Sandra Starling
Aqui e acolá, petistas vêm reclamando de que o julgamento do mensalão vai sendo tocado por integrantes de uma institucionalidade que representa apenas os interesses dominantes na sociedade brasileira. Esse argumento merece uma contradita.
Em primeiro lugar, a escolha do PT em privilegiar a institucionalidade existente, sem a mínima crítica, não se deu quando o partido resolveu se legalizar segundo regras da Lei Orgânica dos Partidos Políticos, concebida pelo então poderoso e maquiavélico general Golbery do Couto e Silva.
Àquele tempo, fez-se de tudo para extrair leite das pedras e ampliar os poucos espaços para uma participação política menos restritiva do que a que a lei pretendia impor. Tanto assim que se optou por apenas ratificar nas convenções oficiais o que já havia sido anteriormente decidido nos encontros de base: primeiro, nos municipais; depois, nos estaduais, com a participação de delegados tirados nos encontros anteriores; e, finalmente, nos encontros nacionais.
Para fugir, também, ao modelito autocrático, foi consagrado o Artigo 14 do estatuto original do PT, que liberava os militantes de seguirem as deliberações partidárias nos movimentos sociais, em profundo respeito à autonomia desses (dou risada quando vejo, agora, a CUT patrocinar filiações ao partido!).
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SEM CAUDILHOS
SEM CAUDILHOS
Tratou-se, também, para dar mais um exemplo, de instituir Conselhos de Ética onde jamais tivessem assento dirigentes partidários. E, assim, se logrou aproveitar todas as (poucas) brechas deixadas pela lei para se tentar organizar um partido mais democrático com decisões “de baixo para cima”. Sem donos. Sem caudilhos.
A imposição da vontade de órgãos estatais por cima das decisões intrapartidárias deu-se quando a direção nacional, ainda nos anos 80, resolveu adotar como critério de “efetivamente filiado” aqueles delegados cujos nomes constassem da listagem dos respectivos tribunais regionais eleitorais, em vez de arrolamentos emanados das executivas estaduais. Aí começaram a prevalecer na luta política interna as decisões heterônomas (oriundas das regras impostas pelo Estado brasileiro).
Como chiar agora, dizendo que os petistas estão sendo julgados por um STF que representa os dominantes?! Esqueceram-se de que, dos 11 juízes, apenas três não foram apontados por presidentes da República petistas? E que os dois procuradores gerais da República que cuidaram do mensalão foram indicados e reconduzidos por Lula?
Neste passo, convém também, num salto histórico, lembrar que foi o primeiro governo Lula que, para agradar o eleitorado e não assustar as classes dominantes, soltou e cumpriu a “Carta aos Brasileiros”, comprometendo-se com os poderosos de sempre. Dizer agora que Joaquim Barbosa se esquece de que está fazendo o papel de joguete das classes opressoras parece piada.
Por último, é necessário perguntar como é que se pode ser “preso político” em plena vigência de um governo do próprio partido dos condenados? Conversa para boi dormir.
(Transcrito do jornal O Tempo)