Carlos Newton
Oportuna reportagem de Erich Decat, na Folha, revela que diversos advogados e até ex-ministros do Supremo Tribunal Federal entendem que a perda de mandato do deputado João Paulo Cunha (PT-SP) deve ser imediata.
É triste contestar esse tipo de informação, mas devemos entender que no Brasil de hoje isso é totalmente impossível. Tão cedo João Paulo Cunha não será punido, porque a Justiça brasileira tem tantas brechas e desvios que até os grandes juristas se perdem no meio delas.
Qualquer iniciante com um mínimo de prática forense sabe que o Judiciário é um poder apodrecido, uma espécie de Ilha da Fantasia dos magistrados. Por exemplo: só quem cumpre prazos são os advogados. Juízes, desembargadores, ministros, tribunais, ministério público – nenhum deles se vê obrigado a respeitar prazos. Os processos repousam em berço esplendido, o advogado entrega uma petição e ela pode ficar até mais de um mês paralisada no Protocolo Geral, até ser anexada aos autos. Depois, quanto tempo levará até o juiz abrir novamente o processo? Ninguém sabe, ninguém controla, ninguém pune. Os magistrados são semideuses.
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CONTROVÉRSIAS
CONTROVÉRSIAS
No caso do mensalão, João Paulo Cunha está mais do que julgado e condenado, mas há controvérsias. A Constituição, para variar, é dúbia. O parágrafo 2º do artigo 55 estabelece que a cassação será decidida pela Câmara, “por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa”. E o inciso IV do mesmo artigo 55 da Constituição estabelece a cassação para quem perder os direitos políticos. Aí, a perda será declarada pela Mesa da Câmara de ofício ou após provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, também assegurada ampla defesa.
Deduz-se que a perda dos direitos políticos é automática e ocorre quando há condenação criminal com trânsito em julgado, e perdura enquanto durarem os efeitos da pena aplicada. Bem, deveria ser assim. Mas na prática não é.
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DEVAGARINHO
DEVAGARINHO
No caso de João Paulo e também dos deputados mensaleiros Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT), ainda não julgados, o processo é devagar, devagarinho. Primeiro, leva-se meses até publicar a sentença do julgamento em curso. Depois, apresentam-se os recursos, que o Supremo também leva meses ou até anos para julgar. Só quando publicado o acórdão final, esgotados os recursos, é que o réu é condenado e perde automaticamente os direitos políticos. Mesmo assim, terá de ser julgado de novo na Câmara e condenado por maioria absoluta, vejam só que esculhambação, porque para o Congresso a decisão do Supremo não vale nada, acredite se quiser.
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CONDENADO E REELEITO
CONDENADO E REELEITO
Assim, para um deputado perder o mandato após condenação criminal transitada em julgado – quando não há mais possibilidade de recurso –, é necessário o voto a favor de pelo menos 257 colegas. Isso, até agora, não aconteceu com os deputados já condenados pelo Supremo. E nem foi exatamente por corporativismo dos demais deputados. Em nenhum dos casos de condenação ocorridos, a Câmara foi notificada das decisões do Supremo, a esculhambação é maior do que pensávamos.
O caso mais notório é do deputado Natan Donadon (PMDB-RO), condenado a 13 anos e quatro meses de prisão por formação de quadrilha e peculato em 2010. Até hoje, quase dois anos depois do julgamento, não houve trânsito em julgado do caso do peemedebista. Ele até conseguiu se reeleger para mais um mandato. Assim como Natan, outros casos são do deputado Asdrúbal Bentes (PMDB-PA) e dos ex-deputados José Tatico (PTB-GO) e Zé Gerardo (PMDB-CE). Os dois últimos tentaram a reeleição, mas não conseguiram. Foram punidos pelos eleitores.
Portanto, vamos logo nos acostumar com a ideia de que João Paulo Cunha e os outros mensaleiros só podem ser punidos pelos eleitores. Não devemos alimentar ilusões.
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