A dúvida registral é o instrumento jurídico posto à disposição de qualquer pessoa que não se conforma com as exigências formuladas pelo Cartório de Registro de Imóveis para o registro de um título
É um recurso previsto em lei para os casos de discordância das exigências ou para as hipóteses em que o interessados não as pode satisfazer.
Trata-se de processo de caráter administrativo, não jurisdicional. Pelo processo de dúvida registral as exigências formuladas pelo Oficial do Registro de Imóveis podem ser julgadas e revistas (ou não) por autoridade judiciária superior – no caso o Juiz de Direito competente, assim definido na Lei de Organização Judiciária dos Estados.
A expressão dúvida registral deve sempre ser tomada em sentido técnico-jurídico e não em senso ordinário. O Oficial do Registro nunca tem dúvida – no sentido de hesitação, de insegurança, de pusilanimidade ou de indecisão na tomada de decisão.
Ao formular a exigência, o Oficial do Registro esgota a sua atribuição legal que consiste em examinar, de maneira detalhada e percuciente, o título e seus documentos e imperar a prática do ato de registro ou denegá-lo.
O Oficial sempre se baseia em sólidos fundamentos legais que devem ser enunciados sempre de maneira clara e objetiva na nota devolutiva.
Nota Devolutiva é documento que exterioriza as razões que fundamentaram a denegação do registro. Sua expedição é obrigatória.
O fundamento legal para a suscitação da dúvida registral é o artigo 198 da LRP – Lei de Registros Públicos (→
Lei Federal 6.015/1973) que reza: “havendo exigência a ser satisfeita, o oficial indicá-la-á por escrito. Não se conformando o apresentante com a exigência do oficial, ou não a podendo satisfazer, será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao juízo competente para dirimi-la”.
Em síntese, duas são as hipóteses legais para a suscitação de duvida registral:
- quando o interessado não concordar com as exigências formuladas pelo cartório e
- quando não as puder satisfazer de modo absoluto.
Quem pode suscitar a dúvida registral?
A lei faculta a qualquer pessoa provocar o registro ou a averbação (art. 217 da LRP). Uma vez apresentado o título, ingressando regularmente em Cartório, a pessoa que o entrega será identificado e daí em diante considerado como apresentante do título. Será o apresentante a pessoa legitimada para requerer a suscitação de dúvida. Presume-se que o apresentante represente os interesses daqueles que figuram como partes no contrato ou que tenha legítimo interesse no registro.
Veja o modelo de requerimento →aqui.
O que pode ser objeto de suscitação de dúvida registral?
As duas hipóteses em que o processo de dúvida pode ocorrer levam em consideração a pretensão resistida de prática de atos de registro ou de averbação. Cada uma dessas situações pode levar a caminhos distintos de endereçamento do processo administrativo.
Averbação ou registro?
Como posso saber se o ato será de registro ou de averbação?
No Estado de São Paulo distinguem-se dois caminhos diferentes. Convém desde logo identificá-los para poupar tempo. Mas vamos deixar claro:
Atenção! dúvida registral é cabível unicamente para o pedido de registro – não cabe para mera averbação.
O registro é o ato mais importante praticado num Registro de Imóveis. Os registros são considerados atos principais. Por ele alguém adquire a propriedade, hipoteca um bem ao banco, dá em alienação fiduciária em garantia, institui usufruto, doa um bem imóvel etc.
Já averbações são atos acessórios, que em regra aperfeiçoam ou atualizam os registros. São atos que visam atualizar ou aperfeiçoar um registro já existente.
Alguns exemplos podem ajudar a compreender:
Registro: compra e venda, hipoteca, alienação fiduciária, usufruto, doação, servidão, arrematação, adjudicação etc.
Averbação: mudança de estado civil, oneração de imóveis (como penhora, arresto, sequestro), locações para exercício de direito de preferência, cisão, fusão e incorporação de sociedades etc.
