Carlos Chagas
Está o governo Dilma, melhor dizendo, além do Executivo, estão também o Legislativo e o Judiciário na situação daquele personagem que caiu do vigésimo andar de um edifício e, ao passar pelo décimo andar, comentou: “até aqui, tudo bem”. Tudo bem coisa nenhuma. Adianta muito pouco exaltar as excelências da democracia e afirmar que os protestos de rua exprimem o direito de o povo manifestar-se. Porque as manifestações se fazem contra as autoridades públicas. Contra o governo, contra Dilma, contra o Congresso e contra o Judiciário. Sem esquecer, também contra a ordem política, a ordem econômica e a ordem social.
O risco do colapso de nossas instituições parece à vista. Só que o país já sabe porque os jovens protestam, mas os jovens não sabem como dar seqüência aos protestos. Querem acabar com a corrupção, mas como? Melhores condições de ensino e saúde pública, fazendo o quê? Falta-lhes um programa, um roteiro.
Demos notícia, ontem, de uma idéia que se não fosse doida seria genial: adaptar parte dos elefantes brancos construídos por bilhões de reais para funcionarem, também, como escolas, universidades, centros de saúde e hospitais. Algo capaz de sensibilizar e empolgar todo mundo. Mas terá o governo coragem para tanto? Recursos? Ora, os lucros dos bancos, as remessas de milhões de dólares para o exterior, a parceria de grandes hospitais como o Sírio-Libanês e o Albert Einstein.
Uma conclusão surge inevitável: ou o governo sai na frente, combatendo o vandalismo e interrompendo a sanha dos baderneiros, ou o movimento pacífico logo amargará a rejeição do cidadão comum. Mesmo assim, faltará um plano de mudanças fundamentais, muito acima e além do PAC. Que tal começar pela ampla reforma do ministério, com a diminuição do número de pastas e sua entrega a técnicos de renomada competência, mandando passear os representantes de partidos desmoralizados?
A FALÊNCIA DO ESTADO
É constrangedor verificar o fracasso do Estado no cumprimento de suas obrigações para com a sociedade. Senão vejamos:
Diante da revolta dos jovens que ocuparam as ruas do país inteiro, assistimos primeiro uma ação desmedida e truculenta das polícias militares para depois sobrevir a omissão das corporações. Nada fez a autoridade policial diante do vandalismo praticado em São Paulo, no Rio, Belo Horizonte e outras capitais para impedir a depredação de próprios públicos, lojas e similares. Os animais ficaram e continuam à solta, registrando-se pequeno número de prisões quando as imagens transmitidas pela mídia mostram a maior parte deles de corpo inteiro, apesar do rosto encoberto.
Governadores e prefeitos determinaram o aumento nas tarifas dos transportes públicos sem promover estudos de situação nem prever as consequências. Em poucos dias, voltaram atrás premidos pelo império das circunstâncias, deixando sem resposta a indagação maior: se os reajustes eram necessários, foi sinal de fraqueza revogá-los. Se não eram, não deveriam ter sido adotados.
O combate à corrupção permanece oculto, com Legislativo e Judiciário tergiversando e não dando seqüência às apurações, punições e aprovação de novas medidas imprescindíveis a deixar os corruptos na defensiva. A construção dos estádios de futebol dá a medida de como se rouba patrimônio publico. As empreiteiras responsáveis pela implantação ou reforma de arenas orçadas em milhões passaram a sugar bilhões sem que ninguém reagisse, no poder público.
DIFERENÇAS
Em Paris, 1968, os estudantes ocuparam as ruas, estendendo seu protesto à França inteira e, depois, a muitas capitais da Europa. Insurgiam-se contra o imobilismo das instituições que discriminavam os jovens e engessavam a sociedade através de métodos arcaicos de domínio dos mais velhos. Foi o diabo, pois o movimento pegou feito sarampo e serviu para oxigenar a civilização. Quem ficou sem saída foi o presidente Charles De Gaulle, que depois de alguns dias de silêncio foi procurar nos militares com os quais estava rompido a ajuda necessária para o restabelecimento da ordem. Quanto tudo serenou, apareceu o reverso da medalha: uma passeata de quase um milhão de franceses desfilou pelos Campos Elísios em apoio ao presidente.
Alguém imagina que uma vez assentada a poeira da rebelião pacífica, mas nem tanto, dos jovens brasileiros, haverá ânimo para uma passeata em apoio de Dilma ou do Lula? São diferentes as situações
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