Texto de Daniel Pereira e Adriano Ceolin, publicado na edição daVEJA que está nas bancas
AINDA É POUCO
Os novos presidentes da Câmara e do Senado prometeram enfrentar os principais problemas do Congresso. O começo, porém, não foi muito alvissareiro
O Senado e a Câmara têm orçamentos bilionários, que crescem ano após ano e que, somente em 2013, consumirão 8,5 bilhões de reais dos cofres públicos. Essa dinheirama, coletada do bolso dos contribuintes, financia há décadas toda sorte de mordomias para parlamentares e funcionários, o que concorre para a desmoralização crescente do Poder Legislativo.
No início deste ano, no entanto, um sopro de novidade varreu o Congresso. Com novos comandantes eleitos, as duas Casas anunciaram medidas de corte de despesas. No Senado, a promessa é de um choque de gestão, ainda pendente de aprovação no plenário, que resultaria numa economia de 262 milhões de reais em dois anos.
Já a Câmara aprovou, na semana passada, o projeto que limita o pagamento de 14º e 15º salários aos congressistas, reduzindo o fardo de uma mamata existente há 67 anos. Essas decisões contrariam a tradição recente de deputados e senadores, sempre dispostos a aumentar os próprios privilégios e consolidar o espírito de corpo existente entre eles.
A dúvida é se apontam para um novo caminho ou apenas atendem aos propósitos políticos mais imediatos dos presidentes recém-empossados. O senador Renan Calheiros e o deputado Henrique Eduardo Alves, ambos caciques do PMDB, foram eleitos para dirigir seus pares, em fevereiro, apesar de responderem a denúncias variadas, que podem ser resumidas no fato de terem a imagem associada ao fisiologismo mais exacerbado.
Diminuir gastos, portanto, lustra a imagem de ambos e sinaliza para a opinião pública o começo de uma caminhada moralizadora. Diante do tamanho do problema, esse começo, porém, parece tímido demais. Henrique Alves, por exemplo, só planeja mais duas ações nessa seara.
Ele promete passar um pente-fino nos contratos firmados entre a Câmara e as empresas terceirizadas, que servem para empregar aliados de políticos e parentes de servidores. Além disso, afirma que moralizará o desembolso de horas extras aos funcionários, outra área em que a gastança corre solta.
Mas nada além disso. Henrique Alves não tem planos de acabar com nenhum privilégio dos nobres deputados, até porque os privilégios, segundo ele, nem sequer existiriam. “Discordo completamente da tese de que há mordomias.” O deputado enfatizou ainda que não tem a intenção de aumentar o rigor para com os colegas que só aparecem para trabalhar às quartas-feiras, ou mesmo para com aqueles que assinam o ponto e, logo depois, embarcam para seu estado.
“Os parlamentares brasileiros estão entre os que mais trabalham no mundo. Vou melhorar o marketing da Casa para mostrar como dignificamos o Parlamento”, afirma Alves. Nem mesmo o faz de conta na análise das notas fiscais utilizadas para justificar o uso da verba indenizatória será enfrentado.
Podem dormir tranquilas as excelências que gastam dinheiro público — sob o pretexto de custear a atividade parlamentar — em empresas de familiares e aliados ou que compram gasolina em quantidade suficiente para dar várias voltas ao redor do planeta. Pelo menos no discurso, a vida no Senado será um pouco menos doce.
Alvo de forte pressão popular, materializada numa petição assinada por 1,6 milhão de pessoas que pedem sua renúncia da presidência do Senado, Renan Calheiros mantém a promessa de seguir adiante com medidas moralizadoras.
“Cortes de mordomias são um processo irreversível. Precisamos aproximar o Parlamento da sociedade.” O senador diz que demitirá funcionários terceirizados que dão apoio administrativo nos gabinetes e reduzirá o número de secretarias e diretorias da Casa.
A esmagadora maioria das medidas, no entanto, atinge os servidores. Os senadores e suas mordomias serão poupados. A previsão, por enquanto, é que eles tenham apenas suas despesas médicas expostas à luz do sol. Despesas, registre-se, que continuarão sem limites.
Ou seja: debaixo da cortina de marketing, o prometido corte de gastos não passará de perfumaria no campo das mordomias.
A extinção do serviço médico da Casa, propalada como mais uma medida moralizadora de Calheiros, é outra iniciativa de pouquíssimo impacto. O ambulatório é a menor das despesas. O grosso dos gastos é com o reembolso das despesas médicas, que somam 100 milhões de reais por ano. Nisso, Calheiros não mexeu.
Na semana passada, ele apresentou um pedido de reembolso de 33.000 reais gastos com um dentista para a restauração completa de sua arcada dentária, clareamento dos dentes incluído.
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