Os alunos do 3º ano de uma das melhores escolas de ensino médio dos Estados Unidos, a Wellesley High School, em Massachusetts, estavam reunidos, numa tarde ensolarada no mês passado, para o momento mais especial de sua vida escolar, a formatura. Com seus chapéus e becas coloridos e pais orgulhosos na plateia, todos se preparavam para ouvir o discurso do professor de inglês David McCullough Jr. Esperavam, como sempre nessas ocasiões, uma ode a seus feitos acadêmicos, esportivos e sociais. O que ouviram do professor, porém, pode ser resumido em quatro palavras: vocês não são especiais. Elas foram repetidas nove vezes em 13 minutos. “Ao contrário do que seus troféus de futebol e seus boletins sugerem, vocês não são especiais”, disse McCullough logo no começo. “Adultos ocupados mimam vocês, os beijam, os confortam, os ensinam, os treinam, os ouvem, os aconselham, os encorajam, os consolam e os encorajam de novo. (...) Assistimos a todos os seus jogos, seus recitais, suas feiras de ciências. Sorrimos quando vocês entram na sala e nos deliciamos a cada tweet seus. Mas não tenham a ideia errada de que vocês são especiais. Porque vocês não são.”
O que aconteceu nos dias seguintes deixou McCullough atônito. Ao chegar para trabalhar na segunda-feira, notou que havia o dobro da quantidade de e-mails que costumava receber em sua caixa postal. Paravam na rua para cumprimentá-lo. Seu telefone não parava de tocar. Dezenas de repórteres de jornais, revistas, TV e rádio queriam entrevistá-lo. Todos queriam saber mais sobre o professor que teve a coragem de esclarecer que seus alunos não eram o centro do universo. Sem querer, ele tocara num tema que a sociedade estava louca para discutir – mas não tinha coragem. Menos de uma semana depois, McCullough fez a primeira aparição na TV. Teve de explicar que não menosprezava seus jovens alunos, mas julgava necessário alertá-los. “Em 26 anos ensinando adolescentes, pude ver como eles crescem cercados por adultos que os tratam como preciosidades”, disse ele a ÉPOCA. “Mas, para se dar bem daqui para a frente, eles precisam saber que agora estão todos na mesma linha, que nenhum é mais importante que o outro.”
A reação ao discurso do professor McCullough pode parecer apenas mais um desses fenômenos de histeria americanos. Mas a verdade é que ele tocou numa questão que incomoda pais, educadores e empresas no mundo inteiro – a existência de adolescentes e jovens adultos que têm uma percepção totalmente irrealista de si mesmos e de seus talentos. Esses jovens cresceram ouvindo de seus pais e professores que tudo o que faziam era especial e desenvolveram uma autoestima tão exagerada que não conseguem lidar com as frustrações do mundo real. “Muitos pais modernos expressam amor por seus filhos tratando-os como se eles fossem da realeza”, afirma Keith Campbell, psicólogo da Universidade da Geórgia e coautor do livro Narcisism epidemic (Epidemia narcisista), de 2009, sem tradução para o português. “Eles precisam entender que seus filhos são especiais para eles, não para o resto do mundo.”
Em português, inglês ou chinês, esses filhos incensados desde o berço formam a turma do “eu me acho”. Porque se acham mesmo. Eles se acham os melhores alunos (se tiram uma nota ruim, é o professor que não os entende). Eles se acham os mais competentes no trabalho (se recebem críticas, é porque o chefe tem inveja do frescor de seu talento). Eles se acham merecedores de constantes elogios e rápido reconhecimento (se não são promovidos em pouco tempo, a empresa foi injusta em não reconhecer seu valor). Você conhece alguém assim em seu trabalho ou em sua turma de amigos? Boa parte deles, no Brasil e no resto do mundo, foi bem-educada, teve acesso aos melhores colégios, fala outras línguas e, claro, é ligada em tecnologia e competente em seu uso. São bons, é fato. Mas se acham mais do que ótimos.
DIEGO ESCOSTEGUY, COM MURILO RAMOS E MARCELO ROCHA
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No dia 27 de junho, o Núcleo de Inteligência da Polícia Federal remeteu à Procuradoria-Geral da República um relatório sigiloso, contendo todas as evidências de envolvimento do governador Marconi Perillo com o esquema da construtora Delta e do bicheiro Carlinhos Cachoeira. Como governador de Estado, Perillo só pode ser investigado pelo procurador-geral da República – e processado no Superior Tribunal de Justiça. O relatório, a que ÉPOCA teve acesso com exclusividade, tem 73 páginas, 169 diálogos telefônicos e um tema: corrupção.
O documento está sob os cuidados da subprocuradora Lindora de Araújo, uma das investigadoras mais experientes do Ministério Público. Ela analisará que providências tomar e terá trabalho: são contundentes os indícios de que a Delta deu dinheiro a Perillo.
