POLÍTICA
Merval Pereira, O Globo
É provável que tenhamos ainda hoje a definição dos votos sobre as acusações contra o deputado federal petista João Paulo Cunha, que precisa de quatro votos em cinco para ser absolvido (já recebeu os votos absolutórios dos ministros Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli) ou apenas mais dois votos para ser condenado pela maioria do Supremo Tribunal Federal.
Digo que é provável porque não se sabe qual a extensão do voto de Cezar Peluso. Se optar, como é o mais provável, por dar seu voto integralmente antes de se aposentar em 3 de setembro, poderá tomar boa parte da sessão de hoje.
O ministro Peluso tem o direito de antecipar o voto, não só pelo regimento interno do Supremo, mas pela decisão do plenário no primeiro dia de julgamento, cuja maioria decidiu que cada um votaria da maneira que quisesse.
O fato de todos até agora, inclusive o revisor, terem aceitado adotar o procedimento proposto pelo relator Joaquim Barbosa, não quer dizer que Peluso seja obrigado a fazer o mesmo. Ele pode simplesmente dar voto integral sem nem pedir autorização excepcional ao presidente do Supremo, prevista no regimento interno.
É provável que Peluso já saiba o que a maioria de seus pares acha, e por isso a atitude que tomar estará respaldada por essa maioria. Mesmo quando o regimento interno permite decisão que Peluso considere que precisa ser apoiada pela maioria, ele procura atuar segundo o pensamento do plenário.
Foi o que houve nas votações sobre a Lei da Ficha Limpa, quando Peluso era presidente da Corte. Ele proferiu o voto de Minerva a favor de Jader Barbalho na decisão sobre se a lei o impedia de assumir vaga no Senado, dando-lhe ganho de causa, quando se recusara a desempatar em outra ocasião.
Peluso explicou então que, embora o regimento determine que em caso de empate o presidente votará uma segunda vez para decidir, não se considerava à vontade nessa situação e preferiu seguir a opinião do plenário: na primeira sessão de julgamento sobre a chamada “Ficha Limpa”, quando se recusou a desempatar o julgamento, o fez simplesmente porque a maioria presente não concordou com a aplicação da regra regimental.
No caso de Barbalho, porém, todos os ministros presentes, inclusive os que tinham votado em sentido contrário, decidiram aplicar a regra regimental. Este é o ministro Peluso que estará atuando esta semana pela última vez no Supremo. Seu voto será importante para definir se a tendência do plenário está na direção apontada até agora pela maioria, e também para testar caminhos jurídicos traçados por alguns ministros o votarem.
Cármen Lúcia tratou da “verdade real” em contraponto à “processual” a que o revisor tanto faz questão de se referir. Para a ministra, esse processo é extremamente árduo pela dificuldade de se colherem provas, “de se saber qual é a verdade real e a verdade processual”.
Com isso, ela tocou num ponto crucial, que o ministro Luiz Fux já havia abordado anteriormente, o da qualidade das provas.
A função da prova no processo era bem definida, lembra Fux: transportar para o processo a verdade absoluta que ocorrera na vida dos litigantes. Nesta concepção, uma condenação no processo só pode decorrer da verdade dita “real” e da (pretensa) certeza absoluta do juiz a respeito dos fatos.
Contemporaneamente, ressaltou Fux, “chegou-se à generalizada aceitação de que a verdade (indevidamente qualificada como ‘absoluta’, ‘material’ ou ‘real’) é algo inatingível pela compreensão humana, por isso que, no afã de se obter a solução jurídica concreta, o aplicador do Direito deve guiar-se pelo foco na argumentação, na persuasão, e nas interações que o contraditório atual, compreendido como direito de influir eficazmente no resultado final do processo, permite aos litigantes”.
O que importa para o juízo “é a denominada verdade suficiente constante dos autos”. Para ele, o moderno Direito Penal resgata “a importância que sempre tiveram, no contexto das provas produzidas, os indícios, que podem, sim, pela argumentação das partes e do juízo em torno das circunstâncias fáticas comprovadas, apontarem para uma conclusão segura e correta”.
Essa maneira de encarar o processo reduz a importância da alegada “falta de provas” nos autos contra os réus, para dar maior dimensão às testemunhas, aos indícios, às conexões entre os fatos.
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