquela língua estranha, que rompe com a lógica e vai juntando alhos com bugalhos, o ministro subiu ao palco e deu vivas a Bob Marley, a Chico Mendes, à Paz, à resistência e conclamou: “Não vamos deixar queimar a Amazônia”. Parecia discurso de gente chapada.
E isto, gente! Nada de queimar a Amazônia!
Minc não queima a Amazônia!
De jeito nenhum! A Amazônia, Minc não queima!
E também falou em defesa do cerrado, da caatinga, da Mata Atlântica, pediu que todos fechassem os olhos e abraçassem a amiga, o amigo, beijassem a namorada, o namorado… A droga, que mata milhares de pessoas por ano no Brasil — ou por causa do narcotráfico ou em decorrência dos malefícios advindos do consumo — era tratada ali como o elixir da paz. E os presentes gritavam “Maconha! Maconha!”.
Então o homem resolveu pensar! Transcrevo um trecho. Importante dizer que, enquanto falava, Minc dançava. Metido num daqueles coletinhos eloqüentes, movia o barrigão e o “traseiro gordo” (by Fucker & Sucker) de modo um tanto constrangedor. Peço que atentem para a lógica severa da fala:
“Vamos acabar com a impunidade. Daí a importância da música, a consciência da rapaziada. Vamo defender o cerrado, a caatinga, a Amazônia, a Mata Atlântica e o o reggae, o reaggae é a liberdade.”
Um maluco gritava:
- A Maconhaaaa!!! E o pré-sal!!! O pré-sal!!!
Voltemos com Minc.Outro recado. Ontem, a gente meteu três a um na Argentina. Só que tem um outro placar que a gente ta perdendo da Argentina. Os juízes da Argentina descriminalizaram o usuário. O usuário não é criminoso. E esse jogo, a gente está perdendo aqui. Nós vamos virar esse jogo. Nós vamos acabar com a hipocrisia. Consciência! (…) Viva a Tribo de Jah! Viva a consciência ecológica! Viva a natureza! Viva a liberdade!
Espertinho, Minc não pronuncia a palavra “maconha”. Deixa pra galera!
Já expus em outras ocasiões as razões por que as drogas não devem ser descriminadas  — e é preciso falar de todas as drogas, não só da maconha, como se faz habitualmente, num truque vagabundo. A questão, aqui, é outra. No conjunto da obra, a atuação de Minc vai muito além da defesa da descriminação.
Atenção!
Há quem, parece, acredita que a maconha deva ser descriminada porque o dano da liberação seria inferior ao da repressão. Até onde entendo, é a posição de FHC, por exemplo. Está errado! Erradíssimo! Deveria parar de falar no assunto. Pensou mal a questão. Ademais, foi presidente da República por oito anos. Por que não tomou, então, as medidas consequentes? Porque um país não faz isso sozinho. Sua opinião está virando coisa de diletante. E vai acabar se misturando com irresponsáveis como Minc.
Este ministro, como nota, não está tratando da descriminação como um mal menor. Nada disso! Ele acredita nos valores positivos da maconha; ele acredita, como se nota, que ela abra os umbrais de uma nova consciência. Qualquer um sabe o que significa um “viva” a Jah e sua tribo!
FHC diga o que quiser, não é problema meu. Se sou de um partido da oposição digno deste nome — e desde que não defenda, claro, a liberação da maconha — pego este vídeo do Coroa do Rio e levo ao ar no horário eleitoral. Os brasileiros precisam saber o que pensa o ministro do Meio Ambiente. Enquanto mães arrastam a sua tragédia nas favelas do Brasil, enterrando seus filhos, perdendo-os para o narcotráfico, Minc brinca de fechar os olhos no placo e dar “vivas” à liberdade. A gente sabe bem o que isso significa.
Política de redução de danos, por mais idiota que seja, é bem-intencionada. A de Minc implicaria um aumento brutal dos danos. Entre outras razões, as pessoas podem passar a discursar como Minc…
Ademais, o Brasil não deve nada à Argentina nesse quesito. A mesma lei que pune a apologia das drogas — e Minc fez apologia — já protege o usuário. Basta ler o Artigo 28. Aliás, ele tem até direito à assistência gratuita do Estado — sim, é uma obrigação pública tratar do drogado. Enquanto ele está dando vivas às drogas, não podemos importuná-lo com questões ou leis porque seria autoritário, reacionário. Quando o filho da mãe está todo estropiado, aí merece a assistência social por conta de um mal que adquiriu por vontade, por escolha, por opção.
A tara de certos brasileiros pelo estado é tal, que a gente estatizou até os viciados.
Ah, só para lembrar. Minc é o ministro que chamou os produtores rurais de “vigaristas”. Honesto é Minc.

