O Estado de S.Paulo - 21/11
O historiador britânico Vernon Bogdanor, da Universidade de Oxford, num ensaio, pergunta o que faz um governo ser bem-sucedido. Observa que, quando o governo controla a sociedade e a mídia, há grande chance de sucesso e aprovação popular. Tal controle é prerrogativa das ditaduras, especialmente as totalitárias, e só funciona enquanto elas duram. Numa democracia, tudo é mais difícil, pois o governo depende da aprovação periódica da população e a propaganda exacerbada pode não escamotear fracassos. Ademais, numa democracia, a opinião pública é volúvel quanto aos seus líderes e os sentimentos de insatisfação muitas vezes são mais profundos que os evidenciados nas manifestações públicas. Trata-se do que o também britânico Isaiah Berlin chamou de o "tropel da História", que só os grandes estadistas com conhecimento histórico - ou com grande capacidade intuitiva - conseguem ouvir.
Voltando à Bogdanor, são três os grandes fatores que impedem o sucesso de um governo: as amarras ideológicas, que estorvam a compreensão do momento histórico; o moralismo, pela imposição de valores rígidos à sociedade; e o pânico, quando demonstra ansiedade ou medo diante de dificuldades. Com relação ao primeiro, foram o pragmatismo e a renovação dos trabalhistas britânicos pós 1995 que permitiram superar a ideologização compulsiva prevalecente desde o fim da 2.ª Guerra Mundial, da mesma forma que, no Brasil, a Carta ao Povo Brasileiro desempenhou o mesmo papel em relação à ascensão do PT ao poder. O pragmatismo e a capacidade de dialogar são mais eficazes do que a estreiteza ideológica.
Quando os governos prometem instaurar o paraíso na Terra, impondo seu moralismo sobre a sociedade, suas chances de sucesso se reduzem. O exemplo da imposição da Lei Seca nos EUA, aclamada depois por Herbert Hoover como "um grande experimento social e econômico, calcado em motivos nobres e propósitos de largo alcance", mostrou-se um desastre quanto aos objetivos a que se propunha, pois estimulou o crescimento da demanda com oferta pronta e eficiente. Ociosa, é claro, a referência ao moralismo dos regimes comunistas, que prometeram o paraíso e entregaram o inferno. Finalmente, governos hiperativos e com excesso de iniciativas - por mero populismo ou porque acham que entendem mais da realidade do trabalho e dos negócios - facilmente entram em pânico e geram um clima de insegurança e apreensão na sociedade.
O que foi dito serve para ressaltar, em suma, que governos bem-sucedidos são os que, de forma pragmática, olham para o futuro, promovem reformas estruturais profundas, são cientes das suas limitações, trabalham sem estardalhaço e têm consciência clara das restrições e oportunidades do momento histórico. São governos eficientes e transformadores, mas, infelizmente, percebidos como monótonos ou "sem graça". Numa América Latina picaresca, os governos espetaculosos sempre são mais atraentes, e são objeto de desprezo os que são sérios e bem-sucedidos. Felizmente, o Brasil sempre se diferenciou dos "hermanos", pela busca de maior equilíbrio institucional e capacidade de negociação dos conflitos inerentes à governança e o seu relacionamento com a sociedade.
É preocupante, porém, que vivamos um momento de ideologização exacerbada e de afrouxamento das premissas macroeconômicas que levaram à estabilidade monetária e à maior segurança no aporte de recursos privados para os investimentos nas infraestruturas. Trocar a estabilidade da moeda por um crescimento incerto; apoiar-se no devaneio de retorno do Estado desenvolvimentista e seus protecionismos; culpar o câmbio pela baixa produtividade do sistema produtivo; afrouxar o controle nos gastos públicos, detonando a responsabilidade fiscal; estimular a "contabilidade criativa"; e ressuscitar velhas posturas nacionalistas juvenis acabarão por comprometer o sucesso do período FHC-Lula. A percepção tardia dos desacertos poderá levar ao pânico e à maior insegurança e cautela dos investidores e consumidores.
