sexta-feira, 20 de abril de 2012

A ACUSAÇAO DE BARBOSA NUM MUNDO EM QUE AS PALAVRAS FAZEM SENTIDO TEM DE TER CONSEQUÊNCIAS


O ministro Joaquim Barbosa, apesar do vocabulário a que recorre, não é um homem qualquer. É um membro do Supremo Tribunal Federal. Em dezembro, daqui a oito meses, ocupará a presidência do tribunal.

Se ele acusa um colega de manipular decisões de tribunal, a matéria interessa, acho, ao Senado, que tem de acionar o Conselho Nacional de Justiça. Num mundo em que as palavras fazem sentido, ou ele retira essa acusação — que mantenha as ofensas pessoais a Peluso, que também o atacou, eis um problema que diz respeito a ambos, embora lamentável —, ou, comprovada a acusação, Peluso tem de ser condenado por crime de responsabilidade. Não comprovada, então o futuro presidente do Supremo cometeu crime de calúnia, no mínimo.
Se as palavras deixarem de fazer sentido até no Supremo, o que nos resta?
Por Reinaldo Azevedo

Britto defende Peluso de acusações de Barbosa


 


No supremo barraco armado por Joaquim Barbosa, o novo presidente do STF, Carlos Ayres Britto, tomou as dores do antecessor Cezar Peluso. Disse que é “logicamente impossível” manipular decisões nos julgamentos do tribunal.
Declarou o seguinte: “É impossível manipular o resultado. Porque, se um presidente proferir um resultado em desconformidade com o conteúdo da decisão, ele está desconsiderando o voto de cada um dos ministros.”
Dono de alma contemporizadora, Britto tentou construir uma tese que ajude a explicar o veneno de Barbosa, hoje seu vice: “O que aconteceu e tem acontecido, e pode ser confundido com manipulação, é um presidente mais enfático.”
Como assim? “Entre o voto e a proclamação, ele tenta reverter o quadro, mas isso é natural, não é manipulação. Nunca vi e nunca verei um presidente alterar o conteúdo de decisão, porque os outros perceberiam.”
E quanto à insinuação de Barbosa, primeiro ministro negro da Corte, de que seria vítima de racismo? “Eu nunca vi”, disse Britto. “Nós somos contra o racismo por dever, pois o racismo é criminalizado pela Constituição.”
Como se vê, o Supremo precisa marcar uma sessão para unificar a jurisprudência das brigas. Até aqui, vigorava a tese segundo a qual quando um não quer, dois não brigam. Ao criticar Barbosa, chamando-o de “inseguro”, Peluso mostrou que, quando um quer, dois brigam.
Ao desancar Peluso –“ridículo”, “brega”, “caipira”, “corporativo”, “desleal”, “tirano”, “pequeno” e manipulador de resultados— Barbosa deixou claro que, quando dois querem, aí mesmo é que a briga se torna inevitável. O caso reclama a edição de uma súmula vinculante.

As vezes pão é queijo e queijo é pão

Autor:Jonas de Carvalho - BLOG: TEM SAÚVA NO JARDIM
Quem ainda não visitou o Blog acima esta perdendo uma excelente leitura.
Quem leu "O vexame do dr Peluso"  aqui no Saúva ficou sabendo,  entre outras coisas, que em entrevista ao Valor e a respeito do julgamento do "mensalão" o ex presidente do STF disse que o tal julgamento pode durar 20 dias com os ministros trabalhando das 08 as 18 de segunda a sexta. E isso é bom?

Fiquei pensando a respeito e me lembrei que quando olho para aqueles ministros e ministras metidos em suas togas a discorrerem seus considerandos intermináveis sobre um porção de coisas, penso que o fazem em razão do extremo zelo pela Justiça e pela responsabilidade que têm nas mãos. E por isso descem às minúcias de cada caso, e debatem, e pedem vistas, recursos, convocam, filosofam, buscam nos anais jurídicos outros julgamentos semelhantes, fazem poesias, ouvem testemunhas e acusados, estudam as provas mais um pouco e consideram tudo outra  vez e pedem mais vistas e mais um pouco de sessões para advogados, ufa !, tudo em nome da Justiça e para que as decisões que saírem dali sejam mais próximas possível da verdade. 



 Apenas condenam ou absolvem  depois de uma profunda reflexão sobre o que quer que seja.

Pois sendo o STF o ultimo patamar na hierarquia jurídica, ao condenado não caberá mais recursos senão que assumir suas culpas e penas.

Por isso a respeito das decisões do STF se pode citar o velho ditado popular e que serve para colocar um ponto final em todas as coisas: pão, pão queijo, queijo.

Mas eis que surge o sr Peluso e com meia dúzia de palavras nos revela que o assunto "mensalão" pode ser resolvido em 20 dias.

Das duas uma: ou o sr Peluso por conta de uma indisfarçável frustração, por por causa das circunstâncias, não estará sob os holofotes presidindo o julgamento de um caso muita importância para a história do Brasil e por isso trata-o como se fosse uma briga de vizinhos, ou então ele quis dizer que as vezes, e dependendo da pressão externa, pão pode ser queijo e queijo pode ser pão.

Fiquem em paz,

Jonas

Peluso: destempero na despedida


Autor: Luiz Nassif


Na quinta-feira 19, o Supremo Tribunal Federal (STF) passou a ser presidido pelo ministro Carlos Ayres Britto, que completará 70 anos de idade em novembro e terá de deixar as funções, salvo se, até lá, for aprovada a apelidada “emenda da bengala”. Essa emenda-constitucional muda o regramento ao passar para 75 anos a idade limite de aposentadoria compulsória aos servidores públicos.
Fora o grande preparo jurídico, Britto tem marcado a sua trajetória na Corte pela ponderação, equilíbrio e independência. E não terá dificuldade em colocar uma pá de cal no mal estar criado pelo seu antecessor, Cesar Peluso, que se comportou, na véspera de deixar a presidência do STF, de forma destemperada, para dizer o menos.
Peluso atacou, pesadamente e sem razão, a presidenta Dilma Roussef que, diante de uma explosiva crise econômica-financeira internacional, não reajustou os vencimentos dos magistrados e, por tabela, o de todas as carreiras jurídicas assemelhadas. Ou seja, evitou o conhecido “efeito cascata”.
À suprema magistrada da Nação, por não ter contentado o bolso das togas, Peluso atribuiu violação à Constituição e descumprimento de decisão do Supremo. O ministro, que cai na compulsória em setembro próximo e poderá ficar no caso de vingar a emenda da bengala,  criticou também o colega Joaquim Barbosa, a sua vice no Conselho Nacional de Justiça, Eliana Calmon, e o senador Francisco Dornelles, responsável pelo arquivamento de projeto de emenda Constitucional (PEC) fundado em proposta de Peluso de aceleração de processos.
O ex-presidente do STF atribuiu insegurança ao colega pelo fato de o próprio Barbosa achar que chegou ao Supremo não por méritos, mas pela cor da pele. Sobre Calmon, disse não ter contribuído em nada, tendo sido uma espécie de Operação Mãos Limpas italianas, que não condenou ninguém. Calmon, até agora, não lhe respondeu e até poderia lembrar que, ao contrário da sua afirmação, ganhou dele todos os embates. Ao contrário de Peluso, abriu as portas para acabar com o corporativismo assegurador de impunidade a magistrados com desvios de conduta e tornou os tribunais mais transparentes.
Quanto à Operação Mãos Limpas, Peluso esqueceu, dentre outras,  da condenação definitiva de Betino Craxi, primeiro-ministro italiano obrigado a fugir para a Tunísia para evitar a prisão. Quanto a Dorneles, o ministro olvidou do vetusto princípio da separação dos poderes. Não bastasse, ouviu de Barbosa um juízo negativo: “se acha e não sabe perder”.
O STF, depois da trágica gestão de Gilmar Mendes, viveu na presidência de Peluso tempos de defesa corporativa. Mas com o mérito de apagar a imagem, deixada por Mendes, de agradar a grupos formados por potentes e poderosos. Peluso deu transparência ao STF e não deixou fora de pauta feitos sobre questões de interesse social relevante.

O Holocausto sob a ótica do Vaticano



“Designar algo como mal é uma maneira de assinalar que aquilo abala nossa crença no mundo”(Susan Neiman, escritora)

Por Sheila Sacks

A partir da visita do papa Bento 16 aos campos de extermínio de Auschwitz-Birkenau,  na Polônia, em 2006, o Vaticano vem anualmente enfatizando, por ocasião das celebrações do Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto (instituído pela ONU em 27 de janeiro de 2005), a importância da lembrança dessa tragédia humana que marcou de forma ignominiosa  o século 20.

Cruzando o portão de entrada do campo principal sobre o qual havia o letreiro original em alemão “Arbeit macht frei” ( o trabalho liberta) – roubado em 2009 e substituído por uma réplica- o papa rezou, acendeu uma vela em memória às vítimas do nazismo e manifestou a esperança de que “Deus não permita coisas como estas”, nunca mais. Ainda que, segundo o pontífice em seu discurso, o horizonte político seja preocupante e “que forças obscuras pareçam emergir de novo no coração dos homens”.

Em visita às celas dos prisioneiros e as áreas onde funcionavam as câmaras de gás, Bento 16 lembrou do teor das atrocidades cometidas naquele local que resultaram em mais de um milhão de mortes e expressou todo o seu espanto diante da força do Mal: “Falar neste lugar do terror é quase impossível. Neste local falham as palavras e só pode haver um silêncio comovente – silêncio que é um grito interior a Deus. Por que, Deus, o senhor permaneceu em silêncio? Como pôde tolerar tudo isso? Onde estava Deus naqueles dias?”, indagou o papa diante de sua comitiva, convidados e alguns sobreviventes presentes à cerimônia.

Símbolo extremo do Mal

Três anos depois, na residência de verão de Castel  Gandolfo, o papa voltou a falar sobre o terror do nazismo, ao recordar o sacrifício da freira carmelita Edith Stein (de pais judeus) e do padre franciscano Massimiliano Kolbe que morreram no campo de Auschwitz e foram canonizados pela Igreja. “Os lagers (campos de morte) nazistas como todo campo de extermínio devem ser considerados símbolos extremos do Mal, do inferno que se abre sobre a terra”, evocou Bento 16 para um grupo de fiéis.

Meses antes, em maio de 2009, o pontífice já tinha ressaltado o papel da memória no combate ao esquecimento. Em Jerusalém, ao lado do presidente de Israel, Shimon Peres, Bento 16 falou da importância da lembrança “para impedir que um horror semelhante pudesse desonrar novamente a humanidade”. Na sala dos Nomes do Museu do Holocausto Yad Vashem,  (até 2010 já haviam sido identificados nominalmente quatro milhões de judeus assassinados pela Alemanha nazista), o papa exortou os homens de bem a honrar aqueles que perderam a vida, mas jamais perderam seus nomes. “Que os nomes dessas vítimas não pereçam nunca! Que o seu sofrimento não seja nunca negado, diminuído ou esquecido! E que toda pessoa de boa vontade vigie para erradicar do coração do homem qualquer coisa capaz de acarretar tragédias semelhantes a essa!”, declarou, após conversar com sobreviventes e depositar uma coroa de flores no local.

Repercutindo as palavras do papa, o porta-voz do Vaticano e diretor da sala de Imprensa da Santa Sé, padre Federico Lombardi, expressou o desejo de que “a lembrança da Shoá (‘catástrofe’, em hebraico) leve a humanidade a refletir sobre a imprevisível potência do Mal quando conquista o coração do homem”. Em editorial, no programa semanal “Octava Dies” do Centro Televisivo do Vaticano (2009), padre Lombardi advertiu que o extermínio de seis milhões de judeus se configura em uma “espantosa manifestação da potência do Mal que desafia a fé na própria existência de Deus”. Segundo o porta-voz, o papa não só condena toda forma de esquecimento e de negação da tragédia do extermínio como também expõe as dramáticas interrogações que esse evento tem proposto à consciência do homem e do crente.

A memória que confronta o Mal

Em janeiro de 2012, lembrando mais uma vez a data da libertação do campo de Auschwitz, o Vaticano reafirmou a importância das pessoas não se esquecerem, passados 67 anos, “da tragédia infame do Holocausto”.  Sob o título “Preservar a Memória”, padre Lombardi redigiu a mensagem em que remete à memória dolorosa do Holocausto como “o lugar teológico da pergunta mais radical sobre Deus e sobre o Mal”. Segundo o religioso, “a memória do Holocausto é um ponto de confronto crucial na história da humanidade para entender o que está em jogo quando se fala em dignidade irrenunciável de toda a pessoa humana, da universalidade dos direitos humanos e do compromisso por sua defesa”.

Sacerdote jesuíta de 69 anos, o italiano Federico Lombardi estudou matemática e teologia na Alemanha. Em 1990 foi nomeado diretor Geral da rádio Vaticano e dez anos depois assumiu a direção do Centro Televisivo. Indicado por Bento 16, em 2006, para chefiar a Sala de Imprensa, Lombardi  tornou-se responsável pela gerência de todas as mídias do Vaticano.

Daí a importância de seu comunicado que representa o pensamento oficial da Igreja Católica sobre a tragédia. De acordo, ainda, com o porta-voz da Santa Sé, “se existiram homens capazes de chegar a tão absurda atrocidade, ninguém nos assegura que no futuro isso não possa se repetir”.  Lembrando que a geração das testemunhas, que viveu os tempos e horrores do Holocausto, está diminuindo rapidamente, padre Lombardi acentuou que “a memória dolorosa se torna advertência para o hoje e para todos os tempos”. E assume um compromisso: “ Nós também continuaremos a fazer isso (lembrar as vítimas) neste dia, em solidariedade, em primeiro lugar, ao povo de Israel e a todas as vítimas do absurdo ódio homicida.”

O Mal na esfera do homem

A tocante indagação do sumo pontífice sobre a ausência de Deus diante do horror de Auschwitz – um fato histórico que ameaça a noção teológica tradicional do sentido do mundo e da existência humana – mostra uma perplexidade que o pensamento filosófico já tentou responder em tempos anteriores frente a outros eventos caracterizados pela ascendência do Mal.

No século 18, o filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804) já havia retirado Deus e outros enunciados incompreensíveis presentes na metafísica (área da filosofia que busca dar explicações sobre a essência dos seres e as razões de estarmos no mundo), dos limites do conhecimento humano. Dessa forma, fora da perspectiva religiosa, a questão do Mal não estaria intrinsecamente ligada a Deus, e questionamentos à Sua presença (ou ausência) diante de males naturais, como terremotos e tsunamis, e males morais - dos quais o Holocausto é um exemplo assustador –  soariam descabidos e alienados de propósito. 

Na obra “Trabalho sobre o Mito”, o filósofo Hans Blumenberg (1920-1966), que chegou a ser preso e levado a um campo de concentração, em 1944, ao analisar o célebre poema “Prometheus”, de Goethe (1749-1832), escrito em 1774, e seu impacto sobre a filosofia alemã, observa que a ideia central transmitida pelo autor é a de que “ Deus teria que organizar  o mundo de forma diferente caso houvesse se preocupado com o homem”. A tragédia de Prometeu, submetido ao suplício diário por um poder despótico e arbitrário, reflete a impotência do homem para entender ou explicar  o Mal em suas formas mais avassaladoras. Essa dificuldade de compreensão é sempre profundamente perturbadora à consciência moral clássica que vincula o sofrimento ao castigo e ao pecado.  Considerando uma situação como a dos campos de extermínio, onde seres humanos, sob os auspícios do estado, violaram as normas da sensatez e da razão praticando atos contra cidadãos inocentes que não deixam espaço para justificação ou explicação, pode-se afirmar que Auschwitz  revelou uma nova face do Mal ainda mais espantosa:  a da barbárie burocratizada, alienada, e altamente desenvolvida.

Uma ameaça à alma humana

É o que observa a autora do livro “O Mal no Pensamento Moderno”, a  norte-americana Susan Neiman, que dirige o “Eistein Forum” , instituição alemã que discute os grandes temas universais : “O que choca e modifica nossa compreensão do mal em Auschwitz é que os assassinos não eram bestas e demônios e se comportavam como tais e sim seres humanos comuns, que levavam uma vida mundana como qualquer outro. Isso foi conceitualmente devastador porque revelou uma possibilidade na natureza humana que esperávamos não ver.”

