sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

PSICANÁLISE DA VIDA COTIDIANA Mortes no Trânsito: um vértice do homicídio!



CARLOS VIEIRA
Um dos fatos impressionantes no “pressuposto mundo civilizado” é que o animal humano é o ser vivo que mata mais o seu semelhante. O ser humano dito civilizado! 
Sigmund Freud deixou em sua brilhante e atual obra que o ser humano traz em sua essência, em sua natureza, dois impulsos, ou instintos (pulsões): o instinto de vida e o instinto de morte. Quero enfatizar nesse momento, o instinto de morte, essa força somato psíquica onde o desejo é a destruição: impulso agressivo em direção a outro ser humano (homicídio), e o impulso agressivo em direção a si mesmo (suicídio). É óbvio que somente existe a força homicida. O ato de matar! 
Mata-se por instinto, perversidade; mata-se por inveja, ciúme, rivalidade e competição; mata-se por narcisismo (orgulho) ferido; mata-se pela ofensa à honra; mata-se como resultado da onipotência, arrogância, estupidez; estados mentais encontrados predominantemente em pessoas sob estado de embriagues alcoólica. 
O que é o homicídio no trânsito? Digo homicídio para dar tônica na palavra matar, para enfatizar que a natureza humana, quando em estado de embriaguez. A mente é povoada por um estado “psicótico” que compreende os seguintes elementos de ordem neurofisiológica e psicopatológica: reflexos diminuídos, atenção e discernimento da avaliação de perigo, nula; fantasia de poder onipotente, ou seja, nada me acontecerá e darei conta de dirigir sem perigo; egoísmo mortífero onde predomina a minha vontade, o meu desejo, a minha satisfação, sem avaliar que pode destruir o meu semelhante; falta de respeito às pessoas que estão dentro do veículo, convencendo a todos que nada acontecerá: eu estou bem, posso dirigir sem problemas! Poderia ficar descrevendo comportamentos corriqueiros que os leitores sabem e têm consciência disso. 
A questão que se infere é: como civilizar o ser humano? Quais as medidas efetivas, do ponto de vista de política social para educar no sentido de prevenir que o impulso de morte, natural do ser humano, se domesticado, civilizado? 
No sentido individual, penso que divulgar e conscientizar que a mente tem uma força homicida é fundamental. A psicanálise contemporânea oferece não a cura da loucura, mas a capacidade de cuidar dela (loucura), por mais que isso espante as pessoas. Somos loucos, todos, em algum momento, em alguma situação. Sempre digo que existem os loucos sãos e insanos. Nós temos uma loucura que se manifesta, nos sonhos, nos pesadelos, em estados tóxicos, e em momentos de arrogância, estupidez e pretensiosidade de nos sentirmos muito poderosos. Dirigir é um exercício de poder, poder que pode ser utilizado sadiamente para se locomover, para viver, para encurtar espaços, um meio de transporte; mas dirigir pode ser uma arma para realizar o impulso destrutivo, consciente e inconsciente. 
O homicida do trânsito, fala-se, deveria ter culpa. Melhor seria a palavra responsabilidade, culpa exige castigo e, após o castigo volta-se a matar; responsabilidade é a capacidade de sentir respeito e consideração pelo outro. Responsabilidade desenvolve mudança, crescimento e transformação. Responsabilidade é um sentimento amoroso que considera o ferimento causado ao outro, e daí aparece a mudança na qualidade da relação interpessoal – isso é desenvolver civilidade! 
Do ponto político social os recursos são outros: No dia 11 de maio foi lançado um programa mundial chamado de Década de Ações para a Segurança no Trânsito – 2011/2012, promovido pela Organização Mundial da Saúde. Nessa data, 178 países signatários da Resolução A/64/L44 da Organização das Nações Unidas anunciaram seus planos de ação: a meta é reduzir em até 50%, o índice de mortalidade nas ruas e estradas desses países durante esse período. 
No Brasil, o governo lançou O PARADA – Pacto Nacional pela Redução de Acidentes. Um pacto pela Vida, coordenado pelo Ministério das Cidades. Através do DENATRAN, O PARADA promove campanhas de conscientização, ações de mobilização e educação com o objetivo de diminuir o número de mortes e outros danos causados por acidentes de trânsito. Acrescente-se que O PARADA é um pacto que conta, além do governo, com a participação de empresas privadas, organizações não governamentais e qualquer grupo comunitário que desejar participar: é um pacto pela Vida!
Vida, caro leitor, lembra-se? O outro impulso ou instinto componente da natureza humana. Civilidade é a predominância da vida sobre a morte.
Carlos.A.Vieira, médico, psicanalista, Membro Efetivo da Sociedade de Psicanálise de Brasilia e de Recife. Membro da FEBRAPSI e da I.P.A - London.

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