Alguns desses 169 diálogos já vieram a público; a vasta maioria ainda não. Encontram-se nesses trechos inéditos as provas que faltavam para confirmar a simbiose entre os interesses comerciais da Delta em Goiás e os interesses financeiros de Perillo. Explica-se, finalmente, o estranho episódio da venda da casa de Perillo para Cachoeira, que não foi bem entendido. Perillo nega até hoje que tenha vendido o imóvel a Cachoeira; diz apenas que vendeu a um amigo. O exame dos diálogos interceptados fez a Polícia Federal, baseada em fortes evidências, concluir que:
1) assim que assumiu o governo de Goiás, no ano passado, Perillo e a Delta fecharam, diz a PF, um “compromisso”, com a intermediação do bicheiro Carlinhos Cachoeira: para que a Delta recebesse em dia o que o governo de Goiás lhe devia, a construtora teria de pagar Perillo;
2) o primeiro acerto envolveu a casa onde Perillo morava. Ele queria vender o imóvel e receber uma “diferença” de R$ 500 mil. Houve regateio, mas Cachoei¬ra e a Delta toparam. Pagariam com cheques de laranjas, em três parcelas;
3) Perillo recebeu os cheques de Cachoeira. O dinheiro para os pagamentos – efetuados entre março e maio do ano passado – saía das contas da Delta, era lavado por empresas fantasmas de Cachoeira e, em seguida, repassado a Perillo. Ato contínuo, o governo de Goiás pagava as faturas devidas à Delta;
4) a Delta entregou a um assessor de Perillo a “diferença” de R$ 500 mil;
5) a direção nacional da Delta tinha conhecimento do acerto e autorizou os pagamentos.
Para compreender as negociações, é necessário conhecer dois personagens, que chegaram a ser presos pela PF. Um é o tucano Wladmir Garcez, amigo de Perillo e ex-presidente da Câmara de Vereadores de Goiânia. Garcez atua como uma espécie de embaixador de Perillo junto à Delta e à turma de Cachoeira: faz pedidos, cobra valores, entrega recados. O segundo personagem é Cláudio Abreu, diretor da Delta no Centro-Oeste e parceiro de Cachoeira no ataque aos cofres públicos de Goiás. Na hierarquia da Delta, Abreu detinha a responsabilidade de obter contratos públicos para a construtora e – o mais difícil, custoso – assegurar que os governantes liberassem os pagamentos em dia. A corrupção neste caso, como em tantos outros, nasce na oportunidade que o Poder Público oferece: um detém a caneta que pode liberar o dinheiro; outro detém o dinheiro que pode mover a caneta. Na simbiose entre a Delta e o governo de Goiás, Garcez e Abreu eram os sujeitos que se dedicavam a fazer o dinheiro girar, multiplicar-se. Não há caixa de campanha ou questiúncula política nessa história. O objetivo era ganhar dinheiro.
A mensagem Para a Justiça O relatório da PF traz indícios de que a Delta transferiu dinheiro a Perillo, e eles devem ser investigados Para o eleitor A investigação pode dar um novo norte à CPI do Cachoeira
A PF começou a monitorar as atividades ilegais das duas turmas, de Perillo e da Delta, em 27 de fevereiro do ano passado. Naquele momento, Perillo cobrava o pagamento do “compromisso” da Delta. Num diálogo interceptado pela PF às 20h06, Cachoeira pede pressa a Abreu. Disse Cachoeira: “E aquele trem (dinheiro) do Marconi(governador), hein? Marconi já falou com o Wladmir (Garcez), viu”. Abreu chora miséria, como bom negociante. “Vou falar amanhã que não tem jeito”, diz Cachoeira. “Mas não é 2 milhões e meio, não. Ele (Marconi) quer só a diferença.” Cachoeira refere-se, aqui, à operação de venda da casa, o assunto mais urgente naquele momento. Abreu faz jogo duro: “Pois é, doutor, eu não tenho como. Do mesmo jeito que o Estado tá com o orçamento fechado, eu também tô”. O jogo é simples: uma parte quer que a outra aja antes. Perillo quer o dinheiro antes de liberar a fatura; Abreu, da Delta, quer a fatura paga antes de liberar o dinheiro para Perillo.
As negociações prosseguem, emperradas em alguns momentos por desconfianças mútuas. Numa ligação na mesma noite, Cachoeira certifica Abreu de que Garcez, o interlocutor de Perillo, não está pressionando a Delta sem motivos. “Não é o Wladmir, não. É ele(Marconi) que tem esse trem na cabeça, da diferença e não sei o quê, viu?”, diz. No dia seguinte, preocupado com a demora da Delta em liberar o dinheiro, Cachoeira pede a Garcez que dê “um aperto” em Abreu, de modo a garantir o negócio. Garcez liga para Abreu e reforça que a Delta deve pagar logo o “compromisso” com Perillo. Garcez explicara a Perillo que a Delta não conseguiria quitar o acerto logo. Diz Garcez, no diálogo com Abreu: “Tive lá no Palácio, conversei com o governador lá. Falei... ‘Olha, o compromisso que ele (Abreu) tinha feito com o senhor faltava 1 milhão e meio. (...) Ele (Abreu) vai ver se cumpre aquele compromisso com o senhor”. Diante da pressão, Abreu diz que tem “outros compromissos” em Mato Grosso e em Mato Grosso do Sul. Pede tempo.
Nervoso com a lentidão de Abreu, Cachoeira resolve dar prosseguimento ao negócio com Perillo – e cobrar depois da Delta. A partir daí, o acerto realiza-se com rapidez. Ainda no dia 28, Garcez informa a Cachoeira que Perillo quer cheques nominais. Combinam a entrega de três cheques para o dia seguinte, às 14 horas: dois de R$ 500 mil e um de R$ 400 mil, depositados no dia 1o de cada mês. Em seguida, no dia 1o de março, Cachoeira faz a operação: pede ao sobrinho que assine os cheques, avisa a Delta e manda entregar os cheques no Palácio das Esmeraldas, sede do governo de Goiás. Às 14h53, Garcez, que estava no Palácio, confirma a Cachoeira que os cheques foram entregues e avisa que levará a escritura do imóvel no dia seguinte. Doze minutos depois, Cachoei-ra já pede a contrapartida a Garcez: “O trem da Delta, aqueles 9 milhões que o Estado tem de pagar... Você levou para mostrar para ele (Perillo)?”. Garcez confirma: “Tá comigo aqui. Oito milhões, quinhentos e noventa e dois, zero quarenta e três”. Às 16h37, Garcez informa a Cachoeira que está no gabinete do governador, entregando os cheques. Em seguida, Garcez comunica a Abreu que os problemas da Delta acabaram. “(Perillo)falou que vai resolver: ‘Não, pode deixar que isso aqui eu resolvo’”. E resolveu: ainda no dia 1o de março, o governo de Goiás liberou R$ 3,2 milhões para a conta da Delta. No dia seguinte, o cheque de R$ 500 mil foi depositado na conta de Perillo.
No dia 3 de março, Cachoeira comemora com Abreu a “porta aberta” com Perillo. “Ele (Perillo)engoliu aqueles 500 mil... Ele (Perillo) responde em tudo, deu as contas para pagar”, afirma Cachoeira. Cachoeira pediu a seu sobrinho Leonardo Ramos, que costuma assessorá-lo, para que preparasse um contrato de compra e venda no nome de um laranja – e começou a chamar amigos para conhecer a linda casa que comprara de Perillo. No dia 25 de março, o governo de Goiás liberou mais um pagamento de R$ 3,2 milhões para a conta da Delta. Enquanto os pagamentos caíam nas contas da Delta, a Delta cobria, por meio de uma empresa laranja, os cheques dados por Cachoeira.
O segundo cheque de R$ 500 mil foi compensado no dia 4 de abril. Cachoeira, sempre zeloso, checava tudo com seu contador. No dia 29 de abril, antes da compensação do último cheque, no valor de R$ 400 mil, Abreu voltou a reclamar com Cachoeira que as faturas da Delta haviam sido retidas novamente. Abreu foi claríssimo na contrapartida necessária para pagar o último cheque: “Deixa eu te contar uma amarelada que eu dei aqui. Wladmir (Garcez) tá me rodeando aqui. Eu falei: ‘Wladmir, tá bom: que dia vai me pagar? Tá prometido até sexta que vem, tá? Então vamos fazer o seguinte: eu pago os 400. Se ele (Perillo) não me pagar até sexta (...) você me devolve os 400’. Aí ele amarelou aqui”. Os dois reclamaram da demora de Perillo. Cachoeira disse: “Agora tem de tolerar porque nós já pusemos o pé na jaca”. Eles reclamam, reclamam, reclamam... mas no fim pagam. No dia 2 de maio, Cachoeira ordenou a seu contador que contatasse o pessoal de Perillo e descontasse o último cheque. “Aquele lá (o cheque) não podia falhar de jeito nenhum, né?”, diz o contador. O cheque foi descontado. E o que aconteceu? O governo de Goiás liberou mais uma parcela de R$ 3,2 milhões para a conta da Delta.
Não demorou para Cachoeira perceber que morar na antiga casa do governador de Goiás lhe traria problemas. Num diálogo com sua mulher, Andressa Mendonça, em 17 de maio (leia na página ao lado), Cachoeira compartilhou seu temor por telefone: “Esse trem não vai dar certo (da casa). Vão acabar sabendo que é minha”. Cachoeira começou, então, a procurar um modo de se desfazer do imóvel, apesar dos protestos de Andressa, que já decorara a casa e adorava o lugar. As conversas interceptadas pela PF mostram em detalhes como Cachoeira repassou a casa para um terceiro, o empresário Walter Santiago, sem aparecer. Para isso, recorreu à ajuda de Garcez, que coordenou a transação. Garcez assegurou ao empresário que a casa era de Perillo. No dia 12 de julho, Walter Santiago, rodando num carro blindado, encontrou-se com Garcez e lhe entregou R$ 2,1 milhões em dinheiro vivo. Cachoeira orientou Garcez pelo telefone: “Manda trazer o dinheiro aqui no Excalibur (prédio onde mora Cachoeira), entendeu? Manda o professor(Walter Santiago) trazer no Excalibur, porque ele tá com carro blindado”.