Por Reinaldo Azevedo

PSICANÁLISE DA VIDA COTIDIANA A Angústia dos Poetas.


CARLOS VIEIRA
O mundo é feito de pessoas normais e pessoas que têm uma sensibilidade, uma natureza incomum. Natureza essa que pode ser definida como uma capacidade interna e psíquica de apreender além do sensível-sensório. Apreender o que se esconde por detrás das palavras, o não dito, a apreensão da experiência humana sob uma forma metafórica, abstrata e intuitiva. Estou me referindo à sensibilidade estética artística do compositor, do pintor, do músico, do ator, do diretor de cinema, do escritor e principalmente dos poetas. 
Carlos Drummond de Andrade, um dos maiores poetas brasileiro e quiçá do cânone da Literatura Universal, em seu poema – “Procura da Poesia” no livro A Rosa do Povo, escreve: “Penetra surdamente no reino das palavras./ Lá estão os poemas que esperam ser escritos,/ Estão paralisados,/mas não há desespero,/ há calma e frescura na superfície inata./ Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário,/ Convive com teus poemas, antes de escrevê-los,/ Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam./ Espera que cada um se realize e consume/ com seu poder de palavra/ e seu poder de silêncio./ Não forces o poema a desprender-se do limbo,/ Não colhas no chão o poema que se perdeu./ Não adules o poema. Aceita-o./ como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada no espaço./ Chega mais perto e contempla as palavras./ Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra/ e te pergunta, sem interesse pela resposta,/ pobre ou terrível, que lhe deres:/ Trouxestes a chave?... 
Então, caro leitor, essa é uma declaração da atitude de um artista antes de compor sua arte, na busca do indizível e da capacidade de apreender a natureza e a natureza humana. 
Penso que o Poeta assim como todos os artistas, os cientistas e os místicos têm essa capacidade de intuir fatos que se encontram no mundo, nunca pensados pelas pessoas comuns. A diferença é que eles são capazes de sofrer angústias primitivas que ainda não podem ser nomeadas. Isso faz das suas vidas, vidas turbulentas, vidas que estão além da nossa comum, e que os coloca em experiências de muita dor psíquica, muita variação de humor e profundos estados de tristeza e alegria. São pessoas aquém e além do tempo em que vivem; são mentes que mergulham em “estados de loucura sana” e afloram com a percepção de experiências psíquicas nunca pensadas. Lembro de Platão quando se refere a essa capacidade de alguns homens apreenderem na natureza fatos não percebidos nem sentidos pelo homem comum. Esses homens são os gênios e os loucos, só que uma loucura de um louco “internado num manicômio sem manicômio”, como escreveu Fernando Pessoa em seu poema – Esta velha angústia -. 
Na experiência psicanalítica hodierna fala-se em “aspectos neuróticos” e “aspectos psicóticos” das pessoas ditas normais. Isso equivale a dizer que somos normais e loucos em alguns momentos da vida. O que faz bela a experiência analítica é que ela oferece subsídios para que nós possamos tirar proveito das nossas “loucuras sanas” e, desse modo, aprendermos e nos identificarmos com o que os poetas escreveram. Um poema só alcança seu objetivo (se é que tem objetivo) quando o leitor sente que o escritor está tocando em experiências profundas que ele viveu e não sabia nomeá-las. 
O autor do livro que deu nome ao atual filme – Na Estrada – Jack Kerouac escreve: “Aqui estão os loucos. Os desajustados. Os rebeldes. Os encrenqueiros. Os que fogem ao padrão. Aqueles que não se adaptam às regras, nem respeitam o status quo. Você pode citá-los ou achá-los desagradáveis, glorificá-los ou desprezá-los. Mas a única coisa que você não pode é ignorá-los. Porque eles mudam as coisas, eles empurram adiante a raça humana. E enquanto alguns os veem como loucos, nós os vemos como gênios. Porque as pessoas que são loucas o bastante para pensarem que podem mudar o mundo são as únicas que realmente podem fazê-lo.” 
Hoje eu quero homenagear essas pessoas, e principalmente os poetas, na letra de Fernando Pessoa, em seu poema “Esta velha angústia”:
“Esta velha angústia 
Esta angústia que trago há séculos em mim, 
Transbordou da vasilha, 
Em lágrimas, em grandes imaginações, 
Em sonhos em estilo de pesadelo sem terror, 
Em grandes emoções súbitas sem sentido algum.
Transbordou 
Mal sei como conduzir-me na vida 
Com este mal-estar a fazer-me pregas na alma! 
Se ao menos endoidecesse deveras! 
Mas não: é este estar entre, 
Este poder ser que... 
Isto.
Um internado num manicômio é, ao menos, alguém, 
Eu sou um internado num manicômio sem manicômio. 
Estou doido a frio, 
Estou lúcido e louco, 
Estou alheio a tudo e igual a todos: 
Estou dormindo desperto com sonhos que são loucura 
Porque não são sonhos, 
Estou assim...
Pobre velha casa da minha infância perdida! 
Quem te diria que eu me desacolhesse tanto! 
Que é do teu menino? Está maluco. 
Que é de quem dormia sossegado sob o teu teto provinciano? 
Está maluco. 
Quem de que fui? Está maluco. Hoje é quem eu sou.
Se ao menos eu tivesse uma religião qualquer! 
Por exemplo, por aquele manipanso 
Que havia em casa, lá nessa, trazido da África. 
Era feiíssimo, era grotesco. 
Mas havia nele a divindade de tudo que se crê. 
Se eu pudesse crer num manipanso qualquer – 
Júpiter, Jeová, a Humanidade – 
Qualquer serviria, 
Pois o que é tudo senão o que pensamos de tudo?
Estala, coração de vidro pintado.”

