LEGADO
Para Portugal, Maria da Glória levou a informalidade:
andava a pé e fazia crochê em bancos públicos
Quando d. Pedro I gritou independência ou morte e abdicou do trono de Portugal para se tornar imperador do Brasil, foi a ela que o monarca passou a responsabilidade de governar os portugueses. Sua primogênita Maria da Glória, porém, tinha apenas 7 anos quando ascendeu ao posto de rainha de Portugal com o nome de d. Maria II. E, brasileira de nascimento, a menina vivia na chácara onde a sua mãe, a imperatriz Leopoldina, a pôs no mundo, na quinta da Bela Vista, em São Cristóvão, no Rio de Janeiro. “Maria da Glória – a princesa brasileira que se tornou rainha de Portugal” (Editora Octavo) é o título de um dos livros mais vendidos há meses em Portugal e que acaba de desembarcar no Brasil.
Resultado de uma extensa pesquisa sobre as cartas escritas por Leopoldina, d. Pedro I, marechais, duques, embaixadores, políticos e as correspondências trocadas entre Maria da Glória e a rainha Vitória da Inglaterra, a obra avança ao expor as marcas da infância fluminense na futura rainha portuguesa. “Os historiadores portugueses tendem a olhar para Maria da Glória a partir do momento em que ela ocupa o trono e não dão tanta importância para o que viveu no Brasil”, disse a autora Isabel Stilwell à ISTOÉ. A filha de d. Pedro I cresceu em uma casa conturbada pelos episódios de infidelidade do pai, ora temperamental e violento, ora afetuoso e dedicado aos filhos. Logo nas primeiras páginas isso fica claro.
Resultado de uma extensa pesquisa sobre as cartas escritas por Leopoldina, d. Pedro I, marechais, duques, embaixadores, políticos e as correspondências trocadas entre Maria da Glória e a rainha Vitória da Inglaterra, a obra avança ao expor as marcas da infância fluminense na futura rainha portuguesa. “Os historiadores portugueses tendem a olhar para Maria da Glória a partir do momento em que ela ocupa o trono e não dão tanta importância para o que viveu no Brasil”, disse a autora Isabel Stilwell à ISTOÉ. A filha de d. Pedro I cresceu em uma casa conturbada pelos episódios de infidelidade do pai, ora temperamental e violento, ora afetuoso e dedicado aos filhos. Logo nas primeiras páginas isso fica claro.
"Nunca pensei em atrair outro homem senão o meu marido,
mas ele nunca pensou em mais nada senão em seduzir
outras mulheres (...) espero que Maria tenha mais sorte"
Imperatriz Leopoldina
Aos 7 anos, a menina, atrás de uma porta e tapando a boca com a mão para que os soluços não fossem ouvidos, presenciou a mãe sendo agredida pelo imperador, que insistia que a imperatriz comparecesse à cerimônia do beija-mão dele ao lado de sua mais famosa amante: Domitília de Castro, a marquesa de Santos. “Pedro (...) aceito que me mantenha presa na minha própria casa, protejo os nossos filhos desta vergonha, mas não tolero que venha aqui com essa mulher pedir-me que vá abençoar a vossa relação... que aceite a ir a esse beija-mão com ela de um lado, e eu do outro, como se fosse minha igual”, disse a ele Leopoldina, então grávida do oitavo filho.
Com a recusa da mãe, Maria da Glória ouviu gritos, sons de pontapés, empurrões e barulho de louça estilhaçada. Nem mesmo Domitília, que implorava para que a fúria do imperador cessasse, conseguiu contê-lo. “Quando entrei no quarto, a senhora d. Leopoldina estava atirada no chão, e a infanta d. Maria da Glória agarrada à mãe, num pranto sem fim”, relata a carta escrita por Maria Francisca de Portugal e Castro, a marquesa de Aguiar, dama de companhia da imperatriz. Birrenta como o pai, a então princesa do Brasil o enfrentava: “Julga que me vai fazer o mesmo que fez à mamãe? Eu sou rainha de Portugal, o meu avô é arquiduque da Áustria, e vou para a Europa para longe de si, e dessa jararaca (Domitília), e levo os manos comigo. Todos.”
