Gabriela G. AntunesÉ jornalista. Morou nos EUA e Espanha antes de se apaixonar por Buenos Aires. Na cidade, trabalhou no jornal Buenos Aires Herald e hoje é uma das editoras da versão em português do jornal Clarín. Escreve aqui todos os sábados
“Ni una menos” virou o mote da campanha. Algo que não nasceu na Argentina, foi emprestado de uma campanha similar dos anos 90 na cidade de Juárez, no México
Já havia certo incômodo, e isso não se restringia à Argentina, com o “piropo”, a cantada de rua que tanto chateia as mulheres. De “diosa” (deusa), “bombon”, divina, a coisa foi escalando para um assédio inoportuno.
Uma onda de crimes passionais hediondos, com requintes de crueldade, o sumiço de meninas menores de quatorze anos, o tráfico de mulheres e a violência doméstica foi a última gota. Cartunistas famosos se uniram, houve mobilização nas redes sociais e finalmente uma manifestação levou mais de 150 mil pessoas ao Congresso argentino no último três de junho. Além do protesto na capital, mais de 100 cidades deram voz a mulheres que, por muitos anos, se calaram.
Uma onda de crimes passionais hediondos, com requintes de crueldade, o sumiço de meninas menores de quatorze anos, o tráfico de mulheres e a violência doméstica foi a última gota. Cartunistas famosos se uniram, houve mobilização nas redes sociais e finalmente uma manifestação levou mais de 150 mil pessoas ao Congresso argentino no último três de junho. Além do protesto na capital, mais de 100 cidades deram voz a mulheres que, por muitos anos, se calaram.
“Ni una menos” virou o mote da campanha. Algo que não nasceu na Argentina, foi emprestado de uma campanha similar dos anos 90 na cidade de Juárez, no México.
Na Argentina, com população de pouco mais de 40 milhões, em 2014 ocorreram 277 feminicídios. A maioria tinha entre 19 e 30 anos. Em 62% dos casos, o responsável foi alguém que teve envolvimento emocional com a vítima. E estes dados podem ser bem piores, já que as ONGs locais reclamam da ausência de números oficiais.
No Brasil, essa situação parece, em termos globais, mais grave: são mais de cinco mil mortes ao ano, 472 ao mês, 15 ao dia, uma vítima a cada uma hora e meia.
A questão na Argentina ficou mais evidente nos últimos meses, quando uma onda de crimes cometidos contra mulheres, por seus namorados ou esposos, tomou conta dos noticiários locais. A banalidade das motivações para os assassinatos, a tenra idade das vítimas e a crueldade com a qual foram perpetrados os crimes chocaram a sociedade local. Mulheres queimadas, espancadas e até enterradas vivas deixaram os argentinos de cabelo em pé. O machismo, enraizado na sociedade, entrou para a pauta de discussão.
O feminicídio como crime hediondo, com pena de prisão perpétua, foi aprovado em 2012 na Argentina e está caracterizado como crime cometido por parentes, descendentes, cônjuge ou ex-cônjuge.
Uma das vozes mais importantes para a aprovação da lei foi a do pai da turista francesa Cassandre Bouvier, assassinada no norte argentino. Ela e uma amiga foram violentadas e mortas em uma trilha turística em Salta.
Em uma carta publicada no Jornal Le Monde, Jean-Michel Bouvier descreveu sua luta: “Eu me impus a idéia de que atos cometidos contra a liberdade das mulheres e, finalmente, sobre suas vidas, mereciam uma classificação específica com as mesmas conseqüências jurídicas que um crime contra a humanidade (...). Eu havia encontrado a bandeira de luta que teria sido um orgulho para minha Cassandre”.
Nem uma Cassandre a menos.
FONTE - http://noblat.oglobo.globo.com/cronicas/noticia/2015/06/cartas-de-buenos-aires-nem-uma-menos.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário