segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Federalismo brasileiro é só para inglês ver...



Cesar Ramos
Montesquieu ensinou o modo pelo qual os estados modernos poderiam praticar a democracia, mas advertiu: ela só era viável em países de reduzidas dimensões. Os EUA contornaram o óbice, dividindo-se em vários estados, unidos.
O filósofo francês Gabriel Bonnot de Mably (cit. Bobbio, 1987: 103)  reconheceu de imediato a eficácia da solução em “Observações sobre o Governo e as Leis dos Estados Unidos da América” (1784): “Somente através da união federativa a república, que durante séculos após o fim da república romana foi considerada uma forma de governo adequada aos pequenos Estados, pode tornar-se a forma de governo de um grande Estado como os Estados Unidos da América.”
Os norteamericanos retalharam o poder, intrínseca e espacialmente, relacionando-o num sistema de terminologia mecânica – “freios e contrapesos” – porém não estanques, e sim desse modo relativizados, ensejando combinações equilibradas e impedindo o crescimento de qualquer hegemonia, para completa admiração do historiador francês Alexis de Tocqueville:
“Vejam com que arte, na comuna americana, tomou-se o cuidado, se assim posso me exprimir, de espalhar o poder, a fim de interessar mais gente pela coisa pública. O poder administrativo nos Estados Unidos não oferece em sua constituição nada central nem hierárquico; é isso que o faz não ser percebido. O poder existe, mas não se sabe onde encontrar seu representante.”
O notável cientista político e senador italiano Norberto Bobbio neste ponto também foi enfático. “O federalismo é o princípio mais profundamente inovador da era contemporânea… Quando se diz que o federalismo marca o rumo da história contemporânea, no sentido de uma efetiva ação de liberdade, significa dizer que o federalismo executa, no âmbito da sociedade civil, o acordo entre o poder central e os grupos periféricos, com um maior respeito às autonomias das partes individuais do que se refere ao todo, e com um menor fortalecimento do todo no que se refere às partes, levando-se em conta o que ocorreu nos sistemas históricos até aqui conhecidos.”
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D. PEDRO II NOS EUA
Dom Pedro II viajou a Washington, de lá trazendo a fórmula completa, mas o golpe militar fez o país se prostrar de joelhos à nova “classe política”. Na geração seguinte, coube a Getúlio a extrema-unção do federalismo, queimando as bandeiras estaduais. E a Revolução de 64 colocou a pá-de-cal no regime que permitiu aos colonos do Mayflower o impressionante desenvolvimento. A Constituição de 88 aperfeiçou a tolice, ao gáudio dos incontáveis mensaleiros.
O Brasil sempre se mostrou federativo apenas “para inglês ver”. Nenhum político tem fito de repartir o poder. E quanto mais competente, quanto mais forte sua vontade de poder, menor o apreço ele tem à liberdade. A negação total do valor da liberdade, a maximinização do domínio – eis ai a idéia de autocracia e o princípio do absolutismo político – o poder do Estado concentrado em um único indivíduo, caso do Príncipe, de Maquiavel, ou num grupo, caso do Príncipe, de Gramsci.
A implementação do regime federativo somente será possível através de completa reformulação constitucional, iniciativa impossível de ocorrer por parte do Congresso, ou do Executivo. Significa retirar o poder da impostura, devolvendo ao povo o que lhe pertence. Ela, naturalmente, jamais concordará.
Para mim, existe apenas uma chance quase insignificante à reversão. Ela passa pela conscietização dos governadores, já comprovados alienados ao desdenharem, e até condenarem à heróica atuação de Itamar Franco. S. Exas. preferem deixar que a riqueza produzida em seua territórios seja surrupiada ao centro, onde repartem o gigantesco butim.

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