Com a recusa da mãe, Maria da Glória ouviu gritos, sons de pontapés, empurrões e barulho de louça estilhaçada. Nem mesmo Domitília, que implorava para que a fúria do imperador cessasse, conseguiu contê-lo. “Quando entrei no quarto, a senhora d. Leopoldina estava atirada no chão, e a infanta d. Maria da Glória agarrada à mãe, num pranto sem fim”, relata a carta escrita por Maria Francisca de Portugal e Castro, a marquesa de Aguiar, dama de companhia da imperatriz. Birrenta como o pai, a então princesa do Brasil o enfrentava: “Julga que me vai fazer o mesmo que fez à mamãe? Eu sou rainha de Portugal, o meu avô é arquiduque da Áustria, e vou para a Europa para longe de si, e dessa jararaca (Domitília), e levo os manos comigo. Todos.”
"Quando for rainha de Portugal vou bater o pé, ser teimosa,
determinada como Domitília (acima), que consegue tudo o que quer"
Maria da Glória
Apesar das mágoas pelo tratamento dispensado por d. Pedro I à sua mãe, Maria da Glória e o pai tinham uma forte ligação. O imperador, inclusive, foi a Portugal para tomar o trono do irmão Miguel, que se autoproclamou rei, enquanto a princesa brasileira rumava de barco à Europa. Seu tio Miguel foi seu primeiro marido. Aos 15 anos, já longe do Brasil, d. Maria II iniciou o reinado português. Para a nova terra, levou uma informalidade incomum às cortes europeias. “Ela tinha gosto por andar a pé, fazia crochê ao lado dos filhos em bancos de jardins públicos e não foi dramática com os partos por ter visto como ocorria a sua volta, no Brasil”, conta a autora Isabel.
Maria da Glória teve 11 filhos – morreu aos 34 anos ao dar à luz o último deles. Provavelmente pelos episódios presenciados na infância, manteve, mesmo quando grávida, uma vida sexual ativa com o seu marido, Fernando de Saxe-Coburgo-Gotha. “Não queria correr o risco de d. Fernando agir como o pai, d. Pedro I”, diz a escritora. Pensando em prestigiar a amante marquesa de Santos, o imperador do Brasil agrediu fisicamente Leopoldina grávida. Ela veio a falecer no mês seguinte, pouco tempo depois de ver o filho que esperava nascer morto. A princesa do Brasil foi a última pessoa a falar com a mãe. E fez um pedido à marquesa de Aguiar. “Senhora d. Maria Francisca, pode pôr a Maria Pequenina no caixão com a minha mãe”, disse ela, referindo-se à boneca que, diziam, era parecida com Maria da Glória. Foi nesse ambiente bem brasileiro, não muito sereno e repleto de amor, que começou a ser moldado o caráter da rainha d. Maria II, de Portugal.
Maria da Glória teve 11 filhos – morreu aos 34 anos ao dar à luz o último deles. Provavelmente pelos episódios presenciados na infância, manteve, mesmo quando grávida, uma vida sexual ativa com o seu marido, Fernando de Saxe-Coburgo-Gotha. “Não queria correr o risco de d. Fernando agir como o pai, d. Pedro I”, diz a escritora. Pensando em prestigiar a amante marquesa de Santos, o imperador do Brasil agrediu fisicamente Leopoldina grávida. Ela veio a falecer no mês seguinte, pouco tempo depois de ver o filho que esperava nascer morto. A princesa do Brasil foi a última pessoa a falar com a mãe. E fez um pedido à marquesa de Aguiar. “Senhora d. Maria Francisca, pode pôr a Maria Pequenina no caixão com a minha mãe”, disse ela, referindo-se à boneca que, diziam, era parecida com Maria da Glória. Foi nesse ambiente bem brasileiro, não muito sereno e repleto de amor, que começou a ser moldado o caráter da rainha d. Maria II, de Portugal.
"Em minha casa mando eu, na minha mulher mando eu. E eu
ordeno que a senhora se vista e desça aos salões neste minuto"
D. Pedro I, em discussão com a esposa Leopoldina
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