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18.5.2013
|9h00m
COLUNA NO GLOBO
Há uma convicção crescente entre os especialistas de que o Brasil deveria dar um passo atrás no Mercosul. O bloco deixaria de ser união aduaneira para ser área de livre comércio. A vantagem é que o Mercosul continuaria, mas não impediria novos acordos do Brasil com outras partes do mundo. Sendo união, os países têm que seguir a mesma tarifa externa e isso nos paralisa.
O presidente do Centro Brasileiro de Relações Internacionais, embaixador Luiz Augusto de Castro Neves, não teve dúvidas quando perguntei, na Globonews, se a Argentina atrapalha:
— Muito. A Argentina é o único país que se subdesenvolveu.
O retrocesso na Argentina é coisa antiga, mas houve piora recente com a crise cambial e as barreiras ao comércio até entre os países do próprio bloco.
O economista José Tavares, do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento, revelou que depois que fizemos do Mercosul uma união aduaneira não houve mais nenhuma união aduaneira no mundo e proliferaram zonas de livre comércio. Os dois explicaram que a nova modalidade de acordo integra cadeias produtivas e reduz custos de transações. São rápidas e eficientes.
— O Brasil está há 20 anos construindo o Mercosul — que aumentou o comércio e o investimento com a Argentina — mas tem concepção errada e partiu de patamar muito alto de tarifas ao comércio — diz Tavares.
Os dois acham que o Brasil é muito protecionista. Tavares explicou que durante 70 anos o país teve problemas de balanço de pagamentos. Agora não tem, mas continua com as mesmas medidas.
Castro Neves lembrou que a Argentina impõe aos sócios barreiras inaceitáveis, como a exigência de licença prévia de importação. A solução é deixar de ser união aduaneira. Para Tavares, a prova de que protecionismo não é remédio está em três setores brasileiros:
— Três setores que não têm medidas de proteção e estão muito bem: aviões, alimentos e cosméticos. Estamos entre os quatro maiores produtores do mundo de aviões, somos um dos mais competitivos na produção de alimentos, inclusive industrializados, e a área de cosméticos é dinâmica. Consumimos mais desodorantes e creme de enxaguar do que os americanos, em termos absolutos.
Tavares acha que o erro do país é ter tarifa alta para bens intermediários, que encarece custos industriais. Acha que os setores químico e siderúrgicos são competitivos e, se as tarifas fossem menores, pressionariam o governo por reformas:
— Há uma ideia errada sobre a abertura do Collor. Ela foi muito suave, e depois disso o Brasil continuou abrindo lentamente seu comércio.
Os dois acham que esse protecionismo não criará constrangimento ao novo diretor geral da OMC, Roberto Azevêdo, que terá que tirar a camisa de representante do país e ser um funcionário internacional.
O embaixador e o economista alertaram que esse é um momento decisivo do comércio internacional.
— Azevêdo terá que perguntar aos países se querem continuar com a Rodada Doha ou se vai por outro caminho. Não pode decidir sozinho — diz o embaixador.
Tavares aposta nas qualidades pessoais de Azevêdo:
— Foi uma escolha feliz não só para nós. Ele tem sensibilidade para o que é relevante no comércio internacionais, que não são essas bobagens que o Brasil anda fazendo, mas sim a inclusão dos novos temas como investimento, compras governamentais, serviços. O Brasil sempre foi contra a inclusão desses temas.
Seja como for, desde o início da Rodada Doha, há 12 anos, a tendência no mundo foi criar acordos de livre comércio, que não tratam de tarifas em si, mas de todas as outras formas de integração das cadeias produtivas. Segundo Castro Neves, esse é o futuro: integrar cadeias produtivas, como fez a China nos últimos anos, mas o Brasil tem relutado em se integrar. Um dos motivos é o Mercosul. O outro, o nosso velho protecionismo.
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