O historiador britânico Vernon Bogdanor, da Universidade de Oxford, num ensaio, pergunta o que faz um governo ser bem-sucedido. Observa que, quando o governo controla a sociedade e a mídia, há grande chance de sucesso e aprovação popular. Tal controle é prerrogativa das ditaduras, especialmente as totalitárias, e só funciona enquanto elas duram. Numa democracia, tudo é mais difícil, pois o governo depende da aprovação periódica da população e a propaganda exacerbada pode não escamotear fracassos. Ademais, numa democracia, a opinião pública é volúvel quanto aos seus líderes e os sentimentos de insatisfação muitas vezes são mais profundos que os evidenciados nas manifestações públicas. Trata-se do que o também britânico Isaiah Berlin chamou de o "tropel da História", que só os grandes estadistas com conhecimento histórico - ou com grande capacidade intuitiva - conseguem ouvir.
Voltando à Bogdanor, são três os grandes fatores que impedem o sucesso de um governo: as amarras ideológicas, que estorvam a compreensão do momento histórico; o moralismo, pela imposição de valores rígidos à sociedade; e o pânico, quando demonstra ansiedade ou medo diante de dificuldades. Com relação ao primeiro, foram o pragmatismo e a renovação dos trabalhistas britânicos pós 1995 que permitiram superar a ideologização compulsiva prevalecente desde o fim da 2.ª Guerra Mundial, da mesma forma que, no Brasil, a Carta ao Povo Brasileiro desempenhou o mesmo papel em relação à ascensão do PT ao poder. O pragmatismo e a capacidade de dialogar são mais eficazes do que a estreiteza ideológica.
Quando os governos prometem instaurar o paraíso na Terra, impondo seu moralismo sobre a sociedade, suas chances de sucesso se reduzem. O exemplo da imposição da Lei Seca nos EUA, aclamada depois por Herbert Hoover como "um grande experimento social e econômico, calcado em motivos nobres e propósitos de largo alcance", mostrou-se um desastre quanto aos objetivos a que se propunha, pois estimulou o crescimento da demanda com oferta pronta e eficiente. Ociosa, é claro, a referência ao moralismo dos regimes comunistas, que prometeram o paraíso e entregaram o inferno. Finalmente, governos hiperativos e com excesso de iniciativas - por mero populismo ou porque acham que entendem mais da realidade do trabalho e dos negócios - facilmente entram em pânico e geram um clima de insegurança e apreensão na sociedade.
O que foi dito serve para ressaltar, em suma, que governos bem-sucedidos são os que, de forma pragmática, olham para o futuro, promovem reformas estruturais profundas, são cientes das suas limitações, trabalham sem estardalhaço e têm consciência clara das restrições e oportunidades do momento histórico. São governos eficientes e transformadores, mas, infelizmente, percebidos como monótonos ou "sem graça". Numa América Latina picaresca, os governos espetaculosos sempre são mais atraentes, e são objeto de desprezo os que são sérios e bem-sucedidos. Felizmente, o Brasil sempre se diferenciou dos "hermanos", pela busca de maior equilíbrio institucional e capacidade de negociação dos conflitos inerentes à governança e o seu relacionamento com a sociedade.
É preocupante, porém, que vivamos um momento de ideologização exacerbada e de afrouxamento das premissas macroeconômicas que levaram à estabilidade monetária e à maior segurança no aporte de recursos privados para os investimentos nas infraestruturas. Trocar a estabilidade da moeda por um crescimento incerto; apoiar-se no devaneio de retorno do Estado desenvolvimentista e seus protecionismos; culpar o câmbio pela baixa produtividade do sistema produtivo; afrouxar o controle nos gastos públicos, detonando a responsabilidade fiscal; estimular a "contabilidade criativa"; e ressuscitar velhas posturas nacionalistas juvenis acabarão por comprometer o sucesso do período FHC-Lula. A percepção tardia dos desacertos poderá levar ao pânico e à maior insegurança e cautela dos investidores e consumidores.
Nenhum comentário:
Postar um comentário