Em algum momento da atual Bienal do Livro de São Paulo se falará da iminente morte do livro e as opiniões se dividirão.
Alguns dirão que o livro nunca acabará, e aí estão as bienais, as feiras e as flips para provar isto, e outros dirão que o livro caminha para a obsolescência e logo estaremos lendo tudo em tabletes, ipodes, ipedes e E-tceteras. Não se chegará a nenhuma conclusão e a conversa será transferida para a próxima bienal.
O escritor americano John Barth não duvida que o livro como nós o conhecemos e amamos acabará, mas nos propõe dois consolos.
O primeiro é a história do fim dos dinossauros, cuja existência foi encurtada pelo choque de um asteroide com a Terra, mas ainda viveram um milhão de anos entre o impacto do asteroide e sua extinção completa.
Neste período apareceram alguns dos seus espécimes maiores — um bom presságio para a literatura impressa, que pode reagir ao choque da literatura eletrônica produzindo suas maiores obras antes de desaparecer.
O outro consolo sugerido por Barth — um bom romancista e ensaísta com o gosto por jogos de palavras e metalinguagem — é a opera, que não só é um exemplo de anacronismo que teima em sobreviver como nos fornece outra metáfora para a insistência em viver de um condenado.
Geralmente a melhor ária de uma ópera clássica é a última, quando uma heroína, digamos, à beira da morte ainda encontra força e fôlego para cantá-la. Pensemos no livro, portanto, como uma soprano tísica que ainda nos dará boas surpresas antes do fim.
Barth também poderia ter lembrado o disco de vinil, cuja morte — como se vê, hoje, nas lojas de disco — foi decretada prematuramente.
Muita gente está abandonando o CD e voltando para o vinil, o equivalente a largar o tablete e voltar para o livro. E a morte do livro vem sendo anunciada há muito tempo.
Se você aceitar que a paródia é a decomposição da literatura em estado avançado, e que “Dom Quixote” é um romance inaugural, então você pode dizer que essa conversa da morte do livro começou com Cervantes, há 400 anos.
Se resistiu à gozação de Cervantes, o livro resistirá a todos os impactos eletrônicos.
Se a paródia é a decomposição da literatura, e ‘Dom Quixote’ é romance inaugural, a conversa da morte do livro começou.
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