domingo, 23 de setembro de 2012

O DOIDO E O BÊBADO (1)



Luiz Berto
O nome dele eu não digo, para evitar possíveis ingrezias no futuro. Afinal, trata-se de um militar da ativa, soldado da nossa briosa Polícia, grande amigo, de papo e de cana. Respeitado em Palmares e na região, valente, não leva desaforos para casa. Sempre admirei sua coragem pessoal. Não provocava ninguém, mas nunca levava a pior. Todavia, essa história não tem nada a ver  com suas brigas. Deu-se assim:
À falta de um hospital especializado, os doidos furiosos que por ali aparecem são despachados para o Hospital Psiquiátrico da Tamarineira, no Recife. Os mansos ficam por lá mesmo, e as ruas estão cheias deles. Pacíficos, cada um com sua mania, colorindo a paisagem já tão rica e variada com os sãos.
Pois sucedeu-se que este meu amigo da Polícia foi escalado, junto com outro colega, para levar um doido ao Recife. O infeliz estava amarrado na cadeia, único lugar seguro antes de se iniciar a viagem. De manhã, embarcaram numa camioneta da corporação, com o paciente devidamente amarrado no banco de trás. Na saída da cidade, pegaram a BR-101 e descambaram no rumo da Capital.
Viagem pequena, pouco mais de cem quilômetros, toda em pista asfaltada.
Na entrada do Recife, precisamente no Bairro de Prazeres, pararam com a camioneta em frente a uma venda e desceram para tomar uma bicada de cachaça. O doido ficou lá dentro, bem amarrado e de olhos abertos. Os dois soldados tomaram um trago cada um, se preparando para a conclusão da missão. Era só entregar o doido e sua papelada no hospital, e regressar a Palmares.
Saíram da venda, voltaram à camioneta e tomaram um susto: o banco estava o lugar mais limpo; o doido fugira e só deixara a corda no assento. Conseguira se desamarrar durante a viagem. Olharam para os lados, e nada. Havia muito mato por ali. Pelo tempo que haviam passado na bodega, o doido fujão devia estar bem longe.
- Tamos fodidos! – foi o comentário do meu amigo.
Mas o susto só durou até o momento em que deram com os olhos num bêbado maltrapilho, dormindo numa esquina ao lado da bodega. Tinha o mesmo tipo físico do doido fujão; viera a calhar.
Suspenderam o infeliz e enfiaram-no na camioneta.
- Mas eu não fiz nada: só tava dormindo – ainda protestou debilmente o bêbado.
- Te cala, que tu és doido.
E dispararam rumo à Tamarineira. Lá, entregaram o homem, despacharam os papéis e ainda tiveram o cuidado de alertar o funcionário que os recebeu:
- Cuidado que este é perigoso. A mania dele é dizer que não é doido. Lá em Palmares, já enganou muita gente com essa conversa.
Despediram-se e entraram na camioneta. Regressaram a Palmares, felizes por  mais uma missão cumprida
(1) Do livro “A Prisão de São Benedito e Outras Histórias”

Nenhum comentário:

Postar um comentário