A arquitetura do Palácio dos Doges guarda dois aspectos que se chocam: as suntuosas salas do poder, ricamente decoradas por grandes mestres da pintura veneziana, nas quais os Doges viviam e supervisionavam a administração da República e onde recebiam seus visitantes, príncipes e embaixadores de outros países, e um mundo paralelo, muito misterioso, chamado em nossos dias de Itinerários Secretos.
Além das prisões e das tristemente célebres salas de tortura e execução, o visitante passa por pequenos ambientes densos de história e por uma experiência que a mim me pareceu curiosa: passeia (por isso talvez o número reduzido de pessoas em cada grupo) pelos caibros que ficam acima do belíssimo teto da Sala do Grande Conselho.
As prisões:
Os Pozzi, calabouço em pedra que tem esse nome desde o século XIII, era dividido em dois andares. O mais baixo ficava no nível da rua e era muitas vezes invadido pelas águas, o que tornava o ambiente mais triste ainda pela insalubridade.
Em suas paredes vemos inscrições muito antigas, algumas famosas, como a de um padre que detido ao ser traido por um amigo escreveu a frase que virou um provérbio: Deus me preserve de meus amigos, etc. etc...
As Prisões de Chumbo foram criadas justamente para acabar com os Pozzi. Receberam esse nome porque ficavam justo abaixo dos telhados do palácio, recobertos por placas de chumbo, o que as tornava geladas no inverno e muito quentes no verão. Os Pozzi passaram a ser ocupados apenas por prisioneiros comuns, extremamente perigosos.
(Em 1797 uma revolta popular acabou com as prisões e as destruiu, deixando apenas um dos calabouços para que a história não se perdesse).
Suas celas eram reservadas aos presos políticos e foi numa delas que Casanova foi aprisionado e da qual fugiu, numa história rocambolesca, escrita por ele mesmo. Mas seu relato sobre a prisão é fiel à arquitetura do lugar e por isso muitos creem seja verdadeiro.
Outro prisioneiro: Giordano Bruno, que ali ficou até ser entregue à Inquisição.
Os suspiros:
Resta ainda falar do Palácio das Prigioni Nuove (acima, na fachada que dá para a laguna). Ao todo, somando as celas dos Pozzi e as das Prisões de Chumbo, só havia 25 celas. Foi por isso que ergueram outra ala, separada do corpo do palácio pelo Rio (pequeno canal) di Palazzo. Seu acesso era pela Ponte dos Suspiros.
A linda ponte liga o Palácio às Prigione Nuove e foi construída entre 1595 e 1605. Sua delicadeza externa, notável na foto abaixo, contrasta com seu interior lúgubre que é dividido ao comprido em dois corredores para que os detidos, quando levados diante do juiz, não pudessem nem se ver, nem se falar.
Ela foi apelidada pelo povo de Ponte dos Suspiros e é de se imaginar os longos e sentidos suspiros dos presos que por ela passaram.
Falta falar da Ponte da Palha (abaixo). Fica na margem da laguna, na Riva degli Schiavoni, entre o Palácio Ducal e as Prigioni Nuove. É pequena, estreita, e dela temos a melhor vista da Ponte dos Suspiros e do pôr do sol que é uma das características mais marcantes dessa cidade tão marcante em tudo. Por isso está sempre cheia de turistas...
Amanhã encerro essa 'novela' com o espólio de Constantinopla (antes Bizâncio, hoje Istambul).
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