Dois episódios comprovaram o fracasso do modelo de agências reguladoras implantado no Brasil. O primeiro e mais escandaloso foi a venda de pareceres técnicos com a intermediação de dois irmãos integrantes da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) e da ANA (Agência Nacional de Águas).
O segundo refere-se à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que está demorando anos para autorizar o licenciamento de medicamentos no Brasil. A denúncia é da associação de fabricantes de medicamentos.
A criação das agências reguladoras foi uma boa ideia no papel que acabou não funcionando bem. As razões são muitas e variadas.
Faltam recursos e material humano. As agências são sabotadas pelos ministérios, que relutam em perder poder. Algumas, porém, extrapolam no seu poder de regulamentação. As indicações, que deveriam ser estritamente técnicas, são políticas e pouco transparentes, além de seguirem critérios duvidosos.
A indicação de dois irmãos por meio da ex-chefe de gabinete da Presidência da República em São Paulo é uma vergonha e demonstra como o modelo padece da necessária seriedade e transparência.
Tampouco é adequado o papel de “proconzão” que as agências estão assumindo. Não custa lembrar que elas regulam setores estratégicos. E, como tal, não devem se comportar exclusivamente como agências setoriais de defesa do consumidor.
Na época em que foi instituído pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o comando das agências tinha um perfil mais técnico e independente. Ainda no governo FHC, a situação começou a piorar em termos de autonomia.
No governo Lula, sucederam indicações políticas de cunho técnico precário que só fragilizaram ainda mais o modelo.
O Senado Federal, responsável por analisar as indicações para as diretorias das agências, também tem seu quinhão de culpa, não dando o devido tratamento às sabatinas. O ideal seria que estabelecesse critérios técnicos que poderiam rejeitar a indicação de personalidades de perfil comprometido ou inadequado.
O Senado deveria cobrar, de todos os indicados e sabatinados, um relatório anual de suas atividades a fim de que este seja submetido a debate parlamentar. Já que referendou a indicação do Executivo, cabe aos senadores fiscalizar o desempenho do indicado.
Falta, também, uma espécie de ombudsman para as agências, ou seja, uma instituição na qual os desvios possam ser denunciados e investigados, e o denunciante seja protegido.
Ninguém, em sã consciência, critica abertamente uma agência reguladora, sob pena de ter seus interesses prejudicados na forma de uma retaliação. A existência de uma corregedoria seria ideal para fiscalizar a atuação das agências.
Além de serem fiscalizadas, elas deveriam também ter uma espécie de rating anual acerca de sua eficiência. Uma espécie de Enem para as agências. Tais avaliações deveriam ser divulgadas amplamente e submetidas a debate no Congresso.
Há anos tramita uma proposta na Câmara que redefine o papel das agências. Infelizmente, o projeto não avança.
Dias atrás, a Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle do Senado aprovou o projeto que prevê a realização de auditorias periódicas do Tribunal de Contas da União nas agências reguladoras. Apresentada pelo então senador Gerson Camata, em 2007, a matéria seguirá para análise da Câmara dos Deputados. Apesar de vários projetos tramitarem na Casa, o avanço é lento.
Considero a existência de agências reguladoras um avanço frente ao modelo anterior. Mas, da forma como funcionam, é essencial reavaliar o modelo e aperfeiçoá-lo. Urgentemente.
Murillo de Aragão é cientista político
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