domingo, 23 de setembro de 2012

Vereador malufista ameaça dar “porrada” e “tiro” no CQC em pronunciamento


Por Flávio Morgenstern

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O vereador malufista Wadih Mutran (PP-SP) ameaçou dar “porrada”, “martelada” e “tiro” nos repórteres e humoristas do CQC na última quinta-feira (06/09). Antes uma notícia que veríamos divulgada em todas as mídias petistas, o fato foi apagado misteriosamente dos torcedores do Haddad.
Para quem acha que os tempos de saloon acabaram, quando era possível matar e ameaçar pessoas de tiros, cacetadas, bordoadas, pauladas, murros, porretadas, sopapos, montinhos, chineladas, voadoras, sovas de pau, coices com e sem giratória e demais empurrões e ameaças ao futuro de opositores sem temer conseqüências, a notícia traz um detalhe bizarro: a ameaça não foi feita na surdina, em tom baixo, sussurrada à boca pequena e apenas vazada por ouvidos bisbilhoteiros. A ameaça foi feita em pronunciamento oficial na tribuna da Câmara de São Paulo.
Informa o Portal Imprensa (o vídeo encontra-se no fim do artigo):
“Todos os repórteres merecem o meu respeito, mas sem vergonhas, cachorros, ordinários, vagabundos como esses homens que não tem nada para fazer vim aqui me menosprezar?”, disse Mutran referindo-se à equipe do “CQC”. “Eu vou querer que você coloque quatro policial (sic) na porta do meu gabinete para descer o cacete neles se eles vierem lá. [...] Eu vou faltar com decoro. Vou dar porrada, vou dar martelada. E se não der um tiro…”, acrescentou Mutran.
O trecho do discurso foi exibido pelo programa na última segunda-feira (10/9). A reação do vereador deve-se à visita do repórter do “CQC” Ronald Rios à Câmara na última quarta-feira (5/9). O humorista procurou diversos vereadores, entre eles Mutran, para questionar o enriquecimento de 97% de seu patrimônio durante a vigência de seu mandato nos últimos quatro anos.
O aumento de patrimônio chegou a quase R$ 2 milhões (de R$1,9 milhões para R$3,8 milhões). Mutran não quis responder as perguntas de Ronald Rios, mas em reportagem da Folha de S.Paulo, de julho deste ano, atribuiu seu enriquecimento à conquista de dois prêmios da loteria.
Nas redes sociais, um dos produtores do programa, Rodrigo Rodrigues afirmou que teme pela sua vida. Ele estava no episódio junto com Rios e um cinegrafista.
O enriquecimento de Mutran já havia sido noticiado pelo Implicante, com a sua curiosa explicação da trinca de bilhetes premiados. Mutran também afirma guardar R$1,4 milhão em espécie, dinheiro que afirma ser proveniente de aplicações e “negociações”. Apenas o enriquecimento do vereador é responsável por 25% do que os 53 vereadores paulistanos que buscam a reeleição declararam ter enriquecido.
Principal nome do curral eleitoral da Vila Maria, Mutran é um dos grandes bastiões de malufismo da zona norte (o outro curral é o Belém, do outro lado da Marginal). Bairros conservadores e bastante povoados por militares e profissionais liberais, a dominância de Wadih Mutran em cartazes, cavaletes, panfletos e placas pela região chega a lembrar o coronelismo regional dos currais eleitorais do Nordeste.
Uma ameaça de violência em plena tribuna da Câmara dos Vereadores, pedindo auxílio policial, não parece tão descabida. Em pleno Senado, em 1963, Arnon de Mello (PDC-AL) pai do ex-presidente Fernando Collor de Mello, tentou matar um desafeto a tiros dentro da Alta Câmara, que andava armado e o ameaçou de morte. Acabou matando com um dos tiros o senador José Kairala (PSD-AC), um comerciante de Brasiléia, que acabou com os intestinos e a veia ilíaca trespassados. O senador João Agripino (UDN-PB), tio do atual líder do DEM no Senado, José Agripino (RN), atracou-se com Péricles para tirar-lhe a arma. Kairala tentou ajudar, mas foi atingido pelo segundo disparo de Arnon.
Tanto Arnon quanto Péricles foram absolvidos, depois de presos por alguns dias. Na Câmara, já houve dois outros tiroteios, também terminados em absolvição completa. Lembra o Estadão:
Em 8 de junho de 1967, houve outro tiroteio, só que na Câmara. Dias antes, os deputados Nelson Carneiro (MDB-RJ) e Estácio Souto Maior (MDB-PE), pai do piloto Nelson Piquet, discutiram asperamente na disputa pela presidência da União Interparlamentar. Souto Maior então deu um tapa em Nelson. Às 12h30 daquele dia, este encontrou Souto Maior conversando com o deputado Milton Reis (MDB-MG), em frente à agência do Banco do Brasil, no hall inferior.
Bateu-lhe no ombro e gritou: “Agora você vai me pagar aquele bofetão.” Souto Maior devolveu: “Sai pra lá, seu negro.” Nelson, que não era afeito a armas, tinha na mão o revólver calibre 38 que comprara dias antes e acertou o rival no primeiro tiro. Souto Maior, com o revólver já à mão, caiu. Do chão, disparou cinco vezes e errou todas, até porque Nelson – numa cena de saloon – abrigou-se atrás de uma pilastra. No processo, ambos foram absolvidos.
Outro episódio de faroeste ocorreu no dia 26 de dezembro de 1929. Na chegada à Câmara, no Rio de Janeiro, o deputado gaúcho Simões Lopes encontrou o desafeto Souza Filho (PE), que lhe deu uma bengalada. Simões sacou o revólver e deu dois tiros em Souza, que morreu. No processo, alegou ter pensado que Souza mataria seu filho, que o acompanhava. Foi absolvido.
 Parece haver uma certa garantia de qualquer tipo, não só de ameaça, como de consumação de violência, desde que se possua um cargo público, que deveria acarretar maior, e não menor responsabilidade. Mesmo utilizando o espaço público para a ameaça, terminando por uma plácida absolvição.

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