Em seguida, Garcez informou a Cachoeira que Lúcio Fiúza, então assessor especial de Perillo, estava com eles no carro. Responde Cachoeira: “Então pega tudo e vem para casa. Dá só os quinhentos na viagem para o doutor Lúcio. (...) Já fala para o doutor Lúcio pegar os cem também (parte do assessor de Perillo). É dois e cem, viu (R$ 2,1 milhões, o dinheiro a ser entregue)? Pega os cem logo e já mata ele, ou então já fala a data que ele tem de entregar”. Não fica claro se os R$ 500 mil para Fiúza referem-se à parte de Perillo nessa segunda operação – ou se era um pagamento pendente por outra razão. Também nessa segunda operação, Cachoeira recebeu – e distribuiu a gente próxima a Perillo – mais dinheiro do que valia o imóvel.
Cachoeira confirma isso num diálogo com Andressa, ainda no dia 12. Andressa pergunta por quanto ele vendeu a casa. “Dois e cem”, diz Cachoeira. “Esse trem é do Marconi e não ia dar certo, não. Tem de passar logo esse trem para o nome dele (possivelmente o empresário Walter). Porque eu vou perder um trem de bilhões por causa de um negócio à toa.” Andressa não quer saber de negócios ou dinheiro. Quer saber da prataria da casa e das coisas bonitas e caras que comprou para decorá-la. “Você explicou para ele (empresário Walter) que roupa de cama, coisa pessoal, acessório de banheiro, nada disso vai, né?”, diz Andressa. Cachoeira se irrita: “Deixa a roupa de cama do jeito que tá lá. Não faça isso, não. Pega as pratarias que o Wladmir escondeu lá dentro”. “Eu não vou deixar roupa de cama de 400 fios para ele, não. Cê tá louco?”, diz Andressa. Cachoeira, então, confessa o preço real da casa e revela a existência da “diferença”. “Deixa do jeito que tá. Aquilo lá custou quanto? Afinal, eu comprei ela (a casa) por mil (R$ 1 milhão), vendi por mil e quinhentos (R$ 1,5 milhão). Tá bom, me ajudou a vender.” A conta é a seguinte, segundo a PF: o empresário Walter Santiago pagou R$ 2,1 milhões pela casa. Destes, R$ 100 mil foram para Fiúza, o assessor de Perillo, R$ 500 mil para Perillo, levados por Fiúza – e o restante, R$ 1,5 milhão, para Cachoeira.
Segundo Perillo, a Receita Federal atestou que seu patrimônio é compatível com seus rendimentos
O que Cachoeira fez depois de receber o R$ 1,5 milhão? Ligou para a Delta. Confirmou o recebimento do dinheiro e perguntou a Abreu se o contador da Delta já fora avisado. Abreu disse que estava ao lado de Carlos Pacheco, principal executivo da Delta, a quem Abreu chama de “chefe”. Abreu disse: “Eu falei com o chefe aqui, viu, amigo? Ele falou que era para você guardar esse dinheiro, era para você aplicar lá no entorno (entre Brasília e Goiás), no projeto. Que o projeto lá vai exigir uns 4 milhões e meio, mas eu falo com você pessoalmente”. A PF não descobriu que projeto seria esse. Mas a fala de Abreu deixa claro o que outros diálogos confirmam: a direção da Delta nacional não só sabia das operações de Cachoeira no Centro-Oeste, como coordenava algumas negociações. Até agora, a Delta insiste na versão segundo a qual Abreu agia sozinho.
E manteve sua linha de defesa, após ÉPOCA questionar a empresa sobre as novas evidências. Por meio de uma nota, a Delta afirma não ter conhecimento da apresentação de uma fatura da empresa ao governador Marconi Perillo, nem da visita de Wladmir Garcez ao Palácio de governo para resolver um assunto da empreiteira. A nota também afirma: “Empresas de construção civil que atuam no setor público, como a Delta, precisam zelar e velar pelo recebimento pontual e em dia dos compromissos assumidos a fim de não ocorrer solução de descontinuidade nas obras”. A empresa diz ainda que o ex-presidente Carlos Pacheco nunca teve relação comercial com Cachoeira e que a empresa tem prestado esclarecimentos necessários aos órgãos instituídos.
Perillo também preferiu não prestar esclarecimentos a ÉPOCA. Não respondeu às perguntas sobre eventuais conversas para discutir pagamentos da Delta e sobre a relação desses pagamentos com a venda da casa. Em nota, limitou-se a dizer que “prestou, por meses a fio, todos os esclarecimentos solicitados pela imprensa, pela sociedade e pela CPI”. Perillo criticou ainda o deputado Odair Cunha (PT-MG), relator da CPI do Cachoeira. Disse que o deputado quer transformar a CPI numa “comissão de investigação do governador Marconi Perillo”. Diz ainda a nota: “No exaustivo crivo a que foi submetido, nenhum fato se encontrou que possa desabonar sua biografia (de Marconi Perillo) de cidadão ou de homem público. Ao contrário, a Receita Federal, por exemplo, emitiu nota técnica na qual atesta que o patrimônio do governador é compatível com seus rendimentos. Portanto, o governador Marconi Perillo informa que, considerando já devidamente esclarecidos os assuntos de fato relevantes, não se pronunciará mais a respeito de questões atinentes a sua vida privada, reservando essa providência, como é natural, unicamente para os assuntos relacionados a suas atividades como governador do Estado”.
