Mundo afora, a regulamentação do aluguel temporário já é uma realidade.
O aluguel temporário em cidades como Nova Iorque, Paris e Amsterdã, por exemplo, os proprietários que anunciam seus imóveis no Airbnb têm que registrar o imóvel na prefeitura, são fiscalizados e devem respeitar um limite anual de diárias por ano para este tipo de hospedagem.
Para cada lugar, um enquadramento e uma justificativa. Em Paris, alega-se que a atrativa remuneração vinda dos temporários torna o mercado imobiliário desfavorável para os locais que buscam longos contratos e para controle da quantidade de visitantes. Na cidade americana, é porque a plataforma cria uma concorrência desleal com os hotéis. E esta tem sido exatamente a alegação geral, incluindo no Brasil.
Por outro lado, as empresas que anunciam estes imóveis defendem o direito de uso da propriedade pelo morador e se ancoram na Lei do Inquilinato, que permite aluguéis de até 90 dias no país. Nesta queda de braço, nada é muito claro. Mas o novelão ganhou um novo capítulo.
Desde ontem entrou em vigor em Caldas Novas, Goiás, a taxação de aluguel por temporada, a primeira no Brasil. A partir de agora, todos os aluguéis por temporada, independentemente da plataforma, têm que declarar o uso da propriedade para tais fins e pagar Imposto Sobre Serviço (ISS) a cada locação.
Dois anos de negociações
Segundo o secretário municipal de Turismo de Caldas Novas, Ivan Garcia Pires, a lei foi feita a partir de conversas com vários envolvidos ao longo de dois anos, é baseada na Lei do Turismo e no Código Tributário Municipal e haverá fiscalização aleatória. As multas a quem for pego descumprindo a regra serão destinadas para um fundo de turismo e outro de meio ambiente.
— Com o passar dos anos, começou a ficar prejudicial para os hotéis, que têm uma série de tributos a pagar. O aluguel por temporada é uma boa opção aqui, mas tem que oferecer algo que não prejudique ninguém e pague impostos. Todo mundo sai ganhando — defende.
Nos mesmos moldes, Ubatuba, no litoral paulista, publicou uma lei parecida, que estabelece a regulamentação das hospedagens de até 45 dias diretos em imóveis com mais de três leitos disponíveis. Segundo a prefeitura, a lei ainda precisa ser regulamentada por decreto. Portanto, não é válida para esta temporada e haverá um tempo para os proprietários se adequarem. Entre os critérios, quem puser o imóvel à disposição terá que abrir uma empresa, cumprir as exigências da lei geral do turismo, de segurança do Corpo de Bombeiros e da legislação da Vigilância Sanitária. Os sites de agenciamento de hospedagem que aceitarem imóveis não autorizados pela prefeitura também serão multados.
Outros problemas na frente
Apesar dos passos lá fora (que levaram anos) e desta nova página no Brasil, o setor acredita que a regularização não deve sair tão cedo no Rio. Isto porque há muitos entraves para que vigore. Primeiro, porque há questões mais urgentes, como impulsionar a economia, oferecer segurança aos moradores e, agora, a vacinação contra a febre amarela — entre outros problemas. Além disso, a fiscalização seria complicada.
Alfredo Lopes, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH), diz que a entidade entregou no final do ano passado uma minuta à prefeitura solicitando a regularização.
— Não somos contra o aluguel de temporada. O que queremos é um tratamento tributário igualitário. Os hotéis têm uma série de exigências que os moradores não têm, como cumprir a legislação de proteção ao consumidor e pagar o Imposto Sobre Serviço (ISS), assim como a água e IPTU mais caros por serem unidades comerciais.
Outro fator que contribui para os passos mais lentos na capital fluminense é que, mesmo com a oferta de quartos tendo aumentado nas Olimpíadas, a hospedagem em casas ajudou a absorver os turistas, gerando renda principalmente para os moradores que quiseram aproveitar a vinda massiva dos visitantes.
— Não há qualquer indício de que a cidade tomaria medidas questionáveis e atrasadas que pudessem ferir a economia local e o direito dos moradores de locar seus imóveis para viajantes. Vamos continuar trabalhando com autoridades, como fazemos no mundo inteiro. E, no Rio, vamos sempre defender a importância da geração de renda e do empreendedorismo para a recuperação da cidade — afirma a gerente de comunicação para América Latina do Airbnb, Leila Suwwan.
Os dois lados de uma moeda bem valiosa
Uma das principais brigas é sobre o serviço. Quem aluga por curta duração defende que não há, o que os diferenciaria da hospedagem de um hotel. Por outro, a rede hoteleira alega o contrário.
— Pode ser menos, mas há — diz Alfredo Lopes, da ABIH. Esta é, também, uma daquelas questões sem acordo.
O advogado especialista em direito imobiliário Armando Miceli lembra outro conflito comum: os vizinhos.
— A locação temporária é permitida até o momento em que viola o direito do vizinho e do condomínio — afirma.
Em um dos casos que chegaram às suas mãos, moradores de um luxuoso prédio no Leblon se uniram para pedir na Justiça que o vizinho da cobertura fosse proibido de alugar o espaço por temporada.
A justificativa, acatada pela Justiça até agora (o proprietário ainda pode recorrer), é que a alta rotatividade e as intermináveis festas causavam desordem e traziam insegurança para os demais vizinhos.
Para Miceli, a regulamentação deve ser federal, como tem sido feito no exterior.
— O município, o Estado e a Federação não vêem o dinheiro, e os vizinhos e condomínios são prejudicados — diz.
Situações como esta do apartamento no Leblon acontecem, mas não são as mais corriqueiras. O problema, como sempre, é a falta de bom senso geral.
Leila Suwwan, do Airbnb, esclarece que a empresa orienta que os proprietários deixem bem claro nos anúncios não só as regras da casa, como também as do condomínio, justamente para evitar tais conflitos.
Ainda sobre regulamentação
Leila diz que o Airbnb mantém diálogo permanente com autoridades federais e municipais para garantir regras justas de funcionamento e evitar que o lobby hoteleiro impeça a atividade.
— Temos orgulho de ter celebrado acordos tributários em mais de 340 jurisdições, com a coleta e a remessa de mais de US$ 510 milhões em impostos em todo mundo — explica.
Já a Booking.com, outra grande plataforma, disse que não vai se pronunciar sobre o assunto no momento. O Alugue Temporada, por sua vez, disse em nota que acredita em regulamentações justas e eficazes para todos: “Estamos estudando medidas em relação a estas leis municipais, que são inconstitucionais e que ainda não estão em vigor. Além disso, continuamos trabalhando para proteger o mercado de aluguel por temporada de regulamentações onerosas que comprometam as atividades e impossibilitem os viajantes de aproveitar as vantagens de alugar por temporada. É importante ressaltar que a empresa não foi contatada pela prefeitura de Caldas Novas”.
Fonte: O Globo
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