O Globo
Pelas próprias características do tema, propostas econômicas tendem a ser mais objetivas. A candidata Marina Silva (PSB) não poderia ser mais clara em pontos básicos de seu programa de governo, neste campo: restaurará o chamado “tripé” — metas de inflação, responsabilidade fiscal e câmbio flutuante —, para estabilizar a economia; formalizará a autonomia operacional do Banco Central, com mandato fixo para diretores; metas fiscais destinadas à União e instituição do Conselho de Responsabilidade Fiscal com a missão de auditá-las, entre outros itens.
Já no campo político, o texto do programa de Marina não tem a mesma objetividade, é perigosamente vago. Admita-se que também o tema contribui para algum devaneio. Mas não necessariamente.
É óbvio que todos os partidos e candidatos se autointitulam democratas. E não há por que duvidar deles. O xis da questão é saber o entendimento do candidato sobre os mecanismos de funcionamento do regime de democracia representativa, estabelecido na Constituição.
Reconhece-se, e não apenas no Brasil, que este tipo de regime — o melhor já criado até hoje — deve passar por aperfeiçoamentos, para aproximar as ruas dos centros de decisão, mas sem abalar o sistema de representação.
Nos Estados Unidos, por exemplo, estados decidem por plebiscitos uma série de questões objetivas locais, em que cabem respostas binárias — sim ou não. (Daí ter sido um equívoco da candidata Dilma Rousseff, no debate da Bandeirantes, citar os plebiscitos americanos para justificar consultas populares no Brasil sobre temas intrincados como a reforma política).
Marina Silva e o PSB se propõem a fazer uma “democratização da democracia”. A candidata precisa esclarecer o que é isso. Até porque seu berço ideológico é o mesmo de frações do PT que namoram métodos de “democracia direta” desenvolvidos nos laboratórios do bolivarianismo chavista — arranjo de poder em grave crise na América Latina.
Constam do programa da candidata algumas platitudes: “a política precisa absorver a mensagem de reconectar eleitos e eleitores”; “vamos ampliar a participação, a transparência e a ética e, ao mesmo tempo, tornar mais eficiente o funcionamento das instituições republicanas (...)”. Isso com a ajuda da internet, como, de fato, pode ser.
Falta clareza. Em específico, sobre o papel do Legislativo nesta “democratização da democracia”. Este ponto é estratégico até porque Marina Silva se tornou forte candidata numa trapaça do destino, sem que tenha partido próprio. O PSB apenas a hospeda.
Sem comparar pessoas, a experiência histórica é negativa quando candidatos pensam poder prescindir da estrutura partidária. O que se agrava caso, sob o pretexto de se dar mais legitimidade às decisões, fundamentos da democracia representativa sejam adulterados.
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