Perillo depôs na CPI do Cachoeira há um mês, quando começavam a se acumular evidências de que ele mantinha relações com a empreiteira Delta e com Cachoeira. Na ocasião, foi claro: “O senhor Carlos Cachoeira não teve a menor participação na venda da casa. (A venda da casa) foi feita de forma transparente ao atual empresário Walter Paulo. (...) Os valores (da venda da casa)foram de acordo com o mercado”. Até agora, desconfiava-se que as três afirmações não eram verdadeiras. Agora, com o relatório da PF, sabe-se que são falsas: Cachoeira participou da compra da casa, a operação aconteceu na sombra e o valor da venda foi superior ao de mercado.
Perillo também disse à CPI: “De forma desavisada ou maldosa, vejo, aqui ou acolá, afirmações de que o senhor Carlos Augusto, o Cachoeira, teria influência em meu governo”. Os diálogos interceptados pela PF e a cronologia do pagamento das faturas à Delta revelam que Cachoeira tinha, sim, influência. Outra frase de Perillo: “Falaram (nos diálogos até então divulgados) sobre seus planos (da turma de Cachoeira), mas nada se concretizou. Nada! Reafirmo: nada se concretizou”. Aqui, mais uma vez, as cobranças da Delta ao amigo de Perillo, os cheques compensados nas contas de Perillo e o consequente pagamento das faturas da Delta apontam o contrário. Por fim, Perillo bradou na CPI: “Não tem propina no meu Estado”. É uma afirmação ousada. Os delegados da Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República, ao que parece, discordam.
Diante da expectativa de mais um pibinho pela frente, a presidente Dilma Rousseff mudou da água para o vinho seu discurso econômico, passando a valorizar mais outras medidas que não a do Produto Interno Bruto, que até outro dia era festejado pelo governo como comprovação de que o país passara a ser a sexta economia do mundo, superando a Inglaterra e ameaçando a França, que está em quinto lugar.
Com o crescimento pífio previsto para este ano — por volta de 2% ou até menos, segundo algumas previsões — e o dólar valorizando, o país corre o risco de fechar o ano caindo novamente de patamar entre as maiores economias do mundo.
Pelo terceiro ano consecutivo, o país crescerá menos que os emergentes, a ponto de o economista Jim O’Neill, criador da sigla Brics para um estudo da Goldman Sachs sobre as principais economias emergentes do mundo, dizer que o Brasil corre o risco de perder sua posição no grupo.
A presidente se referiu à capacidade de um país tratar bem seu futuro, isto é, as crianças e os adolescentes, como mais importante do que o mero crescimento econômico medido pela acumulação de bens, e, se pode ter razão em teoria, na prática está lidando com medidas complementares e não dissociadas.
A não ser que esteja pensando em um tipo de modelo à la Cuba, onde o governo teoricamente dá mais valor ao desenvolvimento social do que ao econômico, isto é, mais ao IDH do que ao PIB, o que na prática se mostra um desastre.
Estamos em 84º lugar no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e perdemos para países da região como Chile, Uruguai, Argentina. Cuba, que voltou a ter seu desenvolvimento humano medido depois de anos ausente do relatório do programa das Nações Unidas, aparece em 51º lugar.
Já tratei desse assunto diversas vezes aqui, mas é sempre bom repetir. Em uma coluna de março lembrei que a Noruega, por exemplo, não está entre as maiores economias do mundo, mas é a número um em IDH, método criado pelo economista paquistanês Mahbub ul Haq e pelo Prêmio Nobel Amartya Sen para avaliar outras dimensões na medição da qualidade de vida de um povo.
Além do PIB per capita corrigido pela paridade do poder de compra de cada país, o IDH leva em conta a longevidade e a educação.
Para aferir a longevidade, o indicador usado é a expectativa de vida ao nascer. O item “educação” é avaliado pelo analfabetismo e pela taxa de matrícula em todos os níveis de ensino.
O ideal é unir os dois indicadores, e por enquanto são os países desenvolvidos que conseguem isso. A maior economia do mundo continua sendo a dos Estados Unidos, que também são o 4º colocado em IDH.
A China já é o segundo PIB do mundo e, tudo indica, alcançará os Estados Unidos em alguns anos, mas, quando se trata de qualidade de vida, está na rabeira da lista do IDH, em 101º lugar.
O Japão, que caiu para o terceiro lugar no ranking do PIB, está em 12º lugar no IDH. A Alemanha é a mais bem colocada entre os grandes da Zona do Euro, em 9º lugar.
A França está em 20º lugar. O Reino Unido, que ultrapassamos pelo PIB, está em 28º lugar na relação do IDH, enquanto a Itália está em 24º.
Os dois últimos do ranking das dez maiores economias do mundo, Rússia e Índia, estão também na rabeira da lista do IDH: Rússia em 66º (melhor que o Brasil) e Índia em 124º (pior que a China).
A presidente Dilma Rousseff tem toda a razão. Como já escrevi aqui quando saiu a notícia de que passáramos a ser a sexta economia do mundo, mais importante que isso é sabermos que estamos em 84º lugar no IDH; em 88º no Índice de Desenvolvimento Educacional; ainda somos um dos mais desiguais na distribuição de renda do mundo, apesar dos avanços recentes.
E entender que, para deixarmos de ser o 73º país no ranking de renda per capita, temos que encarar as reformas estruturais de que o país necessita para crescer sustentavelmente, principalmente na educação.
