O GLOBO - 28/12
Este é o pior fim de ano da última década. E não apenas para o governo, mas para a maioria dos argentinos. Quase todos os consultores que medem as expectativas sociais e medem as preferências dos eleitores o confirmam. Um deles, trabalhando para os líderes políticos de diferentes partidos e, em particular, por um dos candidatos presidenciais aspirante com mais chances para 2015, terminou de processar os dados de dezembro. Eles são terríveis.
Foram obtidas respostas de 1.100 argentinos em todo o país, não incluídos apagões e saques ocorridos até 14 de dezembro. Há um dado realmente assustador. Se denomina percepção da inflação. É o aumento do custo de vida “calculado” pelas pessoas. Para este 2013, superou 43%. E, para o próximo ano, os entrevistados acreditam que vá exceder 50%. Ou seja: muito além dos limites em que a inflação começa a se tornar incontrolável.
Mas isso não é tudo. Quando perguntados sobre a situação atual do país em comparação com os últimos três meses, 45% responderam “pior”, 40% “igual” e apenas 11% disseram que “melhor”. Com um pouco menos de pessimismo percebem a situação na própria casa: 28% acham que está pior, 50%, igual, e 17% enxergam melhoria. Mas as expectativas sobre o país, e sua situação doméstica, tendem a ser muito negativas para os próximos três meses.
Em outras palavras, é o quadro mais pessimista desde que a consultoria vem perguntando, há quase uma década: 28% disseram que a situação econômica e social vai piorar, 41% acham que permanecerá a mesma e 27% prevêem melhoria.
A imagem positiva da presidente está em colapso, apesar da decisão oficial de fazê-la aparecer apenas para comunicar uma “boa notícia”. Sua imagem despencou em pelo menos dez pontos percentuais.
Parece bastante claro, se você presta atenção nos resultados de pesquisas recentes, que a bala de prata que teria o novo chefe de gabinete, Jorge Capitanich, já foi disparada. E errou o alvo. Também está claro que o mau humor social aumenta com a percepção de casos de corrupção que a Justiça não condena.
Se a eleição para presidente fosse hoje, nenhum candidato governista, exceto Daniel Scioli, teria a menor chance de passar para o segundo turno. A pesquisa destaca primeiro Sergio Massa, com mais de 26%; em segundo, Daniel Scioli, com quase 19%; em terceiro lugar, Hermes Binner, com mais de 11%, e, em quarto lugar, Mauricio Macri, com quase 9% . Muito abaixo ficam Jorge Capitanich, com 5%, e Julio Cobos. E, em uma terceira etapa, aparecem José Manuel De la Sota, Florencio Randazzo, Sergio Urribarri, Jorge Altamira e Elisa Carrió.
Mas, além dos personagens, há outro grande dado econômico sobre os qual tampouco dá para ser muito otimista. É a distorção de preços relativos. A consultoria Melconian & Santangelo possui número contundentes. Analisa a inflação acumulada em dezembro de 2001 a novembro de 2013 e compara com outros preços. Registra uma grande confusão, um problema estrutural difícil de resolver. Entre 2001 e 2013, o nível geral de preços subiu 681%; a carne, 1.226%; alimentos em geral, 1.135%; o dólar oficial, 530%; o dólar paralelo, 875%; salário privado e formal, 902%; o salário informal, 758%; os combustíveis, 744%; pão, 824%; aluguéis, 350%; medicamentos, 294%, e, as tarifas, 144%.
Vejamos as tarifas. O transporte por ônibus, trem e metro aumentou 156%. E o gás, água e luz, apenas 120%. Isso explica, em parte, a falta de energia contínua ou, o que é o mesmo, a razão pela qual as distribuidoras de energia elétrica não investem. A resposta é óbvia: congelaram a margem de lucro por quase dez anos.
Se as tarifas na Argentina houvessem seguido o ritmo da inflação, nas casas mais pobres, de baixo consumo de energia, a conta de luz teria tido um aumento de 1.650%; para o consumidor pequeno-médio, 480%; para o consumidor médio-grande, aumento de 190%. Os únicos que estão pagando eletricidade pelo que se supõe que vale são alguns dos maiores consumidores, mas eles respondem por apenas 10% da demanda. E isso não é suficiente para os distribuidores decidirem fazer a infraestrutura necessária para evitar apagões.
A pergunta por trás da pesquisa de Melconian & Santangelo é a mesma que se fazem os mais próximos do governo e a maioria dos economistas com algum senso comum: como e em que contexto se vai harmonizar os preços? O ajuste será feito pelo governo que se vai ou por aquele que vai chegar? A rebelião policial nas províncias desencadeada pelos grandes atrasos salariais não deveria ser considerada uma demonstração do que pode vir a acontecer?
A história recente da Argentina mostra que uma distorção de preços como essa pode acabar em um “Rodrigazo”. O fantasma de um desfecho violento preocupa a cúpula da Igreja e o Papa Francisco. Alguns meses atrás, antes mesmo da operação de Cristina Kirchner, Jorge Bergoglio vinha falando com líderes políticos do governo e da oposição. Pedia a todos a mesma coisa: que orem por ele e façam todo o possível para que esta Argentina cada vez mais pobre e mais injusta não termine em um banho de sangue.
