domingo, 2 de setembro de 2012

Quero ter orgulho do Brasil - "Temos quatro anos para mostrar ao mundo que somos muito mais do que essa fama que nos precede"



Doze horas depois de apagada a chama olímpica em Londres eu já estava confortavelmente acomodada numa espreguiçadeira aproveitando o sol e o mar da Barceloneta. A praia de Barcelona. Coisa que teria sido impossível há 22 anos. Simplesmente porque, naquela época, não havia praia em Barcelona.
Nem acredito que se passou tanto tempo desde a minha última visita. Lembro bem que caminhei pelas ramblas, me fartei da fantástica culinária local, visitei a obra inacabada de Gaudí. Os guindastes ainda fazem parte da paisagem da Catedral da Sagrada Família mas muitas outras coisas mudaram. Agora, por exemplo, existe praia, e todo um bairro moderno e vibrante ao largo dela.
Incrível que Barcelona, cidade mediterrânea, tenha demorado tantas décadas para reencontrar o mar. Mas é verdade. A praia de Barcelona é um dos legados da Olimpíada de 1992. E, 20 anos depois do evento, saí dali convencida de que não existe a tal maldição das cidades-sede. Existe, sim, mau planejamento, desorganização, miopia governamental, corrupção. Prestei especial atenção ao fato justamente por estar saindo de uma cobertura olímpica – a de Londres. Barcelona é, apesar da imensa crise que fragiliza parte da Europa, exemplo de como aproveitar o marketing e os investimentos gerados por um evento planetário e mudar o destino de uma comunidade.
Gastou-se muitíssimo – 400% acima do orçamento original, segundo um estudo da Universidade Autônoma de Barcelona. E, vejam só, 78% desse dinheiro foi usado em novas áreas verdes e praias! Talvez por causa dessa clara prioridade para as áreas públicas Barcelona tenha se tornado, a partir de 1992, o quinto destino turístico da Europa!
Antes de 92 a cidade era bem diferente. No lugar onde nestas férias tentei espantar a palidez-escritório, há duas décadas havia fábricas, galpões e uma linha férrea que separavam Barcelona do Mediterrâneo. Dizem que o destino industrial da cidade foi selado pelo Generalíssimo Franco, contrariado pela resistência da brava população catalã durante a Guerra Civil. Para a Olimpíada de 92, as velhas docas foram demolidas e cinco quilômetros de praia foram urbanizados. Os apartamentos da Vila Olímpica são hoje disputadíssimos (ou pelo menos eram, antes da crise), uma marina foi criada e centenas de bares e restaurantes fervem na longa madrugada dos catalães.
O Porto Olímpico ganhou novas fronteiras com as construções que se seguiram a ele. Prédios incríveis de apartamentos e escritórios nessa nova região da cidade. Além dos hotéis, claro. Dinheiro privado numa região atraente, bonita e plenamente integrada ao Centro Velho por linhas de ônibus e metrô.
Tudo perfeito? Não, meus caros, a unanimidade não existe. Muitas das arenas olímpicas erguidas para 92 estão apenas acumulando pó desde então. É o caso do megaestádio para 65 mil pessoas, onde se realizaram as cerimônias de abertura e encerramento dos Jogos, além das competições de atletismo. Naquela época era difícil imaginar um estádio modular – até mesmo desmontável – como o construído na cidade de Londres nesta Olimpíada. Prejuízo de pequeno impacto se comparado aos incríveis benefícios trazidos para moradores e turistas.
É possível, sim, ser sede de uma Olimpíada que ainda apresente resultados extraordinários décadas depois de realizada. Mas, para isso, é preciso mais do que samba, sorriso e jeitinho. Para Barcelona, cidade média e de certa forma apartada do resto da Espanha, o desafio era menor do que o do Rio de Janeiro. Mas nem por isso deixa de ser uma grata inspiração. Temos quatro anos para mostrar ao mundo que sim, nossa mulata é a tal e nosso futebol é arte pura. Mas que somos muito mais do que essa fama que nos precede. 

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