Temos tido sinais permanentes de que o ensino de Matemática entre nós está abaixo das necessidades do país. O professor Arnaldo Niskier, membro da Academia Brasileira de Letras, fez uma relação de indícios de nosso atraso nesse setor: aprovação de apenas 42,8% dos alunos do 3º ano do ensino fundamental com os conhecimentos básicos de matemática; em apenas 35 cidades do país, mais da metade dos alunos do 9º ano do ensino fundamental sabe Matemática, teriam nota superior a 5; apenas 11% dos jovens que alcançam a 3ª série do ensino médio têm aprendizado suficiente na matéria.
De 2000 a 2009, o Brasil aparece entre as três nações que mais evoluíram no Pisa — exame internacional de avaliação — segundo boletim da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgado em 2010.
E, no entanto, ainda ocupa a 53ª posição entre 65 países. Os países que fazem parte da OCDE, os mais avançados do mundo, aplicam cerca de 7% do PIB em pesquisa e desenvolvimento.
O Brasil não passa de 1%, sendo suplantado largamente por Coreia do Sul e China, países que estavam atrás de nós nesse setor nos anos 1980. Em 1960, a Coreia já tinha escolaridade média superior à do Brasil em 1,4 ano de estudo, e essa diferença só fez aumentar de lá para cá, estando atualmente em mais de seis anos.
Depois de aparentemente desistir da possibilidade de crescer acima de 3% ainda este ano, a presidente Dilma Rousseff tenta encarnar a personalidade de seu tutor, repetindo como Lula que “nunca antes neste país” se fez tanto pela distribuição de renda.
E repete até mesmo as gafes do antecessor, ao comemorar o desastre econômico europeu para fazer um contraponto ao modelo brasileiro.
Segundo ela, o Brasil usa uma fórmula mais eficiente: fomentar o desenvolvimento “distribuindo o bônus para o povo. Hoje eles (os espanhóis) estão cortando o 13º salário, 30% do salário dos vereadores e aumentando os impostos, e (mesmo assim) o país vai de mal a pior” — disse a presidente.
Fez lembrar o ex-presidente Lula, que criou um embaraço diplomático ao dizer, para se vangloriar, que “é muito bom terminar o mandato e ver que os EUA continuam em crise”, em contraste com o Brasil, que crescera naquele ano 7,5%.
Deu no que deu. Este ano, é possível que os Estados Unidos em crise cresçam mais que nós.
Nesse ritmo, já que Luís Estêvão foi cassado em 2000, o Senado parece levar doze anos para se livrar de um colega inconveniente. Fico imaginando quem será a bola da vez em 2024 ou como será o Brasil em 2027, quando Demóstenes Torres retornar à cena política.
Será que vai acontecer o que aconteceu com Fernando Collor, que permaneceu inelegível por oito anos, voltou e está aí como caçador, ou melhor, cassador, ao lado de Renan Calheiros, Jader Barbalho, Gim Argello, que já estiveram com a corda no pescoço?
Eu disse “retornar à cena política”? A rigor, ele nem saiu. E esse é um fato que soa como deboche ou no mínimo como uma incongruência institucional. Como é que alguém, declarado sem condições morais por seus próprios pares, já que colocou o mandato a serviço de um bicheiro, pode no dia seguinte reassumir o cargo de procurador do Ministério Público de Goiás, que é comandado por seu irmão Benedito Torres? E isso com direito a salário de R$ 24 mil, dois assessores e outras regalias. Tudo dentro da lei.
Para os mais otimistas, a cassação do senador é um fato positivo que por si só reabilita a imagem do Senado. Há controvérsia. Pensando no substituto, há quem diga que ruim com Demóstenes, pior sem ele.
Nas palavras de Carlinhos Cachoeira recolhidas pela polícia de uma gravação telefônica, Wilder Pedro de Morais, o suplente, lembra o Max de “Avenida Brasil”: “É um bosta” — um bosta de quem roubou a mulher, depois de tê-lo impulsionado na política, indicando-o para a chapa de Demóstenes ao Senado em 2010 (a diferença é que Max não é o corno, ele corneia. Aliás, nunca a imprensa foi obrigada a publicar tanto palavrão como agora).
O mais grave, porém, não é essa condição de traído de que ninguém está livre, e sim as suspeitas que recaem sobre ele antes mesmo de assumir. Diálogos interceptados pela polícia demonstrariam a intimidade do bicheiro com esse seu então protegido político.
Nessa novela real em que se mente tanto, me intriga também estar por fora da linguagem jovem. Não sei o que quer dizer a expressão “força na peruca”, contida na mensagem da afilhada para o padrinho, que pelo menos nisso é sincero, não esconde a careca. O que significa? Cartas para a Redação, por favor.
Diante dos desvios do Senado, não há como não lembrar o grande Darcy Ribeiro, para quem a instituição era melhor do que o paraíso, pois “não é preciso morrer para chegar até ele”. Deve estar muito triste.
Comprando um cafezinho da tarde, ou para ser exato um latté- que é expresso com leite fervido- pois o café regular Americano é super aguado, vejo um pedido no balcão, "Já votou?"