Este é o pior fim de ano da última década. E não apenas para o governo, mas para a maioria dos argentinos. Quase todos os consultores que medem as expectativas sociais e medem as preferências dos eleitores o confirmam. Um deles, trabalhando para os líderes políticos de diferentes partidos e, em particular, por um dos candidatos presidenciais aspirante com mais chances para 2015, terminou de processar os dados de dezembro. Eles são terríveis.
Foram obtidas respostas de 1.100 argentinos em todo o país, não incluídos apagões e saques ocorridos até 14 de dezembro. Há um dado realmente assustador. Se denomina percepção da inflação. É o aumento do custo de vida “calculado” pelas pessoas. Para este 2013, superou 43%. E, para o próximo ano, os entrevistados acreditam que vá exceder 50%. Ou seja: muito além dos limites em que a inflação começa a se tornar incontrolável.
Mas isso não é tudo. Quando perguntados sobre a situação atual do país em comparação com os últimos três meses, 45% responderam “pior”, 40% “igual” e apenas 11% disseram que “melhor”. Com um pouco menos de pessimismo percebem a situação na própria casa: 28% acham que está pior, 50%, igual, e 17% enxergam melhoria. Mas as expectativas sobre o país, e sua situação doméstica, tendem a ser muito negativas para os próximos três meses.
Em outras palavras, é o quadro mais pessimista desde que a consultoria vem perguntando, há quase uma década: 28% disseram que a situação econômica e social vai piorar, 41% acham que permanecerá a mesma e 27% prevêem melhoria.
A imagem positiva da presidente está em colapso, apesar da decisão oficial de fazê-la aparecer apenas para comunicar uma “boa notícia”. Sua imagem despencou em pelo menos dez pontos percentuais.
Parece bastante claro, se você presta atenção nos resultados de pesquisas recentes, que a bala de prata que teria o novo chefe de gabinete, Jorge Capitanich, já foi disparada. E errou o alvo. Também está claro que o mau humor social aumenta com a percepção de casos de corrupção que a Justiça não condena.
Se a eleição para presidente fosse hoje, nenhum candidato governista, exceto Daniel Scioli, teria a menor chance de passar para o segundo turno. A pesquisa destaca primeiro Sergio Massa, com mais de 26%; em segundo, Daniel Scioli, com quase 19%; em terceiro lugar, Hermes Binner, com mais de 11%, e, em quarto lugar, Mauricio Macri, com quase 9% . Muito abaixo ficam Jorge Capitanich, com 5%, e Julio Cobos. E, em uma terceira etapa, aparecem José Manuel De la Sota, Florencio Randazzo, Sergio Urribarri, Jorge Altamira e Elisa Carrió.
Mas, além dos personagens, há outro grande dado econômico sobre os qual tampouco dá para ser muito otimista. É a distorção de preços relativos. A consultoria Melconian & Santangelo possui número contundentes. Analisa a inflação acumulada em dezembro de 2001 a novembro de 2013 e compara com outros preços. Registra uma grande confusão, um problema estrutural difícil de resolver. Entre 2001 e 2013, o nível geral de preços subiu 681%; a carne, 1.226%; alimentos em geral, 1.135%; o dólar oficial, 530%; o dólar paralelo, 875%; salário privado e formal, 902%; o salário informal, 758%; os combustíveis, 744%; pão, 824%; aluguéis, 350%; medicamentos, 294%, e, as tarifas, 144%.
Vejamos as tarifas. O transporte por ônibus, trem e metro aumentou 156%. E o gás, água e luz, apenas 120%. Isso explica, em parte, a falta de energia contínua ou, o que é o mesmo, a razão pela qual as distribuidoras de energia elétrica não investem. A resposta é óbvia: congelaram a margem de lucro por quase dez anos.
Se as tarifas na Argentina houvessem seguido o ritmo da inflação, nas casas mais pobres, de baixo consumo de energia, a conta de luz teria tido um aumento de 1.650%; para o consumidor pequeno-médio, 480%; para o consumidor médio-grande, aumento de 190%. Os únicos que estão pagando eletricidade pelo que se supõe que vale são alguns dos maiores consumidores, mas eles respondem por apenas 10% da demanda. E isso não é suficiente para os distribuidores decidirem fazer a infraestrutura necessária para evitar apagões.
A pergunta por trás da pesquisa de Melconian & Santangelo é a mesma que se fazem os mais próximos do governo e a maioria dos economistas com algum senso comum: como e em que contexto se vai harmonizar os preços? O ajuste será feito pelo governo que se vai ou por aquele que vai chegar? A rebelião policial nas províncias desencadeada pelos grandes atrasos salariais não deveria ser considerada uma demonstração do que pode vir a acontecer?
A história recente da Argentina mostra que uma distorção de preços como essa pode acabar em um “Rodrigazo”. O fantasma de um desfecho violento preocupa a cúpula da Igreja e o Papa Francisco. Alguns meses atrás, antes mesmo da operação de Cristina Kirchner, Jorge Bergoglio vinha falando com líderes políticos do governo e da oposição. Pedia a todos a mesma coisa: que orem por ele e façam todo o possível para que esta Argentina cada vez mais pobre e mais injusta não termine em um banho de sangue.
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