Segundo  Neiman,  Auschwitz modificou nossa compreensão sobre o problema do mal, já que as condições de educação e cultura na Alemanha não deveriam conduzir a formas de barbárie tão sofisticadas quanto avassaladoras, mas a uma genuína civilização. As câmaras de gás foram introduzidas para, simultaneamente,  matar o maior número de pessoas possível poupando as vítimas de uma morte agonizante e os assassinos de visões que atormentassem suas consciências. De acordo ainda com a pensadora, os agentes da SS realizavam seu trabalho seguindo a ordem burocrática das atividades cotidianas, paradoxalmente “despidos de sinais de má-intenção”.  Para o filósofo judeu alemão Gunther Anders (1902-1992) - que exilou-se nos Estados Unidos em 1936 e retornou à Alemanha  em 1950 -   os  crimes cometidos em Auschwitz e nos demais  campos de extermínio se constituíram  em  ameaças, não  à humanidade em si, mas à alma humana, porque seria preciso um coração muito duro (ou mesmo ausência de alma) para levar  uma criança a uma câmara de gás.

E assim como o Talmud (livro milenar das leis judaicas e comentários rabínicos) ensina que salvar uma vida é como salvar o mundo, o escritor russo Fiódor Dostoiévski (1821- 1881), de forma literária, adverte que assassinar uma criança é suficiente para amaldiçoar o mundo. Porém, em Auschwitz, “o pensamento parou, pois as ferramentas da civilização pareciam tão impotentes para lidar com aquele acontecimento quanto o foram para evitá-lo. Dessa forma, qualquer um poderia levar um tiro por fazer bem o seu serviço, assim como outros poderiam escapar da seleção da morte fazendo o mesmo”(Neiman). Os campos da morte, continua Neiman, distorceram os pressupostos mais básicos da racionalidade que ordena os mundos normais, instituindo  “assassinatos em massa no século 20 que  não foram nem fruto da paixão, nem  da ignorância”.

Ilógico e irracional

Sobrevivente do campo de concentração de Buchenwald, na Polônia, e por mais de uma década exercendo a função de grão-rabino de Israel,  Israel Meir Lau, de 75  anos, teve os pais e irmãos assassinados nos campos da morte. Para o religioso, o fato do nazismo e da solução final para a eliminação dos judeus terem como berço uma Alemanha onde a população judaica se encontrava mais integrada e adaptada à sociedade secular,  mostra que o  antissemitismo é ilógico e que não é possível enfrentá-lo de maneira racional. “Alguns perguntam onde estava D´us durante o Holocausto, mas nós devemos perguntar onde estava o homem durante o Holocausto. Como foi possível que homens cultos, que amavam a filosofia e a música, cortassem crianças em pedaços e à noite retornassem aos seus lares para beijar seus filhos e regar suas flores? Essa é a pergunta que jamais deverá calar”, afirma Lau.

Autor do livro de memórias “Lúlek – a história do menino que saiu do campo de concentração para se tornar o grão-rabino de Israel”, Meir Lau é atualmente rabino-chefe da cidade de Tel-Aviv e presidente do Museu em memória das vítimas do Holocausto (Yad Vashem), de Jerusalém.

Lembrança coletiva

Em 1953, cinco anos após a fundação do estado de Israel, o então primeiro-ministro David Bem Gurion instituiu o Yom HaShoá – Dia de Memória do Holocausto, escolhendo a data de 27 de Nissan (calendário hebraico) para a celebração por sua associação ao “Levante do Gueto de Varsóvia”, a rebelião  armada de jovens judeus contra a ocupação nazista, ocorrida em 19 de abril de 1943. A homenagem acontece geralmente cinco dias depois do término da Páscoa judaica (Pessach), quando o  país para e seus cidadãos, onde estiverem, guardam dois minutos de silêncio, honrando a memória dos que pereceram nos formos crematórios ou foram covardemente fuzilados.

Enfim, uma data dolorosa a ser lembrada ainda que a memória de fatos tão escabrosos envergonhe a humanidade. Nesse aspecto, aliás, tanto o Vaticano quanto as lideranças judaicas estão de acordo que a lembrança deve funcionar como um aviso de alerta para governos e cidadãos.  E para aqueles que têm o dom ou a capacidade de perceber o Mal em todas as suas formas sutis e enganadoras, vale a ressalva de que de nada servirá essa percepção se a omissão e o silêncio forem as opções escolhidas. Citando Kant: “Só as escolhas mais difíceis revelam liberdade absoluta”. Auschwitz que o diga!