O dono não está trabalhando para as eleições, apesar do nome democrático: Blue State Coffee, mas você pode dizer que esta trabalhando para uma, "Providence melhor."
Nesse lugar em particular, dão uma moeda ou "vale" para o cliente escolher a organização que irá receber a doação do mês- um total de 2% de cada compra. No final do mês a organização com o maior numero de votos ganha essa quantia. Na verdade toda caridade acaba ganhando alguma coisa em algum ponto, pois fazem rodízio todos os meses, tendo cada organização a sua chance.
Vou em outro "coffee shop" que só vende café comprado por um valor justo. Há um grande debate nos Estados Unidos por conta da maioria desses "shops" ou lanchonetes vendendo café caro que na verdade é comprado na América do Sul por centavos apenas. O nome, "Coffee Exchange" incorpora essa prática.
Uma das melhores padarias perto da faculdade, Seven Stars, doa toda sua comida no final do dia para uma casa de desabrigados. Isso é uma raridade pois as grandes corporações (Starbucks, Seattle's Best Coffee e Au Bon Pain) jogam tudo no lixo no final do dia- ou às vezes dão para os empregados pois não querem arcar com as responsabilidades legais que vêm com doações de comida.
Um novo lugar, Small Point Café, aberto há pouco tempo, põe macarrão (tipo spagetti) para clientes mexerem o café em vez de pauzinhos de plásticos ou madeira, "é melhor para o ambiente," o dono me disse com um sorriso.
Os coffee-shops em Providence, com dono próprio em vez de um sistema de corporação, e geralmente de pequena monta, levam tanto o seu café quanto sua consciência social muito a sério. E seus clientes agradecem. O Seattles Best Coffee fechou faz um ano e o Starbucks não chega a ter a mesma "energia" que esses pequenos coffee shops.
Encontrar esses pontos não é para simplesmente tomar café, é uma troca intelectual. Professores encontram seus alunos lá, novas idéias, campanhas políticas e inovações são o foco da conversa.
Isso é tão notável que esse final de semana, em uma coluna especial do New York Times, 36 horas em uma cidade Americana, Providence foi escolhida e um desses "coffee shops com consciência" foi o destaque no "slide show" de Providence.
Nascida em Nova York, de pais brasileiros,Lanna Marie Leitemorou em São Paulo entre 2003-2004 onde lecionou inglês na Wise Up. Mudou-se para Providence, Rhode Island, em 2006, onde está cursando Estudos Portugueses e Brasileiros e Relações Internacionais, na Brown University. Escreve para o Blog do Noblat aos sábados.
A onda de violência iniciada há um mês na Grande São Paulo, quando policiais militares de folga passaram a ser alvo de atentados e mortos, teve um novo capítulo entre a noite de quinta e a madrugada de ontem: em quatro horas, oito suspeitos foram mortos por PMs em seis ocorrências.
Em todos os casos, a versão dos policiais para as mortes é a mesma: eles faziam patrulhamento, desconfiaram de veículos, deram ordem de parada e houve fuga, perseguição e tiroteio.
Em nenhuma das seis ocorrências, duas delas envolvendo a Rota, PMs se feriram.
Um dos mortos é suspeito de ter atirado contra uma base fixa da PM em Parelheiros, bairro da zona sul paulistana.
O saldo das mortes em quatro horas ficou bem acima da média diária registrada entre janeiro e maio deste ano no Estado, segundo a Corregedoria da PM -1,7 ao dia.
A letalidade policial no mesmo período, neste ano, subiu 4,5% em relação ao ano passado: 268 mortos contra 256 em 2011.
"Existe omissão por parte dos responsáveis pela Segurança Pública em São Paulo. Por isso, é difícil responder ao certo o que acontece atualmente. Mas é certo que a polícia está matando mais e isso pode indicar uma falta de controle dentro da PM. Estamos em um período do tudo pode", disse Guaracy Mingardi, pesquisador da FGV e ex-diretor da Secretaria Nacional de Segurança Pública.
A recente onda de violência em São Paulo começou há um mês, após a morte de sete PMs na segunda quinzena de junho, todos de folga e em crimes com características de homicídios encomendados.
No período, 15 ônibus foram incendiados e cinco bases da Polícia Militar, atacadas.
Setores de inteligência das polícias investigam se mortes de PMs e de civis na Grande São Paulo, desde o mês passado, são consequência de uma guerra entre quadrilhas de traficantes, de policiais militares ou se foram encomendadas por integrantes da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).
Na madrugada de quinta, seis homens encapuzados mataram oito pessoas em Osasco, também na Grande São Paulo. Nesse caso, a polícia trabalha com várias hipóteses -desde briga entre traficantes até o envolvimento de PMs.
O Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região, com sede em Goiás, afastou de suas funções na quinta-feira o desembargador Júlio César Cardoso de Brito, acusado de envolvimento com o empresário Carlinhos Cachoeira.
Escutas telefônicas feitas pela Polícia Federal e documentos encaminhados ao TRT pela 11ª Vara Federal Criminal de Goiás sugerem que Brito orientava advogados do grupo de Cachoeira a lidar com ações no tribunal em troca de vantagens financeiras.
