sábado, 20 de outubro de 2012

Petralhas resolvem patrulhar ministro do Supremo que foi ao lançamento do meu livro! Ou: Por que não dar ambrosia a ruminantes



O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, esteve no lançamento de “O País dos Petralhas II” na Livraria Saraiva do Shopping Pátio Brasil, em Brasília, na terça-feira. Tratou-se de um encontro público, ao qual compareceram mais de 400 pessoas. Não comentei que o ministro esteve presente porque pareceria jactância. Ah, sim: aproveito para informar que a senadora Kátia Abreu (PSD-TO) também foi. Como não era uma reunião clandestina, como o encontro foi fartamente fotografado pelos leitores, como há filmes na Internet, é evidente que a informação de que Mendes esteve presente iria circular. Ele não foi lá escondido. Aliás, ao chegar, foi entusiasticamente aplaudido.
O subjornalismo de aluguel da rede e os petralhas decidiram fazer barulho a respeito: “Olhem que absurdo! O ministro foi ao lançamento do livro do Reinaldo Azevedo! Como pode?”. Segundo um texto delinquente que circula por aí, que me foi enviado por um leitor, meu livro “criminaliza o PT”. Não tenho o que fazer com a ignorância alheia. Se as pessoas não conhecem o sentido do verbo “criminalizar”, fazer o quê? O PT é apenas um dos temas de “O País dos Petralhas II”, mas está longe de ser o principal. Dos 113 artigos ali coligidos, só 22 dizem respeito ao partido e sua experiência de poder. Mas isso é o de menos. Vamos ao ponto.
Ir ao lançamento de um livro não implica concordar com tudo o que há nele — e é certo que Mendes não concorda. Como eu sei? O Capítulo 8, por exemplo, chama-se “De juízes e juízos”. Trata de assuntos relativos ao Poder Judiciário. Um dos textos, intitulado “Marcha da insensatez” (da página 313 à 318), faz uma crítica severa a decisões tomadas pelo Supremo — algumas delas com o voto favorável de… Mendes! Não há motivo para ele endossar a minha opinião expressa nesse texto (e certamente em outros tantos), ou teria votado de modo diferente.
Qual é o busílis? Mendes é um democrata, um espírito tolerante, alguém que acolhe a diferença — como sou. Esteve lá porque temos uma relação profissional cordial, não porque pensemos a mesma coisa: ministros do Supremo falam com jornalistas, jornalistas falam com ministros do Supremo. Os petralhas — que combato, sim! — fizeram isto com o Brasil: uma autoridade não pode ir a um evento público de lançamento de um livro de alguém que eles têm como “inimigo” sem que isso seja considerado uma afronta.
Que gente curiosa! Que gente exótica! A ida do ministro ao lançamento do meu livro é vista como a adesão ao antipetismo: “Como pode fazer isso em meio ao julgamento?”. Pois é…
Lembro, por exemplo, que, por cinco votos a quatro, o Supremo rejeitou a denúncia contra o ex-ministro Antonio Palocci no episódio da quebra do sigilo do caseiro Fracenildo. Um dos votos contrários — e, pois, favorável a Palocci — foi de Mendes. Expressei a minha discordância no blog. Os petralhas acharam que ele agiu certo. Quando um integrante do STF vota em favor de um membro do partido,  é apenas um homem isento; quanto vota contra, é ou um golpista ou um traidor.
Até agora, no caso do mensalão, concordei com todos os votos de Joaquim Barbosa e Luiz Fux — que não divergiram entre si. Os dois não estiveram na livraria Saraiva. Também não apareceu por lá Ayres Britto, que deixou de acompanhar o relator em apenas três votos. Mas Mendes, que já divergiu nove vezes, foi! Exigir de uma petralha que adote a pluralidade de ideias como um valor é como oferecer ambrosia a ruminantes. Eles gostam é de capim. É da sua natureza.
Que coisa! Mendes não pode ir ao lançamento de seu livro sem que isso arranhe, segundo essa gente, a sua isenção. Prova de independência dá um membro da corte quando cita, sei lá, José Eduardo Cardozo, ministro da Justiça, ou Márcio Thomaz Bastos, advogado de um dos réus e conselheiro de Lula, como referências intelectuais. Isso já aconteceu nesse julgamento.
Por que Mendes não iria? O arquivo reúne o que tenho escrito sobre o julgamento. Participei de 28 debates na VEJA.com sobre o tema. Estão disponíveis no Youtube. Desafio alguém a provar que tenha escrito ou dito coisas que desmereçam a instituição — mesmo quando discordo do voto deste ou daquele ou quando reprovo um ou outro comportamentos.
Anteontem, o ministro Ayres Britto, que tem atuado com correção, numa de suas considerações, exaltou a pena de alguns jornalistas. Pôs na lista Janio de Freitas. Em seus delírios, este senhor tem acusado, frequentemente, o julgamento de golpismo, associando-o ao suicídio de Getúlio e ao movimento militar de 1964!!! Talvez o ministro ignore as diatribes do outro, não sei. Entendo que o elogio ao jornalista seja devido ao estilo — há quem goste… —, não às teses. Britto certamente não concorda com a acusação de que comanda uma Casa golpista. Os petralhas devem achar a deferência justa, isenta e legítima.
Mendes foi ao lançamento do meu livro porque não se deixa patrulhar por vagabundos — e demonstra isso mais uma vez. Foi aplaudido. Mas também não tem medo de ser vaiado. Divergimos, sim, em vários temas — e isso já ficou claro no blog. Mas convergimos numa coisa: acreditamos que o direito tem de ser achado nas leis. Podem chiar à vontade. Quem é dono da sua vontade não se deixa intimidar.

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