Em 15 de abril de 2012

Peluso “manipulou” julgamentos, diz Joaquim Barbosa


Fernando Rodrigues

Vice-presidente do STF acusa presidente anterior de agir de forma “inconstitucional” e “ilegal”

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa atacou duramente o ex-presidente da Corte Cezar Peluso.
Joaquim Barbosa chamou Peluso de “ridículo”, “brega”, “caipira”, “corporativo”, “desleal”, “tirano” e “pequeno” em entrevista à jornalista Carolina Brígido,disponível para assinantes do jornal “O Globo”.
Mas para além dos ataques mais pessoais, o mais relevante foi uma acusação feita por Joaquim Barbosa: “Peluso inúmeras vezes manipulou ou tentou manipular resultados de julgamentos, criando falsas questões processuais simplesmente para tumultuar e não proclamar o resultado que era contrário ao seu pensamento”.
Trata-se de acusação gravíssima. Se o ex-presidente do STF de fato cometeu tal manipulação, é necessário investigar. Abre-se uma crise institucional.
O “Globo” explica que Joaquim dá como exemplo do que seria a manipulação de Peluso julgamentos de políticos por causa da Lei da Ficha Limpa.
Eis o que diz o ministro Joaquim Barbosa: “Lembre-se do impasse nos primeiros julgamentos da Ficha Limpa, que levou o tribunal a horas de discussões inúteis; [Peluso] não hesitou em votar duas vezes num mesmo caso, o que é absolutamente inconstitucional, ilegal, inaceitável”.
Esse caso seria o do julgamento de 14.dez.2011 no qual o STF livrou Jader Barbalho da Lei da Ficha Limpa e assim deu ao político do Pará o direito de voltar ao Senado.
Esse julgamento estava empatado em 5 a 5 (o tribunal tem 11 integrantes). À época, o STF divulgou uma nota a respeito: “Diante do impasse, a defesa de Jader ingressou com o requerimento [para que fosse usado o voto de qualidade], que foi apresentado ao Plenário pelo presidente Cezar Peluso. ‘Consulto o plenário se está de acordo com a proposta?’, questionou o presidente. A decisão pela aplicação do dispositivo foi unânime. O relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, não participou da decisão porque está de licença médica”.
Joaquim considerou a atitude de Peluso errada: “[Peluso] cometeu a barbaridade e a deslealdade de, numa curta viagem que fiz aos Estados Unidos para consulta médica, ‘invadir’ a minha seara (eu era relator do caso), surrupiar-me o processo para poder ceder facilmente a pressões…”.
Joaquim Barbosa dá a entender que se considera vítima de preconceito de cor dentro do STF, ele que é o primeiro ministro negro da Corte. “Alguns brasileiros não negros se acham no direito de tomar certas liberdades com negros”, declarou na entrevista.
E mais: “Ao chegar ao STF, eu tinha uma escolaridade jurídica que pouquíssimos na história do tribunal tiveram o privilégio de ter. As pessoas racistas, em geral, fazem questão de esquecer esse detalhezinho do meu currículo. Insistem a todo momento na cor da minha pele. Peluso não seria uma exceção, não é mesmo?”.
As declarações de Joaquim Barbosa foram dadas, em parte, como resposta a uma entrevista concedida por Cezar Peluso ao site “Consultor Jurídico” em 18.abr.2012. Peluso nessa entrevista chama Barbosa de “inseguro”.
Ao ser indagado o que achava de ter sido chamado de “inseguro”, Barbosa respondeu: “Permita-me relatar um episódio recente, que é bem ilustrativo da pequenez do Peluso: uma universidade francesa me convidou a participar de uma banca de doutorado em que se defenderia uma excelente tese sobre o Supremo Tribunal Federal e o seu papel na democracia brasileira. Peluso vetou que me fossem pagas diárias durante os três dias de afastamento, ao passo que me parecia evidente o interesse da Corte em se projetar internacionalmente, pois, afinal, era a sua obra que estava em discussão. Inseguro, eu?”.