Por unanimidade, os desembargadores do tribunal decidiram abrir processo disciplinar para investigar denúncias apresentadas pelo Ministério Público do Trabalho e pelo Sindicato dos Servidores Federais em Goiás.
Na véspera, Brito pediu licença de suas funções no TRT, onde era vice-presidente e chefiava a corregedoria.
O processo se baseia em 77 ligações interceptadas pela polícia, em que o desembargador conversa com um dos braços direitos de Cachoeira, Gleyb Ferreira da Cruz, que Brito trata como "irmão".
Nas conversas, o desembargador discute situação de empresas com ações trabalhistas no TRT de Goiás, entre elas o laboratório Vitapan, de Cachoeira, a distribuidora de medicamentos JC, de um irmão do empresário, e a Ideal Segurança.
Há suspeitas de que uma viagem do desembargador a Buenos Aires foi patrocinada por Gleyb. Numa das conversas gravadas, um operador de Cachoeira discute com Brito a encomenda de um computador que o empresário traria para ele de Miami (EUA).
A Justiça de Jersey abre caminho legal para uma possível condenação do ex-prefeito Paulo Maluf, na próxima semana, e a repatriação do dinheiro supostamente desviado pelo político ao Brasil. A corte do paraíso fiscal no Canal da Mancha rejeitou todos os recursos e apelos acionados pela defesa de Maluf e agora vai começar a julgar o mérito da ação movida pela Prefeitura para reaver US$ 22 milhões.
Jersey já havia bloqueado o dinheiro em contas que seriam de Maluf e de empresas ligadas a ele. Agora, decidirá se o valor será devolvido ao Tesouro paulistano. A Prefeitura alega que o dinheiro foi desviado de obras públicas durante a gestão Maluf (1993-1996).
Num documento de 90 páginas, a corte afastou todas as ameaças de novo adiamento da decisão. Rejeitou recursos procedimentais apresentados pela defesa e indicou que, no dia 20, poderia anunciar uma decisão. Durante anos, a defesa do ex-prefeito usou de vários instrumentos legais para frear o processo, tanto na Suíça quanto em Jersey.
Na Suíça, uma decisão de 2003 do Tribunal Superior rejeitou o pedido da defesa de que os documentos sobre as movimentações bancárias envolvendo Maluf e seus familiares fossem divulgados e transmitidos ao Brasil. Mas a ação conseguiu atrasar o processo. Em 2005, a defesa explorou o fato de que os extratos de Maluf foram usados para processá-lo no Brasil por evasão fiscal - e, assim, conseguiu mais uma vez bloquear o processo. Pela lei suíça, a cooperação apenas poderia ocorrer para questões de lavagem de dinheiro.
Em Jersey, a própria corte já avaliou em 2006 e 2007 que Maluf estaria se utilizando de questões procedimentais para frear o processo. Num documento daquele período, os juízes não disfarçam a irritação com o comportamento da defesa do brasileiro.
Maluf nega ter contas no exterior e não comenta o caso. O Estado mostrou ontem que o Ministério Público Federal denunciou criminalmente oito executivos ligados ou que já pertenceram aos quadros das empreiteiras Mendes Júnior e OAS sob a acusação de desvio de dinheiro da obra da Avenida Água Espraiada (hoje Jornalista Roberto Marinho), na zona sul. durante a gestão do ex-prefeito. Segundo a denúncia, parte dos recursos foi enviada para contas em paraísos fiscais em favor de Maluf. Os executivos são acusados de peculato e lavagem de dinheiro.
Ao reassumir o cargo de procurador do Ministério Público de Goiás, o ex-senador Demóstenes Torres causou perplexidade entre alguns juristas e representantes da sociedade. A coordenadora do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), Jovita Rosa, lembrou que ele foi um importante articulador da aprovação da Lei da Ficha Limpa, motivo suficiente para constrangê-lo a assumir o papel de investigador, depois de perder o mandato pelo envolvimento com o bicheiro Carlinhos Cachoeira. — Ele foi um dos principais incentivadores na difícil tarefa de fazer a Ficha Limpa virar lei. Se ainda resta algum pingo de dignidade, Demóstenes deveria ser o primeiro a pedir licença da função de procurador — afirmou Jovita. A coordenadora do MCCE considera que o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) tem o dever de adotar medidas que impeçam o exercício da função pelo ex-senador. E lembrou que, no caso do ex-procurador geral de Justiça do Distrito Federal, Leonardo Bandarra, acusado de envolvimento no escândalo do mensalão do DEM, em 2009, o CNMP agiu para tentar impedi-lo de atuar no MP do DF. — Agora, o CNMP deve agir e reagir a esse tipo de coisa. É inadmissível que alguém que enganou tanta gente, durante tanto tempo, agora exerça a função de investigador. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Rio de Janeiro, Wadih Damous, avaliou que o processo disciplinar contra Demóstenes no MP será mais técnico que no Senado. — No Ministério Público haverá uma predominância de questões técnico-jurídicas, mas a situação do senhor Demóstenes é muito complicada lá, porque as imputações contra ele são muito graves. Talvez mais difícil, porque como é que alguém com acusações contra si tão graves como o ex-senador Demóstenes vai exercer exatamente essas funções de investigação, de abertura de inquérito, de persecução criminal? — questionou.