quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Exemplos inúteis, por Luis Fernando Veríssimo



O sucesso do Wellington Nem no Fluminense traz de volta um velho debate: que tamanho deve ter um jogador de futebol? Não haveria mais lugar para jogadores pequenos num esporte que cada vez mais se decide pela imposição física. Errado, dizem outros. É justamente para se impor aos grandalhões que servem os baixinhos.
A discussão já deveria ter acabado há muito tempo, com as carreiras de Maradona, Romario e Messi, para citar só três exemplos de mirrados que brilharam nos últimos anos, quando o futebol supostamente se transformou em coisa para gente grande. Mas as exceções não convencem, e a discussão continua.
Um pouco como o debate sobre de que tamanho deve ser a participação do estado na economia. A atual crise na Europa e as próximas eleições presidenciais nos Estados Unidos não são sobre outro assunto. Estado regulador ou mercado livre? Como no debate sobre as dimensões ideais de um jogador de futebol, os argumentos de um lado e do outro não parecem fazer muita diferença.
Os exemplos são inúteis. Você esperaria que os descalabros do capital financeiro, responsável direto pela crise, diminuiriam o entusiasmo dos defensores do mercado, já que o que faltou para enfrentar a voracidade destruidora do capital foram intervenções do Estado quando ainda dava para evitar o pior. Mas não, prega-se menos e não mais controle.
O argumento é que, historicamente, em todas as suas crises o capitalismo se autorregenerou sozinho. Errado. Não é preciso ter lido Eric Hobsbawm para saber que em todas as suas crises o capitalismo foi salvo dele mesmo por alguma forma de intervencionismo corretivo — o que não significou que abandonasse seus maus hábitos.
As multidões que se manifestam na Europa em crise não são de mal acostumados inconformados com o fim de estados irrealistas de bem-estar social, como dizem os mercadófilos, são de inconformados com a injustiça de a maioria estar pagando pelos desmandos de uns poucos, que continuam desmandando.
O capital financeiro tantas fez que, além de perverter a atividade econômica e a função bancária, perverteu a semântica: transformou “austeridade” em palavrão. Hoje tem gente morrendo de austeridade na Europa. Não que este argumento vá fazer qualquer diferença.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário