segunda-feira, 29 de abril de 2013

Cartas de Londres: Imagina nas Olimpíadas, por Mauricio Savarese



Para um turista que chega à capital britânica neste início de primavera, é difícil de imaginar que um ano atrás Londres transbordava em pessimismo, chuva e uma tensão de cortar no ar com faca conforme se aproximavam os Jogos Olímpicos.
Em alguma medida, e com problemas em escala bem menor, a percepção negativa antes de um evento gigantesco e o que acontece depois pode lá ter alguma semelhança com o que se passa no Brasil hoje e o que virá depois da Copa do Mundo.
Com justiça ou não, Londres vivia há cerca de um ano um festival de expectativas trágicas (incluindo terrorismo, clima horroroso e fracasso dos atletas locais). O medo de uma vergonha diante do mundo dava calafrios nos britânicos mais engajados.
Hoje, conversar com um londrino sobre aqueles 21 dias entre julho e agosto de 2012 vem quase sempre na companhia de um suspiro saudoso. A maior preocupação, acreditem se quiserem, era com uma pane no sistema de transportes. Afinal de contas, alguma das mais de 270 estações de metrô poderia sofrer ataque terrorista, fechar para reparos ou simplesmente estar cheia demais.
Agora, cada vez que há um atraso de dois minutos se ouve isto: “Nas Olimpíadas não atrasava nunca, tudo foi perfeito.” E um suspiro.
Havia até jornal protestando contra as tempestades uma semana antes da abertura. “Sim, nós chegamos a esse nível de mau humor”, me diz uma designer. “Mas depois que começou e deu tudo certo foi tudo incrível. As pessoas eram mais simpáticas, você fazia amigos facilmente, tinha sempre uma festa. Londres era uma cidade antes, outra durante e hoje é mais como antes, mas sabemos que pode ser diferente.” Suspiro.


O que não mudou por aqui foi o interesse de fanáticos por futebol em irem ao Brasil para a Copa do Mundo. Eles têm ideia de que há violência e que a infraestrutura não é como a daqui. Mas como a nossa grama é mais verde, não faltaram londrinos desde um ano atrás me dizendo que querem “ver futebol de dia e dormir na praia à noite”.
É verdade que em Londres-2012 não houve tantas denúncias de corrupção, promessas não cumpridas nem dirigentes trapalhões oferecendo material de crítica diariamente.
Olimpíadas em uma cidade apenas também são menos complexas do que Copas do Mundo. Mas a julgar pela saudade que os londrinos têm daquilo que adoravam detestar e temer, dá para imaginar um Brasil bipolar nos próximos tempos.

Mauricio Savarese é mestrando em Jornalismo Interativo pela City University London. Foi repórter da agência Reuters e do site UOL. Freelancer da revista britânica FourFourTwo e autor do blog A Brazilian Operating in This Area.Twitter:@msavarese. Escreve aqui às segundas-feiras.

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