CARLOS VIEIRA
J.S.Bach eternizou-se no ritmo do seu “baixo contínuo”, abrindo as portas para a improvisação musical. L. Beethoven, em seus últimos quartetos mostrou o desconforto e a beleza da dissonância. C. Debussy criou o que chamava de “frases musicais femininas”, ou seja, compunha ancorado em harmonias abertas, sem conclusão, deixando no ar aquilo que a música mostrava ainda inaudível. I. Stravinsky ofertou a beleza, contraponto e as síncopes de um ritmo primitivo e contemporâneo. Einstein quebrou o absoluto em sua angústia da relatividade. Heisenberg ganhou um Nobel pela sua “teoria da incerteza”.
Oscar, Oscar Niemeyer, anjo caído de prematuridade veio ao mundo para ficar eterno em sua maneira de arquitetar um universo de curvas sonorosas. Niemeyer olhava para fora, para o mundo, daí sua preocupação mais com as formas do que com a funcionalidade. O pensamento de Oscar sempre foi aberto, infinito, não conclusivo e sem fechar as ideias. Não foi um intimista, ou alguém preocupado com o desejo de arquitetar para qualquer “corte imperial”, pelo contrário, sua obra vai para onde o povo está, para a imensidão de um horizonte infinito. A reta, o pensamento longitudinal foi ultrapassado por uma dimensão “físico-quântica”, helicoidal, interminável e insaturada.
Por que um gênio? A genialidade, segundo Wilfred Bion, psicanalista indiano, pensador pós-moderno do Sec.XX, é a capacidade que uma pessoa tem de tirar proveito da “loucura sana”. Oscar jamais poderia ser um neurótico, funcionário público, depressivo, esperando a aposentadoria na doce ilusão de ser feliz! Oscar era inquieto, criativo, intuitivo, capaz de em meia hora fazer brotar um projeto. A rapidez de sua criatividade não obedecia ao tempo cronológico, mas às informações e inspirações de um inconsciente privado e coletivo. Aliás, nada nesse homem foi escondido, trapaceado, falso, e que tenha obedecido a alguma ordem de governo, e mesmo de um Universo preestabelecido. Liberdade foi seu lema, e além dela, um traço de personalidade marca o arquiteto – a generosidade. Não acumulou riqueza, pensou e ajudou até seus funcionários mais simples a terem seu lar, uma casa, um futuro.
Lembro agora de trechos do poema de Manuel Bandeira – Poética - “Estou farto do lirismo comedido. Do lirismo bem-comportado... Abaixo os puristas... Quero antes o lirismo dos loucos. O lirismo dos bêbedos. O lirismo difícil e pungente dos bêbedos. O lirismo dos clowns de Shakespeare. – Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.”
Oscar Niemeyer foi um homem da rua, dos espaços abertos. Sabia ouvir o samba, fazer um Sambódromo, se deliciar e se inspirar na música erudita. Ladeado pelos acordes de Tom Jobim e convivendo com as letras românticas de Chico Buarque, Niemeyer tinha bossa nova e estilo dissonante das batidas de João Gilberto. Oscar era tão criativo, expansivo, que é inteiramente compreensível como um homem desse estilo tinha uma fobia de voar. Imaginem, leitores, que seria do nosso Arquiteto Maior se não tivesse medo de voar? Em seus voos, ele teria perdido o sentido da gravidade e não voltado mais. Às vezes o medo é uma proteção de uma “explosão sem volta”. Até nisso, como frisei acima, ele soube conviver com sua “loucura”.
“O gênio, que fazia concreto flutuar e repetia que a vida era um sopro, foi sepultado com a simplicidade e a leveza dos seus traços”, escreveu João Valadares, no Correio Braziliense de domingo último.
Parodiando Manuel Bandeira.
Imagino Oscar Niemeyer entrando no céu:
-Licença, meu branco!
-Licença, meu branco!
E São Pedro Bonachão:
-Entra, Oscar. Você não precisa pedir licença.
-Entra, Oscar. Você não precisa pedir licença.
Oscar foi recebido por Juscelino, Jobim, Vinícius, Lúcio Costa, Manuel Bandeira e Carlos Drummond.
Aqui embaixo ficaram suas Obras cantando a Liberdade e a Generosidade. Os gênios não morrem, estão guardados dentro do espaço afetivo das nossas mentes!
Carlos.A.Vieira, médico, psicanalista, Membro Efetivo da Sociedade de Psicanálise de Brasilia e de Recife. Membro da FEBRAPSI e da I.P.A - London.
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