Os musicais são um gênero com um público muito especial. A grande literatura também. Não agradam a muita gente em um mesmo tempo histórico e atingem muitos leitores apenas quando somamos o tempo de sobrevivência.

A Odisseia não seria um best seller em nenhuma época, mas é um dos maiores livros da história quando somamos os seus leitores ao longo de 2.500 anos.

Por incrível que pareça, Os Miseráveis é ao mesmo tempo um filme musical, com base em uma das grandes obras da literatura mundial (grande na profundidade e no tamanho - nas obras completas de Vitor Hugo, da editora Lello & Irmão, de Lisboa, ocupa 1.316 páginas), que fascina qualquer espectador.

O diretor Tom Hooper conseguiu transformar um musical teatral em um musical cinematográfico, que ganha tanto em mensagem quanto em emoção. A cena de abertura traz a possibilidade do efeito cinematográfico, mas as músicas e cantos trazem a força que oferece um espetáculo teatral, ao vivo, presente.

Talvez no teatro, como ouvi de um amigo, a peça dê mais vontade de subir ao palco e cantar com os atores do que a vontade de entrar na tela como no cinema.

A história tão conhecida do livro mostra em primeiro lugar a perseguição entre um homem rígido da lei, em perseguição a um homem de uma moral rígida, que passou 19 anos preso em trabalho forçado, pelo simples fato de ter roubado um pão para alimentar uma sobrinha. Ao lado desta história, o filme mostra a tragédia da pobreza extrema na França do século XX. Talvez esta seja a maior força do filme: mostrar como vivem os miseráveis. E, sobretudo, graças à força da música.

Nas cenas mais belas, esteticamente, e mais belas, musicalmente, transita o clima revolucionário dos que querem a liberdade sem miséria e seus jovens revolucionários mortos em praça pública, esperando um levante do contra as forças conservadoras. Mas o povo fica em casa.

Um filme para ser visto e revisto.

Cristovam Buarque, senador pelo PDT do Distrito Federal e ex-reitor da Universidade de Brasília, resenhará aqui um livro publicado no exterior ou um filme