Lula mal tomara posse, em janeiro de 2003, quando lhe caiu no colo a oportunidade de escolher o primeiro dos oito ministros que indicaria para o STF durante seus dois reinados. Incumbiu o ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos de garimpar um nome. Manifestou um desejo: gostaria muito de enviar ao Supremo um negro. ...
No mês seguinte, fevereiro de 2003, Joaquim Barbosa, então professor visitante da Universidade da California, em Los Angeles, foi alcançado por um e-mail enviado por um desconhecido: Sérgio Sérvulo. A mensagem viraria do avesso sua rotina e abriria em sua biografia um capítulo novo.
Então assessor de Thomaz Bastos, Sérvulo fez saber a Barbosa que seu chefe desejava reunir-se com ele em Brasília. Ao tomar contato com o currículo do seu achado, o ministro da Justiça de Lula reagira como se houvesse bamburrado, como dizem os garimpeiros quando a sorte lhes sorri no serviço de mineração.
Além da coloração de pele requerida pelo presidente, Barbosa exibia bom currículo. De origem humilde, primogênito de oito filhos de um pedreiro com uma dona de casa da cidade mineira de Paracatu, o escolhido formara-se e pós-graduara-se na Universidade de Brasília. Melhor: era doutor pela Sorbonne, a prestigiosa usina de canudos de Paris. Antes de chegar à Universidade da Califórnia, lecionara como visitante na faculdade de Direito de Columbia, em Nova York. Como se fosse pouco, era também eleitor de Lula, Thomaz Bastos ficaria sabendo depois.
Barbosa voou para Brasília. Foi ter com o titular da Justiça, a quem não conhecia senão de nome e de fama. Retornaria a Los Angeles apenas para providenciar a mudança e vender um carro. Em junho de 2003, tomou posse no Supremo. Decorridos nove anos, tornou-se um algoz do PT, uma pedra no sapato do ex-minerador e uma ameaça ao verbete que a enciclopédia reserva ao governo do ex-mandachuva da mina.
Nesta segunda-feira (20), na pele de advogado de um dos réus da ação penal do mensalão, Thomaz Bastos protocolará no STF, junto com defensores de outros acusados, petição contra uma tese cara ao relator Barbosa. Na peça, os doutores classificam de aberração o julgamento fatiado. Reivindicam a leitura integral dos votos dos juízes, não a análise por capítulos.
Em texto veiculado aqui, explicou-se o por quê da aversão dos advogados ao fatiamento. Julgado à moda de Barbosa, o processo do mensalão ganha lógica, realça a tese de formação de quadrilha e potencializa a hipótese de condenações em série. Algo que, se confirmado, faria da história do governo Lula uma ponte ligando o sucesso ao “por outro lado”. Com um escândalo no meio.
Quando pudesse finalmente se pronunciar sobre o passado ainda em suspenso, o verbete da enclopédia teria de anotar que Lula distribuiu renda como nunca antes na história desse país. Por outro lado, permitiu que fossem distribuídas também as valerianas de má origem que azeitaram o apoio no Congresso. Ao contribuir para derrubar o lero-lero segundo o qual o escândalo é uma lenda, Barbosa deve inspirar no ex-presidente que ajudou a eleger uma irremediável sensação de arrependimento.
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