Com vento e sol, por Miriam Leitão



Enviado por Míriam Leitão - 
25.7.2012
 | 
15h00m

COLUNA NO GLOBO


A necessidade de energia para o Brasil em dez anos será revista para baixo, porque a previsão era de um crescimento de 5% ao ano. Mesmo assim, o Brasil precisa de mais de quatro Itaipus. Em termos absolutos, a maior oferta de energia nova virá das hidrelétricas. A fonte com maior crescimento percentual será a eólica, segundo o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim. “Eólica está bombando”.
— O vento no Brasil é melhor do que nos Estados Unidos, que é melhor do que na Europa. Aqui, o vento é unidirecional e de baixa turbulência — afirma.
Tolmasquim fez uma conta: se todos os países elevarem sua geração de eólica em 2013 no mesmo percentual que em 2012, o Brasil, que hoje está em 20º lugar em capacidade instalada dessa fonte de energia, pode pular para o 10º. Vão entrar em operação os parques que foram contratados há quatro anos.
— Os primeiros leilões foram vazios, depois iniciamos um diálogo com o setor. Hoje, há oito empresas de equipamentos instaladas no Brasil. Nem todas passaram na sindicância que o BNDES fez para verificar o cumprimento da norma de comprar aqui dentro, pelo menos, 60% do equipamento, mas estão se ajustando. Uma das empresas de equipamentos, a Tecsis, de Sorocaba, está exportando para o mundo todo.
O investimento no setor acabou criando mais oportunidade, porque o preço da energia ofertada no leilão caiu a um terço nos últimos anos, de R$ 300 por MW para R$ 100. Segundo Tolmasquim, a energia solar ainda está cara, mas a tendência tem sido a queda do preço dos painéis e das células fotovoltaicas. A ideia da EPE é que no solar, o Brasil estará investindo mais fortemente no final da década, mas alguns pontos estão sendo discutidos agora.
— A Aneel autorizou o medidor bidirecional que permite ao consumidor que tiver instalado painel, eventualmente, mandar para a rede o excedente. Assim, ele teria um desconto em sua conta de luz equivalente ao que ele fornecesse. Está no começo, mas existem já dez áreas de concessão. Hoje, o painel é caro, mas se houvesse isenção de PIS/ Cofins como tem em outros setores, se houvesse a possibilidade de descontar no Imposto de Renda parte do custo do investimento e até se o BNDES financiasse da mesma forma que faz com eficiência energética, haveria interesse crescente.
Vento e sol são as chamadas novas renováveis, ou renováveis alternativas. São as que mais têm potencial de crescimento na matriz brasileira. O mapa do país feito pela EPE com as cores indicando a intensidade da potencialidade da energia solar é impressionante. As cores que representam chance alta de produção, com alto fator de capacidade, se esparramam pelo mapa do país. Na eólica, o que já foi medido também impressiona.
— Em terra, o Brasil tem 143 mil MW de potencial eólico, ou seja, dez Itaipus, e isso com torres de 50 metros. Hoje, já estão sendo instaladas torres maiores com maior capacidade. O potencial offshore não foi nem estudado, porque custa três vezes mais, apesar de produzir duas vezes mais — disse.
Não há fonte sem impacto ambiental, mas algumas têm impacto menor. No caso das eólicas, no Rio Grande do Norte, quando elas estão perto das dunas, há preocupação dos órgãos ambientais. Há linhas de transmissão que ainda não têm licença, apesar de a distância desses parques aos centros consumidores ser bem menor do que no caso das hidrelétricas da Amazônia.
Uma fonte na qual se tinha muita esperança está estagnada: a biomassa, conta Tolmasquim. As PCHs (pequenas centrais hidrelétricas) também não estão aumentando. Mesmo assim, as alternativas vão pular em dez anos de 8% para 16% de toda a capacidade instalada brasileira. Em relação às polêmicas termelétricas a carvão, tudo está parado desde a COP 15.
— A conferência foi um marco. Antes de Copenhague, foram aceitas no leilão três térmicas a carvão. Uma de carvão nacional e duas da OGX de carvão importado. Depois de Copenhague, no entanto, alguns projetos conseguiram licença, mas não aceitamos mais térmicas a óleo ou a carvão. Olhando para o futuro, vemos mais as hídricas e as novas renováveis.
Mesmo sendo a fonte que mais vai crescer em termos absolutos, a hídrica vai cair como percentual da matriz. Dos 47 mil MW contratados — dos 61 mil MW necessários — até 2020, a fonte hídrica responde por 51% e vem das polêmicas hidrelétricas da Amazônia, principalmente Belo Monte, Jirau e Santo Antônio. Teles Pires está em construção também. As do rio Tapajós ainda são projeto. Hoje, já se derrubou a ideia de que se for hídrica é boa. Depende de inúmeros fatores como, por exemplo, o impacto na construção. Há hidrelétricas melhores e outras piores. O debate público tem aperfeiçoado alguns projetos e mitigado agressões ao meio ambiente.
Do contratado, a eólica representa 16%, biomassa 6% e PCH 1%. Entre as fontes não renováveis, o óleo está na frente com 13%, gás natural 7%, carvão 3% e urânio 3%.
O Brasil deve se esforçar para diversificar sua matriz, intensificando o investimento nas novas fontes de baixo impacto ambiental. O movimento recente mostrou que é possível aumentar a presença das alternativas. Em pouco tempo, o país encontrou a direção do vento; deveria se esforçar agora para encontrar a luz do sol.
A necessidade de energia para o Brasil em dez anos será revista para baixo, porque a previsão era de um crescimento de 5% ao ano. Mesmo assim, o Brasil precisa de mais de quatro Itaipus. Em termos absolutos, a maior oferta de energia nova virá das hidrelétricas. A fonte com maior crescimento percentual será a eólica, segundo o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim. “Eólica está bombando”.
— O vento no Brasil é melhor do que nos Estados Unidos, que é melhor do que na Europa. Aqui, o vento é unidirecional e de baixa turbulência — afirma.
Tolmasquim fez uma conta: se todos os países elevarem sua geração de eólica em 2013 no mesmo percentual que em 2012, o Brasil, que hoje está em 20º lugar em capacidade instalada dessa fonte de energia, pode pular para o 10º. Vão entrar em operação os parques que foram contratados há quatro anos.
— Os primeiros leilões foram vazios, depois iniciamos um diálogo com o setor. Hoje, há oito empresas de equipamentos instaladas no Brasil. Nem todas passaram na sindicância que o BNDES fez para verificar o cumprimento da norma de comprar aqui dentro, pelo menos, 60% do equipamento, mas estão se ajustando. Uma das empresas de equipamentos, a Tecsis, de Sorocaba, está exportando para o mundo todo.
O investimento no setor acabou criando mais oportunidade, porque o preço da energia ofertada no leilão caiu a um terço nos últimos anos, de R$ 300 por MW para R$ 100. Segundo Tolmasquim, a energia solar ainda está cara, mas a tendência tem sido a queda do preço dos painéis e das células fotovoltaicas. A ideia da EPE é que no solar, o Brasil estará investindo mais fortemente no final da década, mas alguns pontos estão sendo discutidos agora.
— A Aneel autorizou o medidor bidirecional que permite ao consumidor que tiver instalado painel, eventualmente, mandar para a rede o excedente. Assim, ele teria um desconto em sua conta de luz equivalente ao que ele fornecesse. Está no começo, mas existem já dez áreas de concessão. Hoje, o painel é caro, mas se houvesse isenção de PIS/ Cofins como tem em outros setores, se houvesse a possibilidade de descontar no Imposto de Renda parte do custo do investimento e até se o BNDES financiasse da mesma forma que faz com eficiência energética, haveria interesse crescente.
Vento e sol são as chamadas novas renováveis, ou renováveis alternativas. São as que mais têm potencial de crescimento na matriz brasileira. O mapa do país feito pela EPE com as cores indicando a intensidade da potencialidade da energia solar é impressionante. As cores que representam chance alta de produção, com alto fator de capacidade, se esparramam pelo mapa do país. Na eólica, o que já foi medido também impressiona.
— Em terra, o Brasil tem 143 mil MW de potencial eólico, ou seja, dez Itaipus, e isso com torres de 50 metros. Hoje, já estão sendo instaladas torres maiores com maior capacidade. O potencial offshore não foi nem estudado, porque custa três vezes mais, apesar de produzir duas vezes mais — disse.
Não há fonte sem impacto ambiental, mas algumas têm impacto menor. No caso das eólicas, no Rio Grande do Norte, quando elas estão perto das dunas, há preocupação dos órgãos ambientais. Há linhas de transmissão que ainda não têm licença, apesar de a distância desses parques aos centros consumidores ser bem menor do que no caso das hidrelétricas da Amazônia.
Uma fonte na qual se tinha muita esperança está estagnada: a biomassa, conta Tolmasquim. As PCHs (pequenas centrais hidrelétricas) também não estão aumentando. Mesmo assim, as alternativas vão pular em dez anos de 8% para 16% de toda a capacidade instalada brasileira. Em relação às polêmicas termelétricas a carvão, tudo está parado desde a COP 15.
— A conferência foi um marco. Antes de Copenhague, foram aceitas no leilão três térmicas a carvão. Uma de carvão nacional e duas da OGX de carvão importado. Depois de Copenhague, no entanto, alguns projetos conseguiram licença, mas não aceitamos mais térmicas a óleo ou a carvão. Olhando para o futuro, vemos mais as hídricas e as novas renováveis.
Mesmo sendo a fonte que mais vai crescer em termos absolutos, a hídrica vai cair como percentual da matriz. Dos 47 mil MW contratados — dos 61 mil MW necessários — até 2020, a fonte hídrica responde por 51% e vem das polêmicas hidrelétricas da Amazônia, principalmente Belo Monte, Jirau e Santo Antônio. Teles Pires está em construção também. As do rio Tapajós ainda são projeto. Hoje, já se derrubou a ideia de que se for hídrica é boa. Depende de inúmeros fatores como, por exemplo, o impacto na construção. Há hidrelétricas melhores e outras piores. O debate público tem aperfeiçoado alguns projetos e mitigado agressões ao meio ambiente.
Do contratado, a eólica representa 16%, biomassa 6% e PCH 1%. Entre as fontes não renováveis, o óleo está na frente com 13%, gás natural 7%, carvão 3% e urânio 3%.
O Brasil deve se esforçar para diversificar sua matriz, intensificando o investimento nas novas fontes de baixo impacto ambiental. O movimento recente mostrou que é possível aumentar a presença das alternativas. Em pouco tempo, o país encontrou a direção do vento; deveria se esforçar agora para encontrar a luz do sol.

Chico Buarque canta Ela Faz Cinema



HORA DO RECREIO




O Barão de Mauá e os pescadores ameaçados no Rio, por Carlos Tautz



Em 30 de abril de 1854, Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, inaugurou a primeira estrada de ferro construída no Brasil. Ligava o Porto de Estrela, na praia de Mauá, município de Magé (RJ), no fundo da Baía da Guanabara, à localidade de Raiz da Serra, numa cerimônia que teve a presença de D. Pedro II.
Hoje, 158 anos depois, a mesma praia é palco de luta tão heróica quanto à de Mauá. A poucos metros do porto de Estrela, criminosamente abandonado e isolado da sociedade pela empresa GDK, a serviço da Petrobras na construção do complexo petroquímico Comperj, está a minúscula sede da Ahomar.
Esta associação de pescadores teve quatro de seus membros assassinados desde 2010 (Almir e Pituca há apenas um mês). Seu presidente, Alexandre Anderson, vive sob escolta da PM, a mando do Programa de Proteção de Defensores dos Direitos Humanos (PPDDH).
O “crime” dos pescadores artesanais, e que está na raiz dos assassinatos , foi protestar contra o vazamento, pela Petrobras, de1,3 milhões de litros de óleo em 2000 e de resistir à implantação do Comperj.
A exemplo de várias outras obras de porte semelhante em implantação no Estado, este megaprojeto é farto em dinheiro público subsidiado, licenças ambientais irregulares e está associado a um variado cardápio de atentados a direitos humanos.
Em outra baía localizada no Estado – a de Sepetiba –, as barbaridades verificadas em Mauá se repetem como padrão. Moradores são ameaçados pela implantação da siderúrgica TKCSA, que aumentou em 70% a poluição do ar no município, outro pescador também está no PPDDH por resistir à situação.
A TKCSA, onde o BNDES, banco público, enterrou R$ 1,4 bilhão, localiza-se no esquecido bairro de Santa Cruz, onde escolas e postos de saúde são controlados com mão de aço pela siderúrgica e médicos são impedidos de registrar o aumento de graves enfermidades desde que a indústria chegou.
Como se tudo isso não bastasse, a TKCSA é suspeita de contratar milícias para fazer sua segurança e transportar trabalhadores.
Mas os leitores que se assustaram com tantas denúncias em artigo tão curto podem se preparar. Muitas outras sairão da audiência pública que a Câmara dos Vereadores do Rio convocou para 1 de agosto, sobre a situação da pesca artesanal do Rio.
Por sua luta pela economia do Brasil, Mauá foi sabotado e morreu pobre em 1989. É a hora de o País dizer se aprendeu a lição histórica e impedir que outros brasileiros tão bravos continuem a perder suas vidas.

Carlos Tautz é jornalista e coordenador do Instituto Mais Democracia – Transparência e controle cidadão sobre governos e empresas

MPF quer afastamento do comando da PM em SP


by Fábio Pannunzio

O Ministério Público Federal (MPF) quer entrar com uma ação civil pública pedindo o afastamento do comando da Polícia Militar em São Paulo, alegando a perda do controle da situação. A medida será apresentada amanhã, quinta-feira, em audiência pública organizada pelo órgão em parceria com a Defensoria Pública, o Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) e o Movimento Nacional de Direitos Humanos.
Segundo o procurador da República Matheus Baraldi Magnani, a Justiça Federal pode atuar quando tratados e convenções internacionais são desrespeitados, como aqueles assinados pelo Brasil se comprometendo em garantir direitos individuais. "A ideia é também apresentar uma representação ao procurador-geral pedindo a intervenção federal no Estado. São medidas que ajudam a retirar a sensação de poder e de corpo que vem garantindo a impunidade e permitindo ações violentas por parte da PM", afirmou o procurador Magnani.
Outra medida que a ação pretende cobrar é a proibição da prisão em flagrante para casos de "desacato à autoridade". "Muita arbitrariedade tem sido cometida pelas autoridades por causa de supostos desacatos."
Segundo a defensora pública Daniela Skromov de Albuquerque, o objetivo da audiência pública é chegar a ações concretas que sirvam para coibir a violência policial. "O caso do publicitário (Ricardo Prudente de Aquino, de 39 anos, morto na semana passada por PMs durante abordagem desastrosa em Pinheiros) não foi acidente. Foi resultado de um problema estrutural na PM", afirmou a defensora. A família de Aquino e comandantes da PM foram convidados para o evento. Procurado, o comando da corporação afirmou que não havia sido notificado e, por isso, não comentaria o caso.
Ataques
O grupo Mães de Maio, criado por parentes de jovens assassinados após ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC) em São Paulo, em maio de 2006, vai protocolar hoje em Brasília carta à presidente Dilma Rousseff cobrando medidas que, há seis anos, não saem do papel. Elas acusam PMs pela morte de parte deles. "Como nada foi feito, a violência volta a se repetir", diz Débora Maria da Silva, coordenadora do grupo.
Entre as demandas estão o acompanhamento federal jurídico e político do crescimento da violência no Estado; parecer sobre pedido de federalização dos chamados crimes de maio de 2006, quando 493 pessoas morreram em uma semana, após os ataques do PCC; abolição dos registros de casos de "resistência seguida de morte"; e a criação de uma Comissão da Verdade para crimes policiais.

O DIREITO DE RESISTÊNCIA À TIRANIA


    Percival Puggina
            Os que foram para a luta armada no Brasil agiram com legitimidade moral? A resposta afirmativa a essa pergunta não dissolve a anistia. Já a resposta negativa desqualifica muitas das pretensões de seus militantes, seja no plano político, seja no das indenizações.
            Em 1966, o regime vigente contava dois anos, tinha amplo apoio popular e da mídia, e não dava sinais de esmorecimento. O primeiro sangue correu no dia 25 de junho daquele ano. Foi um atentado terrorista: a explosão de bomba no aeroporto de Guararapes, no Recife, onde deveria desembarcar o general Costa e Silva. Dois mortos, uma dúzia de mutilados e feridos. A tragédia só não foi maior porque uma pane no avião obrigara o general a se deslocar por via terrestre e o anúncio dessa mudança fizera com que a maior parte das pessoas já houvesse deixado o aeroporto no momento da explosão. Andassem as coisas conforme planejara a Ação Popular, teria ocorrido ali a maior chacina da história republicana.
            Com a indiscriminada impiedade do terrorismo, começou a luta armada no Brasil. Pois bem, onde era ensinado o fabrico de bombas em nosso país? Não havia, aqui, qualquer experiência com a produção de artefatos para ações terroristas. As escolas de engenharia e os engenheiros não estavam para essas coisas. O leitor tem uma chance de apontar no Google Earth (antigamente se diria no "mapa-múndi") o lugar onde o construtor do artefato aprendeu as técnicas para sua montagem. Se colocou o dedo na ilha de Cuba, acertou. Foi lá, naquele decantado paraíso da autodeterminação dos povos, que o ex-padre Alípio de Freitas (indenizado pela Comissão de Anistia com mais de um milhão de reais) recebeu instrução e treinamento para ser terrorista no Brasil. Se Fidel não se importava com quanto sangue cubano fazia correr, não haveria de ser com sangue brasileiro que se iria preocupar. E assim andou a resistência armada ao regime de 1964: mais de uma centena de vítimas; assaltos a bancos e quartéis, com morte de sentinelas, vigilantes e clientes; execuções de companheiros,  sequestros e "justiçamento" de adversários. Executaram um marinheiro inglês apenas por ser inglês. Por ser norte-americano, mataram um capitão na frente da mulher e dos filhos.
            Tendo presente o caráter efetivamente autoritário do regime então vigente e o rigor da repressão às organizações (cerca de uma centena) que partiram para a luta armada, a pergunta que se impõe é a seguinte: os que militaram nesses grupos e cometeram tais crimes agiram sob a proteção moral do direito de resistência à tirania? Tal alegação é apresentada insistentemente como forma de legitimar os atos cometidos
            É importante esmiuçar um pouco essa questão. Se é verdade que a sã filosofia, em nome do bem comum e da dignidade da pessoa humana, sempre reconheceu a existência de um direito de resistência à tirania, também é verdade que a mesma sã filosofia impõe condições para legitimar o uso da violência com esse fim. Ou seja, resistir à tirania é um direito. Empregar a violência para isso implica certas condições e os militantes da luta armada não se enquadravam em muitas delas, a saber: a) não estavam esgotados todos os meios pacíficos para reverter a situação; b) havia uma clara desproporcionalidade entre os meios e os fins (as ações violentas não conduziam ao objetivo proclamado); c) como o objeto de toda insurreição é instaurar um novo poder, a nova ordem pretendida (implantação de um regime comunista no Brasil) era sabidamente muito pior do que o regime que enfrentavam; d) inexistia a certeza moral de que os sofrimentos causados pela insurreição não seriam (como de fato não foram) superiores aos benefícios esperados das ações violentas. Porque tudo isso foi percebido com clareza pela sociedade brasileira, não houve qualquer apoio da opinião pública aos atos praticados pelos guerrilheiros. O desejo de acender, no estilo cubano ou chinês, focos revolucionários nos campos e nas cidades, fracassou redondamente.
            Ao contrário dos intelectuais fanatizados por ideologias, o povo, o povo simples, sabe que não se pega em armas e não se parte para a violência em má companhia, por uma causa ruim.
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Percival Puggina (67) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.