Carlos Chagas
Dos 513 deputados federais, 82 são candidatos a prefeito e 5 a vice-prefeito. Disputarão prefeituras 5 senadores, dos 81. A gente fica pensando que motivos levam personagens envolvidos no plano federal a mergulhar nos municípios. Falta de condições para tratar de problemas nacionais? Desencanto pela frustração de não encontrar soluções ou competência para resolver o todo, preferindo cuidar das partes, ou retornar a elas? Mero enfado por precisarem viver em Brasília, ou na detestável ponte aérea entre a capital e suas origens? Quem sabe a descoberta de mecanismos de ação direta para ajudar o semelhante? Descrença na democracia representativa? Ou a desconfiança, até a certeza, de que não retornarão ao Congresso nas próximas eleições?
Vai fazer falta?
Tanto faz a razão, pois a verdade é que estão abandonando propostas nacionais e muitas vezes inviáveis em troca de objetivos específicos, municipais. Em vez de contribuir para aprimorar a Constituição ou emendar leis obsoletas, vão cuidar da construção de pontes, avenidas e postos de saúde. Para os que concorrem às prefeituras das capitais ou grandes cidades, sempre haverá o sonho de mais tarde ascenderem aos governos de seus estados, mesmo diante do perigo de, se vitoriosos, acabarem outra vez na Câmara ou no Senado. Coisa de que nem cogitam agora.
Dizia o saudoso dr. Ulysses que ninguém mora (com homenagens à sua excepcional mulher) no país ou no estado. Mora-se no município.
Não deixa de ser estranha essa opção de deputados e senadores retornarem ao ponto de partida, não obstante exceções. Wenceslau Brás deixou a presidência da República após complicado mandato, para tornar-se vereador em Itajubá, por muitas décadas. Rodrigues Alves saiu do palácio do Catete, no Rio, para voltar a ser governador de São Paulo. Exemplos não faltam, senão desses retornos surpreendentes, de recuos menos notáveis, do Congresso Nacional para os municípios.
O singular no atual momento eleitoral é o número jamais alcançado no passado. Até agora 87 mandatários federais saltam de banda e optam pela ação política em suas bases primárias. Muitos quebrarão a cara, é óbvio, perdendo a eleição e obrigados a permanecer no plano federal, não propriamente por sua vontade. Boa parte, porém, festejará o retorno.
Um cientista político e até um sociólogo poderiam dedicar-se à exegese filosófica desse fenômeno, mas para nós, simples testemunhas, vale apenas perscrutar seus motivos. O maior deles, com poucas dúvidas, será o desencanto dos congressistas com a federação, cada vez mais uma ficção de Direito. Assiste-se o poder central prescindir do Poder Legislativo, coisa verificada à força na ditadura do Estado Novo de 1937 a 1945 e no regime militar de 1964 a 1985.
Servem para quê, deputados e senadores, a não ser aqueles que se dedicam a variadas formas de mensalões e sucedâneos? Atingidos pela impotência de realizar promessas de antigas campanhas, vão concluindo ser melhor prestar serviços reais do que girar em torno de sonhos impossíveis, como o de mudar o Brasil ou de aprimorar a democracia a partir do ápice da pirâmide.
Por essas e outras razões, um belo dia o Congresso desaparece sem que ninguém se tenha dado conta.
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