segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

O MONSTRO PREVIDENCIÁRIO - Rapphael Curvo



Rapphael Curvo

A Constituição Federal diz em seu artigo 194 que “A seguridade social compreende um conjunto de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde e a assistência social”. Isto quer dizer que cabe a todos contribuir com ações que possam dar a cada um dos trabalhadores suporte ao seu bem-estar e justiça social dentro do princípio de igualdade e solidariedade que deve ser praticada pelo organizador político social de uma Nação, o Estado. Quer dizer também que cabe ao Estado assegurar a todo cidadão o recebimento dessa contribuição solidária da sociedade àqueles que de alguma forma fizeram e fazem jus. Afinal, há um processo de transferência para o Estado de parte do trabalho de uma parcela da população para que possam aqueles, impossibilitados ou incapacitados, serem atendidos em seus diretos básicos de cidadão que devem ser providos por ele, o Estado.

Mais à frente, a Constituição Federal diz em seu artigo 195 que “ A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios…” e estabelece as fontes. Acontece que o governo brasileiro não obedece o que foi muito bem concebido pela Constituição de 1988. Há uma constante ação de utilização do dinheiro previdenciário com destinações outras daquelas estabelecidas pela norma constitucional. Não bastasse, é enorme o processo de fraudes e desvios que existem nas contas da seguridade social. Antes de 1988, o dinheiro da Previdência foi utilizado para muitas obras por todo este Brasil. Até mesmo Brasília teve boa parte do dinheiro da contribuição social usado na sua construção. A utilização de “desvios legais” veio com a Desvinculação da Receita da União-DRU. O dinheiro que sobrava em caixa, e era muito, ao invés de ser aplicado e estabelecido um fundo voltado ao atendimento da seguridade, foi permitido ao governo lançar mão dele para usá-lo como bem entendesse. É verdade que hoje, pelo que estou informado pela mídia, mesmo com a não retirada de recurso pela DRU, que corresponde a 30% do que é arrecadado pela seguridade social, não será possível cobrir o déficit previdenciário.

A queda da arrecadação tem um dos fortes pontos no desemprego e a queda da produção industrial. Maior razão ainda dessa queda está nas benesses praticadas para atendimento político do governo às reivindicações de setores que poderiam contribuir sem qualquer risco de quebra, como é o setor bancário e do agronegócio. Acontece que quanto mais arrecadar, seja pelo sistema previdenciário ou fiscal, mais o governo gasta. Em poucos meses, motivados pelas ações do MPF contra o presidente, foram dadas isenções e liberação de verbas que, de alguma forma, atingem o caixa do governo. Aí, ele se volta para o caixa da seguridade social para atender demandas políticas que pouco ou nada contribuem para a melhoria de setores que possam reerguer a ocupação de mão de obra no País. Os gastos do governo continuam aumentando, não há uma política de cortes levada a sério, bastou qualquer problema político para os gastos serem acrescidos. É bom lembrar que no ano de 2015, o governo pagou de juros pelo dinheiro gasto sem produzir resultados de crescimento econômico, a bagatela de R$ 450 bilhões, ou seja, mais de 8% do PIB. Nesse mesmo ano fez desonerações superiores a R$ 280 bilhões, incluso nelas, R$ 144 bilhões que eram cabíveis à Seguridade Social.

A verdade é que a reforma virou apenas um discurso e não mais será votada nem agora e tampouco em 2018. O governo tem que encontrar outro meio de cobrir o déficit previdenciário e existem dois caminhos rápidos para isso. O primeiro é deixar os conchavos com a politicagem praticada pelos mercenários congressistas e extinguir, de imediato, metade dos ministérios. O segundo é deixar de sufocar com impostos o setor produtivo para que ele, crescendo, faça gerar empregos e aumento da arrecadação, não só advindos dos trabalhadores como também dos patrões. Esta medida poderia ser acrescida de alguma facilidade de contribuição dos que estão na informalidade. Muitas outras medidas têm que ser adotadas e que poderiam realizar impacto de curto prazo. Uma delas seria criar o sistema de duas semanas laborais em uma de calendário. A semana sem qualquer alteração legal funcionaria de segunda a quinta feira. A outra, de regime Especial, de sexta feira a domingo. Nesta última, só seria exigida a contribuição social. O setor produtivo estaria livre de tributos no que for produzido no período. Em artigos passados, muito escrevi sobre esta proposta e sua estrutura legal. A continuar como está, o governo será devorado pelo monstro previdenciário.


N.E.: “foi permitido ao governo lançar mão…”  Mas quem deu permissão de botar a mão em dinheiro que é nosso e não dele?  Quando se reconhecerá que o nome disso é ROUBO? Quando o povo reagirá e dirá “NÃO”?  Bando de LADRÕES, em todos os três poderes! 

Aqui na redação, discordamos, Raphael. Quem já está sendo devorado somos nós, bando de ovelhas.

Fernando Gabeira e 'o choro privilegiado' - O Estado de São Paulo




Há coisas na democracia brasileiro que não entendo bem. Uma delas é essa possibilidade que o Supremo dá ao ministro com voto vencido de pedir vista e adiar a decisão da maioria. Talvez essa dificuldade se explique pelo fato de ter uma experiência parlamentar, na qual defendi causas minoritárias.
No Parlamento, depois que a maioria se manifesta, o resultado é proclamado e só resta ao perdedor fazer uma declaração de votos, o direito de espernear, como dizíamos no plenário. Daí não entendo por que o ministro Dias Toffoli pode adiar a proclamação de um resultado indiscutível numericamente. Tenho a impressão de que, se me fosse dada a chance de bloquear uma decisão majoritária, hesitaria.
De certa forma, eu me sentiria numa brincadeira que perdeu a graça. Se a maioria não consegue impor uma decisão majoritária, acaba despertando certa compaixão pela sua fragilidade.
Os defensores do foro privilegiado já perderam a batalha. Deveriam contentar-se com o choro e abrir mão de manobras protelatórias. Adiar a decisão apenas atrasa uma experiência que já foi decidida, no debate pela imprensa, nas redes sociais, nos movimentos cívicos e nas pesquisas de opinião.
Um grupo minoritário de ministros do Supremo não pode decidir o que é melhor para nossa experiência democrática. No Brasil, o atraso é tão entranhado nos costumes que se consagra até o direito de atrasar, que agora está sendo exercido pelo ministro Toffoli.
Mas não é só desejo de voto mais pensado. Ele tem algo articulado com os políticos, os principais interessados em manter o foro privilegiado.
Enquanto o STF pisa no freio, a Câmara se apressa a votar um projeto no mesmo sentido, restringindo o foro privilegiado.
Aí pode entrar um gato: a extensão do foro privilegiado aos ex-presidentes, algo que favorece Temer, Lula e Dilma, até Collor, quando deixar o mandato de senador. É realmente algo inédito no mundo: o País que derrubou dois presidentes no período de democratização conclui que devem ser protegidos também depois do mandato.
Durante o mandato presidencial, já são de certa forma blindados. Só podem ser processados por crimes posteriores à sua posse. Assim mesmo, quando são acusados por crimes cometidos durante o mandato, a investigação é submetida à Câmara, onde a maioria é hostil à Lava Jato.
Estamos todos atentos, embora a atenção nem sempre baste para inibir os políticos desesperados. Eles nem se importam mais com as consequências para a democracia.
As coisas podem não ser tão simples como se pensa. Num programa de televisão, Gustavo Franco, ao lançar seu livro sobre a história monetária no Brasil, afirmou que o mercado acha que qualquer dos candidatos favoritos no momento continuará a reconstruir o País.
No caso do PT, o mercado tem esperanças de que, vitoriosa, a esquerda volte a se encontrar com a classe média e abrande sua linha. Não tem sido esse o discurso do PT. Lula afirmou várias vezes que vai estabelecer o controle social da imprensa. Em quase todas as análises, a esquerda conclui que foi derrubada porque não soube radicalizar.
Pelo menos no discurso, o caminho aponta para a Venezuela. Além do mais, tenho minhas dúvidas quanto à reconciliação com a classe média. Acho, sinceramente, muito improvável, mesmo com a ampla admissão dos erros e das trapaças.
No caso de Bolsonaro, tudo indica que caminha para uma visão liberal na economia, dura na repressão ao crime e conservadora nos costumes. É formula que tenta conciliar o avanço do capitalismo com as tradições que ele, naturalmente, dissolve na sua expansão global.
Tanto para os eleitores de Trump como para os de Bolsonaro, há uma força nostálgica em movimento. Voltar atrás, no caso americano, explorando carvão, tentando ressuscitar áreas industriais arruinadas. No caso brasileiro, voltar aos tempos do regime militar, durante o qual não houve escândalos de corrupção nem a violência urbana.
O Brasil de hoje é muito diferente do País dos anos 1960. E também não é o mesmo dos anos 1990, quando o PT chegou ao poder.
O economista Paulo Guedes, que deverá ser o homem da economia na campanha Bolsonaro, afirmou que, ao se encontrarem os dois, uniram-se ordem e progresso. Se entendemos por ordem o combate à corrupção e uma política de segurança eficaz, tudo bem. Mas a eficácia não se mede pelo número de mortos, e sim pelas mortes evitadas. E o progresso? Assim como está no lema da Bandeira, é bastante vago. Muitos o associam ao crescimento econômico.
Mas tanto os marxistas como os liberais tendem a uma visão religiosa do mundo, abstraem a limitação dos recursos naturais, algo que envolve todas as espécies. Num contexto de campanha radicalizada, qualquer das hipóteses terá muita dificuldade em governar um País dividido. E no processo de reconstrução será preciso encontrar alguns pontos que unam a Nação para além de sua clivagem ideológica.
Na sua entrevista ao Roda Viva, Gustavo Franco deu uma pista que me pareceu interessante: ao invés de falarmos tanto em reformas, sempre empurradas com a barriga, por que não buscar uma sociedade de inovação?Essa história de deixar as coisas apodrecendo, mas só mexer nelas em reformas, tem de ser substituída por uma ideia de inovação permanente.
É esse o mundo em que vivemos. Se não nos adaptamos a ele, seremos, de certa forma, engolidos.
A campanha eleitoral ainda nem começou. Fala-se num candidato de centro. De fato, suas chances serão boas. No entanto, na política não se trabalha apenas com chances, mas também com a encarnação da proposta, o candidato.
O PSDB, com Alckmin, fala em choque de capitalismo, algo que vi e ouvi em 98. De choque em choque, vai acabar a energia. Um mesmo empresário alemão levou 56 dias para abrir uma empresa em São Paulo e apenas 24 horas para abrir outra nos EUA. Que tal segurar os fios e experimentar o choque antes de aplicá-lo no País?