Percival Puggina
Não sou fã da atual configuração do STF. Após certas deliberações ali tomadas, a Constituição deveria receber atendimento em Pronto Socorro para se refazer dos maus tratos. Coisa muito feia. Na origem dessa minha zanga está a tal história de tomar os princípios constitucionais em estado bruto e passá-los no esmeril, dando-lhes formato que sirva para articular o texto com o que vai na testa do julgador. Tal conduta é mais do que recorrente. Já vi ministro invocar o princípio da dignidade da pessoa humana até para opor-se à rinha de galos (concordo com a proibição, mas não com a aplicação desse princípio ao caso). Impossível negar, porém, que a Corte, neste momento, desfruta de amplo reconhecimento nacional. A atividade que vem desenvolvendo é aparatosa, demorada, mas consistente. Os fatos foram objeto de perícias. Há provas documentais, circunstanciais e testemunhais. Poucos põem em dúvida as ocorrências descritas. E todos os que dizem que os crimes não existiram são pagos para tanto, ou têm a perder, com o reconhecimento deles, algo material ou imaterial, de cunho político, ideológico ou filosófico.
Seja como for, o julgamento do Mensalão põe na mesa dos debates o sistema de governo, o sistema eleitoral e a política como a praticamos no Brasil. Repetidas vezes essas pautas têm sido objeto de considerações dos ministros do STF e da mídia que cobre as sessões. Inúmeras vezes, também, do alto da minha insignificância, tenho escrito que esse modelo é ficha-suja, concentra poder político e financeiro em proporções incompatíveis com a democracia e, por isso mesmo, atua como feromônio para atrair e excitar patifes de toda ordem. São tantas e tamanhas as regalias disponíveis no almoxarifado do poder que só fica ao seu desabrigo quem quer. O Mensalão é a monetização de outras práticas para composição de maiorias parlamentares, que se instalaram no país desde que Collor foi apeado do poder.
Hoje vamos às urnas. Do meu ponto de vista, a política brasileira alcançou um nível de degradação que só os eleitores podem retificar. O sistema e seus males jamais serão corrigidos por via judicial. Menos ainda com as mudanças dependendo de uma deliberação dos que dele se beneficiam. No entanto, o cidadão, o ser humano em sua dimensão política, pode, por ato da própria vontade, abandonar os velhos critérios de escolha e proporcionar aos partidos, em sua negligência, sucessivas lições de discernimento, escolhendo não apenas os bons, mas os melhores entre os bons.
O que escrevi só será utópico se considerarmos que o Mensalão venceu. Com efeito, assim como, em meio à indignação popular, há o Mensalão corrompendo os andares de cima, há o Mensalinho fazendo o mesmo nos andares de baixo. Todo eleitor que escolhe candidato por interesse pessoal, corporativo, comercial, não republicano, está usando a democracia e as instituições para benefício próprio. Sua atitude pouco difere daquela que despreza nos mensaleiros.
Ao votar hoje, tenha em conta de que as câmaras municipais são a estufa onde se produzem as futuras elites políticas do país. O eleitor que pretende votar no mais caricato, para "protestar"; no cara de determinada afiliação, sabe-se lá por quê; na celebridade tal ou qual, apenas porque já ouviu falar dele ou dela; e por aí afora, faça este favor à Nação: vote em branco ou nulo. Lembrem-se os demais, por fim, da frase de George J. Nathan - "Os maus políticos são eleitos pelos bons cidadãos que não votam". Portanto, às urnas, cidadãos!
Zero Hora, 07 de outubro de 2012
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