quinta-feira, 11 de julho de 2013

Deslocamentos: a Flip e o mix pós-tudo, por Mara Bergamaschi


Estive, como outras 20 mil pessoas, na última Flip. Não fui como jornalista (cobri sozinha uma vez e fiquei traumatizada), muito menos como autora (de pequena e séria editora). Ainda sob impacto cívico das jornadas de junho, quando o controle remoto só se satisfazia com imagens das ruas (viciei até no Marcelo Rezende), cheguei a Paraty para acompanhar alguns debates.
Só que, para meu espanto, hesitava em trocar a política - minha primeira e amortecida paixão profissional -, pela literatura – a atual. Enquanto tentava me reorientar, ouvi de amigos inteligentes (e reencontrei tantos, saídos do Facebook!) a primeira frase-síntese: “Estamos todos deslocados.”
Percebi que, como eu, boa parte dos que estavam lá ainda perambulava pelas passeatas que nunca se dispersam - continuam a se mover, indisciplinadas e libertas, pelo território interior, derrubando muros e marcos.
Depois, ouviria a segunda frase, que cairia como uma luva para mim, não só nos dias de hoje, mas, confesso, há uma boa década: “estou sem identidade”. E repeti a confidência, feita por alguém que ele conhecia muito bem, na hora de responder ao convite de Ricardo Noblat para colaborar neste prestigioso blog. ”Você sabe, também estou assim sem identidade”. Evadia-me, mas sinceramente.

Paraty

A lista de nuances existenciais iria além de meio esquerda e meio direita: meio repórter, meio escritora, meio frila, meio internauta, meio fato e análise, meio crônica e ficção (e mezzo rúcula/calabresa, pois em Paraty pizza era a única comida mais ou menos fácil). “Você precisa é escrever mais”, sentenciou Noblat, acrescentando que estabelecera (ai!) um primeiro contato extrassensorial com as páginas do meu romance.
Ao longo da semana, veria, aliviada, o mix política-literatura que me afligia prevalecer sem confusões na 11ª Flip. Além de perpassar vários debates, o tema ganharia três excelentes mesas-extras sobre as manifestações e sua cobertura jornalística. Na última plenária, experimentaria enfim a plenitude da identificação! Quis fazer a plaquinha de cartolina: Marcos Nobre (o filósofo) me representa!
Antes disso, ouvi dos ninjas da internet: “a mídia acabou, caducou”. O impacto do veredicto diminuiu quando me lembrei dos muitos obituários da opinião pública - hoje vivíssima.
Não vejo nas ruas ou nas redes, que reeditam sagaz e velozmente o noticiário, a decretação cabal da inutilidade da imprensa. Mas acho que exigem sim do jornalista profissional, jovem ou maduro, o exercício mais contundente de sua função social. Uma boa polêmica pós-tudo para nós, escrevinhadores e leitores.

Mara Bergamaschi é jornalista e escritora. Foi repórter de política do Estadão e da Folha em Brasília. Hoje trabalha no Rio, onde publicou pela 7Letras “Acabamento” (contos,2009) e “O Primeiro Dia da Segunda Morte” (romance,2012). É co-autora de “Brasília aos 50 anos, que cidade é essa?” (ensaios,Tema Editorial,2010). 

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