domingo, 24 de março de 2013

Escolha de dirigentes de estatais deveria ser ainda mais rigorosa do que a de empresas privadas — diz um dos maiores especialistas em recrutamento do mundo


Ricardo Setti

Zehnder: "Nenhuma nomeação de ministro e de diretor de estatal ou autarquia deve ser 100% política" (Foto: Emiliano Capozoli / VEJA)
Zehnder: "Nenhuma nomeação de ministro e de diretor de estatal ou autarquia deve ser 100% política" (Foto: Emiliano Capozoli / VEJA)
Entrevista concedida a Duda Teixeira, publicada em edição impressa deVEJA
A PRAGA DA INCOMPETÊNCIA
O suíço especialista em recrutamento diz que a falta de qualificação dos funcionários públicos nomeados por padrinhos políticos chega a ser mais danosa do que a corrupção
Escolher o melhor candidato para comandar estatais ou órgãos públicos deveria ser um processo muito mais cuidadoso e rigoroso do que o adotado pelas empresas privadas. Essa é a tese central defendida pelo suíço Egon Zehnder, um dos mais famosos headhunters do mundo.
Dono de uma empresa de recrutamento com escritórios em 38 países, inclusive o Brasil, ele participou da seleção e escolha de presidentes de estatais e de instituições públicas da Inglaterra, da Austrália, de Singapura e da Suíça. Aos 82 anos, Zehnder entrevista, todos os dias, pessoalmente, candidatos às vagas de consultor em sua empresa.
Defensor apaixonado da meritocracia, ele critica a proliferação de cargos de confiança na administração pública brasileira.
No Brasil, mais de 22 000 cargos do governo federal são de confiança (preenchidos por critérios políticos). Mais de 1 000 só no primeiro escalão. O que o senhor acha desses números?
Mesmo considerando o tamanho do país, são números exageradamente altos. Na Suíça, onde moro, não existe um único cargo público que possa ser preenchido por alguém cuja única qualificação seja atender a critérios políticos.
Por que o excesso de cargos de confiança é ruim?
Quando se fazem concursos públicos ou se adotam outros métodos objetivos de seleção, a chance de que os critérios utilizados tenham sido justos e adequados é maior. A sociedade precisa ter a garantia de que o escolhido é o mais capaz para desempenhar a função, conhece a área e já passou por várias situações parecidas com as que vai enfrentar no futuro.
Exercer um controle rigoroso sobre os processos de recrutamento é algo plenamente possível. Mas é muito difícil ter esse domínio quando se precisa preencher dezenas de milhares de cargos. Se o eleito não tiver as exigências mínimas para a função, certamente a empresa ou instituição enfrentará percalços a curto, médio ou longo prazo. Nenhuma nomeação de diretor de estatal ou de autarquia deve ser 100% política.
Nomeações equivocadas são mais danosas no setor público ou no privado?
A escolha errada de um funcionário de alto escalão traz mais consequências indesejadas em instituições governamentais. Elas têm um papel na sociedade que vai muito além dos interesses econômicos dos acionistas. Um erro na nomeação reduz a possibilidade de a empresa estatal ou o órgão público desenvolver seu papel social e limita a capacidade do país para alcançar seus objetivos estratégicos.
Também leva a resultados decepcionantes em termos de volume de produção e no desenvolvimento interno de tecnologia. Uma pesquisa publicada na revista da Harvard Business School em 2001 mostrou que, entre os diversos fatores que determinam o desempenho de uma empresa e que podem ser controlados, a seleção dos gestores é a que tem a maior relevância estratégica.
A escolha certa do presidente de uma empresa pode ter um impacto positivo de 40% no seu resultado.
Existe alguma relação entre corrupção e incompetência administrativa?
É claro que se devem selecionar sempre pessoas com integridade, para impedir fraudes, tanto no setor público quanto no privado. Estima-se que o custo da corrupção represente 5% do faturamento das companhias, um dado aviltante. Estatisticamente, porém, a corrupção é menos nociva do que a escolha de um gestor ineficiente.
"Um trabalhador na linha de produção de uma fábrica que tenha todas as qualidades para o seu ofício produz 40% mais do que um funcionário-padrão" (Foto: Getty Images)
"Um trabalhador na linha de produção de uma fábrica que tenha todas as qualidades para o seu ofício produz 40% mais do que um funcionário-padrão" (Foto: Getty Images)

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