Danielle Legras
No sábado passado, uma manifestação de solidariedade ao povo siriano reuniu centenas de pessoas na esplanada dos Direitos Humanos que se encontra em face ao rio Sena, diante da torre Eiffel. Ao entrar na esplanada percebe-se a inscrição do artigo primeiro da Declaração dos Direitos do Homem "Os homens nascem e são livres e iguais em direitos".
O conflito siriano, que começou há exatos três anos, tem provado que tal artigo já não possui valor algum, bem como a vida humana. Os números oficias - que procuram identificar os estragos feitos durante esse período - são catastróficos.
Segundo as Organizações das Nações Unidas, 146 mil pessoas teriam sido mortas desde então e 570 mil teriam sido feridas. O número de refugiados no exterior é de 2,5 milhões. De acordo com as estimações da Unicef, cerca de 1 milhão de crianças se encontram atualmente em zonas de difícil acesso a qualquer tipo de ajuda humanitária.
Nos jornais franceses Libération e Journal du Dimanche deste final de semana, o leitor descobriu a existência de um dossier siriano contendo 54.000 fotos de 11.000 corpos torturados e executados.
As fotografias destes corpos martirizados foram feitas por um antigo agente do regime de Bachar El-Assad, conhecido pelo pseudônimo César.
O street artista Banksy realizou este vídeo em apoio às vítimas da guerra na Síria.
César trabalhava no departamento de documentação da segurança militar. Seu papel era o de fotografar os corpos dos prisioneiros mortos. A existência desses documentos se justificavam de duas maneiras: eles permitiam às autoridades do regime de El-Assad de enviar os certificados de óbito às famílias atestando uma parada cardíaca. Eles serviam também para mostrar à hierarquia que o "trabalho" estava sendo bem feito.
César se tornou um espião logo no início da revolução. Durante dois anos fotografou cadáveres que mesmo depois de mortos pareciam agonizar. Ele copiava as imagens num pendrive que depois escondia no corpo. Se ele fosse descoberto a punição estaria a altura de sua traição.
No ano passado, a morte de César foi simulada e ele foi exfiltrado pelo exército livre da Síria. Vendo as seis terríveis fotos publicadas nos jornais, entendi perfeitamente a importância do que ele fez. A tortura imposta aos traidores do regime (jovens estudantes, homens e mulheres de todas as idades) é tão cruel que é difícil acreditar que ela tenha sida imposta por um ser humano.
Os métodos usados são múltiplos e variados, mas sempre com a intenção de "assassinar" o inimigo lentamente, de modo que ele tenha a impressão de morrer muitas vezes.
O que me faz pensar com profunda tristeza e certo desespero no artigo V da declaração dos Direitos do Homem : "Ninguém será submetido à tortura, nem tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante."
A declaração dos Direitos do Homem é fruto da Revolução Francesa. Um texto que é o fundamento primordial do nosso futuro comum e bússola das nações. Teria ele se transformado num amontoado de palavras sem sentido?
Danielle Legras é jornalista e tem duas grandes paixões, seu métier e Paris. Há dez anos, decidiu unir o útil ao agradável.
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