14/06/2012
às 15:56 \ Feira Livre
Augusto Nunes
PUBLICADO NO GLOBO DESTA QUARTA-FEIRA
A proximidade do julgamento do mensalão agita os espíritos militantes e passionais, mesmo aqueles mais sofisticados, revestidos de uma camada de educação e fineza.
Já houve a atrapalhada intervenção do ex-presidente Lula no encontro indevido com o ministro do Supremo Gilmar Mendes, um dos juízes do processo, intermediado pelo também ex-presidente da Corte Nelson Jobim. Artilharia no próprio pé, pois a iniciativa deve ter levado o STF a acelerar o calendário do julgamento. Passou, também, o gesto infanto-juvenil do mensaleiro José Dirceu de conclamar estudantes a ir às ruas, no estilo “Cinelândia 1968″, para defendê-lo perante os 11 magistrados do Supremo. Teatral e inócuo, por óbvio.
No fim de semana, foi a vez do ex-ministro da Justiça no primeiro governo Lula, Marcio Thomaz Bastos, no programa “Ponto a Ponto”, da TV Bandeirantes, entrar em ação, de forma mais sutil, ao seu estilo. Ministro quando explodiu o escândalo, em 2005, e hoje advogado de um dos réus, José Roberto Salgado, ex-diretor do Banco Rural, instituição acusada de participar da operação de lavagem daquele dinheiro, Thomaz Bastos explora um tema caro a certos petistas: a suposta interferência da imprensa profissional no caso.
Teme o advogado o que chama de “publicidade opressiva” dos meios de comunicação independentes contra os réus. De forma elegante, até oblíqua, o advogado repõe em circulação a tese surrada e risível de que uma “imprensa golpista” inventara o mensalão e, em seguida, tratara de prejulgar os denunciados pelo Ministério Público. A tese até recebeu a unção de uma certa intelligentzia petista. Agora, na visão de Thomaz Bastos, influenciáveis ministros do STF, sufocados por uma “publicidade opressiva”, se preparam para executar a condenação orquestrada.
Ora, quem denunciou o mensalão foi um dos participantes dele, o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), da base do governo. O esquema de desvio de dinheiro público e privado para comprar apoio parlamentar ao governo não surgiu de qualquer laboratório de maquiavelismos oculto em alguma redação. Foi escancarado numa entrevista de Jefferson à “Folha de S.Paulo”. Lula não iria fazer um pedido público de desculpas à população por algo inexistente (embora tenha aderido depois à tese conspiratória). Tanto que os maiores desdobramentos políticos do caso foram a cassação dos mandatos de Roberto Jefferson e do principal denunciado, José Dirceu, deputado pelo PT paulista.
Impossível mascarar a verdade de que a imprensa profissional é movida por fatos. Já a opinião sobre eles é exposta de maneira translúcida no espaço dos editoriais. E é fato, por exemplo, que, em 2006, o então procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, ofereceu denúncia contra os mensaleiros ao Supremo. Outro fato: no ano seguinte, os ministros consideraram consistentes os argumentos do MP para abrir o processo, no qual Dirceu é tachado de chefe de uma “organização criminosa”.
E serão fatos condenações e absolvições a serem decididas no julgamento que se inicia em agosto. Nada mais nem menos do que isto
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