terça-feira, 10 de dezembro de 2013

A gente sempre dá um jeito, por Elton Simões


Uma simples verdade: no fim, a gente sempre dá um jeito. Às vezes até um jeitão. Ou, carinhosamente, “jeitinho”.
“Jeitinho”, a gente sabe, é um modo de agir informal, amplamente aceito, que se vale de improvisação, flexibilidade, criatividade, intuição, etc., diante de situações inesperadas, difíceis ou complexas, não baseado em regras, procedimentos ou técnicas estipuladas previamente.
O “jeitinho” não conhece limites. Escrúpulo passa a ser limitação que a urgência não pode tolerar. Normas são vistas como meros inconvenientes. Artifícios de validade ética discutível são a norma.
O “jeitinho” justifica a violação de normas e convenções sociais, através de navegação social dissimulada. Faz uso da chantagem emocional, laços afetivos e familiares, recompensas, promessas, dinheiro, ou outros francamente antiéticos, para obter favores para si ou para outrem.
Os adeptos do “jeitinho” consideram de alto status agir dessa forma, como se isto significasse ser uma pessoa articulada, bem posicionada socialmente, capaz de obter vantagens inclusive ilícitas, consideradas imorais por outras culturas. Entretanto, o “jeitinho” é nocivo e custa caro. Por isso, surpreende que o “jeitinho” não seja ilegal, ou no mínimo, considerado imoral.
Além disso, o “jeitinho” somente tem valor em momentos de crise aguda, quando não parece mesmo existir alternativa. Portanto, a incompetência é, na maior parte dos casos, condição necessária e indispensável para que ele tenha algum valor. O número de vezes em que o “jeitinho” é utilizado é diretamente proporcional ao grau de incompetência.
“Dar um jeito” ou “Dar um jeitinho” significa encontrar alguma solução não ideal ou previsível. “Jeitinho” é sintoma de sistema doente. Não é virtude, mas apenas um conjunto de ações desesperadas para remediar situações que não precisariam existir se as coisas tivessem sido bem feitas.
É a venda da facilidade através da fabricação da dificuldade. E, como a capacidade de criação de dificuldades é ilimitada, o preço da facilidade é infinito.

Elton Simões mora no Canadá. Formado em Direito (PUC); Administração de Empresas (FGV); MBA (INSEAD), com Mestrado em Resolução de Conflitos (University of Victoria). E-mail: esimoes@uvic.ca

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