Veja mais:
Definido que estejamos diante da negativa da prática de um ato de averbação, a via adequada não será a suscitação de dúvida. Nesse caso, o apresentante deverá formular um pedido de providências diretamente perante o Juízo Competente. Para se obter o modelo do requerimento de instauração do pedido de providências e acessar outras informações úteis, acesse → pedido de providências administrativas.
Na dúvida, você pode questionar o registrador se o caso será de dúvida ou de mero procedimento administrativo.
No caso de averbação, o caminho será o → pedido de providências.
Preciso de um advogado?
Não. Nesta fase de irresignação em face das exigências formuladas pelo Registrador não é necessário a assistência de um advogado. Por se tratar de um procedimento administrativo (art. 204 da LRP) a capacidade postulatória (exigência de advogado) não é requisito indispensável, embora seja sempre recomendável a assistência de um profissional do Direito por envolver matéria técnica-jurídica.
Posteriormente, esgotando-se a fase de apreciação da dúvida pelo juiz singular, manejando o interessado recurso de apelação (art. 202 da LRP), a representação por meio de advogados será um requisito indispensável, como veremos em seguida.
Qual o prazo para requerer a instauração do processo de dúvida registral?
O Cartório de Registro de Imóveis tem o prazo máximo de 15 dias para ultimar o exame do título. Ao cabo desse prazo, deverá proceder ao registro ou devolver o título acompanhado de nota devolutiva indicando, com clareza, objetividade e de uma só vez, as exigências que estão a impedir o acesso do título e o registro perseguido.
O processo de exame, cálculo e registro deve ser ultimado em 30 dias (art. 205 da LRP). Uma vez devolvido o título com exigências, no interregno do trintídio o interessado poderá requerer a suscitação de dúvida. Note-se:
- O Oficial do Registro está obrigado a atender o pedido de suscitação de dúvida. Em caso de negativa, o interessado poderá representá-lo perante o juiz corregedor permanente (art. 30, II, da Lei 8.935, de 1994) para providências administrativas e disciplinares.
- A suscitação de dúvida deverá interromper o prazo de validade da prenotação (art. 198, I, da LRP). Esse procedimento garante os direitos do interessado contra quaisquer outros de terceiros.
- O prazo para a suscitação da dúvida deverá ser razoável. Admite-se o prazo de até 15 dias em analogia com o prazo de exame do título.
- Escoado o prazo de validade da prenotação, sem que o interessado manifeste de maneira expressa e formal sua irresignação (requerimento) somente com nova entrada, novo protocolo e nova prenotação será possível que o Oficial aprecie o pedido de suscitação de dúvida.
Basta só um requerimento?
Não basta um simples requerimento. O título deverá sempre ser reapresentado para exame integral pelo Juiz competente.
Atenção! O documento que foi devolvido deve ser anexado ao requerimento de suscitação de dúvida no original. Todos os demais documentos que acompanhavam o título deverão ser reapresentados.
O Juiz analisará as razões da devolução, as contra-razões, confrontando-as com o título. O Magistrado não está adstrito aos problemas levantados pelo Oficial, podendo avançar sobre aspectos não agitados pelo Serventuário. O exame do Juiz é livre e não vinculado ao exame antecedente do Oficial, nem às razões apontadas pelo interessado.
O que é impugnação? Qual o prazo?
Após a entrega do pedido de suscitação de dúvida, o interessado deverá aguardar que o Oficial o cientifique dos termos da dúvida e o notifique para que possa tomar as providências cabíveis:
- Impugnar, querendo, os termos da dúvida perante o juízo competente no prazo de 15 dias (art. 198, III, da LRP). A impugnação pode ser apresentada pelo interessado sem a concorrência ou representação por advogado.
- Quedar-se inerte. Não é necessário impugnar a dúvida. Com ou sem impugnação a dúvida haverá de ser julgada pelo juízo competente.
A impugnação consiste em confrontar as razões expostas pelo Oficial do Registro de Imóveis nos termos de dúvida.
