segunda-feira, 25 de março de 2013

QUE VERGONHA! Petistas querem “lealdade” do futuro ministro do Supremo — imaginando livrar a cara dos mensaleiros condenados na fase de recursos


Ricardo Setti

Ministros do STF Ricardo Levandowski e Luiz Fux (Foto: Carlos Humberto / STF)
Ministros do STF Ricardo Levandowski e Luiz Fux: para a escolha do novo ministro, na vaga de Ayres Britto, o primeiro é citado por petistas graúdos como "exemplo de lealdade"; o segundo, por sua independência no caso do mensalão, como algo que não se deve repetir (Foto: Carlos Humberto / STF)
O ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres Britto se aposentou em novembro do ano passado, depois de presidir com firmeza e isenção a maior parte do julgamento do caso do mensalão. E até agora, decorridos mais de quatro meses, o governo não dá sinais de movimentação para designar seu substituto.
Pouca gente sabe — e eu sou um dos que NÃO sabe — o que a presidente Dilma vem cogitando antes de focar-se em um nome.
O que, sim, eu sei — e que me cobre de vergonha, como brasileiro — é que, dentro do PT, e mesmo em círculos mais próximos à presidente, o que se comenta não é tanto a competência técnica do futuro ministro, seu currículo, sua experiência. O que se comenta é sobre a necessidade de que o futuro ministro tenha uma misteriosa qualidade: “lealdade” — seja política, seja ideológica, seja o que for. Certamente seria ao governo que o designará.
Quando se cita a “lealdade”, cita-se, ao mesmo tempo, o ministro Ricardo Lewandowski, aquele mesmo que, como revisor do processo cujo relator foi o ministro Joaquim Barbosa, criou todos os casos possíveis para atrasar o julgamento do mensalão e que em geral se pronunciava pela não culpabilidade dos principais figurões do PT envolvidos na roubalheira.
Há também quem sussurre para não se correr novamente o “risco Fux” — uma referência ao ministro Luiz Fux, cujo nome foi indicado pela presidente ao Senado e que tomou posse em março de 2011. Fux fizera intenso lobby para ser alçado do Superior Tribunal de Justiça (para o qual fora nomeado, em lista tríplice, pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso). O lobby incluiu reunião e até apelo ao próprio José Dirceu, já fora do governo e denunciado ante o Supremo pelo procurador-geral da República como “chefe da quadrilha” do mensalão — mas ainda influente.
Uma vez no Supremo, porém, Fux, no processo do mensalão, agiu com plena independência e revelou-se um dos ministros mais rigorosos no julgamento e na condenação dos mensaleiros.
Os petistas não querem ver repetido o caso — principalmente num período em que o Supremo, depois de publicado o acórdão (espécie de resumo da sentença) do julgamento, provavelmente até o final de abril, começará a examinar recursos ainda cabíveis interpostos pelos réus. Gostaria, essa gente, de ver um ministro “amigo” na hora de debruçar-se sobre os recursos, para, quem sabe, ajudar a aliviar a pena de alguns dos figurões condenados.
Resta saber, porém, que jurista com um mínimo de dignidade profissional e pessoal se prestaria ao papel de se comprometer a ser “leal” — no mau sentido da palavra — ao governo que o nomeou no mais alto tribunal do país.
Saulo Ramos: depois de chegar ao Supremo, a independência é a regra (Foto: veja.abril.com.br)
O ministro do Supremo, com efeito, é um agente do Estado tão poderoso e com tantas garantias — não pode ser demitido por ninguém (só é afastado se cometer crime), não pode ser aposentado antes de completar 70 anos, não pode ser mudado de cargo, não pode ter os salários reduzidos, tecnicamente não deve nada a ninguém, em tempo algum — que alguém nessa posição só será submisso ao Executivo por razões de péssimo caráter.
Que, naturalmente, incluem a possibilidade de ser corrompido.
Claro que há exceções à regra quase geral do comportamento isento, mas acho que está correto o experientíssimo ex-ministro da Justiça Saulo Ramos, grande advogado e jurista que, em 2010, quando o consultei sobre que influência haveria no Supremo com tantos ministros sendo nomeados por um só presidente – Lula, que àquela altura faria sua nona indicação –, disse, entre outras coisas, o seguinte:
– Na longa história do Supremo Tribunal Federal são muito raros os casos de ministros nomeados por um presidente da República e que a este fiquem subservientes no posterior exercício da função. Houve alguns que até hostilizaram, em votos, seus patronos apenas para demonstrar sua total independência, o que também é mau, pois demonstra parcialidade ao contrário.
Aguardemos e vejamos se a presidente vai se deixar envolver pelo canto de sereia dos petistas que querem livrar a cara dos mensaleiros de alguma maneira, ou manterá a sobriedade e a correção técnica das indicações que fez até agora para o Supremo.

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