Quem é o Juiz de Direito competente?
O juízo competente é aquele assim definido na Organização Judiciária dos Estados. No caso do Estado de São Paulo, é o juiz corregedor permanente dos Cartórios de Registro de Imóveis. Especificamente no caso da Capital de São Paulo, é o juiz da Primeira Vara de Registros Públicos de São Paulo.
O que é dúvida inversa?
Também chamada de dúvida registral inversamente suscitada, trata-se de prática não vedada pela lei e pelas autoridades judiciárias e que consiste em deduzir, diretamente perante o juízo competente, a pretensão de superar as exigências formuladas originariamente pelo Oficial Registrador.
Nesse caso, o juiz determina a autuação do pedido e abre vistas dos autos ao Registrador, que deverá:
- Prenotar imediatamente o título.
- Prestar as informações rogadas e fundamentar as exigências formuladas anteriormente.
Note-se que a dúvida ordinária ou a inversamente suscitada leva sempre à procedência ou improcedência em relação ao Oficial Registrador, já que a suscitação de dúvida é atribuição cometida pela lei exclusivamente ao Registrador e não às partes interessadas.
Procedência ou improcedência?
A dúvida será procedente quando o juiz de direito competente confirmar a posição do cartório. Serão procedentes as razões do Oficial do Registro de modo que o registro não se consumará. Note-se que o juiz não está adstrito às questões apresentadas pelo Oficial Registrador podendo denegar o registro por razões outras que não as que foram originariamente opostas pelo encarregado do Registro.
Será improcedente quando as exigências formuladas pelo Oficial forem superadas e o registro for autorizado. Nesse caso, o título retorna ao Cartório que haverá de praticar os atos anteriormente negados, retroagindo os efeitos do registro à data da prenotação (apresentação do título).
Saliente-se que mesmo nas hipóteses de dúvida inversamente suscitada, a regra da procedência ou improcedência não se modifica: será procedente quando o registro não se fizer, improcedente quando o registro for autorizado.
Ainda posso recorrer? Quais os recursos disponíveis?
Se a dúvida for julgada procedente, ainda resta a via do recurso de apelação prevista no art. 202 da LRP. O prazo para recorrer é de 15 dias.
Nesta fase para recorrer o apresentante deverá ser representado por advogado.
Não cabe recurso especial (STJ) nem recurso extraordinário (STF). O procedimento de dúvida reveste-se de caráter administrativo, não-jurisdicional, agindo o juízo monocrático, ou o colegiado, em atividade de controle da Administração Pública, consoante decisões das cortes superiores, razão pela qual descabem tais recursos.
Quais os efeitos da decisão?
A lei estabelece o procedimento registral para o desenlace da dúvida:
- Procedente. Se a dúvida for julgada procedente, os documentos serão restituídos à parte, dando-se ciência da decisão ao oficial, para que a consigne no Protocolo e cancele a prenotação;
- Improcedente. Se a dúvida for julgada improcedente, o “interessado apresentará, de novo, os seus documentos, com o respectivo mandado, ou certidão da sentença, que ficarão arquivados, para que, desde logo, se proceda ao registro, declarando o oficial o fato na coluna de anotações do Protocolo”. (art. 203 da LRP).
Via jurisdicional
A via jurisdicional (não administrativa) não está fechada ao interessado.
Como já salientado, a decisão da dúvida tem natureza administrativa e não impede o uso do processo contencioso competente (art. 204 da LRP). Havendo interesse, o apresentante poderá recorrer à via jurisdicional para alcançar o registro denegado pelo Oficial do Registro.
A via do mandado de segurança, segundo parte da doutrina, acha-se também aberta.
Fonte: http://cartorios.wordpress.com/
OBS.:
Lembramos que uma das principais fontes de dúvida registral é a questão do desconto de 50% das custas cartorárias para registro do 1º imóvel financiado no SFH.
Fique atento aos seus direitos! Reclame e suscite a dúvida registral sempre que se sentir prejudicado.